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Operações de exportação, Contribuição Social sobre o Lucro Líquido e imunidade.

Comentários à Emenda Constitucional nº 33/01

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02/06/2005 às 00:00
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3. DA DISTINÇÃO ENTRE RECEITA E LUCRO:

Até agora se demonstrou, claramente, a aplicação da imunidade prevista no art. 149, § 2º, relativamente à CSLL. Mas o leitor poderia questionar acerca da distinção da hipótese de incidência desta contribuição social (lucro), que possui conceito diverso de receita, o que poderia constituir óbice à pretensa do contribuinte.

Entretanto, veremos neste capítulo que essa divergência conceitual não obstaculiza a fruição desse incentivo fiscal.

Façamos um retrospecto legislativo e uma análise de sua composição, para ao final apresentarmos nossa conclusão.

A Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL foi instituída pela Lei nº 7.689/88 e posteriormente alterada pelas Leis nºs 8.034/90, 8.212/91, 8.541/92, 8.981/95, 9.065/95 e 9.249/95.

Dita contribuição é destinada ao financiamento da Seguridade Social, é devida por todas as pessoas jurídicas domiciliadas no País e as que lhe são equiparadas pela legislação do Imposto de Renda e tem como base de cálculo o lucro líquido do período de apuração antes da provisão para o imposto de renda, ajustado com as adições determinadas e exclusões admitidas, conforme legislação de regência.

Entretanto, a despeito de a norma imunizante ter tratado exclusivamente da desoneração das receitas decorrentes de exportação e de sabermos que os institutos da receita e do lucro são distintos, provar-se-á no decorrer deste tópico que, na verdade, são institutos interdependentes. Para tanto, em lição propedêutica, vale destacar alguns conceitos destes vocábulos, nas diversas disciplinas que os têm como objeto de estudo.

O Direito Comercial distingue-os na Demonstração do Resultado do Exercício, nos seguintes termos (art. 187 da Lei nº 6.404/76, e alterações):

receita bruta das vendas e serviços;

( - ) deduções das vendas, os abatimentos e os impostos;

= receita líquida das vendas e serviços;

( - ) custo das mercadorias e serviços vendidos

= lucro bruto;

( - ) as despesas com as vendas;

( - ) despesas financeiras, deduzidas das receitas;

( - ) despesas gerais e administrativas;

( - ) outras despesas operacionais;

= lucro ou prejuízo operacional;

( + ) receitas não operacionais;

( - ) despesas não operacionais;

= lucro líquido do exercício antes da provisão para o Imposto de Renda;

( - ) provisão para o Imposto de Renda;

= lucro líquido do exercício.

No tocante ao Direito Tributário, área científica para a qual a escrituração contábil é a base para as adições e exclusões previstas na legislação, o conceito de receita é o valor do faturamento mensal (receita bruta), assim entendida a totalidade das receitas auferidas, independentemente da atividade exercida pelo contribuinte e da classificação contábil adotada para a escrituração das receitas, admitidas as exclusões e deduções previstas na legislação em vigor para fins de apuração das bases de cálculo do PIS e da COFINS.

O lucro líquido do exercício, por sua vez, deve ser determinado com observância dos preceitos da Lei Comercial (Decreto-lei nº 1.598/77). A base de cálculo da CSLL devida pelas pessoas jurídicas tributadas com no lucro real é o valor do resultado do exercício, antes da provisão para o imposto de renda ajustado pelas adições e exclusões legais (Lei nº 7.689/88). A base de cálculo da CSLL devida pelas pessoas jurídicas tributadas com base no lucro presumido ou arbitrado, e por aquelas dispensadas de escrituração contábil, é o lucro líquido, correspondente a 12% (doze por cento) da receita bruta, na forma definida na legislação vigente (Leis nºs 9.249/95, 9.430/96 e 10.684/03).

Desta feita, a par dos conceitos acima expostos, pode-se perceber de sua análise que a receita e o lucro estão intimamente ligados, sendo o lucro uma parcela que está contida na receita e que, portanto, também deve ser alcançado pela imunidade tributária como a receita o é, pois dele é uma parcela.

Explicitando melhor: a despeito do fato de a base de cálculo da CSLL ser o lucro, tomado pelo seu conceito contábil diverso do de receita, a abrangência da imunidade decorre de que a receita da exportação é componente deste lucro tributável, resultante da depuração da receita pelas despesas, ajustado pelas adições e exclusões previstas em legislação tributária.

Ora, é verdade que a CSLL não tem como fato gerador o auferimento de receita, mas o auferimento de lucro pela pessoa empresarial com aquelas receitas. É verdade também que lucro possui conceito diferente do conceito de receita. Receita não é lucro, lucro não é receita. Mas também não se discute que o lucro com as exportações está contido no conceito de receita das exportações.

Destarte, o Legislador Constituinte Derivado, ao excluir, por meio da edição da EC nº 33/01, do campo de competência tributária as receitas formadoras do lucro (não propriamente o lucro), protegeu de forma mais ampla e efetiva a exportação nacional.

Portanto, norma que imuniza o lucro, de fato não atinge a receita ou o faturamento (minus dixit), pois a receita, produto bruto das vendas de mercadorias e serviços, pode ocorrer com ou sem lucro.

Assim, é possível haver receita ou faturamento sem que ocorra lucro. Mas a recíproca não é verdadeira. Norma que, constitucionalmente, exclui dos possíveis fatos jurígenos as receitas de exportação, ipso facto também exclui o lucro operacional delas resultante, o excedente que delas provém e que compõe o acréscimo patrimonial no exercício, no campo de incompetência ou, como preferem alguns, no campo de não-incidência constitucional.

Ademais, há de se destacar que, nos termos em que reza o Regulamento do Imposto de Renda, aplicável à CSSL, não é possível formar o Lucro Operacional sem as receitas de exportação, senão vejamos:

"Art. 274. Ao fim de cada período de incidência do imposto, o contribuinte deverá apurar o lucro líquido mediante a elaboração, com observância das disposições da lei comercial, do balanço patrimonial, da demonstração de lucros ou prejuízos acumulados. (Decreto-lei nº 1.598, de 1977, art. 7º, § 4º, e Lei nº 7.450, de 1985, art. 18).

§ 1º. O lucro líquido do período deverá ser apurado com observância das disposições da Lei nº 6.404, de 1976 (Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. 67, inciso XI, Lei nº 7.450, de 1985, art. 18, e Lei nº 9.249, de 1995, art. 5º)."

Nesse diapasão, conclui-se de forma peremptória que receita ou faturamento não é lucro, e que, por isso mesmo, é evidente que a imunidade não se estende ao lucro propriamente dito, mas apenas à parte do lucro da pessoa jurídica formado pelas receitas de exportação, quais sejam, aquelas receitas comprovadamente decorrentes das exportações de bens e serviços, não outras que advenham de vendas de mercadorias e serviços no mercado interno, ou de atividades não operacionais.


4. DA APLICABILIDADE INDISTINTA DA NORMA IMUNIZANTE AOS CONTRIBUINTES QUE OPTAM PELO REGIME DE TRIBUTAÇÃO COM BASE NO LUCRO PRESUMIDO E REAL – QUANTIFICAÇÃO DA IMUNIDADE DAS RECEITAS DE EXPORTAÇÃO:

Em primeiras linhas, diga-se que o fato de a empresa optar pelo regime de tributação com base no Lucro Presumido não obsta a fruição da imunidade aqui tratada, eis que a base de cálculo para as empresas que adotam tal regime de tributação é, justamente, a receita bruta.

Isto, ao contrário do que pode se pensar, somente vem a facilitar a quantificação do benefício fiscal aludido, pois, nesse passo, presume-se o lucro unicamente com base nas receitas auferidas, sem qualquer necessidade de confrontá-las com as despesas realizadas, ou seja, sem que seja necessária a depuração das receitas pelas despesas dedutíveis.

Desta forma, a sistemática de apuração do Lucro Presumido, no que se refere à base de cálculo da CSLL, coloca o contribuinte em situação mais confortável para determinação do quantum que deverá ser recolhido aos cofres públicos, devendo somente fazer incidir a CSLL sobre a proporção das receitas internas e não-operacionais, haja vista a imunidade que alberga as receitas decorrentes de exportação.

Além do mais, pela própria interpretação dos dispositivos que tratam dessa forma de tributação pode-se vislumbrar que o fato gerador da CSLL é trimestral, apurando-se a contribuição devida nos períodos de janeiro a março, abril a junho, julho a setembro e outubro a dezembro, ocorrendo o fato jurídico imponível sempre no último dia de cada trimestre.

A propósito, vejamos a redação do caput do artigo 1º, da Lei nº 9.430/96, aplicável à contribuição em comento por força do artigo 28 (7) do mesmo diploma legal, ipsis litteris:

"Art. 1º. A partir do ano-calendário de 1997, o imposto de renda das pessoas jurídicas será determinado com base no lucro real, presumido, ou arbitrado, por períodos de apuração trimestrais, encerrados nos dias 31 de março, 30 de junho, 30 de setembro e 31 de dezembro de cada ano-calendário, observada a legislação vigente, com as alterações desta Lei.

O regime de tributação com base no Lucro Presumido não comporta ajuste ao final do exercício, eis que os valores pagos no último dia do mês subseqüente a cada trimestre são presumidos como definitivamente devidos, haja vista a inexistência de confrontação das receitas auferidas com as despesas efetuadas."

Diversamente da apuração do Imposto de Renda e da CSLL com base no Lucro Presumido, há a apuração desses tributos com base no Lucro Real, na qual os pagamentos mensais ou trimestrais constituem somente antecipação do pagamento do tributo devido ao final do exercício.

Nesse segundo regime ocorre um único fato gerador somente em 31 de dezembro de cada ano, após o que se apresentará Declaração de Ajuste Anual, na qual se apurará o tributo devido por todo o período e se procederá à restituição dos valores pagos a maior, ou à complementação dos valores remanescentes.

Desta forma, como visto em tópico anterior, receita e lucro não se confundem, este é formado por aquela, após a dedução das despesas nos termos da lei, e sendo as receitas decorrentes de exportação, não deverão ser computadas para efeito de apuração do Lucro Real, sendo este o resultado da confrontação das receitas internas e não-operacionais com o total das despesas dedutíveis.


5. TERMO INICIAL DE VIGÊNCIA E EFICÁCIA DA IMUNIDADE DA CSLL SOBRE RECEITAS DECORRENTES DE EXPORTAÇÃO – INAPLICABILIDADE DAS REGRAS DA ANTERIORIDADE GERAL E NONAGESIMAL:

Outro ponto relevante a ser considerado é o momento a partir do qual pode o contribuinte excluir da base de cálculo da CSLL as receitas decorrentes de exportação.

Preliminarmente, é de se notar que a regra inscrita no artigo 149, § 2º, I, introduzido pela EC nº 33/01, conforme já demonstrado em tópico próprio, é de eficácia plena, na medida em que determina, de forma imperativa, "as contribuições [...] não incidirão sobre as receitas decorrentes de exportação" sem que se condicione a eficácia dessa norma a qualquer medida legislativa de ordem infraconstitucional.

Muito diferente, por exemplo, da regra de eficácia contida que prevê a exclusão da incidência do ISS sobre exportação de serviços, a medida em que o artigo 156, § 3º, II, da CR/88, dispõe que "...cabe à lei complementar [...] excluir da sua incidência exportações de serviços para o exterior".

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Assim, por ser a referida norma de eficácia plena, esta já se produz no exato momento da entrada em vigor daquela, o que se dá nos termos do artigo 5º da EC nº 33/01, segundo o qual "esta Emenda Constitucional entra em vigor na data de sua promulgação."

Há que se considerar, ainda, que não se aplica à imunidade prevista no artigo 149, § 2º, I, o princípio da anterioridade, seja geral (artigo 150, III, b), seja de noventa dias (artigo 195, § 6º).

A anterioridade geral – que seria aplicada à CSLL não fosse a exceção prevista no artigo 195, § 6º – não se aplica porque o artigo 150, III, ‘b’, se refere apenas à lei que instituir ou aumentar tributos, o que não ocorre no presente caso, já que a regra imunizante, muito ao contrário, reduz o quantum devido a título de contribuições sociais que incidam de alguma forma sobre a receita, na medida em que exclui das suas bases de cálculo as receitas decorrentes de exportação.

Não se aplica, tampouco, o princípio da anterioridade nonagesimal previsto no artigo 195, § 6º, pois, embora o texto deste dispositivo se refira à lei que houver instituído ou modificado as contribuições previdenciárias, a expressão "modificado" deve ser entendida no sentido de "aumentado", ou seja, da mesma maneira como é entendida a anterioridade geral prevista no artigo 150, tendo em vista que a anterioridade é uma das "limitações ao poder de tributar", verdadeira garantia para o contribuinte perante o Fisco, e que só é aplicada nas situações em que o contribuinte é onerado pela Lei, e não quando a Lei reduz a sua carga tributária.

Nesse sentido já decidiu o plenário do Supremo Tribunal Federal quando julgou a Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 712-DF, ocasião em que asseverou serem os denominados princípios constitucionais tributários oponíveis pelo contribuinte contra o Estado, mas não por este contra aquele.

Assim, como a EC nº 33/01 entrou em vigor, nos termos do seu artigo 5º, na data de sua promulgação, a imunidade da CSLL sobre as receitas decorrentes de exportação tornou-se plenamente vigente em 12 de dezembro de 2001, data de sua publicação.

Desta forma, tomando por base as conclusões deste tópico e do imediatamente anterior, no qual ficou comprovado que a opção pelo regime de tributação pelo Lucro Presumido resulta na ocorrência de fatos geradores trimestrais, sempre no último dia de cada trimestre, e, a opção pelo regime de tributação com base no Lucro Real resulta na ocorrência de um único fato gerador anual em 31 de dezembro, conclui-se, à toda evidência, que se a norma imunizante veio ao mundo jurídico em momento anterior à ocorrência do fato gerador, fato gerador não houve, eis que a imunidade impede a incidência da norma tributária, excluindo da hipótese de incidência o auferimento das receitas decorrentes de exportação para efeito de apuração da CSLL devida.

Conseqüentemente, a CSLL apurada no último trimestre de 2001, cujo fato gerador ocorreu em 31 de dezembro de 2001 (data posterior à promulgação da EC nº 33/01), já deveria ter sido albergada pela norma imunizante, resultando assim num pagamento de valor inferior ao contabilizado, tendo como base de cálculo somente as receitas que advieram das operações comerciais do mercado interno.

E, ainda que se considere que o fato gerador da CSLL é complexivo, e não instantâneo, ainda assim, não se deverá considerar a tributação no período que se findou no dia 31 de dezembro de 2001, haja vista que aos fatos geradores pendentes aplica-se imediatamente a lei tributária nova, nos termos do artigo 105 do CTN.

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Sobre o autor
Leonardo Zehuri Tovar

Advogado em Vitória (ES), Pós-graduado em Direito Processual Civil pela Faculdade Cândido Mendes de Vitória, Pós-graduado em Direito Público pela Faculdade de Direito de Vitória, Mestrando em Direitos e Garantias Constitucionais Fundamentais pela Faculdade de Direito de Vitória, autor de artigos em revistas especializadas

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

TOVAR, Leonardo Zehuri. Operações de exportação, Contribuição Social sobre o Lucro Líquido e imunidade.: Comentários à Emenda Constitucional nº 33/01. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 697, 2 jun. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6823. Acesso em: 18 mai. 2024.

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