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Responsabilidade pelo fato do produto e do serviço x responsabilidade pelo vício do produto e do serviço:

paralelo

Leia nesta página:

Nos dizeres de Sérgio Cavalieri Filho, "o desenvolvimento tecnológico e científico , a par dos indiscutíveis benefícios que trouxe para todos nós, aumentou enormemente os riscos de consumidor, por mais paradoxal que isso possa parecer. Isto porque um só defeito de concepção, um único erro de produção pode causar danos a milhares de consumidores, uma vez que os produtos são fabricados em série, em massa, em grande quantidade".

O art. 8o do CDC materializa o princípio da segurança, que estabelece o dever do fornecedor de não colocar no mercado de consumo produtos ou serviços com defeito ou que coloquem em risco a saúde ou segurança do consumidor. Assim, se o fizer, nos vícios de insegurança responderá objetivamente pelos danos causados ao consumidor e nos vícios de adequação (qualidade ou quantidade do produto), responderá por culpa absolutamente presumida.

O CDC prevê duas espécies de responsabilidade : a primeira, pelo fato do produto ou serviço, com regramento previsto nos arts. 12 a 17 e a segunda, pelo vício do produto ou serviço, com previsão legal nos arts. 18 a 25. Procuraremos, a partir de agora, estabelecer as principais diferenças entre tais modalidades de responsabilidades. Senão vejamos :

a) Nos dizeres do professor Rizzato Nunes "o vício é uma característica inerente, intrínseca do produto ou serviço em si. O defeito é um vício acrescido de um problema extra, alguma coisa extrínseca, que causa um dano maior que simplesmente o mau funcionamento, o não funcionamento, a quantidade errada, a perda do valor pago" . Assim, quando a anomalia resulta apenas em deficiência no funcionamento do produto ou serviço, mas não coloca em risco a saúde ou segurança do consumidor não se fala em defeito, mas em vício. Portanto, fato do produto ou serviço está ligado a defeito, que, por sua vez, está ligado a dano.

b) Na responsabilidade pelos fatos do produto e do serviço o defeito ultrapassa, em muito, o limite valorativo do produto ou serviço, causando danos à saúde ou segurança do consumidor. Já na responsabilidade pelos vícios do produto ou serviço o vício não ultrapassa tal limite versando, sobre a quantidade ou qualidade do mesmo.

c) Na responsabilidade pelos fatos do produto ou serviço o CDC adotou a responsabilidade objetiva mitigada, cabendo ao consumidor mostrar a verossimilhança do dano, o prejuízo e o nexo de causalidade entre eles. Ao fornecedor cabe desconstituir o risco e o nexo causal. Já na responsabilidade pelos vícios do produto ou serviço, o CDC adotou a responsabilidade subjetiva com presunção de culpa, porém o consumidor poderá ser beneficiado com a inversão do ônus da prova (art. 6o, VIII), caso em que o fornecedor terá o mesmo ônus previsto na responsabilidade objetiva, ou seja, desconstituir o nexo causal entre o risco e o prejuízo.

d) Na responsabilidade pelos fatos do produto ou serviços o comerciante responde subsidiariamente, pois os obrigados principais são o fabricante, o produtor, o construtor e o importador. Assim, só será responsabilizado quando aqueles não puderem ser identificados, quando o produto fornecido não for devidamente identificado, ou ainda, quando não conservar os produtos perecíveis adequadamente (art. 13, CDC). Na responsabilidade pelos vícios do produto ou serviço, por sua vez, o comerciante responde solidariamente, juntamente com todos os envolvidos na cadeia produtiva e distributiva (art. 18, CDC).

Como semelhanças temos que a reparação do dano é integral tanto para a hipótese de acidente de consumo (responsabilidade pelo fato do produto ou serviço), quanto para os vícios de adequação. Assim, poderá o consumidor reparar todos os danos, sejam pessoais (morais – aqueles que afetam a paz interior da pessoa, abrangendo tudo aquilo que não tem valor econômico, mas causa dor e sofrimento -) ou materiais (patrimoniais : englobam o prejuízo consumado – dano emergente – e aquilo que se deixa de ganhar – lucro cessante -).

Além disso, apesar do capítulo referente aos vícios do produto ou serviço não especificar nenhuma excludente de responsabilidade, pode-se dizer que aquelas previstas para os fatos do produto ou serviços, tais como a inexistência do defeito e a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro, também são aplicáveis aos primeiros.

Se pegamos, por exemplo, o caso concreto de dois amigos, "A" e "B", que vão em uma loja de carros importados e compram um Porsche modelo 911 turbo cada um e que depois de saírem da loja pilotando suas "máquinas" se deparam com o fato do sistema de freio de seus veículos não funcionar em um cruzamento, de maneira que "A" acaba batendo seu carro em um poste, fraturando a perna esquerda, e "B", por sorte, consegue parar seu carro e sair ileso, teremos aqui as duas modalidades de responsabilidades previstas no CDC. A responsabilidade da loja, como comerciante, será solidária em relação à "B", pois se trata de um vício do produto, e subsidiária em relação à "A’, por se tratar de um fato do produto, afinal houve danos à saúde do consumidor.


BIBLIOGRAFIA

1 - CARNEIRO, Odete Novais - Da Responsabilidade por Vício do Produto e do Serviço - São Paulo: Editora RT, 1998

2 - JÚNIOR, Alberto do Amaral - A responsabilidade pelos vícios dos Produtos no Código de Defesa do Consumidor - Revista de Direito do Consumidor n. 03. Ed. RT : São Paulo, 1992.

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3 – FILOMENO, José Geraldo Brito – Manual de direitos do Consumidor - são Paulo : Atlas, 2000.

4 – DENARI, Zelmo - Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Anteprojeto - Rio de Janeiro : Forense Universitária, 1999.

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Sobre o autor
Ricardo Canguçu Barroso de Queiroz

advogado em Goiânia (GO), especialista em Direito Processual Civil pelo Instituto Brasileiro de Direito Processual e em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

QUEIROZ, Ricardo Canguçu Barroso. Responsabilidade pelo fato do produto e do serviço x responsabilidade pelo vício do produto e do serviço:: paralelo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 47, 1 nov. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/715. Acesso em: 5 nov. 2024.

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