A globalização do capital no decorrer do século XX, após produzir a globalização dos padrões culturais, acabou por implementar a globalização econômica irreversível do século XXI, transformando a comunidade de indivíduos em comunidade de organizações sociais.
O econômico ‘sem fronteiras’ instaurou-se de forma definitiva no cenário mundial. Para se ajustar à nova realidade, todos os países, notadamente os países emergentes, tiveram que inserir microssistemas jurídicos dentro de seus respectivos sistemas jurídicos, por ações das grandes corporações transnacionais com suas filiais, sucursais, escritórios, agências etc espalhados no mundo inteiro. Essas empresas buscam obter melhores resultados econômico-financeiros mediante transferência, entre suas unidades ligadas por laços societários ou de direção, de seus executivos, seu know how, seus produtos e matérias primas.
No quadro de uma economia globalizada, a questão da elevada carga tributária assume um papel da maior importância. De fato, ela se constitui em um sério obstáculo às relações internacionais no campo do comércio e da cultura, à medida em que onera excessivamente uma atividade desenvolvida no âmbito internacional, interferindo, ainda, nos movimentos de capitais, de pessoas e prejudicando as transferências de tecnologia e os intercâmbios de bens e serviços.
Quanto maior a carga fiscal existente em certos países, maior é o interesse de as empresas e pessoas físicas em fazer investimentos no exterior, atraídos por inúmeros fatores, tais como: moedas fortes, estabilidade econômica e política, isenções tributárias ou redução de impostos, segurança, sigilo e privacidade nos negócios, liberdade de câmbio, economia de custos administrativos e eventual acesso a determinados tipos de financiamento internacional, a juros baixos.
Essas zonas privilegiadas existem em várias partes do globo e alguns entusiastas chegam a falar delas como tax havens ou ‘paraísos fiscais’. E para as sociedades comerciais constituídas nessas ‘zonas livres’ convencionou-se dar o nome inglês de offshore companies.
Uma offshore company é uma entidade situada no exterior, sujeita a um regime legal diferente, ‘extraterritorial’ em relação ao país de domicílio de seus sócios. Contudo, na realidade atual, a expressão é aplicada mais especificamente às sociedades constituídas em ‘paraísos fiscais’, onde elas gozam de privilégios tributários (impostos reduzidos ou até mesmo isenção de impostos). E isso só se tornou possível, quando alguns países adotaram a política da isenção tributária, para atrair investimentos e capitais estrangeiros. Na América Latina, o Uruguai é um exemplo típico dessa política.
Empresa offshore é aquela constituída de acordo com as leis de um determinado país, como objetivo de desenvolver suas atividades exclusivamente em países distintos daquele onde ela foi constituída, ficando ainda, por força da lei, proibida, muitas vezes, de estabelecer qualquer tipo de vínculo comercial com outras empresas constituídas na mesma jurisdição. Geralmente, esse tipo de empresa é constituída nos chamados ‘paraísos fiscais’, jurisdições com benefícios fiscais e com garantias de confidencialidades.
Os ‘paraísos fiscais’ consistem em territórios, nos quais inexiste a intervenção do Estado na atividade econômica no plano tributário, permitindo que as atividades e transações de natureza comercial e financeira, desde que de caráter internacional, sejam conduzidas sem que delas se origine a obrigação de recolher quaisquer tributos.
Podemos encontrar a classificação dos ‘paraísos fiscais’ adotando os seguintes critérios:
a)paraísos fiscais puros, ou chamados zero tax heaven, aqueles que não impõem quaisquer tributos;
b)paraísos fiscais relativos, ou chamados low tax heaven, aqueles que impõem certos tributos, porém com alíquotas reduzidas;
c)Por fim, paraísos fiscais que impõem tributos em níveis considerados normais, comparados com a tributação regular, mas garantem isenções ou tratamentos preferências, às vezes, especiais para determinadas categorias de rendimentos.
Além dos critérios acima mencionados, para a escolha de um ‘paraíso fiscal’, podemos mencionar uma série de fatores que são levados em conta para sua existência.
Vejamos, então, algumas das principais condições para a existência de um paraíso fiscal.
A primeira delas, está relacionada, obviamente, coma a baixa carga tributária ou a inexistência de tributação.
Em segundo lugar, aparece a estabilidade política seguida da equidade no tratamento em relação aos estrangeiros.A estabilidade política representa segurança jurídica, no sentido de se afastar os riscos de confisco de ativos estrangeiros. Em relação à equidade no tratamento aos estrangeiros, nos ‘paraísos fiscais’ inexistem restrições aos investimentos estrangeiros em quaisquer atividades, mesmo naquelas áreas em que a legislação local dos países em geral, normalmente, criam restrições à atuação dos estrangeiros.
Em seguida, deve ser analisada a ausência de controles cambiais, ou seja, a permissão para a livre conversibilidade das moedas (Payment paradises).
Outro fator a ser apontado versa sobre a confidencialidade e o sigilo bancário que, nos ‘paraísos fiscais’, atuam de forma diferente, propiciando um interesse melhor aos estrangeiros.
Sendo assim, cada ‘paraíso fiscal’ apresenta uma determinada especialidade.
Os principais ‘paraísos fiscais’ identificados somam mais de trinta jurisdições, tendo como destaques Áustria, Panamá, Bahamas, Ilhas Cayman, Suíça, Luxemburgo, Hong Kong, Uruguai e Ilha da Madeira, parte de Portugal, que oferece a possibilidade de isenção tributária sobre lucros auferidos em seu território.
Pela legislação brasileira, os ‘paraísos fiscais’ são conceituados como, países que não tributam a renda ou que a tributam com alíquota máxima inferior a 20 %.
Atualmente, está acontecendo com freqüência cada vez maior, a formação, pelas pessoas físicas de alta renda, de empresas holdings pessoais ou familiares, visando administrar os investimentos feitos. Essas holdings pessoais proporcionam sigilo, privacidade e segurança, que não desfrutariam no país de origem e, muitas vezes, permitem, ainda, economizar imposto de renda, dependendo do lugar onde são pagos os rendimentos. Nos pagamentos de dividendos, por exemplo, a redução do nível de impostos retidos na fonte pode ser obtida pela utilização de uma companhia constituída em jurisdição de imposto nulo.
De certo modo, sabemos que a constituição de uma offshore ou de uma holding em um determinado ‘paraíso fiscal’ não deve ser generalizada como sinônimo de atividades ilegais, pois ninguém está obrigado a administrar seu patrimônio e seus negócios de forma a propiciar maior arrecadação de tributos ao Estado. Nesse sentido, qualquer norma anti-elisiva geral, como aquela veiculada pelo parágrafo único do CTN, introduzida pela Lei Complementar nº 104/01, configura atentado ao direito de o contribuinte eleger a via menos onerosa, em termos de encargo tributário. O que o contribuinte não pode é afrontar a lei tributária, que não se confunde com a opção de trilhar pelo caminho não abrangido pela norma tributária.
Mas, a coisa não e tão simples assim, nos dias de hoje, em razão da elevada carga tributária, principalmente, no Brasil. Infelizmente, as condições oferecidas pelos ‘paraísos fiscais’ e os retornos constituídos pelas offshores direcionam o comportamento dos contribuintes, que acabam extrapolando do âmbito da economia de impostos, evasão legal ou elisão fiscal como é conhecido na nossa doutrina, para o campo das ilegalidades sob diferentes disfarces. Há, assim, inegável desvio de conduta dos contribuintes.
Um dos principais aspectos desse desvio de conduta está relacionado com a utilização dos mecanismos de proteção, advindos da confidencialidade e do sigilo bancário, oferecidos pelos ‘paraísos fiscais’. Esses mecanismos são utilizados como um tipo de escudo protetor para a prática de atividades criminosas. Não é por outra razão que as normas da OCDE, Organização para Cooperação do Desenvolvimento Econômico, recomendam a inserção nas legislações internas dos países membros ou não dessa Organização, de preceitos que possibilitem ao fisco ter acesso às informações bancárias, não só para coibir a evasão artificial de lucros e receitas, como também para servir de instrumento de combate ao tráfico de drogas e aos esquemas de lavagens de dinheiro.
Atualmente, a constituição de offshore, tornou-se uma prática adotada pelos brasileiros, a qual, vem crescendo cada vez mais, tendo como a principal causa a elevada carga tributária, que supera a capacidade contributiva, considerada pelos países, que adotam o regime Democrático de Direito, como pressuposto fático e básico da instituição de impostos. Esse encargo tributário inusitado em que vivemos, de um lado, prejudica o desenvolvimento de nossa economia agravando o quadro de miséria social. De outro lado, estimula a sonegação por meio de instrumentos sofisticados, propiciados pela economia globalizada, que veio a reboque dos avanços tecnológicos no campo da comunicação.
Essa forte pressão tributária, como é natural, aumenta o nível da rejeição social das normas tributárias. E o governo, que não analisa as causas, mas prefere combater apenas o resultado tende a utilizar o poder político do Estado para gerar instrumentos normativos cada vez mais drásticos (cerceamento de defesa na esfera administrativa, quer pela exigência de garantia de instância, quer pela supressão de recurso ao colegiado, quer pela criação de ´´turmas especiais´´ nos Conselhos de Contribuintes a critério do Ministro da Fazenda, para julgar determinados casos; sanções políticas consistentes em inscrição do devedor do tributo no Cadin, inabilitação do CPF/CNPJ, proibição de imprimir talonários de notas fiscais, não expedição de certidões de regularidade fiscal seguida da exigência dessa certidão em ‘n’ situações; penhora on line; indisponibilidade universal dos bens do executado etc.).
Como resultado dessa fúria legislativa, os direitos e garantias fundamentais dos contribuintes são violados com freqüência cada vez mais acentuada, sem que encontrem remédios contra tais abusos.
Uma forma eficaz de acabar com a sonegação tributária nas mais diversas modalidades, dentre as quais, a utilização dos ‘paraísos fiscais’ é aliviar a pressão tributária, devolvendo o oxigênio ao setor produtivo. Para tanto, é preciso diminuir o tamanho do Estado, que parece não mais caber dentro do PIB, ou seja, o Estado vem gastando mais do que a Nação consegue suportar. O porquê dessas despesas elevadas é outro assunto que merece estudo a parte.