A judicialização da saúde face ao princípio da separação dos poderes

10/10/2019 às 15:49
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A saúde é direito garantido expressamente na CF/88, porém inúmeras vezes se faz necessário buscar auxílio no judiciário para garantir tal direito. Assim, a pesquisa visa analisar se a interferência do judiciário na saúde fere a separação dos poderes.

RESUMO

 

O presente trabalho tem como objetivo analisar a judicialização do direito à saúde face ao princípio da separação dos poderes. Tal direito, apesar de expresso na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, muitas vezes para garantir a sua efetivação se faz necessário buscar socorro no Poder Judiciário. Devido a esta crescente necessidade de buscar o Poder Judiciário para conseguir acesso ao tratamento de saúde necessário, busca-se analisar se as decisões proferidas pelos juízes, impondo aos entes federados a concessão destes tratamentos de saúde fere o princípio constitucional da separação dos poderes. Utilizando do método de procedimento monográfico e método de abordagem dedutivo, a pesquisa foi realizada com base em doutrinas, jurisprudência, teses de mestrado, teses de doutorado e leis. Destarte, a pesquisa traz, primeiramente, o conceito de saúde relacionando-o com o princípio da dignidade da pessoa humana, além de apresentar as noções gerais sobre o Sistema Único de Saúde. Em seguida, são apresentados alguns dos entraves para a concretização do direito à saúde. Por fim, trabalha-se a questão da judicialização da saúde, ilustrando-se tal fato com a análise do Recurso Especial 1.657.156/RJ, o qual obrigou o Poder Público a fornecer medicamentos não incorporados ao Sistema Único de Saúde. A pesquisa identificou a frequente intermediação do Poder Judiciário para efetivação do acesso à saúde, visando garantir o direito previsto na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

 

Palavras-Chave: Saúde. Judicialização. Sistema Único de Saúde.

 

 

 

 

 

 

 

 

ABSTRACT

 

This paper aims to analyze the judicialization of the right to health in view of the principle of separation of powers. This right, although expressed in the Constitution of the Federative Republic of Brazil of 1988, many times to ensure its effectiveness is necessary to seek relief in the Judiciary. Due to this growing need to seek the Judiciary to obtain access to the necessary health treatment, it is sought to analyze whether the judgments handed down by the judges imposing on the federated entities the granting of these health treatments violates the constitutional principle of the separation of powers. Using the method of monographic procedure and method of deductive approach, the research was carried out based on doctrines, jurisprudence, master's theses, doctoral theses and laws. Thus, the search brings, firstly, the concept of health relating it to the principle of the dignity of the human person, in addition to presenting the general notions about the Unified Health System. The following are some of the obstacles to the realization of the right to health. Finally, the issue of health judicialization is worked out, illustrating this fact with the analysis of Special Appeal 1,657,156/RJ, which obliged the Public Power to supply medicines not incorporated into the Unified Health System. The research identified the frequent intermediation of the Judiciary to ensure access to health, aiming to guarantee the right provided for in the Constitution of the Federative Republic of Brazil of 1988.

 

Keywords: Health. Judicialization. Health Unic System.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

 

§ – Parágrafo

§§ – Parágrafos

ANVISA – Agência Nacional de Vigilância Sanitária

Art. – Artigo

Arts. – Artigos

CONITEC – Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias

CPC – Código de Processo Civil

CRFB – Constituição da República Federativa do Brasil

DUDH – Declaração Universal dos Direitos Humanos

EC – Emenda Constitucional

LINDB – Lei de introdução às normas do direito brasileiro

MG – Minas Gerais

MS – Ministério da Saúde

OMS – Organização Mundial da Saúde

PCDT – Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas

RE – Recurso Extraordinário

RENAME – Relação Nacional de Medicamentos Essenciais

REsp – Recurso Especial

RISTJ – Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça

RJ – Rio de Janeiro

S/N – Sem Número

SC – Santa Catarina

SE – Sergipe

STA-AgR – Suspensão de Tutela Antecipada em Agravo Regimental

STF – Supremo Tribunal Federal

STJ – Superior Tribunal de Justiça

SUS – Sistema Único de Saúde

 

 

 

 

 

SUMÁRIO

 

1 INTRODUÇÃO.. 11

2 A PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL DO DIREITO À SAÚDE.. 13

2.1 Conceito de saúde. 13

2.2 A relação entre direito à saúde e a dignidade da pessoa humana. 16

2.3 Noções gerais sobre o Sistema Único de Saúde – SUS.. 19

3 ENTRAVES PARA A CONCRETIZAÇÃO DO DIREITO À SAÚDE.. 23

3.1 O princípio da reserva do possível versus o princípio do mínimo existencial 23

3.2 A inobservância das atribuições de cada ente da federação em relação ao sistema único de saúde - SUS.. 26

3.3 A limitação do fornecimento de medicamentos aos contidos na Relação Nacional de Medicamentos Essenciais - RENAME.. 31

4 JUDICIALIZAÇÃO DA SAÚDE.. 35

4.1 A busca pela efetivação de um direito garantido constitucionalmente. 35

4.2 As decisões judiciais no âmbito da saúde. 39

4.3 Recurso Especial 1.657.156/RJ: obrigação do Poder Público de fornecer medicamentos não incorporados, através de atos normativos, ao Sistema Único de Saúde. 42

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS.. 47

REFERÊNCIAS.. 49

 

1 INTRODUÇÃO

 

O objetivo do presente trabalho é o estudo do direito à saúde, sob a ótica da frequente necessidade de judicialização deste direito para sua plena efetivação.

Sabe-se que a Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB) trouxe o princípio da separação dos poderes, todavia, muitas vezes, existe a necessidade de interferência do Poder Judiciário na esfera de atuação do Poder Executivo. Destarte, diante de tal interferência, visa-se analisar se as decisões judiciais que obrigam os entes federados a fornecerem acesso a tratamento de saúde violam o princípio da separação dos poderes.

Conforme cediço, a saúde é um direito de todos e a CRFB estipulou o Estado como garantidor deste direito, fornecendo acesso universal e igualitário a todos que necessitem, através de políticas sociais e econômicas. Apesar da proteção constitucional do direito à saúde, muitas vezes, devido a inação do Estado na realização de políticas públicas, faz-se necessário buscar amparo no Poder Judiciário para efetivação do direito à saúde.

Ante a essa corriqueira interferência do Poder Judiciário, busca-se analisar se as decisões judiciais que impõe o fornecimento de acesso ao tratamento de saúde violam ou não o princípio da separação dos poderes ou apesar de contrariar o princípio da separação dos poderes a interferência do Poder Judiciário se faz necessária para que o direito previsto na Constituição Federal não seja apenas uma “promessa constitucional”.

Desta forma, a pesquisa pretende analisar se existe a violação do princípio da separação dos poderes, indicando o contexto histórico do Sistema Único de Saúde (SUS) no Brasil, apontando os principais entraves para efetivação do direito à saúde, além disso, visa identificar a forma como deve ser proferida as decisões judicias no âmbito da saúde, ilustrando-se tal tema trazendo à baila o recente julgamento do Recurso Especial (RE) 1.657.156/RJ.

Buscando-se uma apresentação didática, bem como uma exposição clara e objetiva, o presente trabalho foi estruturado em três capítulos. Utilizou-se do método de procedimento monográfico e o método de abordagem dedutivo. Versa o primeiro capítulo sobre a proteção constitucional do direito à saúde, sendo elencado neste capítulo o conceito de saúde, a relação entre o direito à saúde e a dignidade da pessoa humana e trata sobre noções gerais sobre o Sistema Único de Saúde.

Por sua vez, o segundo capítulo trabalha alguns dos entraves encontrados para a concretização do direito à saúde. Trazendo neste capítulo o princípio da reserva do possível versus o mínimo existencial, a inobservância das atribuições de cada ente da federação em relação ao Sistema Único de Saúde e a limitação do fornecimento de medicamentos aos contidos na Relação Nacional de Medicamentos Essenciais.

Por fim, o terceiro capítulo versou sobre a judicialização da saúde, sendo debatida esta busca pela efetivação do direito garantido constitucionalmente, as decisões judiciais no âmbito da saúde e a decisão exarada no Recurso Especial 1.657.156/RJ que obriga o Poder Público a fornecer medicamentos não incorporados, através de atos normativos, ao Sistema Único de Saúde.

Para o desenvolvimento deste trabalho foram realizadas pesquisas bibliográficas, além de outras fontes de consulta, tais como legislação pertinente ao tema, livros de autores diversos, teses de mestrado, teses de doutorado e jurisprudência.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

2 A PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL DO DIREITO À SAÚDE

 

2.1 Conceito de saúde

 

Antes de adentrar ao tema central do trabalho, faz-se mister trabalharmos alguns conceitos e a parte histórica referente ao direito à saúde.

Ayres (1997) ensina que existia uma dificuldade muito grande de se conceituar saúde, do ponto de vista epistemológico desde a Grécia antiga, devido a carência de estudos do conceito propriamente dito e devido a influência da indústria farmacêutica, que tinha como ideia de saudável o fato de não estar doente. Todavia, devido a evolução dos estudos da divisão do corpo humano e o surgimento das mais variadas especialidades médicas vêm sendo promovido um movimento que busca a transformação da saúde em um objeto científico.

Conforme entendimento adotado pela Organização Mundial da Saúde – OMS (1946, p. s/n), “saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e social e não apenas a ausência de doença”.

Sobre o conceito de saúde, ensina Silva (2014, p. 1.093):

 

Origina-se do latim salus (conservação da vida, salvação), designa o vocábulo estado de saúde ou o estado de sanidade dos seres viventes. Estar com saúde, ou ter saúde, pois, é exercer normalmente todas as funções dos órgãos. Correntiamente, porém, exprimindo saúde o estado de sanidade, é suscetível de qualificação, dizendo-se, assim, boa saúde, saúde regular, ou má saúde, para que se determinem a sanidade perfeita, a sanidade não muito regular e a má sanidade. Constitui um dos direitos sociais, previstos constitucionalmente. É da competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios cuidar da saúde.

 

Conforme leciona Masson (2015), saúde é um direito de segunda geração, sendo este substancial para uso dos demais direitos. A saúde foi consagrada como direito social, conforme art. 6° da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB), veja-se: “ são direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”. Assim, nota-se que a saúde se apresenta como um dos mais importantes deveres do Estado, devendo este direito ser assegurado, através de políticas sociais e econômicas que vislumbrem a redução do risco da doença e quaisquer outros agravos, tornando-a acessível de forma universal e igualitária.

Na 8ª Conferência Nacional de Saúde (1986, p.382), buscou-se debater o conceito de saúde de maneira ampla, contrapondo a teoria da saúde-doença de Cristopher Boorse, que define saúde como ausência de doença, chegando-se a ideia de que:

 

Em seu sentido mais abrangente, a saúde é a resultante das condições de alimentação, habitação, educação, renda meio ambiente, trabalho, transporte, emprego, lazer, liberdade, acesso e posse da terra e acesso a serviços de saúde. É assim, antes de tudo, o resultado das formas de organização social da produção, as quais podem gerar grandes desigualdades nos níveis de vida.

 

Além de trabalhar o conceito de saúde de forma mais abrangente, na 8ª Conferência Nacional de Saúde (1986, p.382), trabalhou-se a ideia de não abstração da saúde, veja-se:

 

A saúde não é um conceito abstrato. Define-se no contexto histórico de determinada sociedade e num dado momento de seu desenvolvimento, devendo ser conquistada pela população em suas lutas cotidianas.

 

Após todo o debate realizado na 8ª Conferência Nacional de Saúde (1986, p. 382), que contou com a participação de 4.000 pessoas, concluiu-se que para a concretização da ideia do pleno exercício do direito à saúde, deve-se garantir:

 

Trabalho em condições dignas, com amplo conhecimento e controle dos trabalhadores sobre o processo e o ambiente de trabalho; alimentação para todos, segundo as suas necessidades; moradia higiênica e digna; educação e informação plenas; qualidade adequada do meio ambiente; transporte seguro e acessível; repouso, lazer e segurança; participação da população na organização, gestão e controle dos serviços e ações de saúde; direito à liberdade, à livre organização e expressão; acesso universal e igualitário aos serviços setoriais em todos os níveis.

 

Corroborando com a temática trabalhada na 8ª Conferência Nacional de Saúde de 1986, Czeresnia e Freitas (2003) trazem o conceito de saúde extraído da 2ª Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde, realizada em 1988, que entende a saúde como uma condição resultante da criação, promoção e manutenção de políticas públicas saudáveis, de ambientes favoráveis a saúde, da autonomia para o desenvolvimento de competências e de habilidades para cuidar de si e dos outros, da ação comunitária responsável por controle social, da reorientação dos serviços de saúde.

 No ordenamento jurídico brasileiro, a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB), em seu artigo 196, traz que:

 

A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantindo mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

 

Buscando-se um melhor entendimento do artigo 196 da CRFB, Mendes e Branco (2014) dividiram o artigo em seis elementos. O primeiro trata do direito de todos. Neste elemento, encontram-se tanto a defesa do direito individual como a do direito coletivo. O segundo elemento é o dever do Estado, que deverá promover políticas públicas que visem garantir a saúde, entendendo-se Estado como União, Estados, Distrito Federal e Municípios. O terceiro ressalta a necessidade de se formular políticas sociais e econômicas que efetivem o direito a saúde. O quarto elemento ressalta a importância de políticas que visem à redução do risco de doenças e de outros agravos, buscando-se a implementação de ações preventivas, com o combate de fatores que podem levar a disseminação de doenças. Já o quinto elemento trata de políticas que visam o acesso universal e igualitário ao sistema de saúde, reforçando a ideia de responsabilidade solidária entre os entes da federação, garantindo acesso sem privilégios ou preconceitos aos que necessitem. O último elemento explanado pelos autores traz ações e serviços para promoção, proteção e recuperação da saúde, com a implementação e manutenção das políticas públicas de saúde, garantindo-se, assim, a eficácia do serviço.

Segundo Prado (2012), o direito à saúde está inserido dentre os direitos fundamentais e, com isso, configura-se como marco da passagem do constitucionalismo liberal para o constitucionalismo social, pois passa a impor um dever ao Estado. Assim, busca-se uma ação positiva, através de uma efetiva e eficaz prestação do direito à saúde.

Conforme consta da 11ª Conferência Nacional de Saúde de 2000, houve a reafirmação do conceito de saúde trazido pela 8ª Conferência e foi trabalhada a necessidade da criação de políticas públicas multissetoriais e de modelos de atenção que assegurem a universalidade, integridade e equidade com o fito de garantir o direito à saúde. 

Com a finalidade de garantir e reafirmar o conceito mais abrangente de saúde, a 12ª Conferência Nacional de Saúde de 2003 teve como uma de suas diretrizes gerais a ampliação da compreensão da saúde no sentido de qualidade de vida, garantida de forma interssetorial e como política de governo para a inclusão social e a construção da cidadania, nos planos individuais e coletivos.

Relata Prado (2012, p. 51):

 

A saúde não deve ser entendida apenas como fenômeno puramente biológico, uma vez que ela também é resultante de condições socioeconômicas e ambientais, devendo a doença ser considerada como um sinal estatisticamente relevante e precocemente calculável, de alterações do equilíbrio homem-ambiente, induzidas pelas transformações produtivas, territoriais, demográficas e culturais, incontroláveis nas suas consequências, além de sofrimento individual e de desvio duma normalidade biológica ou social.

 

Assim, deve ser observado o conceito abrangente de saúde, pois o estado de saúde representa muito mais do que meramente ausência de doença e sua efetivação não diz respeito apenas ao fornecimento de medicamentos e tratamentos para quem necessite. Pois, conforme Berlinguer (1987), considerar saúde de forma isolada, ignorando as condições que cercam o indivíduo e a coletividade, não levando em conta o relacionamento das pessoas com o meio social e ambiental, significa o regresso à época que doença era entendida como um fenômeno meramente biológico, desprovido de qualquer outra interferência que não fosse o homem e o seu corpo.

 

2.2 A relação entre direito à saúde e a dignidade da pessoa humana

 

Conforme ensinam Barros e Rangel (2018), a compreensão do direito à saúde está muito além da letra da lei, necessitando de desdobramentos para atingir a sua plenitude. Deve-se compreender o direito à saúde como um pressuposto para o direito à vida e para uma melhor percepção do direito à vida deve haver o seu entendimento juntamente com a dignidade da pessoa humana.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) de 1948, principal fonte dos direitos sociais, estabelece em seu artigo XXV:

Todo ser humano tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar-lhe, e a sua família, saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle.

 

Silva (2014, p.714) conceitua dignidade como termo “derivado do latim dignitas (virtude, honra, consideração), em regra se entende a qualidade moral que, possuída por uma pessoa, serve de base ao próprio respeito em que é tida”.

A dignidade da pessoa humana, conforme ensinam Sarlet et al (2017), ocorreu de forma tardia no Brasil, comparando-se com a absoluta maioria das outras ordens constitucionais. A dignidade da pessoa humana passou a figurar no primeiro Título do texto constitucional, mais especificamente no art. 1°, III.

Explana Bitencourt (2010, p. 65) sobre a ideia Kantiana de dignidade, cujo os ensinamentos ainda se fazem presentes nos tempos atuais, segundo o autor:

 

A grande contribuição moderna para a reflexão sobre a dignidade da pessoa humana, cujo legado ainda se vê em nossos dias, é a ideia kantiana de que o ser humano existe como um fim em si mesmo, não como meio. Daí decorre que todo homem tem dignidade, não preço; consequência da dignidade humana é o dever de respeito. Cada ser humano é insubstituível, não tendo equivalente e, portanto, não pode ser trocado por coisa alguma.

 

Assim, tendo-se por base a ideia de que o ser humano existe como um fim em si mesmo e não como um meio, Bitencourt (2010) trabalha a ideia que deve ser respeitada a dignidade e ser reconhecida a condição de humanidade. Devendo o Estado garantir através das suas normas constitucionais os direitos fundamentais, de liberdade, políticos e sociais, pois estes são os direitos com aptidão de garantir o respeito ao ser humano e, consequentemente, assegurar a sua dignidade.

De acordo Sarlet et al (2017, p. 339):

 

Como a dignidade humana ganhou em representatividade e importância no cenário constitucional e internacional, portanto, numa perspectiva tanto quantitativa quanto qualitativa, também se verificou, no plano da literatura (e não apenas no campo do Direito) e da jurisprudência, uma crescente tendência no sentido de enfatizar a existência de uma íntima e, por assim dizer, indissociável ligação entre dignidade da pessoa humana e os direitos humanos e fundamentais reconhecidos e protegidos na esfera do direito internacional e do direito constitucional.

 

Conforme ensina Novelino (2013), não se pode desassociar a ideia do direito à vida do direito à dignidade da pessoa humana e o direito à saúde, pois estes possuem caráter fundamental, sendo direitos contidos não apenas entre os direitos fundamentais, previsto na CRFB, mas também presentes no grupo de direitos que constituem o mínimo existencial.

Segundo ensinamento de Prado (2012), o direito a saúde é direito necessário para uma condição de vida e bem-estar social, constituindo, desta forma, a sua denominada forma de Direito Social, ultrapassando a ideia de se concretizar apenas com a oferta dos serviços de saúde, pois está interligado a dignidade da pessoa humana, sendo esta imagem que sobressai no Estado brasileiro, tendo em vista a estrutura de Estado Democrático de Direito trazida pela CRFB.

Ensinam Sarlet et al (2015), que no direito à saúde existe a vinculação mais contundente com o direito à vida e o princípio da dignidade da pessoa humana. Devido a essa vinculação, entre saúde e dignidade da pessoa humana, relata Novelino (2018), que o direito à saúde é garantido a todos que estejam no território brasileiro, independente de nacionalidade ou país de domicílio.

Corroborando com o exposto, Barroso (2009) traz a ideia de que toda sociedade deve viver dignamente, cabendo ao Estado constitucional de direito se manter gravitando em torno deste princípio e também da centralidade dos direitos fundamentais.

Ademais, ensinam Sarlet et al (2017, p. 771):

 

O direito à vida (e, no que se verifica a conexão, também o direito à saúde) assume, no âmbito desta perspectiva, a condição de verdadeiro direito a ter direitos, constituindo, além disso, pré-condição da própria dignidade da pessoa humana. Para além da vinculação com o direito à vida, o direito à saúde (aqui considerado num sentindo amplo) encontra-se umbilicalmente atrelado à proteção da integridade física (corporal e psíquica) do ser humano, igualmente posições jurídicas de fundamentalidade indiscutível.

 

Devido a esse atrelamento do direito à saúde com os demais direitos fundamentais, ensina Prado (2012) que deve ser suprimida a ideia de direitos sociais serem de segunda categoria, pois não existe hierarquia entre as dimensões dos direitos fundamentais. Assim, têm-se a interligação da essência dos direitos sociais juntamente aos direitos fundamentais e à dignidade da pessoa humana. Tendo em vista a consagração destes em doutrinas e jurisprudência, uma vez que são pilares do Estado Democrático de Direito e, por isso, deve o Estado garantir a eficácia dos direitos fundamentais, pois, configuram-se como estimativa para a vida com dignidade.

Destarte, Sarlet et al (2017) demonstram que o direito à saúde merece especial destaque, pois, trata-se de um bem interligado a outros bens e direitos fundamentais. Assim, devido essa interligação, qualquer ato que venha a desconsiderar estes valores, torna-se totalmente inadmissível e inconstitucional.

 

2.3 Noções gerais sobre o Sistema Único de Saúde – SUS

 

Apesar do Sistema Único de Saúde – SUS ter se consolidado com a CRFB, este programa teve início, conforme ensina Prado (2012), com a decadência do modelo médico privatista que se espalhou na segunda metade do século XX, devido ao processo de industrialização brasileira. Assim, houve um desenvolvimento das políticas públicas de saúde visando garantir o direito à saúde.

Paiva e Teixeira (2014, p. 16) ensinam que:

 

Com a promulgação da nova Constituição Federal, completa-se o processo de retorno do país ao regime democrático. No contexto de busca de implantação de um estado de bem-estar social, a nova carta constitucional transformava a saúde em direito de cidadania e dava origem ao processo de criação de um sistema público, universal e descentralizado de saúde.

 

Conforme consta dos ensinamentos do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (2006), as bases doutrinárias para o novo sistema público de saúde foram lançadas na 8° Conferência Nacional de Saúde de 1986, tendo imediatos desdobramentos de trabalhos técnicos que foram desenvolvidos pela Comissão Nacional de Reforma Sanitária, que embasaram a confecção da Seção da Saúde da CRFB.

Relatam Mendes e Branco (2014) que com a criação do SUS o constituinte originário rompe com a tradição existente de um sistema em nível ordinário como o Sistema Nacional de Saúde e o Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde e adota uma rede regionalizada e hierarquizada sob o critério da subsidiariedade, buscando-se uma melhor efetivação do direito social.

A criação do SUS, conforme Prado (2012), tem por finalidade a universalidade do acesso populacional e da integridade da atenção, apresentando possibilidade de negociação e participação do povo, efetivando-se estas características através dos conselhos e conferências de saúde.

Ensina Novelino (2018) que, buscando-se assegurar os princípios da igualdade e da dignidade da pessoa humana e, sabendo que o SUS é universal, atendendo a diferentes classes sociais, o Supremo fixou tese de Repercussão Geral, no sentido de que é constitucional a regra que veda tratamento diferenciado com relação as acomodações de internação e atendimento médico, mediante pagamento da diferença dos valores correspondentes.

A busca pelo tratamento universal é uma responsabilidade da Administração Pública, como ensina Weicherter (2004), cabendo esta efetivação ao Estado aqui entendido como União, Estados, Distrito Federal e Municípios e, também, a iniciativa privada, porém apenas com atuação complementar.

Assim, apesar de consagrado no texto constitucional, aduz Sarlet et al (2017), a solidificação do direito à saúde encontra-se em nível normativo-constitucional, ademais a Constituição delega ao legislador, em seu art. 197, a função regulamentadora, fiscalizadora e controladora. Incube também ao legislador, no art. 198, a fixação das diretrizes do sistema. Devendo ainda, oportunizar a participação a nível complementar da iniciativa privada, conforme consta do art. 199. Deverá também estabelecer um rol exemplificativo das atribuições que impende ao SUS, de acordo ensinamentos do art. 200.

O processo de criação do Sistema Único de Saúde (SUS), Conforme Paim (2015), exigiu a necessidade da criação de uma legislação específica, que elucidasse o funcionamento das regras trazidas na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB).

Assim, no tocante a criação da Lei específica para o SUS, explana Paim (2015, p. 35):

 

A lei 8.080/90 dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, bem como sobre a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes. Regula, em torno território nacional, as ações e serviços de saúde, isolada ou conjuntamente, em caráter permanente ou eventual, por pessoas naturais ou jurídicas de direito público ou privado. Tem, portanto, uma abrangência muito grande. Não se limita ao SUS, nem ao setor público. Ao se referir às ações e serviços de saúde prestadas por pessoas naturais ou jurídicas, pode ser interpretada como capaz de interferir na medicina liberal e na medicina empresarial, por exemplo. Do mesmo modo, ao contemplar entidades jurídicas de direito público ou privado, essa regulação poderia se dirigir a serviços e ações de saúde realizados por funções públicas, instituições filantrópicas e empresas privadas, como as que comercializam planos de saúde.

 

Os recursos para financiamento do SUS, conforme ensina Moraes (2014), são provenientes dos recursos do orçamento da seguridade social, como estabelece o art. 195 da CRFB. Além dos recursos da seguridade social, explica Novelino (2013) que, devido a necessidade de se conferir uma maior efetividade nas ações e serviços de saúde, teve-se a Emenda Constitucional (EC) 29 do ano 2000 que acrescentou ao art. 198 os §§ 2° e 3°, que versa sobre a obrigatoriedade da União, Estados, Distrito Federal e dos Municípios investir valores mínimos todos anos.

Buscando-se a obrigatoriedade da execução das programações orçamentárias, ensina Novelino (2018), a EC n°86/2015 trouxe a imposição à União da aplicação em ações de, pelo menos, quinze por cento da receita corrente líquida do respectivo exercício financeiro em ações e serviços públicos de saúde. Faz-se necessário salientar que este percentual deve ser cumprido de forma progressiva, atingindo o mínimo de quinze por cento até o ano de 2020.

Além do texto constitucional, têm-se a Lei 8.142/90, que, de acordo ensinamentos de Prado (2012), garante que todos os usuários do sistema participem da gestão dos serviços e versa sobre as transferências intergovernamentais de recursos financeiros.

Conforme aduz Silva (2017), o SUS implica ações do Estado de forma descentralizada, tendo em cada esfera do governo uma única direção, com prioridade para atividades que visem a prevenção e participação da comunidade, com isto, têm-se a confirmação do caráter social individual e de direito social coletivo.

Com já citado, poderá haver a participação da iniciativa privada na assistência à saúde, todavia, de acordo com Novelino (2018), não poderá a instituição privada ser obrigada a prestar o atendimento sem a devida contraprestação. Destarte, a participação das instituições privadas se dá através de contratos de direito público ou convênios, devendo estes serem firmados, preferencialmente, com entidades sem finalidade lucrativa e entidades filantrópicas. A participação de instituições que visem lucro também é permitida, todavia é vedada a destinação de recursos públicos.

Importante destacar que o rol de competências do Sistema Único de Saúde, previsto no art. 200 da CRFB, de forma alguma deve ser entendido como exaustivo, como explica Novelino (2018), pois as suas competências foram reguladas e ampliadas através da Lei Orgânica da Saúde (Lei 8.080/90), que apresenta as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde e a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes.

Relativo aos objetivos e atribuições do SUS, cabe dizer, conforme Prado (2012), que estes estão em constante aperfeiçoamento, através de uma série de ações e serviços de políticas públicas sociais e econômicas, sempre buscando a efetivação da saúde, garantindo-se uma boa qualidade de vida e, sempre visando garantir a eficácia do princípio da dignidade da pessoa humana conforme a norma constitucional.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

3 ENTRAVES PARA A CONCRETIZAÇÃO DO DIREITO À SAÚDE

 

3.1 O princípio da reserva do possível versus o princípio do mínimo existencial

 

Apesar de todo o aparato normativo que visa garantir o acesso universal e igualitário ao direito à saúde, conforme trabalhado no capítulo anterior, o acesso efetivo a saúde encontra entraves e, este capítulo trabalhará alguns destes entraves que interferem no cumprimento universal no direito à saúde.

Ensina Silva (2014) que o termo reserva do possível consiste em um termo hermenêutico, devendo a sociedade entender que o fornecimento do serviço público está sujeito a uma prestação de forma racional, observando-se as condições históricas.

O surgimento da reserva do possível, conforme Mendes e Branco (2017), se deu em um julgamento realizado pelo Tribunal Constitucional Alemão, onde estudantes reivindicavam o direito de admissão em curso superior de medicina, com fundamentos na Lei Fundamental alemã que garantia liberdade para escolha de trabalho, ofício ou profissão. Todavia, a Corte alemã ao decidir o litígio entendeu que o pleito se encontrava limitado na reserva do possível, não devendo o Estado disponibilizar o acesso a todos que pretendessem cursar medicina, sob pena de comprometimento da efetivação dos demais direitos sociais.

 Meirelles et al (2016) entendem que os deveres do Poder Público serão efetivados ou cumpridos conforme a disponibilidade dos recursos públicos. Neste mesmo pensamento, destaca Souza (2013) que ainda que possua recursos disponíveis deverá o Estado analisar a razoabilidade da pretensão requerida.

Sarlet et al (2017, p. 754) sustenta a caracterização da reserva do possível estruturada através de uma tríplice dimensão, qual seja:

 

(a) a real disponibilidade fática dos recursos para efetivação dos direitos sociais; (b) a disponibilidade jurídica dos recursos materiais e humanos, que guarda conexão com a distribuição das receitas e competências tributárias, orçamentárias, legislativas e administrativas, e, em países como o Brasil, ainda reclama equacionamento em termos de sistema federativo; e (c) problema da proporcionalidade da prestação, em especial quanto à sua exigibilidade e razoabilidade, no que concerne à perspectiva própria e peculiar do titular do direito.

 

Importante ressaltar que apesar da vinculação destes fatores, ensinam Sarlet et al (2017), que não se pode permitir que estes fatores sejam utilizados como uma barreira invencível para efetivação dos direitos fundamentais, mas sim como mais um instrumento que visa garantir a proteção dos direitos fundamentais e sociais, com o fito de garantir um direito essencial em contrapartida a outro, diante da indisponibilidade de recursos.

Buscando-se uma melhor compreensão da tríplice dimensão proposta por Sarlet et al, Masson (2015) faz o estudo individualizado de cada uma das dimensões, sendo que a dimensão da disponibilidade fática deve ser analisada levando-se em consideração não apenas uma única demanda, mas sim analisando a possibilidade de se estender a prestação a todos que dela necessitem, respeitando o princípio da isonomia e universalização dos direitos sociais.

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 No tocante a dimensão da disponibilidade jurídica, deverá ser verificado a possibilidade de o Poder Judiciário interferir quando os órgãos Legislativos e Executivos se manterem inertes à implementação de direitos. Apesar do debate sobre a viabilidade do Poder Judiciário intervir em decisões que envolva a alocação de verbas, que deveriam serem tomadas pelo Legislativo e Executivo, reputa-se válida tal interferência havendo violação inconteste e desarrazoada dos comandos constitucionais. Destarte, torna-se possível que o Poder Judiciário, ainda que de modo atípico, determine a implementação das políticas públicas definidas pela CRFB.

Corroborando com o entendimento proposto por Masson, Cunha (2012, p.785) expõe que:

 

As decisões sobre prioridades na aplicação e distribuição de recursos públicos deixam de ser questões de discricionariedade política, para serem uma questão de observância de direitos fundamentais, de modo que a competência para tomá-la passaria do Legislativo para o Judiciário.

 

Ilustrando-se o exposto, Masson (2015) traz o exemplo de intervenção do Poder Judiciário no entendimento exarado pela 1ª turma do Supremo Tribunal Federal (STF) no Recurso Extraordinário (RE) 429903/RJ, onde a Corte firmou o entendimento de que a Administração Pública deverá manter estoque de um medicamento específico devido à gravidade da doença, com a finalidade de que não haja interrupções no tratamento pela falta deste.

E, por fim, relativo a dimensão da proporcionalidade e razoabilidade, Masson (2015) explana que deverá o pleito ser razoável a sua necessidade e deverá haver disponibilidade financeira do Estado para efetivação do pedido. Porém, não deverá ser utilizada a reserva do possível como fonte para frustação da efetivação das políticas públicas estabelecidas na CRFB, devendo-se observar sempre a ocorrência de motivo justo e verificável.

O que vem se tentando explicar é que apesar de existir e ser cabível a alegação da reserva do possível deverá o Estado observar a aplicação do mínimo existencial, porém deve-se salientar, conforme explica Bitencourt (2010, p. 144) “o mínimo existencial não significa que os direitos sociais só são fundamentais quanto ao mínimo de suas possibilidades”, corroborando com este pensamento, Sarlet et al (2017) leciona no sentido que deverá o Estado resguardar não apenas o direito à vida do cidadão, mas sim o direito à vida saudável, ou seja, uma vida com qualidade.

Mister salientar que o termo mínimo existencial, conforme Masson (2015), surgiu na doutrina alemã buscando resguardar os direitos mais básicos e elementares para uma vida digna. Conforme a autora, há no direito brasileiro pelo menos duas correntes em relação ao tema, uma corrente entende não haver um conteúdo definitivo no mínimo existencial, possuindo variações conforme o tempo e o local, esta é defendida por Ricardo Lobo Torres; a outra posição que se tem é a da professora Ana Paula de Barcellos que aponta que a constituição do mínimo existencial é feita pela educação fundamental, saúde, assistência aos desamparados e acesso à justiça.

Assim, importante ressaltar que, conforme Novelino (2018, p. 517) “a possibilidade de se invocar a reserva do possível em relação aos direitos sociais que compões o mínimo existencial não encontra resposta homogênea na doutrina”. Segundo o autor, existe aqueles que defendem não existir direito ao mínimo existencial e de outro lado há quem entenda que o direito ao mínimo existencial possui caráter absoluto, não podendo encontrar óbices para a sua efetivação no princípio da reserva do possível.

Ilustrando-se a ideia do caráter essencial de proteção ao mínimo existencial, têm-se o pronunciamento do Ministro Celso de Melo no RE 482.611/SC, no sentido que a “impossibilidade de invocação, pelo Poder Público, da cláusula da reserva do possível sempre que puder resultar, de sua aplicação, comprometimento do núcleo básico que qualifica o mínimo existencial”.

3.2 A inobservância das atribuições de cada ente da federação em relação ao sistema único de saúde - SUS

 

Buscando-se garantir de forma mais eficaz o desenvolvimento nacional e amenizar as desigualdades regionais no território brasileiro o Constituinte de 1988 elegeu como forma de organização e distribuição do poder estatal o Federalismo.

Ensina Horta (1986), para que seja estabelecido um Estado Federal se faz necessário a adoção de determinados princípios, técnicas e instrumentos operacionais, que o autor condensou da seguinte forma: deverá haver uma decisão do poder constituinte para a criação do Estado Federal e suas partes indissociáveis; deverá ocorrer a repartição de competências entre Federação e Estados-membros; deverá ser atribuída autonomia constitucional aos Estados-membros; será utilizada a intervenção federal para restabelecimento do equilíbrio federativo, em casos definidos na Constituição; a Câmara dos Estados permitirá a participação do Estado-membro na formação da legislação federal; poderá os Estados-membros, em número qualificado, propor emenda à Constituição; a formação de novo Estado ou modificação territorial dependerá de aquiescência da população do Estado afetado; e, deverá existir no Poder Judiciário Federal de um Supremo Tribunal, para interpretação e proteção da Constituição Federal e, para que possa dirimir conflitos existentes entre a União, os Estados, outras pessoas de direito interno, além das questões relativas à aplicação ou vigência da lei federal. Importa salientar que não se faz necessário o acumulo de todas as características, por isso, conforme o autor, teve-se modelos múltiplos de federalismo.

Ensinam Odorissi e Hermany (2018), pode-se entender o federalismo como uma técnica que visa a distribuição do poder posto a serviço de um ideal de descentralização, multiplicando os centros decisórios trazendo uma maior proximidade destes com os destinatários, criando formas de participação e fiscalização do poder pelos administrados.

Tal método, conforme ensina Bercovici (2004), visa amenizar as dificuldades na execução das políticas públicas, em especial na área social e econômica, através de mecanismos que visam cooperar e harmonizar o exercício das competências legislativas e administrativas, equilibrando a descentralização federal e integração econômica nacional.

O federalismo cooperativo, ensinam Sarlet et al (2017), teve sua origem nos Estados Unidos da América e também teve seu desenvolvimento na Constituição germânica sob o amparo da Lei Fundamental de 1949, visando a atuação conjunta da União e dos Estados-membros, buscando-se alcançar objetivos comuns.

Explicam Odorissi e Hermany (2018, p.246):

 

No cenário brasileiro, o federalismo, adotado pelo legislador constituinte de 1988, assumiu uma forma inovadora e diversa da estabelecida pelo sistema norte-americano. Foi estabelecido um sistema de três níveis, incluindo o Município como ente federado.

 

Importa mencionar o texto normativo trazido pela CRFB em seus arts. 23 e 24 que demonstra de forma clara as competências comuns aos entes federativos, convencionando-se o federalismo do tipo cooperativo.

O art. 23, II, dá a entender ser competência comum dos entes federados o cuidado da saúde, porém, deve-se observar o parágrafo único do artigo que prevê a edição de Lei Complementar para fixar as normas de cooperação entre os entes, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional.

Considerando-se o teor deste artigo se tem que a União, o Estado, o Distrito Federal e os Municípios são solidários no cumprimento da efetivação do acesso à saúde. Conforme ensina Venosa (2017, p. 113) “a solidariedade da obrigação é um artifício técnico utilizado para reforçar o vínculo, facilitando o cumprimento ou a solução da dívida”.

Para Asensi (2015), não significa que todos os Entes da Federação possuem os mesmos deveres e atribuições devido a competência comum, embasa este entendimento devido a CRFB e a Lei n. 8.080/90 determinarem atribuições exclusivas e comuns de cada Ente, assim, têm-se uma previsão dos deveres de cada um dos Entes.

Ensina Santos (2017), apesar de ser competência comum aos Entes Federados o cuidado da saúde este ponto precisa ser melhor compreendido, pois, deve-se analisar as condições do serviço pleiteado versus a condição do Ente para o fornecimento deste serviço.

Esta análise é fundamental para efetivação do pleito, pois, conforme Santos (2017, p.5) os entes “são assimétricos do ponto de vista econômico, social, demográfico, geográfico e no que tange à organização de serviços”. Destarte, foi necessário à distribuição de competência entre os Entes Federativos pelo legislador ordinário.

Visando delimitar a competência para promoção da saúde a Lei n° 8.080/90, estabeleceu em seus artigos 15 a 19 tais competências dos Entes Federados.

A aludida Lei em seu art. 15 trouxe as atribuições comuns dos Entes. Busca-se com essas atribuições, conforme ensina Asensi (2015), a formulação de estratégias e conjugação de esforços para obtenção de uma efetiva saúde no território brasileiro.

O art. 15 da Lei 8.080/90 trouxe um rol de 21 atribuições comuns aos entes federados, dentre elas, fiscalizar as ações e serviços de saúde; administrar os recursos destinados a cada ano à saúde; organizar e coordenar o sistema de informação de saúde; elaborar normas para estabelecimento de padrões de qualidade para promoção da saúde; elaborar e atualizar periodicamente o plano de saúde; elaborar normas para regularização das atividades de serviços privados; implementar o sistema nacional de sangue, componentes e derivados; realizar pesquisas e estudos na área da saúde; fomentar, coordenar e executar programas e projetos estratégicos e de atendimento emergencial.

Além de tratar das atribuições comuns aos Entes, a Lei n° 8.080/90 versa também das atribuições específicas de cada Ente Federado. Trouxe a referida Lei, em seu art. 16, as atribuições de competência exclusiva da União, assim, têm-se que compete a União a direção nacional do SUS, explana Asensi (2015, p. 150) que “o traço mais marcante desta competência é o caráter de coordenação nacional das políticas de saúde a serem desenvolvidas no SUS. ”

O rol de competência da União trazido pelo art. 16, elenca 29 atribuições, dentre elas: formular, avaliar e apoiar políticas de alimentação e nutrição; formular e implementar políticas de controle das agressões ao meio ambiente, ao saneamento básico e ao ambiente de trabalho; participar da definição de normas e mecanismos de controle, com órgãos afins, de agravo sobre o meio ambiente ou dele decorrentes, que tenham repercussão na saúde humana; coordenar e participar na execução das ações de vigilância epidemiológica; estabelecer normas de vigilância sanitária em portos, aeroportos e fronteiras, podendo estas serem complementadas pelos Estados, Distrito Federal e Municípios; formular, avaliar, elaborar normas e participar na execução da política nacional e produção de insumos e equipamentos para a saúde, em articulação com os demais órgãos governamentais; prestar cooperação técnica e financeira aos Estados, Distrito Federal e Municípios; elaborar normas para regular as relações entre o SUS e os serviços privados contratados de assistência à saúde; estabelecer o Sistema Nacional de Auditoria e coordenar a avalição técnica e financeira do SUS em todo o Território Nacional em cooperação técnica com os Estados, Municípios e Distrito Federal. Além das atribuições contidas no art. 16, o parágrafo único do artigo traz a possibilidade de a União executar ações de vigilância epidemiológica e sanitária em circunstâncias especiais.

Consoante a competência da União no tocante aos medicamentos, tal competência é consagrada no Decreto n. 7.508/2011, em seu art. 25 ao 29 trabalha sobre a Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (RENAME), que compreende a seleção e padronização de medicamentos que serão utilizados para atendimento de doenças e agravos no âmbito do SUS. Mister salientar que conforme impõe o art. 29 do referido Decreto, somente poderão compor a RENAME produtos com registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA.

A atribuição específica dos Estados, trazida pela Lei n° 8.080/90, encontra-se no art. 17, devendo o Estado, representado pela secretaria estadual de saúde ou por órgão correspondente, exercer a direção estadual do SUS, além disso, conforme Asensi (2015, p.151) deverá “cada estado formular a sua Relação de Medicamentos em complementação à RENAME. ”

No tocante a competência do Estado, o art. 17 da Lei 8.080/90 trouxe um rol que apresenta 14 atribuições que deverá o Estado exercer para promoção da saúde, dentre estas atribuições pode-se citar, promoção da descentralização dos serviços e das ações de saúde para os Municípios; prestar o apoio técnico e financeiro que necessite os municípios, além de executar supletivamente ações e serviços de saúde; cabe ao Estado coordenar e de formar complementar executar serviços de vigilância epidemiológica e sanitária, serviços de alimentação e nutrição e serviços referente à saúde do trabalhador; coordenar a rede estadual de laboratórios de saúde pública e hemocentros, e gerir as unidades que permaneçam em sua organização administrativa; formular normas e estabelecer padrões, em caráter suplementar, de procedimentos de controle de qualidade para produtos e substâncias de consumo humano; identificar estabelecimentos hospitalares de referência e gerir sistemas públicos de alta complexidade, de referência estadual e regional; colaborar com a União na execução da vigilância sanitária de portos, aeroportos e fronteiras; cabe ainda ao Estado o acompanhamento, a avaliação e divulgação dos indicadores de morbidade e mortalidade no âmbito da unidade federada.

A competência dos Municípios encontra-se estabelecida no art. 18 da Lei 8.080/90, sendo o Município representado pela secretaria municipal de saúde ou por órgão homólogo. Deverá o município coordenar a política de saúde municipal e, além disso, assim como ocorre no Estado, ensina Asensi (2015), deverá o ente municipal desenvolver uma Relação de Medicamentos que complemente a lista de medicamentos estadual e federal.

Conforme leciona o artigo supracitado, compete aos Municípios um rol de 12 atribuições, podendo-se citar, a competência para planejar, organizar, controlar e avaliar as ações e os serviços de saúde e gerir e executar os serviços públicos de saúde; incumbe ao município a participação do planejamento, programação e organização da rede regionalizada e hierarquizada do Sistema Único de Saúde, em articulação com sua direção estadual; deve o município executar os serviços de vigilância epidemiológica, vigilância sanitária, saneamento básico e de saúde do trabalhador; deverá dar execução, no âmbito municipal, à política de insumos e equipamentos para a saúde; formar consórcios administrativos intermunicipais; controlar e fiscalizar os procedimentos dos serviços privados de saúde; normatizar complementarmente as ações e serviços públicos de saúde no seu âmbito de atuação.

Por fim, em seu art. 19, estabelece a Lei n° 8.080/90 que deverá o Distrito Federal exercer as atribuições reservadas aos Estados e aos Municípios.

Desta forma, analisando a repartição de competências trazidas na Lei n°8.080/90, relata Ohland (2010) seria necessário antes do pleito do serviço de saúde a verificação de qual Ente é competente para atender o pedido. Porém, apesar de ser tese consagrada pelo Supremo Tribunal Federal que há competência solidária dos Entes, em recente julgado de um Agravo de Instrumento 10148180010545001, tendo como Relatora Alice Birchal (2018, p. s/n), entendeu-se que:

 

A solidariedade, todavia, não implica em ampla e irrestrita discricionariedade da parte para demandar quaisquer dos entes públicos, devendo atentar para as normas que disciplinam a dispensação de medicamentos nos três níveis: União, Estado e Municípios.

 

Além disso, foi entendido pela Relatora no julgado supracitado que, apesar de o Supremo Tribunal Federal ter entendido que há solidariedade entre os entes federados para prestação da saúde, deve-se, minimamente, observar as competências estabelecidas em lei infraconstitucional, pois não se mostra cabível imputar condenação a pequenos municípios, por exemplo, ao financiamento de tratamentos excepcionais, de custo elevado.

No tocante à solidariedade entre os entes da federação, mister trazer à baila a recentíssima decisão do STF, no julgamento do RE 855178, de relatoria do Ministro Luiz Fux, originando, em 23/05/2019, o Tema 793 onde ficou definido que os entes são solidariamente responsáveis em demandas referentes à saúde, competindo à autoridade judiciária o direcionamento para o órgão competente para execução do cumprimento, respeitando-se os critérios de descentralização e hierarquização, determinando ainda o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro.

Pode-se observar que apesar da solidariedade dos entes, contida no art. 23, II da CRFB, no tocante a promoção da saúde, deve ser levado em consideração que existe um sistema de divisão de atribuições regionalizado e hierarquizado, que envolve as ações e serviços nesta seara conforme a capacidade de cada ente federado, pois evita os debates dentro do processo sobre a qual ente pertence a competência para satisfação da tutela.

 

3.3 A limitação do fornecimento de medicamentos aos contidos na Relação Nacional de Medicamentos Essenciais - RENAME

 

A Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias (CONITEC) no SUS foi criada através da Lei n° 12.401 de 28 de abril de 2011, que busca a regularização referente a assistência terapêutica e a incorporação de tecnologias em saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). A CONITEC visa o assessoramento do Ministério da Saúde (MS) no tocante à incorporação, exclusão ou alteração das tecnologias aplicadas na saúde pelo SUS, atuando também na constituição ou alteração de Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDT).

A tomada de decisão de inclusão de incorporação de tecnologias no SUS deverá ser realizada no prazo de 180 dias, podendo ser prorrogáveis por mais 90 dias, devendo observar a eficácia, acurácia, efetividade e a segurança da tecnologia e, deve-se observar o custo-benefício em relação às tecnologias já existentes. Para que ocorra a avaliação se faz necessário que o procedimento/medicamento esteja registrado na ANVISA.

A CONITEC é composta por uma Secretaria Executiva e um Plenário. Cabe ao Plenário a recomendação ou exclusão de tecnologias no âmbito do SUS, sobre a constituição e alteração nos protocolos clínicos, bem como atualização da Relação Nacional de Medicamentos Essenciais - RENAME. A composição, competências e funcionamento da CONITEC está regulado no Decreto n° 7.646/2011.

Medicamentos essenciais, conforme ensinam Yamauti et al (2017, p. s/n), “medicamento essencial é aquele selecionado com base em critérios epidemiológicos, de efetividade, segurança, comodidade posológica e custo-efetividade que melhoram a qualidade de cuidados e de resultado na saúde. ” Porém, conforme os autores, o Brasil adotou conceito diverso ao da OMS com relação aos medicamentos essenciais, salientam que para o Brasil medicamentos essenciais são aqueles definidos pelo SUS com fito de assegurar acesso do paciente ao tratamento medicamentoso.

Conforme o Ministério da Saúde (2017, p.11), “a RENAME é elaborada atendendo aos princípios fundamentais do SUS, isto é, a universalidade, a equidade, e a integralidade”.

No tocante a publicação da Lista RENAME, ensinam Yamauti et al (2017) que está se encontra em constante atualização, porém a sua publicação ocorre a cada dois anos.

Atualmente está publicada a Lista RENAME do ano de 2017 que pode ser acessada online e, conforme consta do seu texto (2017, p. 12) “a presente edição, a referida subcomissão contou com a colaboração de especialistas ligados a universidades públicas, com expertise clínica”.

Para uma melhor compreensão a Lista RENAME é dividida em seções e seções divididas em anexo. A atual lista conta com quatro seções.

Além das quatro seções, a lista RENAME possui um índice remissivo, possibilitando a busca seja pelo nome do fármaco em sua forma base ou pela sua denominação derivada.

Importa salientar que o financiamento do Componente Básico de Assistência Farmacêutica, conforme consta da Lista RENAME (2017), é responsabilidade dos três entes federados, sendo o repasse regulamentado pela Portaria GM/MS n° 1.555, de 30 de julho de 2013. Sendo o Município responsável pela aquisição e fornecimento dos itens à população.

Referente ao Componente Estratégico da Assistência Farmacêutica os medicamentos contidos nesta seção visam o controle de doenças de alto potencial endêmico, devendo o Ministério da Saúde adquirir e distribuir os medicamentos e repasse aos Estados e Distrito Federal, que deverão armazenar e redistribuir aos Municípios.

O Componente Especializado da Assistência Farmacêutica contém medicamentos que visam garantir tratamento em nível ambulatorial, que possuam custos elevados ou de maior complexidade. O financiamento dos medicamentos desta categoria é regulamentado pela Portaria 1.554, de 30 de julho de 2013.

A Relação Nacional de Insumos integra os itens da relação dos componentes Básicos e Estratégicos da Assistência Farmacêutica. Já os medicamentos de uso hospitalar integram os procedimentos financiados por autorização de internação hospitalar ou por autorização de procedimento ambulatorial de alta complexidade, sendo financiado pelo bloco de atenção de média e alta complexidade ambulatorial e hospitalar.

Após este breve introito sobre a CONITEC e a lista RENAME, necessário analisar que o Estado, considerando como os 03 Entes Federados, muitas vezes, tentam se eximir da responsabilidade de fornecimento do medicamento, embasado na teoria de descentralização do SUS.

Ilustrando-se esta narrativa, têm-se a apelação cível n° 10520120043820001 MG de 2017, onde o Estado de Minas Gerais alega não possuir responsabilidade de fornecimento de medicação, devido a divisão de competências atribuídas pela Lei n° 8.080/90, alega ainda que é insustentável o fornecimento de medicamentos sem a observância do sistema de padronização de medicamentos fornecidos pelo SUS, ou seja, a lista RENAME.

Ensina Mendes (2017) que, a política do SUS, baseia-se na ideia da “medicina com base em evidências”, adotando-se “protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas”. Assim, em regra, deve-se privilegiar o tratamento fornecido pelo SUS em relação à tratamento diverso, caso não se comprove a ineficiência ou impropriedade do tratamento ofertado pelo SUS, pois obrigar o financiamento de qualquer tratamento geraria grave lesão ao orçamento administrativo, prejudicando ainda mais o funcionamento do SUS. Entretanto, explica o autor que, faz-se necessário a periódica revisão dos protocolos existentes e a elaboração de novos protocolos. Ademais, afirma que, em casos excepcionais, comprovado que a única alternativa é o tratamento não constante nos protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas, poderá o requerente pleitear o tratamento judicialmente.

Devido à tentativa de se esquivar da responsabilidade do fornecimento de medicamentos alegando a não inclusão do mesmo na lista RENAME se tornou prática tão rotineira que o STJ, definiu a suspensão de todos os processos que versem sobre a obrigação do poder público fornecer medicamentos não constantes na lista do SUS, gerando o Recurso Especial 1.657.156 (REsp), que será trabalhado no próximo capítulo.

Assim, analisando os argumentos trazidos neste capítulo, pode-se notar que apesar da ampla defesa e normatização para que o acesso à saúde seja universal ainda há inúmeros entraves que acabam por atrapalhar a sua plena eficácia.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

4 JUDICIALIZAÇÃO DA SAÚDE

 

4.1 A busca pela efetivação de um direito garantido constitucionalmente

 

O que vem sendo demonstrado neste trabalho é que apesar das inúmeras garantias previstas na norma constitucional e infraconstitucional para o acesso a saúde, ainda existem empecilhos para a sua plena efetivação, conforme abordado no capítulo anterior. Desta forma, torna-se necessário que o paciente, corriqueiramente, tenha que buscar a via judicial para satisfazer o seu direito.

Ensinam Machado e Dain (2012), no cenário acadêmico do Brasil, a utilização do termo judicialização foi inicialmente utilizado nos estudos de Vianna e colaboradores, em 1999, em sua obra “Judicialização da política e das relações sociais no Brasil”, tendo-se a discursão da judicialização através de dois eixos, sendo o eixo procedimentalista e substancialista. No eixo procedimentalista há o entendimento que a concepção de justiça está ligada autonomia e não ao bem-estar, assim, deveriam os cidadãos se enxergarem como autores no seu direito e não como seus destinatários. Referente ao eixo substancialista, explicam os autores que a judicialização é tida como uma extensão da democracia e ampliação da cidadania, garantindo a grupos a margem da sociedade uma possibilidade para a clamarem os seus direitos. Definem ainda que a judicialização é um instrumento hábil para a comunidade encontrar seus propósitos trazidos formalmente na CRFB.

Ribeiro (2013) explana que, um dos motivos determinantes para a incidência do fenômeno da judicialização está ligado ao aumento de complexidade da sociedade, buscando no sistema jurídico soluções para demandas, sejam elas, concretas, abstratas, genéricas. Para Carlini (2014, p. s/n) “a judicialização da saúde é apenas uma das faces do fenômeno global da judicialização plena da vida brasileira. ”.

Com relação a atuação do judiciário no cenário da saúde, explica Mendes (2017, p. 604):

 

É certo, que não cabe ao Poder Judiciário formular políticas sociais e econômicas na área da saúde, é sua obrigação verificar se as políticas eleitas pelos órgãos competentes atendem aos ditames constitucionais do acesso universal e igualitário.

 

Sobre o direito à saúde e sua exigibilidade perante a via judicial, ensinam Sarlet et al (2017) que, os Tribunais, mesmo o Superior Tribunal Federal (STF), reconhecem a saúde como direito subjetivo e fundamental, podendo-se exigir o seu cumprimento em juízo, superando a ideia de ser um direito programático.

Ilustrando-se a atuação do STF, têm-se o julgamento do Agravo Regimental na Suspensão de Tutela Antecipada 175 Ceará (STA-AgR 175), em março de 2010, onde foram argumentados os critérios do requerimento do direito à saúde como um direito subjetivo. Dentre os argumentos debatidos se pode destacar os seguintes: o direito à saúde possui uma dupla dimensão individual e coletiva, sendo cabível tutela jurisdicional individual mediante ação proposta pelo Ministério Público, tendo em vista se tratar de um direito individual indisponível. Outro ponto debatido foi que a responsabilidade do Estado é solidária, assim, abrange-se todos os entes da Federação. Debateu-se também a questão do dever do Estado em disponibilizar o acesso igualitário e universal a saúde, mesmo que os órgãos legitimados não tenham estabelecido a prestação solicitada pelo requerente. Foi debatido ainda que a alegação da reserva do possível, deverá ser demonstrada cabalmente pelo Poder Público.

Explana o Ministro Gilmar Mendes no seu voto na STA-AgR 175 (2010) que, a judicialização da saúde ganhou tamanha importância teórica e prática, que envolve não apenas os operadores do direito, mas também os gestores públicos, profissionais da área da saúde e a sociedade civil como um todo, o que acaba gerando tensões entre os elaboradores e executores de políticas públicas, devido terem que cumprir determinações muitas vezes diferentes das estabelecidas pelo governo e com custos superiores dos seus orçamentos.

Devido aos inúmeros processos envolvendo questões sobre acesso ao sistema de saúde, em 2009, houve a convocação de uma Audiência Pública. Na abertura da Audiência Pública, o Ministro Gilmar Mendes (2009, p. s/n) esclareceu que,

 

A audiência objetiva esclarecer as questões técnicas, científicas, administrativas, políticas e econômicas envolvidas nas decisões judicias sobre saúde. (...). As considerações que serão apresentadas aqui interessam, de diferentes formas, aos jurisdicionados e a todo o Poder Judiciário de todo o país e poderão ser utilizadas para a instrução de qualquer processo no âmbito do Supremo Tribunal Federal.

 

 Visando um melhor entendimento sobre o assunto, foram ouvidos especialistas sobre saúde pública, entre eles, Gestores Públicos, Magistrados, membros da Advocacia da União, Estados e Municípios, além do Ministério Público, Médicos, Professores, Técnicos de Saúde e Usuários do Sistema Único de Saúde.

Depois de longos debates foi percebido que muitas das vezes a judicialização ocorre não por falta de uma omissão de políticas públicas, mas sim para que fosse dado cumprimento a políticas públicas já estabelecidas. Assim, entenderam que o problema da judicialização da saúde poderia ser evitado caso houvesse o efetivo cumprimento de políticas públicas já existentes.

Uma argumentação frequente sobre a interferência do Judiciário, no tocante à promoção da saúde, diz respeito ao Princípio da Separação de Poderes, conforme estabelece o art. 2° da CRFB. Ensina Mendes (2017) que o princípio da separação dos poderes visa impedir a concentração de poder em uma só esfera do Estado.

Conforme ensinam Sarlet et al (2017), o princípio da separação dos poderes foi enraizado durante as Revoluções francesa e americana, sendo tal teoria elaborada por Montesquieu, onde busca impor uma distinção entre as atribuições dos poderes dos Órgãos.

Segundo Novelino (2016), a separação dos poderes visa garantir o sistema de freios e contrapesos, evitando-se qualquer forma de abuso de poder, além de garantir a harmonia entre o Poder Executivo, Legislativo e Judiciário. Desta forma, os Entes Federados entendem que não caberia ao Judiciário formular políticas públicas, pois geraria um desequilíbrio entre os Órgãos e fere o princípio da separação dos poderes. Todavia há entendimento diverso em jurisprudência, veja-se:

 

EMENTA – APELAÇÃO CÍVEL E REMESSA NECESSÁRIA – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – INQUÉRITO CIVIL – FORNECIMENTO DE MATERIAIS INDISPENSÁVEIS PARA A PRESTAÇÃO DO SERVIÇO PÚBLICO DE SAÚDE NAS UNIDADES BÁSICAS DE SAÚDE – INTERFERÊNCIA DO PODER JUDICIÁRIO – VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA RESERVA DO POSSÍVEL E DA SEPARAÇÃO DOS PODERES – NÃO OCORRÊNCIA – PEDIDO DE DILAÇÃO DE PRAZO PARA CUMPRIMENTO DA DECISÃO – LIMITE TEMPORAL MANTIDO – APELAÇÃO CÍVEL E REMESSA NECESSÁRIA AOS QUAIS SE NEGA PROVIMENTO. A atuação do Poder Judiciário para que as políticas públicas que envolvam direitos sociais e garantias fundamentais sejam concretizadas não atenta contra o princípio da separação dos poderes. A alegação de déficit orçamentário não serve para escusar o ente público do cumprimento da determinação judicial, tendo em vista que a ação posta em juízo se refere a direitos sociais que, dado o seu caráter de garantia fundamental, sobrepõem ao princípio da reserva legal. O prazo de 90 (noventa) dias disponibilizados para o cumprimento da determinação judicial é suficiente, inclusive para o início do procedimento licitatório, sendo certo que o cumprimento da determinação no tempo correto depende tão somente da celeridade e comprometimento do gestor executivo.

 

(TJ-MS-APL: 08019562820178120029 MS 0801956-28.2017.8.12.0029, Relator: Des. Luiz Tadeu Barbosa Silva, Data do Julgamento: 29/01/2019, 5ª Câmara Cível, Data de Publicação: 31/01/2019).

 

Ensinam Sarlet et al (2017), a atuação do Poder Judiciário, ante a inércia do órgão competente, se dá com o fito de preservar a CRFB, desta forma não há usurpação de poder.

Ainda sobe a atuação do Judiciário nas políticas de saúde pública, ensina Masson (2015) que, havendo desempenho deficiente ou omisso do Estado, em relação às políticas públicas de saúde, poderá qualquer pessoa acionar o Judiciário para interferir na causa.

Corroborando com este entendimento, têm-se o voto da Desembargadora Maria Erotides Kneip Baranjak (2018), agindo a Administração de forma omissa e injustificada na efetivação das políticas públicas definidas constitucionalmente a interferência da Poder Judiciário é perfeitamente legítima, servindo como instrumento hábil no restabelecimento da integridade da ordem jurídica violada.

Importa salientar que, em caso de ausência do tratamento pleiteado nos protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas regulados pelo SUS, deverá haver a diferenciação entre os tratamentos puramente experimentais e os novos tratamentos, conforme estabelecido na Audiência Pública da Saúde, em 2009.

Durante o debate na Audiência Púbica da Saúde (2009), entendeu-se por tratamento experimental aquele que se realiza em laboratórios ou centro médico de ponta, tendo participações regidas pelas normas reguladoras da pesquisa médica, assim, não cabe ao Estado o fornecimento destes, devido ainda não terem sidos aprovados ou avaliados. Quanto aos novos tratamentos, são aqueles já avaliados e aprovados pelas pesquisas médicas, porém, não estão incorporados às listas do SUS.

Apesar da constante evolução da medicina na criação de novos tratamentos, para que estes incorporem às listas de tratamentos oferecidos pelo SUS, deverá ser observada uma série de estudos para avaliação da real eficácia, passando por uma avaliação extremamente burocrática e morosa. Assim, devido a impossibilidade de a Administração acompanhar a evolução dos novos tratamentos, surgem inúmeros processos judiciais de pessoas pleiteando o fornecimento de um tratamento diverso daquele oferecido pelo Poder Público.

4.2 As decisões judiciais no âmbito da saúde

 

De início é imperioso dizer que decisões judiciais, segundo Paiva (2017, p.7), “são julgamentos proferidos por magistrados ou por colegiados de instituição judicial”.

Visando uma maior segurança jurídica o art. 93, IX, CRFB, estabeleceu que “todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentas todas as decisões, sob pena de nulidade (...)”, sendo tal requisito de fundamentação replicado no art. 11 do CPC/15. Assim, conforme ensina Lucca (2016), o requisito da motivação é um dever constitucional e legal que impõe aos membros da magistratura o dever de fundamentar os motivos da sua decisão.

Explana Andreatini (2018), exigir que os membros da magistratura se atentem ao dever de fundamentar suas decisões assegura o caráter democrático das atividades do Poder Judiciário, permitindo um controle externo e difuso dos poderes outorgados aos magistrados. Assim, conforme a autora, o dever de fundamentar garante dupla função, sendo elas: função extraprocessual, garantindo a fiscalização da atuação dos juízes e; função endoprocessual, pois apresenta as partes envolvidas no processo os motivos da sua decisão, garantindo que estas busquem a modificação deste entendimento em instâncias superiores.

Segundo o dever de fundamentar as decisões judiciais, afirma Lucca (2016, p.89):

 

Qualquer regra que venha a excepciona-lo será inválida, pois inconstitucional. E nenhum caso concreto poderá afastar a sua incidência para dar prevalência a outros valores supostamente mais importantes. A classificação do dever de motivação segundo a sua real natureza acaba por dar-lhe mais força e maior proteção, exatamente o que pretendem aqueles que o têm como princípio.

 

Ilustrando-se a necessidade de fundamentação traz-se alguns fundamentos utilizados para a manutenção da concessão de medicamento deferido nos autos n° 1.0433.18.017739-9/002, sendo partes o M.M.C e M.A.S.F, sendo a decisão da Desembargadora Sandra Fonseca. O caso versa sobre a necessidade do fornecimento do medicamento adrenalina auto injetável – EPIPEN, para o tratamento de moléstia determinada como alergia à proteína do leite de vaca, com manifestação de anafilaxia. Devido a gravidade do caso o medicamento fora deferido em primeira instância, porém o M.M.C apresentou recurso, com a finalidade de suspender tal decisão.

Para indeferir o pedido do M.M.C, a Desembargadora utilizou como argumento central os requisitos fixados para concessão de medicamentos não constantes nos atos normativos do SUS, REsp 1.657.156/RJ, argumentando que a paciente, M.A.S.F., preencheu todos os requisitos e que além disso a não concessão imediata do medicamento ferira o princípio da dignidade da pessoa humana, mostrando-se estes fundamentos suficientes que demonstram a imprescindibilidade e urgência do tratamento pleiteado, indeferindo desta forma o pleito do M.M.C., ou seja, manteve a decisão de primeira instância, obrigando o M.M.C. ao fornecimento da medicação pleiteada.

Ilustra-se agora o argumento utilizado para negativa de pedido de medicamento, será utilizado o caso dos autos 5013108-09.2018.8.13.0433 sendo litisconsortes passivos o M.M.C e E.M.G e autor P.V.C.O. Versa a lide sobre a necessidade do uso do medicamento ADALIMUMABE pelo requerente, tendo em vista ser portador da doença Chron. Em sua fundamentação que negou a tutela provisória o juiz alegou que o medicamento pleiteado é fornecido, conforme os protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas, para pacientes que tenham o IHB superior igual ou superior a 8 e não ter tido resposta clínica significativa aos fármacos corticosteroide, azatiopriona mais alopurinol, metotrexato ou ter contraindicação ou intolerância a corticosteroide e imunopressor. Alegou que, como o requerente não demonstrou atender o protocolo, uma vez que possui o IHB inferior a 8, não faria jus ao medicamento pleiteado.

Sabendo-se da necessidade de fundamentação e a certeza de que as decisões impostas pelo Poder Judiciário acarretam em inúmeros impactos para os gestores e para a sociedade, relevante mencionar a alteração feita pela Lei n. 13.655/2018 nos artigos 20 e 22 do Decreto-Lei n. 4.657/1942, Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro (LINDB), trazendo o seguinte teor:

 

Art. 20. Nas esferas administrativas, controladora e judicial, não se decidirá com base em valores jurídicos abstratos sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão. (Incluído pela Lei n° 13.655, de 2018)

Parágrafo único. A motivação demonstrará a necessidade e a adequação da medida imposta ou da invalidação de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa, inclusive em face das possíveis alternativas. (Incluído pela Lei n° 13.655, de 2018)

 

Art. 22. Na interpretação de normas sobre gestão pública, serão considerados os obstáculos e as dificuldades reais do gestor e as exigências das políticas públicas a seu cargo, sem prejuízo dos direitos dos administrados.

Com tais modificações foi vedada a motivação em valores jurídicos abstratos, devendo ser considerado o impacto e as reais dificuldades dos gestores em cumprir com a norma estabelecida na decisão judicial. Por um lado, têm-se que tal inovação no artigo poderá funcionar como um retrocesso para as decisões favoráveis a concessão de tratamentos de saúde, pois, conforme Schulze (2018), o juiz não poderá fundamentar apenas no art. 196 da CRFB para deferimento do pleito, deverá analisar questões como a eficácia do tratamento, custo. Deverá o juiz analisar o pleito de forma equânime, ampliando a sua interpretação do caso individual, visando o caso em uma perspectiva coletiva, devendo observar as dificuldades reais dos gestores em cumprir a decisão.

Contrapondo este entendimento, têm-se a posição de Vasconcellos (2018) entendendo que, a saúde não pode ser considerada como um valor jurídico abstrato, tendo em vista possuir normas jurídicas especificas, tanto no âmbito constitucional como no âmbito infraconstitucional.

Sobre as consequências práticas da decisão, ensina Santos (2018, p. s/n): “nada mais contundente e prático do que alegações que fazem antever a morte de alguém por falta de socorro público”. Ou seja, a não concessão do tratamento pleiteado poderá causar severas consequências ao paciente que teve o seu direito universal à saúde negado.

Vasconcellos (2018) faz uma ressalva no sentido que, tomado pela ordem normativa do art. 20 da LINDB, deve-se atentar ao entendimento de solidariedade dos entes, pois há estudos que entendem a solidariedade no tocante a saúde como algo relativo, tendo em vista não haver previsão expressa sobre esta solidariedade e devido a existência de repartições de atribuições dos gestores na Lei n. 8.080/1990.

Depois de toda esta exposição traz-se à baila o posicionamento de Mello (2006, p.1.529):

 

Entre proteger a inviolabilidade do direito à vida e à saúde, que se qualifica como direito subjetivo inalienável assegurado a todos pela própria Constituição Federal da República (art. 5°, caput e art. 196), ou fazer prevalecer, contra essa prerrogativa fundamental, um interesse financeiro e secundário do Estado, entendo – uma vez configurado esse dilema – que razões de ética-jurídica impõem ao julgador uma só e possível opção: aquela que privilegia o respeito indeclinável à vida e saúde humanas.

 

Pode-se afirmar, em síntese, que as decisões proferidas no âmbito da saúde é algo tão complexo que não há atualmente respostas ou soluções prontas e acabadas. Assim, conforme ensinamentos de Oliveira (2015), faz-se necessário avançar no debate sob a ótica teórica, colocando em pauta nos espaços de participação social da política da saúde, buscando proporcionar o diálogo entre os diversos atores sociais envolvidos nessa temática e buscar formas que assegurem uma nova cidadania política.

 

4.3 Recurso Especial 1.657.156/RJ: obrigação do Poder Público de fornecer medicamentos não incorporados, através de atos normativos, ao Sistema Único de Saúde

 

Devido ao grande número de ações requerendo o fornecimento de medicamentos não contemplados na Portaria 2.982/09 do Ministério da Saúde (Programa de Medicamentos Excepcionais), o Ministro Benedito Gonçalves, em 07/03/2017, decidiu, nos termos do artigo 34, XVI, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça (RISTJ), converter o Agravo em Recurso Especial de n° 1.052.276-RJ (2017/0025629-7) em Recurso Especial, para julgamento pelo sistema dos recursos repetitivos.

Importa salientar que, conforme ensinamentos de Neves (2016), para que seja cabível o Recurso Especial deverá ser observado os pressupostos gerais de admissibilidade, pressupostos cumulativos e também pressupostos alternativos. Devendo o recorrente preencher todos os pressupostos cumulativos, elencados no art. 105, III, da CRFB e ao menos um dos pressupostos alternativos, listados nas alíneas do art. 105, III da CRFB, para que seja recebido o Recurso Especial.

Conforme Neves (2016), existe ainda o pressuposto do pré-questionamento, que apesar de alguns entenderem como pressuposto genérico de cabimento, possui fundamental importância de impedir que seja utilizado o Recurso Especial para análise de matéria que não tenha sido objeto de decisão prévia, vedando-se que seja analisada a matéria de forma originária pelo Superior Tribunal de Justiça.

Ensina Theodoro (2016) que, em 2003 ao alterar o seu Regimento Interno o STF instituiu um mecanismo para o julgamento dos recursos extraordinários repetitivos, criando a expressão “julgamento por amostragem”. Em 2008 esta sistemática passou a ser adota também nos recursos especiais.

Theodoro (2016, p.1.137) esclarece que:

A expressão (julgamento por amostragem) retrata muito bem a dinâmica dos recursos repetitivos, que consiste – diante da constatação de uma mesma questão de direito figurar numa série numerosa de recursos -, na possibilidade de selecionar-se um ou alguns deles para seu julgamento servir de padrão ou paradigma. Dessa maneira, julgado o caso padrão, a tese nele assentada prevalecerá para todos os demais de idêntico objeto.

 

Faz-se mister dizer que, conforme Câmara (2017), a técnica dos julgamentos por amostragem poderá ser empregada pelo tribunal de origem. Verificando o Presidente ou o Vice-Presidente a existência de multiplicidade de recursos versando sobre a mesma questão direito, selecionará dois ou mais destes recursos, e os encaminharão para afetação realizada pelo STJ ou STF, devendo ser determinada a suspensão de todos os processos, na área de atuação do tribunal, que versem sobre o assunto afetado. 

Após a decisão de afetação, deverá o relator determinar a suspensão em todo o território nacional. Ocorrendo mais de uma afetação sobre o mesmo tema, define o § 3° do art. 1.037 do Código de Processo Civil (CPC), que será prevento aquele que proferiu a primeira decisão de afetação. A partir da decisão pela afetação começará a correr o prazo de um ano para o julgamento do recurso.

A parte que teve o processo suspenso, devido ao julgamento do recurso repetitivo, poderá requerer o prosseguimento do feito, comprovando a ausência de nexo entre a matéria discutida no recurso repetitivo e a sua demanda.

O relator do recurso especial na Suprema Corte terá poderes especiais, como ensina o art. 1.038 do CPC. Poderá admitir a intervenção de terceiros na controvérsia, ou seja, o amicus curiae, ensina Theodoro (2016, p. 1.148) que, tal intervenção é justificável, devido a “multiplicidade de interessados na tese a ser definida pelo STJ ou STF e pela repercussão que o julgado virá a ter sobre os recursos de estranhos à causa a ser decidida como paradigma.

Realizados todos esses procedimentos cabe ao relator a elaboração do seu relatório e envio de uma cópia aos demais ministros. Enviada a cópia será incluído o recurso em pauta para julgamento, devendo o julgamento, conforme ensina o art. 1.038, § 2° do CPC, ocorrer preferencialmente, salvo os casos que envolvam réu preso e pedidos de habeas corpus. O conteúdo do acórdão deverá ser o mais amplo possível, devendo abranger todos os fundamentos debatidos na tese jurídica posta em análise.

Findada essa breve exposição sobre o procedimento do recurso especial, passa-se a análise do recurso especial 1.657.156/RJ. Trata-se de recurso interposto pelo Estado do Rio de Janeiro, onde alega que os medicamentos, para tratamento de Glaucoma Crônico Bilateral, requeridos pela parte autora não estão previstos nos Protocolos Clínicos incorporados pelo Ministério da Saúde, ou nas listas de dispensação dos entes públicos, entende, por isso, não ser obrigação do Estado do Rio de Janeiro obrigado a fornecê-los.

Devido ser questão de caráter representativo de controvérsia, devido a multiplicidade de recursos a respeito do tema, houve-se a indicação de afetação do recurso, conforme o art. 1.036 do CPC. Sendo a questão controvertida delimitada como: “obrigatoriedade de fornecimento, pelo Estado, de medicamento não contemplado na portaria n. 2982/2009 do Ministério da Saúde (Programa de Medicamentos Excepcionais). Ocorrendo: a suspensão em âmbito nacional dos processos que versem sobre a questão afetada; comunicação aos Ministros integrantes da Primeira Seção e aos Presidentes dos Tribunais Regionais Federais e Tribunais de Justiça; além da abertura de vista ao Ministério Público Federal.

Após análise da delimitação inicialmente proposta, percebeu-se que delimitar o tema vinculado a uma portaria resultaria em um estreitamento indesejável, inviabilizando posterior aplicação dos efeitos do julgamento, tendo em vista a Portaria ser um ato normativo infralegal, tendo sua vigência corriqueiramente extinta, substituída por um ato normativo mais atualizado. Destarte foi proposta a alteração da delimitação, sendo a seguinte redação, “Obrigação do Poder Público de fornecer medicamentos não incorporados, através de atos normativos, ao Sistema Único de Saúde”.

No decorrer do julgamento alguns órgãos solicitaram o seu ingresso no feito, todavia sem sucesso, pois, o relator entendeu que apesar dos órgãos guardarem pertinência quanto ao tema, não possuíam presença de representatividade suficiente para ingresso no feito. Dentre os órgãos que tiveram seu pedido para integrar a lide como amicus curiae negado, pode-se citar o Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo, o Grupo de Amparo aos Doentes de Aids, Associação Nacional dos Defensores Públicos.

Dos órgãos que integraram a feito como amicus curiae, pode-se citar a Defensoria Pública da União, Colégio Nacional de Procuradores Gerais dos Estados e do Distrito Federal, Conselho Federal de Medicina, Ministério da Saúde, Agência Nacional de Vigilância Sanitária.

Em seus votos os Ministros lembraram que a CRFB garantiu a todos os indivíduos o direito à saúde, estipulando o dever do Estado em prestá-la, conforme estabelecido no art. 196 da CRFB, cabendo ao Estado a prestação dos serviços de saúde de forma rápida e eficiente, garantindo-se respeito ao princípio da dignidade da pessoa humana.

Trouxeram também argumentos utilizados no julgamento da STA-AgR 175, que entende o cabimento do fornecimento de medicamento que não sejam fornecidos pelo SUS, desde que seja comprovada a ineficácia do medicamento fornecido na rede pública de saúde.

Por fim, dá análise da tese repetitiva, concluiu-se que esta trata exclusivamente do fornecimento de medicamento e, assim, devido a ampla jurisprudência sobre o assunto, ficou entendido que existe a possibilidade de fornecimento de medicamento que não esteja inserido nos atos normativos do SUS.

Porém, para que seja deferido o pedido, deverão ser observados três requisitos. Primeiro requisito, deverá haver a demonstração da imprescindibilidade ou a necessidade do medicamento no tratamento, sendo tal requisito provado através de laudo médico circunstanciado e fundamentado, que deverá ser expedido por médico que assista o paciente, devendo ser demonstrado a ineficácia dos fármacos fornecidos na rede de saúde pública. O segundo requisito diz respeito a prova de hipossuficiência da pessoa que requer o medicamento, devendo demonstrar que a aquisição implica em comprometimento da sua subsistência e/ou do seu grupo familiar. Faz-se mister esclarecer que não será necessário comprovação de pobreza ou miserabilidade, sendo, tão somente necessário a comprovação da incapacidade de arcar com os custos para aquisição do medicamento prescrito. O terceiro requisito é que o medicamento seja aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA. Tendo em vista tal imposição decorrer da Lei n. 8.080/1991, em seu art. 19-T, II.

Imperioso mencionar que a Corte Superior decidiu modular os efeitos da decisão, conforme ensinamentos do art. 927, § 3° do CPC, atribuindo-se os requisitos e critérios, estabelecidos no julgamento, apenas a processos que forem distribuídos após a conclusão do julgamento.

No julgamento do caso concreto, julgou-se improcedente o recurso especial interposto pelo Estado do Rio de Janeiro e, por se tratar de recurso representativo foi determinada a comunicação à Presidência do STJ, aos Ministros da Primeira Seção, aos Tribunais Regionais Federais e Tribunais de Justiça dos Estados, para que seja os processos que versem sobre o tema julgados com a aplicação da tese firmada pelo Superior Tribunal de Justiça.

Desta forma, após o longo e rico debate, ficou fixada a tese que obriga o órgão público a fornecer medicamentos não incorporados nos atos normativos do SUS, sempre que estiverem presentes, de forma cumulativa, os três requisitos estabelecidos no julgamento do recurso especial 1.657.156 – RJ.

Referente aos medicamentos sem registro na ANVISA, importa mencionar a recentíssima decisão do STF no julgamento do RE 657718/MG, de relatoria do Ministro Marco Aurélio, onde foi decidido, em 22/05/2019, que não poderá o Estado fornecer medicamentos experimentais e que o medicamento que não tenha registro na ANVISA, via de regra, não poderá ser fornecido por decisão judicial, excetuando essa regra quando o houver pedido de registro do medicamento no Brasil, seja o medicamento registrado em renomadas agências de regulação no exterior e inexista substituto do medicamento com registro no Brasil. Além disso, decidiu-se que deverá necessariamente figurar no polo passivo da lide a União, quando o medicamento solicitado não for registrado na ANVISA.

Assim, pode-se notar que apesar de não ser papel do Poder Judiciário a criação de políticas sociais, para o cumprimento e efetivação do direito à saúde, esta interferência ainda se faz necessária devido a inação do Poder Executivo.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

O que se pode notar com este trabalho é que as questões que envolvem saúde sofreram e sofrem constante mutação, desde o conceito de saúde até o fornecimento de procedimentos e medicamentos a quem necessite. O que leva a um frequente estudo sobre este tema.

Pôde-se notar que viver com saúde é condição essencial para se viver com dignidade e, por isso, é dever do Estado a garantia do acesso universal à saúde através de políticas públicas. Abstendo-se da ideia de que saúde é apenas um estado de ausência de doença.

Notou-se que a saúde é prevista como um direito que deve ser cumprido por todos os entes federados, ou seja, há solidariedade entre estes para o fornecimento da saúde. Tal entendimento foi consolidado em recentíssima decisão do STF, em 23/05/2019, no julgamento do RE 855178/SE, decidindo-se que compete à autoridade judiciária, em respeito aos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro. Assim, nota-se que poderá o requerente acionar qualquer dos Entes e depois estes pleitearão o ressarcimento com base nas atribuições da lista RENAME.

Conforme analisado, a lista de Relação Nacional de Medicamentos Essências, tem por finalidade agilizar o procedimento de fornecimento, deixando entabulado os medicamentos e procedimentos que cada Ente deverá ser responsável. Pôde-se notar que apesar da frequente atualização da lista de medicamentos essências a mesma não consegue acompanhar todas as novidades que as indústrias farmacêuticas injetam diariamente no mercado.

Assim, devido a impossibilidade de atualizar diariamente a lista de medicamentos fornecidos pelos Entes, devido ao rigoroso tramite para aprovar a inclusão de medicamentos ou procedimentos a esta, e ao avanço diário farmacêutico, o Poder Judiciário consolidou o entendimento dos requisitos que devem ser cumpridos para que o Ente Público seja obrigado a fornecer o medicamento não constante na lista de medicamentos essências.

Destacou-se o entendimento consolidado no julgamento do REsp 1.657.156/RJ, para fornecimento de medicamento não elencado na lista RENAME onde deve haver a comprovação da imprescindibilidade do medicamento e ineficácia dos medicamentos fornecidos pelo SUS; hipossuficiência da parte solicitante e, por fim, ser o medicamento aprovado pela ANVISA. Referente a aprovação do medicamento pela ANVISA o STF, em 22/05/2019, decidiu no RE 657718/MG que não deve o Estado fornecer medicamentos sem a aprovação deste órgão, porém admitiu a possibilidade de fornecimento caso haja pedido de registro do medicamento no Brasil, seja o medicamento já registrado em renomadas agências de regulação no exterior e inexista substituto do medicamento com registro no Brasil. Ademais, fora decido que nos casos em que o medicamento não tenha registro na ANVISA deverá figurar no polo passivo da lide a União.

Sabe-se que existem inúmeras lacunas para garantir o acesso universal e eficaz ao tratamento de saúde pleiteado, desde a falta de verbas até a frequente inação da Administração Pública na execução de políticas públicas, ocorrendo a frequente judicialização da saúde. Tal método, apesar de gerar na maioria das vezes resultados positivos para aquele que busca o amparo judicial suporta críticas, pois há quem entenda que garantir a saúde não é papel do Poder Judiciário.

Muito se discute que a atuação do Poder Judiciário acaba por violar o princípio da separação dos poderes, porém, ao longo da pesquisa, pôde-se notar que apesar da ação do Poder Judiciário ir contra o princípio da separação dos poderes tal atitude mostra-se necessária, para dar eficácia ao direito garantido constitucionalmente, não incorrendo a usurpação de poder, pois conforme analisado a atuação do Poder Judiciário se dará apenas quando o Estado se mantiver omisso ou com desempenho deficiente.

Apesar de entender não ser a forma mais correta de solução dos problemas na efetivação do acesso à saúde, tendo em vista que para dar cumprimento as ordens judiciais os Entes Federados devem gastar valores não previstos em seu orçamento, o que pode gerar um desequilíbrio nas contas do Ente. Porém, enquanto não houver mudanças nas políticas públicas e uma maior fiscalização do dinheiro destinado à saúde, não se mostra plausível prezar mais por contas públicas do que garantir o tratamento médico a quem necessite.

O que se pode afirmar, após esta pesquisa, é que o assunto aqui trabalhado é de grande complexidade e deve ser trabalhado continuamente, por meio não só de juristas, mas de toda a sociedade, para que consigamos melhorias continuas neste direito que é essencial para uma vida digna.

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