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A nova redação dos quesitos no PL nº 4.203/2001

(reforma do Tribunal do Júri)

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15/06/2006 às 00:00
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2 QUESTIONÁRIO NO TRIBUNAL DO JÚRI

2.1 Conceito de questionário

Para obter-se o veredicto do Tribunal do Júri, dois sistemas são conhecidos: o "inglês", em que os jurados, sem que lhe sejam formulados quesitos, decidem se o réu é culpado ou não culpado (guilty or not guilty) do crime que o acusam, cabendo ao juiz togado a atribuição de qualificar o fato delituoso e graduar a pena; o "francês", onde os jurados, mediante quesitos que lhe são apresentados, decidem acerca do fato criminoso e suas circunstâncias [73]. Nosso estatuto processual adotou o sistema francês, também denominado sistema do questionário [74].

Assim, bem conceitua Hermínio Alberto Marques Porto:

Questionário é o conjunto de perguntas (quesitos) dirigidas aos jurados que integram o Conselho de Sentença, destinadas à coleta da decisão sobre os fatos classificados pela decisão de pronúncia e articulados pelo libelo, e sobre as teses postuladas pela defesa técnica. [75]

Com a adoção do sistema francês, quis nosso legislador que os jurados, ao invés de simplesmente afirmarem se o réu é culpado ou inocente (guilty or not guilty), respondessem a quesitos, correspondentes a fatos, que teriam ou não ocorrido. Assim, os jurados estariam sendo "juízes de fato" e não "de direito", pois confirmariam a existência ou inexistência de determinadas circunstâncias fáticas, permitindo ao magistrado que aplicasse a lei ao caso concreto [76].

Contudo, esse entendimento de que os jurados julgam somente os fatos, segundo José Frederico Marques, é falso e equivocado, e que essa distinção entre juízes de fato e juízes de direito não tem qualquer natureza técnico-jurídica. Como exemplo, refere que o Júri, quando responde ao chamado quesito principal, está julgando sobre a existência do primeiro elemento jurídico do crime, que é o fato típico, ou tipicidade [77].

2. 2 Fontes do questionário

Com a atual formulação dos quesitos, pode-se enumerar como fontes do questionário: o libelo-crime acusatório; as teses defensivas; os debates; o interrogatório do réu; de ofício pelo juiz [78].

O libelo-crime acusatório, que é oferecido pelo Ministério Público, é a fonte primária e obrigatória dos quesitos que apresenta, em forma de artigos, a classificação penal fixada pela decisão de pronúncia e, facultativamente, as agravantes e causas de aumento de pena (art. 417, incisos II e III, e art. 484, incisos I e IV, do CPP) [80].

O libelo é o ato processual de postulação da acusação. Nele encontra-se o ponto de interseção nos procedimentos da competência do Júri, entre o judicium accusationes e o judicium causae [81].

No tocante ao procedimento no Júri, cumpre expor a lição de Hermínio Alberto Marques Porto:

O procedimento é bifásico ou escalonado. (...) A primeira fase, denominada judicium accusationis [ou juízo de formação da culpa], tem encerramento com a decisão de pronúncia (art. 408) transitada em julgado, correndo daí a segunda fase – judicium causae [ou julgamento do mérito] – que estará finda com o trânsito em julgado da sentença proferida pelo Juiz Presidente na sessão de julgamento pelo Tribunal do Júri. [82]

Compete ressaltar que a pronúncia fixa os limites da acusação. Assim, o libelo, como peça acusatória, deve-se restringir a repetir os termos da decisão de pronúncia, dela não podendo afastar-se, sob pena de nulidade [83].

Conforme nota exposta por Adriano Marrey et. al.: o libelo crime (...) limita a ‘imputatio facti’ a nível de acusação, isto é, a acusação que deve ser conhecida pela defesa como conseqüência natural do devido processo legal [84].

No libelo, o juiz encontrará articulado o fato principal – autoria e letalidade – que serão os dois primeiros quesitos a serem formulados aos jurados. Contudo, saliente-se que o primeiro quesito poderá ser desmembrado se houver circunstâncias separáveis [85].

Ainda, no tocante à função do libelo, bem doutrina Guilherme de Souza Nucci:

Para não prejudicar, de qualquer modo, a forma imposta pelo Tribunal do Júri, nem tampouco ferir a plenitude de defesa, deve o juiz seguir fielmente o que foi consignado no libelo-crime acusatório (...).

(...) a pronúncia decide se a acusação é admissível ou não, bem como quais serão os seus limites. Em seguida, com base nessa decisão, o promotor apresenta o libelo, onde coloca, em forma articulada, os fatos que pretende demonstrar provados em plenário. O magistrado presidente (...) dará vista à defesa para contrariá-lo. (...) estará cientificando o réu e seu defensor a respeito da acusação que será sustentada diante do Conselho de Sentença.

Por tudo isso, o juiz precisa ater-se ao libelo para redigir os quesitos, afinal, foi nessa peça formal que o defensor também se baseou para produzir sua manifestação. [86]

Quanto às teses defensivas apresentadas pela defesa técnica em plenário, expressamente prevê o Código de Processo Penal como fonte para os quesitos:

Art. 484. Os quesitos serão formulados com a observância das seguintes regras:

(...)

III – se o réu apresentar, na sua defesa, ou alegar, nos debates, qualquer fato ou circunstância que por lei isente de pena ou exclua o crime, ou o desclassifique, o juiz formulará os quesitos correspondentes, imediatamente depois dos relativos ao fato principal, inclusive os relativos ao excesso doloso ou culposo quando reconhecida qualquer excludente de ilicitude.

IV – se for alegada a existência (...), ou de causa que determine ou faculte diminuição de pena, nas mesmas condições, o juiz formulará os quesitos correspondentes a cada uma das causas alegadas.

Ao Juiz-Presidente descabe formular, por sua iniciativa, quesitos defensivos, pois a articulação do campo defensivo é matéria entregue ao advogado, como acima exposto. Poderá somente o Magistrado, observando a plenitude de defesa, declarar o réu indefeso se considerar a defesa técnica deficiente [87].

Sobre tal aspecto, Adriano Marrey e Alberto Silva Franco ensinam:

Apesar do Magistrado dever aceitar todas as teses compatíveis, mesmo que alternativas, oferecidas pela defesa, bem como a tese do réu, emanada do seu interrogatório, não está obrigado a incluir de ofício tese defensiva não alegada em plenário por qualquer das partes envolvidas. [88]

Por tais motivos, o réu não pode apresentar-se em plenário sem estar acompanhado de defensor habilitado para desenvolver, nos debates em plenário,

todas as questões pertinentes à defesa [89].

Além das teses defensivas expostas perante o Conselho de Sentença, há outra fonte para o questionário durante os debates, qual seja, a alegação do Promotor de Justiça de alguma circunstância agravante não articulada no libelo-crime acusatório (art. 484, parágrafo único, inciso II, do CPP) [90].

Saulo Brum Leal refere que só pode o Ministério Público requerer a formulação de circunstância agravante no plenário de julgamento se surgir alguma prova nova a respeito [91]. Ou seja, se o Ministério Público, mesmo sabedor de circunstância agravante, deixar de articulá-la no momento do oferecimento do libelo, não poderá, após, requerer a quesitação de dita agravante durante os debates no Júri.

No tocante à quesitação de agravante alegada nos debates, Adriano Marrey e Alberto Silva Franco doutrinam que tal fonte do questionário:

(...) mostra-se atualmente de duvidosa constitucionalidade. (...) Não se compreende como possa uma circunstância fática dotada de poder suficiente para reforçar a carga punitiva contra o réu surgir, de inopino, no curso da sessão de julgamento. (...) a imputação inoportuna ou tardia de uma circunstância agravadora de pena constituirá, sem dúvida, uma surpresa para a defesa, que não poderá, dessa forma, preparar-se adequadamente para o entrechoque processual. (...) O devido processo legal não suporta agravos ao contraditório e à ampla defesa. [92]

Inobstante a doutrina de Marrey e Franco, entendemos que não há qualquer ofensa constitucional, desde que a alegação de agravante nos debates seja em virtude de prova nova, isto é, surgida "após"o oferecimento do libelo, em consonância com a lição de Saulo Brum Leal.

Seguindo as fontes para o questionário, encontra-se o interrogatório do réu. Tal ato é indispensável e não comporta a simples e restrita indagação para confirmação ou repulsa sobre o afirmado em interrogatório anterior [93].

Valiosa a lição de José Frederico Marques: a defesa técnica do réu não torna prescindível a ‘autodefesa’. Esclarece que se entende por autodefesa a defesa particular do acusado, através da sua participação em muitos dos atos processuais e da presença àqueles que se realizam perante o público para a instrução e debate da causa [94].

Segundo Saulo Brum Leal, embora haja ilustres doutrinadores em sentido contrário, como Hermínio Alberto Marques Porto, outros, de idêntica magnitude, como José Frederico Marques, Espínola Filho e Magarino Torres, entendem que o interrogatório é fonte do questionário, por força do art. 484, inciso III, do CPP, acima descrito [95].

Saulo Brum Leal destaca que não é apenas ‘meio de prova’, mas também ‘ato de defesa’ (...). E como ato de defesa, que é o interrogatório do acusado, é peça importante para a formulação dos quesitos [96].

Guilherme de Souza Nucci argumenta que deve o magistrado incluir no questionário a tese do réu, levantada por ocasião do interrogatório, no pleno exercício da autodefesa [97]. Nucci, ainda, refere que, em pesquisa realizada com jurados, 85,62% afirmaram que acreditam, às vezes, na palavra do réu, quando ele é interrogado [99]. Assim, entendemos demonstrada a importância da quesitação da tese do réu, ainda que não ratificada pelo seu defensor.

Ao deixar o juiz de utilizar como fonte dos quesitos a tese do réu, haverá manifesta afronta ao princípio da ampla defesa, que, ao lado da defesa técnica, garante ao réu o exercício da autodefesa [100].

Nessa senda é a lição de Adriano Marrey e Alberto Silva Franco:

O interrogatório constitui um dos momentos mais expressivos da autodefesa, e se o acusado, neste ato, manifesta alguma posição defensiva, é evidente que o Juiz-Presidente deve levá-la em conta mesmo em face da inércia ou da omissão da defesa técnica. Constitui, desse modo, dever inafastável do Juiz-Presidente a formulação de quesitos com base no interrogatório do réu, sob pena de nulidade absoluta do julgamento. [101]

Derradeira fonte dos quesitos é a elaboração destes, de ofício, pelo juiz. Aqui, a fonte é o próprio juiz, que poderá formular quesitos sobre atenuantes que lhe pareçam adequadas ao caso. Todavia, o juiz deverá, obrigatoriamente, quesitar, no sentido genérico, sobre atenuantes (art. 484, parágrafo único, incisos III e IV, do CPP [102]).

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Nesse sentido, Aramis Nassif ensina que é obrigatória a quesitação de atenuante genérica, ainda que não alegadas em plenário as específicas. Esclarece, inclusive, que poderá o Juiz-Presidente limitar-se ao quesito genérico e atenuar a pena, sem arrogar o direito da identificação da atenuante específica [103].

Há outras hipóteses de formulação de quesitos de ofício pelo juiz, que são de caráter excepcional, como no exemplo da chegada aos autos, após a pronúncia, de prova sobre a saúde mental do acusado, ou hipótese de desdobramento de quesito (inciso II do art. 484) [104].

2.3 Redação e formulação atual dos quesitos

Como já exposto, os quesitos, cuja totalidade compõe o questionário, representam o meio pelo qual se conhece o veredicto do Conselho de Sentença, que decide pela íntima convicção. Nas palavras de Paulo de Lacerda: nas razões pelas quais o Júri responde aos quesitos consiste a soberania da sua consciência [105].

Assim, é de fundamental importância tanto sua correta formulação, como a coerência das respostas resultantes. Como bem descreve Aramis Nassif: os quesitos são indagações feitas aos jurados que as responderão mediante o depósito de uma de duas cédulas que lhes são distribuídas – uma com a palavra ‘sim’ e outra com a palavra ‘não’ impressas – em uma urna que lhe é exibida pelo oficial de justiça [106].

Desse modo, devem os quesitos serem redigidos em proposições simples e bem distintas, de maneira que cada um deles possa ser respondido com suficiente clareza (art. 484, VI, do CPP). Sendo clara a redação dos quesitos, será possível o fácil entendimento pelos jurados, devendo ser usado, preferencialmente, a linguagem da lei [107].

Destaca-se que, conquanto se recomende que as expressões utilizadas na redação dos quesitos sejam as de lei, isso não é sacramental, sendo conveniente, em certos casos, que o juiz opte por termos equivalentes, sempre em benefício da compreensão dos jurados. Não obstante, adverte-se que os quesitos devem ser redigidos sem conter indagações sobre matéria de direito ou conceitos jurídicos, pois podem levar os jurados à perplexidade. Devem sim, como já afirmado, versar sobre fatos e circunstâncias [108].

Assim, nota-se que o artigo 484 do Código de Processo Penal estabelece regras básicas para a confecção dos quesitos. Vale expor o ensinamento de Hermínio Alberto Marques Porto:

O questionário, de feitura entregue ao Juiz Presidente, compete a previsão de ‘quesitos pertinentes às teses da acusação e da defesa, de forma clara, desmembrados de modo a permitir aos Jurados a plena apreciação de cada assunto separadamente’, assim para prevenir ‘alegações de deficiência e complexidade na sua elaboração’ (...). [109]

Visando dita clareza dos quesitos, a doutrina e jurisprudência têm recomendado que não seja formulado quesito de forma, simultaneamente, interrogativa e negativa, uma vez que poderá gerar confusão no espírito dos jurados e dúvida na intenção de suas respostas [110]. Por exemplo: o réu "não" agiu em defesa de sua pessoa?; o réu "não" concorreu para o crime desferindo tiros de arma de fogo?

Como ensina Adriano Marrey et. al.: ao jurado leigo uma resposta positiva pode anular uma pergunta em forma negativa, e uma resposta negativa pode ensejar uma conclusão positiva, em razão da existência de duas negativas. Com isso, o julgamento torna-se ambíguo [111].

Esclarecido como devem ser redigidos os quesitos, vejamos a ordem de formulação. Os quesitos devem ser organizados conforme determinação previamente estabelecida pelo legislador no art. 484 do Código de Processo Penal. Importante ressaltar que, diante das regras "básicas" previstas em tal dispositivo, deve o Juiz adaptá-las ao caso concreto da peça acusatória e das teses defensivas.

Iniciando os trabalhos para a votação, deve o Juiz-Presidente formular o primeiro quesito que versará sobre o "fato principal", em conformidade com o libelo – art. 484, inciso I, do CPP – que diz respeito à materialidade do fato delituoso e sua autoria.

Denota-se, assim, que a primeira operação do juiz, ao redigir o questionário, é de indagar aos jurados se a conduta do réu se enquadra na figura típica do crime pelo qual é acusado [112].

Na verdade, para indagar-se o fato principal, devem ser feitos não um mas dois quesitos, como no caso do homicídio, seja consumado ou tentado: o primeiro, tratando da materialidade do fato e autoria das lesões; o segundo, tratando da letalidade das lesões, quando for crime consumado, ou seja, do nexo causal entre as lesões sofridas e a morte, e, no caso da tentativa, tratando da intenção de praticar o ato delituoso [113].

Registre-se que a negativa ao segundo quesito desclassifica o delito, uma vez que os jurados terão negado o animus necandi do agente, afastando o julgamento da esfera do Conselho de Sentença. Cabe relevar, também, que, em caso de tese de negativa de autoria, esta já estará sendo resolvida com a resposta ao primeiro quesito [114].

Vislumbra-se que a orientação abstrata da legislação no tocante à formulação dos quesitos é ilustrada, desde logo, no início da quesitação. Como refere James Tubenchlak: (...) o inciso I do art. 484 já traz grave imperfeição, qual seja, a de proclamar que ‘o primeiro quesito versará sobre o fato principal, de conformidade com o libelo’. (...) O fato principal compõe-se (...) do binômio conduta-resultado, não comportando, destarte, quesito único [115].

Além da divisão tradicional do fato principal em dois quesitos, poderá haver outros desdobramentos destes, se houver circunstâncias separáveis (art. 484, II, do CPP). Como no caso do uso de diversos meios sucessivos para a prática do delito: um porrete, depois uma faca, depois arma de fogo [116].

Em caso de co-autoria, o nome do acusado, nos quesitos acerca do fato principal, será representado pela palavra "alguém". Assim, estará sendo indagado aos jurados apenas a materialidade do crime. Após o 2° quesito – do nexo causal – serão, então, formulados quesitos envolvendo a autoria específica e a polêmica autoria genérica, também denominada de quesito genérico [117].

Findos os quesitos sobre o fato principal, o Juiz-Presidente formulará os referentes às "teses de defesa" expostas, como já esclarecido, tanto pela defesa técnica como pelo próprio acusado. A ordem de quesitação das teses defensivas será: a) tese desclassificatória, se houver; b) teses sobre excludentes de ilicitude (art. 23 do CP); por fim, teses de exclusão da culpabilidade [118].

Caso seja alegada tese desclassificatória, esta deve, assim, anteceder as teses absolutórias. Como ensina Saulo Brum Leal: concorrendo tese de desclassificação, essa deverá anteceder as de mérito a fim de que o júri não julgue o que não tinha competência [119]. O pedido desclassificatório ocorre, por exemplo, quando sustenta-se a negativa de dolo, em que haverá quesito sobre dolo direto e dolo eventual. Negado ambos, não mais se estará diante de um crime doloso contra a vida, o que excluirá a competência dos jurados para julgar o feito, transferindo a decisão para o juiz singular.

Seguindo dita ordem, não havendo desclassificação pelo Conselho de Sentença, deve-se indagar aos jurados as eventuais teses sobre alguma excludente da ilicitude (legítima defesa, estado de necessidade, estrito cumprimento do dever legal ou exercício regular do direito - art. 23 do CP).

Havendo o reconhecimento de alguma das excludentes da ilicitude acima enumeradas, deverão ser formulados, obrigatoriamente, quesitos relativos ao excesso culposo ou doloso. Ainda, outro fator relevante a ser contido é que, se a defesa apresentar teses diversas que envolvam a mesma excludente da ilicitude, o Magistrado deverá formular tantas séries de quesitos quantas forem as teses invocadas [120]. Ou seja, não poderá se limitar a indagar somente uma das teses, por serem referentes à mesma excludente, se esta comporta espécies diversas, como por exemplo: legítima defesa real e legítima defesa putativa.

Quanto à exclusão da culpabilidade, os quesitos versarão sobre fato ou circunstância que isente o réu de pena: inimputabilidade; embriaguez completa proveniente de caso fortuito ou força maior; dirimentes da culpabilidade (erro de tipo, coação irresistível e obediência hierárquica) [121].

Vale acentuar que, segundo a Súmula n.° 156, do Supremo Tribunal Federal, é absoluta a nulidade do julgamento pelo júri, por falta de quesito obrigatório. Válido é o esclarecimento exposto por Adriano Marrey e Alberto Silva Franco:

Mostra-se absoluta a nulidade decorrente da junção indevida de matérias, bem como a resultante da falta de quesito inerente a tese implementada pela defesa, não havendo de falar-se em preclusão pelo silêncio da defesa na oportunidade do julgamento. [122]

Matéria discutida na doutrina a ser lembrada é o cabimento ou não da formulação, a pedido da defesa, de quesito que indague aos jurados se "as provas existentes nos autos são insuficientes para a condenação do réu". Enfatizando a relevância de tal questionamento aos jurados, bem ensina Lenio Luiz Streck:

Toda vez que a defesa invocar a favor do réu a circunstância de não existirem provas suficientes para a condenação, mesmo que a latere de qualquer outra tese que esteja esgrimindo em plenário, o juiz deverá formular aos Jurados um quesito acerca da ‘inexistência ou insuficiência de provas para a condenação do acusado’ logo após os demais quesitos defensivos, sob pena de violação do artigo 484, inciso III, do CPP (...). Com isso, em caso de absolvição pelo júri com base no inciso VI do artigo 386 do CPP, ficará aberto o caminho para a vítima ou a sua família buscar a indenização pelo dano causado pelo réu, fato que, sem dúvida, vai ao encontro da procura de uma maior função social para o direito. [123]

A partir desse momento, desde que "já decidida" a condenação do acusado pelos jurados, deverão ser formulados os quesitos sobre majorantes e minorantes - causas de aumento e de diminuição de pena – por força do art. 484, inciso IV, do CPP [124].

Considerando que as causas de diminuição de pena são matéria de defesa - como a tese de homicídio privilegiado -, devem ser quesitadas antes das causas de aumento. Como ressalta Saulo Brum Leal, a privilegiadora, que constitui matéria de defesa, deverá ser proposta antes da qualificadora [125].

Pondo seguimento à ordem proposta por Saulo Brum Leal, serão votadas as causas de aumento e, após, as qualificadoras. Contudo, como refere Heráclito Antônio Mossin, as qualificadoras somente serão questionadas se os quesitos de defesa não as tenham prejudicado [126], e se estiverem especificadas na pronúncia e articuladas no libelo, independentemente de ter havido debates sobre elas no plenário [127].

Assim, votadas as minorantes e majorantes, passarão a ser indagadas as agravantes – arts. 61 e 62 do CP – que tiverem sido articuladas no libelo-crime acusatório ou argüidas no debate em plenário, sendo formulado um quesito para cada circunstância agravante, como prevê o art. 484, parágrafo único, inc. I, do CPP. [128] Convém lembrar que não poderão ser quesitadas as agravantes similares às qualificadoras afastadas na sentença de pronúncia [129].

Por fim, encerrando o questionário, deverá ser indagado aos jurados a existência de atenuantes. Deverá ser feito, primeiramente, um quesito genérico, o qual é obrigatório em caso de condenação, como já afirmado na presente obra. Se este for respondido afirmativamente, será formulado quesitos sobre atenuantes específicas ou inominadas (arts. 65 e 66 do CP), aplicáveis ao caso [130]. Ensina, ainda, Saulo Brum Leal:

Caso nenhuma seja aplicável à hipótese, não se deve formular nenhuma específica, devendo tal fato ser consignado no termo de votação. Contudo, a resposta afirmativa ao quesito genérico deve ser considerada para atenuar a pena, quando de seu cálculo. [131]

Enfim, esta é a ordem e formulação atual do questionário realizado ao Conselho de Sentença, a qual será confrontada, no capítulo seguinte, com a nova proposta de formulação que tramita no Poder Legislativo de nosso país.

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Sobre o autor
Evandro Rocha Satiro

servidor do Poder Judiciário do Rio Grande do Sul

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SATIRO, Evandro Rocha. A nova redação dos quesitos no PL nº 4.203/2001: (reforma do Tribunal do Júri). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1079, 15 jun. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8534. Acesso em: 11 mai. 2024.

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