Os crimes de contrabando e descaminho e suas consequências para o Estado brasileiro

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O presente trabalho possui como objetivo a apresentação, definição e análise dos crimes de contrabando e descaminho sob a óptica do direito aduaneiro e tributário, bem como, as suas consequências para o país e para a Administração Pública.

OS CRIMES DE CONTRABANDO E DESCAMINHO E SUAS CONSEQUÊNCIAS PARA O ESTADO BRASILEIRO

RESUMO: O presente trabalho possui como objetivo a apresentação, definição e análise dos crimes de contrabando e descaminho sob a óptica do direito aduaneiro e tributário, bem como, as suas consequências para o país e para a Administração Pública.

Os crimes acima serão apresentados conforme plasmado no Código Penal (decreto-lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940), sob os Art. 334 e 334-A. Além disso, será apresentado todo o enfoque sobre o tema constante no Decreto nº 6.759, de 5 de fevereiro de 2009, conhecido ordinariamente por Regulamento Aduaneiro. Outras complementações serão apontadas de acordo com a Constituição Federal de 1988 e legislação ordinária.

PALAVRAS CHAVE: contrabando; descaminho; apreensão; aduana; tributos.

  1.  INTRODUÇÃO

O presente artigo teve o tema ora escolhido, dado a sua grande importância para a sociedade brasileira como um todo e a gravidade de seus impactos na economia, saúde e educação do Estado brasileiro, em função da entrada de mercadorias estrangeiras descaminhadas ou contrabandeadas em território nacional. 

Os dezesseis mil quilômetros de extensão de fronteiras terrestres e a notória escassez e insuficiência da fiscalização do Estado, propiciam e fomentam a transposição (entre países vizinhos e o Brasil), de armas de fogo, drogas, agrotóxicos, medicamentos, cigarros, eletrônicos, etc.

Os prejuízos para a indústria e o comércio são incalculáveis, além do cenário propiciar a redução de empregos, possui o condão de enfraquecer e desestimular o parque empresarial, através de uma concorrência desleal. A consequência imediata é a perda de arrecadação do Estado, obtendo-se como reflexo natural a redução de investimento nas áreas de infraestrutura, saúde e ações sociais a serem providas pelos governos em benefício da sociedade.  

O quadro é realmente preocupante, observando-se por exemplo, os números divulgados pela Receita Federal através do sítio eletrônico https://receita.economia.gov.br/noticias/ascom/2020/janeiro/apreensoes-de-mercadorias-atingem-marca-historica-e-superam-r-3-26-bilhoes-em-2019, tem-se a ideia do enorme desafio a ser enfrentado na vigilância e combate ao descaminho e contrabando: foram apreendidos R$ 3,26 bilhões em mercadorias, somente no ano de 2019.

Diante de tamanho desafio a ser enfrentado pelos agentes fiscalizadores do Estado, não há no presente estudo, o objetivo de exaurir as abordagens concernentes ao tema. A pretensão é apresentar de forma sucinta a definição dos crimes de contrabando e descaminho, bem como, como os mesmo são tratados à luz da Administração Pública e seus impactos imediatos para toda a sociedade.

2. OS CRIMES DE CONTRABANDO E DESCAMINHO – DEFINIÇÕES HISTÓRICAS       

2.1 BREVE INTRODUÇÃO

Os crimes de contrabando e descaminho surgiram originariamente no Código Criminal do Império de 1830, sendo conhecidos à época como crimes contra o Tesouro Público e a Propriedade Pública do Estado. Naquele Código, já havia a definição de contrabandear em seu art.177: “é a atividade de importar ou exportar gêneros ou mercadorias proibidas; ou não pagar os direitos dos que são permitidos na sua importação ou exportação”. Percebe-se que o Código Criminal do Império não faz distinção entre contrabando e descaminho, tratando as condutas de não pagar tributos de importação/exportação para mercadorias legalizadas ou importação/exportação de mercadorias proibidas como contrabando.  

Em 1890, através do primeiro Código Penal da República, tem-se o contrabando prescrito em seu art.265, o qual era tratado como crime contra a Fazenda Pública: “Importar ou exportar, gêneros ou mercadorias proibidas; evitar no todo ou em parte o pagamento dos direitos e impostos estabelecidos sobre a entrada, saída e consumo de mercadorias, e por qualquer modo iludir ou defraudas esse pagamento". Ainda no referido instrumento da República, constata-se a “confusão” entre contrabando e descaminho.

O Código Penal de 1940 manteve a tipificação de tais crimes, perpetuando o equívoco já observado nas legislações pretéritas.

Finalmente, com a entrada em vigor da Lei nº 13.008/2014, segregou e definiu as condutas que caracterizam o contrabando e o descaminho, definindo-os em artigos distintos do Código Penal.

Atualmente, os institutos do descaminho e contrabando estão plasmados, respectivamente, no Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), conforme transcrição abaixo:

Dos Crimes Praticados Por Particular Contra A Administração Em Geral:

Art. 334 – Iludir, no todo ou em parte, o pagamento de direito ou imposto devido pela entrada, pela saída ou pelo consumo de mercadoria.

Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos

§ 1o  Incorre na mesma pena quem:

I - pratica navegação de cabotagem, fora dos casos permitidos em lei;

II - pratica fato assimilado, em lei especial, a descaminho; 

III - vende, expõe à venda, mantém em depósito ou, de qualquer forma, utiliza em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, mercadoria de procedência estrangeira que introduziu clandestinamente no País ou importou fraudulentamente ou que sabe ser produto de introdução clandestina no território nacional ou de importação fraudulenta por parte de outrem;

IV - adquire, recebe ou oculta, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, mercadoria de procedência estrangeira, desacompanhada de documentação legal ou acompanhada de documentos que sabe serem falsos.

§ 2o Equipara-se às atividades comerciais, para os efeitos deste artigo, qualquer forma de comércio irregular ou clandestino de mercadorias estrangeiras, inclusive o exercido em residências.

§ 3o A pena aplica-se em dobro se o crime de descaminho é praticado em transporte aéreo, marítimo ou fluvial.

Art. 334-A. Importar ou exportar mercadoria proibida:

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 ( cinco) anos.

§ 1o Incorre na mesma pena quem:

I - pratica fato assimilado, em lei especial, a contrabando;

II - importa ou exporta clandestinamente mercadoria que dependa de registro, análise ou autorização de órgão público competente;

III - reinsere no território nacional mercadoria brasileira destinada à exportação;

IV - vende, expõe à venda, mantém em depósito ou, de qualquer forma, utiliza em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, mercadoria proibida pela lei brasileira;

V - adquire, recebe ou oculta, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, mercadoria proibida pela lei brasileira.

§ 2º - Equipara-se às atividades comerciais, para os efeitos deste artigo, qualquer forma de comércio irregular ou clandestino de mercadorias estrangeiras, inclusive o exercido em residências.

§ 3o A pena aplica-se em dobro se o crime de contrabando é praticado em transporte aéreo, marítimo ou fluvial.

Da análise dos artigos acima, conclui-se que na prática do descaminho o Estado protege a Administração Pública, naquilo que tange a obrigação de se recolher aos cofres públicos tributo devido quando da entrada (importação) de mercadorias estrangeiras autorizadas no país ou de sua saída (exportação).

Dessa forma, quando se tenta iludir o Fisco no intuito de sonegar tributos com a entrada ou saída de mercadorias estrangeiras permitidas em solo nacional, tem-se o instituto do descaminho.

Por outro lado, configura-se o instituto do contrabando, a tentativa de se introduzir em território nacional ou exportar, mercadorias que se mostram proibidas pelas autoridades fiscais, sanitárias, ambientais ou econômicas. Ou seja, os bens que poderiam causar algum tipo de dano ou prejuízo ambiental, sanitário, moral, econômico, etc., se encontram inseridos na figura do contrabando. Além disso, em um segundo plano, tem-se a sonegação fiscal conforme visualizado no descaminho, afrontando diretamente os interesses do Estado e da sociedade.

Por ser um crime com potencial ofensivo mais grave, o contrabando possui uma previsão maior de pena de reclusão.

2.2 A IMPORTÂNCIA SOBRE O CONTROLE TRANSFRONTEIRIÇO DE MERCADORIAS, VEÍCULOS E PESSOAS 

Com uma extensão de fronteiras terrestres gigantesca (aproximadamente 16.000 mil km), o Estado brasileiro enfrenta grandes limitações físicas e financeiras para fazer valer a presença do agente estatal fiscalizador naquelas áreas.

Os recursos de numerários são limitados para as diversas demandas a serem atendidas pelos governantes: saúde, assistência social, previdência, segurança, educação. Além disso, a escassez de servidores públicos concursados e estruturas físicas adequadas aos fins, são outros desafios a serem vencidos, com o fito de se promover a vigilância e o monitoramento adequados aos limites fronteiriços do país.

Nunca é demais lembrar a grandiosa importância sobre o controle transfronteiriço de bens, pessoas e veículos que vem do estrangeiro e a ele retornam ou vão. Até porque, é através desse tipo de tráfego, entre países vizinho, que se dá a entrada (e saída), de mercadorias diversas, cigarros, medicamentos, drogas, armamentos, agrotóxicos, etc.

Dispensa comentários de envergadura mais aprofundada, sobre o destino de todas essas mercadorias e suas consequências para o coletivo em geral. Na vertente das mercadorias ordinárias descaminhadas, o impacto imediato observado se dá no abastecimento dos camelódromos locais com a consequente concorrência desleal sobre o comércio formal, aquele que recolhe seus tributos aos cofres públicos de maneira compulsória e legalizada. Diante de tal cenário, o que se percebe com o passar do tempo é o desaquecimento da economia, a redução na oferta de empregos formais, a redução na arrecadação fiscal, além da exposição da sociedade diante de mercadorias sem certificação ou laudos que comprovem a integridade e qualidade desses produtos adquiridos pelo público em geral.

Além disso, deve-se observar que os armamentos, as drogas, os cigarros, entre outros, são o tipo de mercadorias contrabandeadas que abastecem e financiam o crime organizado e fomentam a desordem e o caos em um movimento centrífugo, onde as ações fluem do cerne da organização criminosa e espalham-se para todas as outras camadas sociais, atingidas diariamente pela violência e a falta de segurança corriqueiras nas grandes cidades.

Nessa mesma esteira de pensamento, constatam-se que medicamentos e agrotóxicos contrabandeados se mostram altamente perniciosos à sociedade, uma vez que muitos deles não são legalizados, certificados e/ou autorizados pelos órgãos de controle e fiscalização do Estado (ANVISA, MAPA, IBAMA). Nesse ponto, abrem-se parênteses para apontar o reduzido preço dos agrotóxicos contrabandeados que adentram nas fronteiras brasileiras (cerca de 300% mais baratos que o produto nacional) e o seu uso indiscriminado e irresponsável por produtores rurais mais inescrupulosos.

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Reforça-se, então, a constatação instantânea sobre o estrago que esses produtos proporcionam à sociedade: medicamentos proibidos e prejudiciais à saúde sendo usados de maneira descontrolada; uso de agrotóxicos ilegais e também prejudiciais à saúde humana sendo manejados em grandes lavouras; mercadorias descaminhadas (como eletrônicos, perfumes, brinquedos, vestuário), sendo comercializadas em camelódromos, levando prejuízo econômico aos empresários (pela concorrência desleal), aos governos (pela sonegação fiscal) e à sociedade (pelo consumo de mercadorias sem garantia ou baixo padrão de qualidade); cigarros sendo comercializados e colocando em risco o bem-estar físico daquele que faz uso dos mesmos; armas que caem nas mãos de criminosos, espalhando a violência, pânico e insegurança na sociedade, dificultando em muito o trabalho das forças policiais; e as drogas, que abastecem o mercado interno e remuneram o criminoso traficante, fomentando a indústria de armamentos contrabandeados.

  Caminhando ao lado da grande importância sobre o controle de mercadorias que atravessam as fronteiras, conforme exposto anteriormente, tem-se o controle de pessoas de chegam e saem do território nacional. O referida fiscalização se mostra imprescindível ao combate de crimes de terrorismo, tráfico de pessoas, aliciamento sexual, entre outros crimes internacionais.

2.3 A COTA DE ISENÇÃO PARA MERCADORIAS ESTRANGEIRAS TRAZIDAS DO EXTERIOR 

O presente assunto se faz de extremo interesse àquele que vai ao exterior e possui a vontade de trazer consigo de volta ao país de origem, bens adquiridos no estrangeiro que venham acompanhados de sua bagagem, com o próprio interessado. Além disso, para o cidadão que se aventura no famigerado circuito de aquisição de mercadorias estrangeiras expostas no Paraguai, o assunto sobre o limite da cota de bens que podem adentrar ao Brasil se faz imprescindível, a fim de que o indivíduo não experimente o amargo dessabor de ser enquadrado nos Art. 334 e 334-A do Código Penal, tendo como objeto mercadorias provenientes de descaminho ou contrabando

Para esses casos, a Portaria MF Nº 440, de 30 de Julho de 2010 e a IN/SRF Nº 1059/2010, de 02/08/2010, são essenciais ao viajante internacional, posto que,   preveem o que poderá ser trazido por este, em termos de bens que se enquadrem no conceito de bagagem, sendo os mesmos isentos de tributação, desde que, o valor daqueles não supere a cota de US$ 500,00 (quinhentos dólares estadunidenses), por viajante.

É importante que os bens se submetam ao regime de tributação especial, obedecendo à cota anterior e ao prazo mínimo fixado de 30 (trinta) dias para aquisição de novos bens no exterior.

Para aquelas mercadorias que extrapolarem a supracitada cota, mas ainda se enquadrarem no conceito de bagagem, poderá ser realizada a sua regularização através do pagamento do valor de 50% daquilo que exceder o limite de US$ 500,00, a título de imposto de importação.

A seguir, apresentam-se alguns pontos norteadores fundamentais IN/SRF Nº 1059/2010, de 02/08/2010 e da Portaria MF Nº 440, de 30 de Julho de 2010, respectivamente:

                        Art. 2º Para os efeitos desta Portaria, entende-se por:

I – bens de viajante: os bens portados por viajante ou que, em razão de sua viagem, sejam para ele encaminhados ao País ou por ele remetidos ao exterior, ainda que em trânsito pelo território aduaneiro, por qualquer meio de transporte;

II – bagagem: os bens novos ou usados que um viajante, em compatibilidade com as circunstâncias de sua viagem, puder destinar para seu uso ou consumo pessoal, bem como para presentear, sempre que, pela sua quantidade, natureza ou variedade, não permitirem presumir importação ou exportação com fins comerciais ou industriais;

III – bagagem acompanhada: a que o viajante levar consigo e no mesmo meio de transporte em que viaje, exceto quando vier em condição de carga;

IV – bagagem desacompanhada: a que chegar ao território aduaneiro ou dele sair, antes ou depois do viajante, ou que com ele chegue, mas em condição de carga;

V – bagagem extraviada: a que for despachada como bagagem acompanhada pelo viajante e que chegar ao País sem seu respectivo titular, em virtude da ocorrência de caso fortuito ou força maior, ou por confusão, erros ou omissões alheios à vontade do viajante;

VI – bens de uso ou consumo pessoal: os artigos de vestuário, higiene e demais bens de caráter manifestamente pessoal, em natureza e quantidade compatíveis com as circunstâncias da viagem;

VII – bens de caráter manifestamente pessoal: aqueles que o viajante possa necessitar para uso próprio, considerando as circunstâncias da viagem e a sua condição física, bem como os bens portáteis destinados a atividades profissionais a serem executadas durante a viagem, excluídos máquinas, aparelhos e outros objetos que requeiram alguma instalação para seu uso e máquinas filmadoras e computadores pessoais; e

VIII – tripulante: a pessoa, civil ou militar, que esteja a serviço do veículo durante o percurso da viagem.

§ 1º Os bens de caráter manifestamente pessoal a que se refere o inciso VII do caput abrangem, entre outros, uma máquina fotográfica, um relógio de pulso e um telefone celular usados que o viajante porte consigo, desde que em compatibilidade com as circunstâncias da viagem.

§ 2º Para os efeitos do disposto no § 1º, incumbe ao viajante a comprovação da compatibilidade com as circunstâncias da viagem, tendo em vista, entre outras variáveis, o tempo de permanência no exterior.

§ 3º Não se enquadram no conceito de bagagem:

I – veículos automotores em geral, motocicletas, motonetas, bicicletas com motor, motores para embarcação, motos aquáticas e similares, casas rodantes (motor homes), aeronaves e embarcações de todo tipo; e

II – partes e peças dos bens relacionados no inciso I, exceto os bens unitários, de valor inferior aos limites de isenção, relacionados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB).

Art. 7º O viajante procedente do exterior poderá trazer em sua bagagem acompanhada, com a isenção dos tributos a que se refere o art. 6º:

I – livros, folhetos e periódicos;

II – bens de uso ou consumo pessoal; e

III – outros bens, observado o disposto nos §§ 1º a 5º, e os limites de valor global de:

                                      a) US$ 500, 00 (quinhentos dólares dos Estados Unidos da América) ou o equivalente em outra moeda, quando o viajante ingressar no País por via aérea ou marítima; e

                                      b) US$ 500,00 (quinhentos dólares dos Estados Unidos da América) ou o equivalente em outra moeda, quando o viajante ingressar no País por via terrestre, fluvial ou lacustre.

§ 1º Os bens a que se refere o inciso III do caput, para fruição da isenção, submetem-se ainda aos seguintes limites quantitativos:

I – bebidas alcoólicas: 12 (doze) litros, no total;

II – cigarros: 10 (dez) maços, no total, contendo, cada um, 20 (vinte) unidades;

III – charutos ou cigarrilhas: 25 (vinte e cinco) unidades, no total;

IV – fumo: 250 (duzentos e cinquenta) gramas, no total;

V – bens não relacionados nos incisos I a IV, de valor unitário inferior a US$ 10,00 (dez dólares dos Estados Unidos da América): 20 (vinte) unidades, no total, desde que não haja mais do que 10 (dez) unidades idênticas; e

VI – bens não relacionados nos incisos I a V: 20 (vinte) unidades, no total, desde que não haja mais do que 3 (três) unidades idênticas.

§ 2º Os limites quantitativos de que tratam os incisos V e VI do § 1º referem-se à unidade nas quais os bens são usualmente comercializados, ainda que apresentados em conjunto ou sortidos.

§ 3º A RFB poderá estabelecer limites quantitativos diferenciados tendo em conta o tipo de mercadoria, a via de ingresso do viajante e as características regionais ou locais.

§ 4º O direito à isenção a que se refere o inciso III do caput somente poderá ser exercido uma vez a cada intervalo de 1 (um) mês.

§ 5º O controle da fruição do direito a que se refere o § 4º independerá da existência de tributos a recolher em relação aos bens do viajante.

Da rápida leitura das disposições acima, percebe-se que existem isenções concedidas, independentemente da cota de US$ 500,00, outras que são concedidas desde que seja apresentada prova de determinados requisitos, e ainda, situações em que se deve obediência concomitante à cota e à quantidade de mercadorias adquiridas.

Ademais, determinados tipos de bens e outros com destinação comercial e ou industrial não podem ser adquiridos através do regime de tributação especial, pois não se enquadram no conceito de bagagem. Da mesma forma, fica vedada a entrada de mercadorias em solo pátrio para fins comerciais ou industriais, através do referido regime.  

2.4 AS PENALIDADES PREVISTAS NO DECRETO Nº 6.759, DE 5 DE FEVEREIRO DE 2009, SOB A ÓTICA DO CONTRABANDO E DO DESCAMINHO

Não obstante esse cenário de dificuldades hercúleas, a Constituição Federal de 1988, prevê em seu Art. 237 que: “A fiscalização e o controle sobre o comércio exterior, essenciais à defesa dos interesses fazendários nacionais, serão exercidos pelo Ministério da Fazenda.” Ou seja, mesmo que as dificuldades se apresentem de maneira inequívoca e em altos níveis, o Estado brasileiro tem o dever de garantir, ou pelo menos tentar, controlar o fluxo transfronteiriço de mercadorias, veículos e pessoas, em obediência ao comando constitucional.

Dessa forma, ao longo dos anos, foi instituído um enorme arcabouço jurídico-legislativo, a fim de subsidiar o agente fiscalizador, e por consequência o Estado, na árdua tarefa de persecução do objetivo de controlar e monitorar as fronteiras brasileiras.

Nesse diapasão, se encontra instituído no ordenamento jurídico o Decreto nº 6.759, de 5 de Fevereiro de 2009, conhecido ordinariamente como Regulamento Aduaneiro, o qual dispõe sobre a administração das atividades aduaneiras, e a fiscalização, o controle e a tributação das operações de comércio exterior.

O referido Regulamento prevê diversas espécies de penalidades, sendo as mais gravosas: o perdimento de veículo, o perdimento de mercadoria e o perdimento de moeda. Registra-se ainda, as previsão das penalidades de multa e sanção administrativa. A própria Constituição Federal de 1988, em seu Art. 5º, XLVI, b,  prevê a pena de perda de bens.

Observa-se que a pena de perdimento de veículo ou mercadoria, pode ser enquadrada em situações que configurem descaminho ou contrabando, ou até mesmo constatando-se os dois institutos ocorrendo simultaneamente. Nada impede que as penalidades sejam aplicadas separadamente ou cumulativamente.

É claro que, para aplicação da pena de perdimento de veículo, se faz imprescindível, anteriormente, ter sido aplicada a pena de perdimento de mercadoria, caso contrário, a pretensão de perda do veículo perderia o objeto, se mostrando sem sentido.

Desta forma, os seguintes artigos do Decreto nº 6.759, apresentam situações que ensejam a aplicação da pena de perdimento para veículo e ou mercadoria em hipóteses em que há ocorrência ora de descaminho e ora de contrabando:

Art. 688 – Aplica-se a pena de perdimento do veículo nas seguintes hipóteses, por configurarem dano ao Erário

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V - quando o veículo conduzir mercadoria sujeita a perdimento, se pertencente ao responsável por infração punível com essa penalidade;  

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Art. 689.  Aplica-se a pena de perdimento da mercadoria nas seguintes hipóteses, por configurarem dano ao Erário

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III - oculta, a bordo do veículo ou na zona primária, qualquer que seja o processo utilizado;

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VIII - estrangeira, que apresente característica essencial falsificada ou adulterada, que impeça ou dificulte sua identificação, ainda que a falsificação ou a adulteração não influa no seu tratamento tributário ou cambial;

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X - estrangeira, exposta à venda, depositada ou em circulação comercial no País, se não for feita prova de sua importação regular;

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XVIII - estrangeira, acondicionada sob fundo falso, ou de qualquer modo oculta;

XIX - estrangeira, atentatória à moral, aos bons costumes, à saúde ou à ordem públicas;

XX - importada ao desamparo de licença de importação ou documento de efeito equivalente, quando a sua emissão estiver vedada ou suspensa, na forma da legislação específica;

..........................................................................................................................

Art. 691.  Também será objeto da pena de perdimento, sem prejuízo de aplicação da multa referida na alínea “b” do inciso II do art. 718, a mercadoria que, nos termos de lei, tratado, acordo ou convenção internacional, firmado pelo Brasil, seja proibida de sair do território aduaneiro, e cuja exportação for tentada

Art. 692.  As mercadorias de importação proibida na forma da legislação específica serão apreendidas, liminarmente, em nome e ordem do Ministro de Estado da Fazenda, para fins de aplicação da pena de perdimento

Art. 693.  A pena de perdimento da mercadoria será ainda aplicada aos que, em infração às medidas de controle fiscal estabelecidas pelo Ministro de Estado da Fazenda para o desembaraço aduaneiro, a circulação, a posse e o consumo de fumo, charuto, cigarrilha e cigarro de procedência estrangeira, adquirirem, transportarem, venderem, expuserem à venda, tiverem em depósito, possuírem ou consumirem tais produtos, por configurar crime de contrabando ou de descaminho

Art. 696.  Aplica-se a pena de perdimento da mercadoria saída da Zona Franca de Manaus sem autorização da autoridade aduaneira, quando necessária, por configurar crime de contrabando

Diante dos supramencionados comandos, nota-se que existem previsões de ensejam a pena de perdimento a ser aplicada em veículos e mercadorias em função de determinada conduta propiciar o dano ao Erário através da sonegação e elisão dos tributos externos, com a entrada irregular de mercadorias estrangeiras em solo nacional.

Percebe-se que a ocultação de mercadorias em fundos falsos de veículos, a fim de ludibriar o Fisco, já se caracteriza por si só, conduta que leva à aplicação da pena de perdimento (tanto nas mercadorias, quanto no veículo transportador/armazenador), de modo que, dependendo do tipo de mercadoria “importada”, o quadro será de descaminho ou contrabando, ou até mesmo ambos.

De uma maneira geral, observa-se que os bens que são proibidos de serem importados e comercializados, tais como armamentos, cigarros, medicamentos, drogas, agrotóxicos, etc., recaem imediatamente na condição de contrabando, estando imediatamente passíveis de aplicação de pena de perdimento e destruição.

São várias as situações a serem observadas na legislação, a fim de que o sujeito passivo da obrigação tributária aduaneira não seja enquadrado em algumas delas, configurando-se descaminho ou contrabando a serem penalizados com a respectiva lavratura de auto de infração e aplicação da pena de perdimento.  

3. CONCLUSÃO

No ano de 2019, dos R$ 3,26 bilhões apreendidos pela Receita Federal, aproximadamente R$ 1,16 bilhões foram cigarros, R$ 0,372 bilhão em eletrônicos, R$ 0,228 bilhão em vestuário, sendo o restante em outras mercadorias diversas. Essas cifras, já são suficientes para perceber o grande impacto causado em diversos ramos da sociedade brasileira. No entanto, fica o questionamento: se foram apreendidos R$ 3,26 bilhões, então, quanto será que passou de maneira ilícita para o outro lado da fronteira? Quanto já não entrou no país através dos anos?

Apesar de o Brasil possuir dimensões continentais e apresentar um enorme déficit de recursos para investimento em segurança, infraestrutura, contratação de pessoal concursado, etc., o Estado não se pode furtar de seu poder-dever de realizar a vigilância, o monitoramento, a fiscalização e as ações de repressão nas regiões fronteiriças.

Mesmo com todas as adversidades e limitações vivenciadas pelo Estado, inclusive com o fatídico jargão popular de “enxugar gelo”, imposto pelas tentativas muitas  vezes frustradas de combate aos ilícitos de descaminho e contrabando nos limites do país, se mostra de fundamental importância e necessária, a continuidade dessas ações, uma vez que, abrir as fronteiras do Brasil a esmo e deixá-las ao léu, seria decretar a falência da economia nacional, obtendo-se ainda, outras consequências danosas para a sociedade, nas áreas de segurança, saúde, etc.

O combate ao descaminho e ao contrabando, trata-se de missão institucional brasileira que deve passar pelo planejamento e troca de informações exaustivas entre os órgãos fiscalizadores (fisco, polícias, agrodefesa, etc.). Caso contrário, o número de operações com eventos finais bem-sucedidos, tende a encolher.

De qualquer maneira, os governantes não podem abrir mão de uma atuação conjunta em combate aos crimes elencados aqui, tampouco, não se deve medir esforços para promover ações educativas, bem como, aquelas de cunho repressivo, a fim de prestar contas àquele cidadão de bem que paga seus tributos em dia e contribui para o bem-estar social da nação e o crescimento do país.   

4. REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988.

CAPARROZ, Roberto. Comércio Internacional e Legislação Aduaneira. 5ª Ed. – São Paulo – Saraiva, 2018.

LUZ, Rodrigo. Comércio Internacional e Legislação Aduaneira. 8ª Ed. – Salvador  - Juspodvm, 2018.

MASSON, Cléber. Direito Penal. 13ª Ed. – São Paulo – Método, 2020.

SARTORI, Angela. Temas Relevantes de Direito Aduaneiro. 1ª Ed. – São Paulo – Aduaneiras, 2018.

Sobre o autor
Rodrigo Ribeiro Gonçalves Ferreira

Formado em Engenharia Civil pela Universidade Federal de Goiás (1999); Pós-Graduação Lato Sensu em Logística Empresarial com Ênfase em Operações Logísticas pela Faculdade de Tecnologia SENAI de Desenvolvimento Gerencial - FATESG (2008); Pós-Graduação Lato Sensu em Gestão Tributária pela Faculdade Venda Nova do Imigrante (2020).

Informações sobre o texto

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