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A gratuidade judiciária na Justiça do Trabalho:

a possibilidade jurídica de sua concessão ao sindicato da categoria profissional enquanto substituto processual

07/12/2006 às 00:00
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O direito processual brasileiro autoriza que alguém atue em juízo como parte, em nome próprio, mas defendendo direito alheio. É o que se chama de substituição processual.

No processo do trabalho, tal instituto se evidencia com maior força quando o sindicato da categoria profissional postula em juízo, em nome próprio, para defender direitos de terceiros (no caso, os direitos da classe trabalhadora).

Nesse contexto, muito se discute, principalmente a nível jurisprudencial, se o sindicato da classe profissional, na qualidade de substituto processual, pode gozar dos benefícios da justiça gratuita.

Com efeito, a Lex Fundamentalis de 1988 dispõe, em seu art. 5º, LXXIV, que "o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos".

Pelos termos do retrocitado dispositivo, ao assegurar o direito fundamental à gratuidade dos serviços judiciários aos carentes de recursos, não distingue entre pessoas físicas ou jurídicas. Não obstante, a hermenêutica constitucional nos permite afirmar que a gratuidade alcança tanto as pessoas naturais como as jurídicas, de modo que o amplo acesso ao Poder Judiciário não pode ter como óbice a natureza da pessoa.

No Direito Processual do Trabalho, a assistência judiciária gratuita é regulamentada pela lei n.º 5.584, de 26 de junho de 1970.

Por esse diploma legal, a assistência é devida, exclusivamente, ao trabalhador. Nesse passo, a redação do art. 14 é de uma clareza meridiana, ao estabelecer que "Na Justiça do Trabalho, a assistência judiciária a que se refere a Lei nº 1.060, de 5 de fevereiro de 1950, será prestada pelo Sindicato da categoria profissional a que pertencer o trabalhador", estando sob a égide legal aquele que "perceber salário igual ou inferior ao dobro do mínimo legal, ficando assegurado igual benefício ao trabalhador de maior salário, uma vez provado que sua situação econômica não lhe permite demandar, sem prejuízo do sustento próprio ou da família".

Assim, em princípio, somente a pessoa física pode se beneficiar da assistência judiciária gratuita. A grosso modo, portanto, o sindicato, por se tratar de pessoa jurídica, não poderia usufruir deste benefício.

No entanto, nada impede que seja concedido ao órgão representativo da classe trabalhadora o benefício da justiça gratuita, que, registre-se, jamais se confunde com o instituto da assistência judiciária gratuita.

A assistência judiciária gratuita, como visto, é monopólio das entidades sindicais. Ela abrange o benefício da justiça gratuita. Pode-se afirmar, em uma escorchada síntese, que a assistência judiciária gratuita é gênero, da qual a gratuidade judiciária é espécie.

Por seu turno, o benefício da justiça gratuita, nas lições de BEZERRA LEITE, pode "ser concedida por qualquer juiz ou qualquer instância a qualquer trabalhador, independentemente de estar sendo patrocinado por advogado ou sindicato, que litigue na Justiça do Trabalho, desde que perceber salário igual ou inferior ao dobro do mínimo legal ou que declare que não está em condições de pagar custas do processo sem prejuízo do sustento próprio ou de sua família".

Como se verifica, a justiça gratuita implica, tão somente, na isenção do pagamento de despesas processuais. Aqui, o paradigma para a concessão é o pressuposto de miserabilidade da parte, consoante preconiza o art. 790, § 3º da CLT.

Enfim, a gratuidade judiciária permite a dispensa da parte do adiantamento das despesas, judiciais ou não, relacionadas ao processo, como também a dispensa do pagamento dos honorários de advogado, garantia que se estende a todos aqueles carentes de recursos; já a assistência judiciária é o patrocínio gratuito da causa por advogado público ou particular, a qual, na Justiça do Trabalho, é prestada pela entidade sindical que representa a categoria a que pertence o empregado.

Considerando que o acesso gratuito à Justiça é um direito constitucionalmente assegurado, nada impede que se estenda o direito da gratuidade judiciária às pessoas jurídicas, como é o caso do sindicato da categoria profissional.

Ademais, curial destacar que os Tribunais tendem a conferir o mesmo tratamento jurídico às hipóteses de assistência judiciária e justiça gratuita, condicionando, sempre, o seu deferimento, à prova da saúde financeira da pessoa. Como o sindicato goza de presunção de carência de recursos, prescindiria dessa prova, em seu favor para, assim, se beneficiar do instituto. Afinal, essa é a base tanto para a concessão da justiça gratuita de que trata a lei 1060/50 como também para a assistência judiciária, nos termos da lei 5584/70.

Essa presunção, porém, não é absoluta, pois admite prova em contrário. Assim como ocorre com a pessoa natural que percebe salário superior a dois salários mínimos, é possível prova contrária à alegação de que sua situação financeira não permite demandar sem o prejuízo de seu sustento e de sua família, também com mais razão não se concebe que, quanto ao ente sindical, que possui renda própria, se possa aplicar o princípio da presunção jure et de jure.

Nesse contexto, insta destacar o seguinte aresto: "JUSTIÇA GRATUITA. SINDICATO SUBSTITUTO PROCESSUAL. O benefício da Justiça Gratuita de que trata a Lei 1060/50 é dirigido a todos que buscam a tutela judiciária, sejam pessoas físicas ou pessoas jurídicas, com arrimo no princípio constitucional que garante o acesso ao judiciário e ainda o duplo grau de jurisdição. Em se tratando de pessoa jurídica sem fins lucrativos, como é o caso dos sindicatos, a declaração de pobreza supre a exigência legal, equiparando-a a pessoa física, diversamente do que acontece com as pessoas jurídicas com fins lucrativos, quando há a necessidade da parte requerente comprovar a miserabilidade. Todavia, demonstrada a inveridicidade das alegações de carência financeira do sindicato, não pode ser deferida a benesse." ( TRT da 5ª Região - Ac. nº 1.330/06 4ª. T. Proc. nº 00125-2005-134-05-01-3-AI Rel. Des.Valtércio Oliveira).

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Desse modo, anotadas as diferenças entre os institutos da assistência judiciária gratuita e gratuidade judiciária (ou justiça gratuita), vê-se, pois, a possibilidade jurídica da concessão desta ao sindicato da classe trabalhadora atuando como substituto processual, conquanto seja pessoa jurídica.

Corroborando de maneira substancial com esta tese, o Superior Tribunal de Justiça, em julgados reiterados, vem proclamando ser possível a concessão do benefício da gratuidade judiciária a pessoas jurídicas com e sem finalidade lucrativa, sendo que, quanto àquelas primeiras, é necessária a prova de sua dificuldade financeira, e, em relação a estas últimas, havendo presunção de que não podem arcar com as custas e demais despesas do processo, despicienda se faz a prova desse óbice.

Noutra guisa, sob o prisma teleológico, a concessão da gratuidade judiciária ao sindicato, enquanto substituto processual, é um meio de adequar o texto da lei à sua finalidade social, qual seja, garantir a todos, seja pessoa física ou jurídica, o amplo acesso à Justiça. Restringir a gratuidade judiciária ao sindicato seria, ainda que indiretamente um modo de dificultar e, até mesmo, restringir o acesso ao Poder Judiciário ao órgão da classe trabalhadora.

Assim, portanto, amparado na doutrina e jurisprudência, verifica-se que não há obstáculo jurídico para o deferimento do benefício da gratuidade judiciária sindicato profissional, na qualidade de substituto da classe, tanto mais porque não explora atividade econômica e muito menos lucrativa.


Referências Bibliográficas

CINTRA, Antônio Carlos de Araújo,GRINOVER, Ada Pellegrini, DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo.São Paulo. Editora Malheiros, 2002, 18º ed.

DELGADO, Maurício Godinho Delgado. Curso de Direito do Trabalho. 5ª ed., São Paulo: LTr, 2006.

LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho, 4ª ed., São Paulo: LTr, 2006.

MARTINS, Sérgio Pinto. Fundamentos de Direito Processual do Trabalho, 9ª ed, São Paulo: Atlas, 2006.

___________________. Direito do Trabalho, 22ª ed., São Paulo: Atlas, 2006.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo.São Paulo, Editora Malheiros,1999, 16ª ed.

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Sobre o autor
Rodrigo Tourinho Dantas

Advogado em Salvador (BA). Bacharel em Direito pela Universidade Católica do Salvador (UCSAL). Pós-graduando "lato sensu" em Direito Processual Civil pela Fundação Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia (UFBA).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DANTAS, Rodrigo Tourinho. A gratuidade judiciária na Justiça do Trabalho:: a possibilidade jurídica de sua concessão ao sindicato da categoria profissional enquanto substituto processual. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1254, 7 dez. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/9261. Acesso em: 17 nov. 2024.

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