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Emenda Constitucional nº 20/98:

aplicabilidade do novo limitador de pagamento previdenciário aos benefícios concedidos em data anterior a 16/12/1998

18/04/2007 às 00:00
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            O presente trabalho procura analisar a aplicabilidade do novo teto máximo de pagamento de R$1.200,00 para os benefícios que já estavam em curso na data da vigência da Emenda Constitucional nº.20.

            Não nos ateremos ao histórico dos limites de pagamentos dos benefícios previdenciários, destacando apenas que em julho de 1988, estipulou-se que os benefícios previdenciários do Regime Geral de Previdência Social seriam limitados, de maneira que o pagamento do benefício não pudesse ultrapassar um valor máximo definido.

            Tal valor limite (teto) foi sendo reajustado no decorrer dos anos, sendo que em julho de 1998, após o reajuste anual, o valor máximo pago aos benefícios previdenciários não poderia ultrapassar R$ 1.081,50 (mil e oitenta e um reais e cinqüenta centavos).

            Com o advento da Emenda Constitucional n.º 20, de 15 de dezembro de 1998, o teto máximo para todos os benefícios previdenciários passou de R$1.081,50 (mil e oitenta e um reais e cinqüenta centavos) para R$1.200,00 (mil e duzentos reais) mensais.

            Tal aumento não decorreu de reajuste, como vinha acontecendo anualmente, mas sim de uma modificação legal do teto vigente, através de nova regra constitucional.

            Ocorre que, na tentativa de evitar o pagamento de parte desse valor, o Ministério da Previdência e Assistência Social editou, em data imediatamente posterior à EC n.º20/98, uma norma interna estabelecendo que o limite máximo do valor dos benefícios do RPGS a serem concedidos a partir de 16 de dezembro de 1998 seria de R$1.200,00 (mil e duzentos reais).

            Significa dizer que todos os benefícios concedidos anteriormente a essa data deveriam permanecer com a limitação do teto anterior, ou seja, de R$1.081,50 (mil e oitenta e um reais e cinqüenta centavos) mensais.

            Tal situação é claramente absurda e ilegal, posto que nem a Lei n.º8.213/91, tampouco a Constituição Federal de 1988 e nem mesmo a própria reforma, em momento algum, autorizaram a existência de dois limitadores para os benefícios mantidos pela RGPS.

            Vejamos mais atentamente os ditames da reforma. A Emenda Constitucional n.º 20/98, em seu artigo 14, dispôs:

            O limite máximo para o valor dos benefícios do regime geral de previdência social de que trata o art. 201 da Constituição Federal é fixado em de R$1.200,00 (mil e duzentos reais), devendo, a partir da data da publicação desta Emenda, ser reajustado de forma a preservar, em caráter permanente, seu valor real, atualizado pelos mesmos índices aplicados aos benefícios do regime geral de previdência social.

            Ocorre que tal aumento de limitador máximo poderia vir a ter reflexos nos benefícios concedidos anteriormente à vigência da EC nº. 20. Isso porque, muitos benefícios, quando da elaboração de sua memória de cálculo, ultrapassam, no valor de seu salário de benefício, o valor total máximo permitido para pagamento.

            E, por uma determinação legal, passaram a ter o valor total de pagamento limitado a esse teto, ainda que possuíssem o direito ao recebimento de um valor maior, direito esse adquirido por suas contribuições ao Regime Geral de Previdência Social.

            O mesmo acontece com aqueles beneficiários que obtém como salário de benefício valores inferiores ao salário mínimo vigente à época da concessão. Sua renda mensal inicial passa a ser um salário mínimo, devendo o INSS fazer os pagamentos sempre dentro desse limitador mínimo.

            Quanto aos limitadores em si, não há que se discutir sua legalidade, tanto para o menor quanto o maior valor de pagamento. O que devemos analisar mais atentamente são os reflexos dos aumentos desses limitadores (tetos) sem que houvesse um reajuste efetivo de todos os benefícios já em curso.

            Com o advento da EC n.º 20/98, todos os segurados que estivessem recebendo R$1.081,50 em 12/1998, mas cujo total da renda reajustada ultrapassasse tal limite, deveriam passar a receber de acordo com o novo teto, ou seja, levando-se em consideração o teto limitador de R$1.200,00.

            Isso não significa dizer que todos deveriam ter passado a receber mais. Ao contrário. O que mudou foi apenas o limitador legal e não os valores percebidos mensalmente.

            Para uma melhor compreensão da injustiça cometida pela Autarquia Ré, tomemos por base o exemplo:

            Aposentadoria com DIB 06/1994, Salário de benefício de R$ 639,79, RMI limitada a 582,86 na época da concessão.

Renda Mensal

Índice de majoração*

renda devida reajustada

valor pago (teto)

06-1994

639,79 582,86

05-1995

639,79 1,4286 913,98 832,66

05-1996

913,98 1,1500 1.051,07 957,56

06-1997

1.051,07 1,0776 1.132,63 1.031,87

06-1998

1.132,63 1,0481 1.187,10 1.081,50

            Nesse caso, a partir da EC n.º20/98, o benefício deverá ser pago no montante mensal de R$1.187,10, passando a não sofrer qualquer limitação, posto que inferior ao novo teto. Cabe-nos ressaltar, por oportuno, que não se trata de reajuste de benefício, mas apenas de adequação ao novo limite máximo da renda mensal que foi estabelecido na EC n.º 20/98.

            Explicamos: se o beneficiário tem direito ao pagamento maior do que o teto, mas, devido a uma limitação legal, tem seu valor de benefício diminuído, por certo que o aumento do limite resultará numa adequação do valor do benefício ao teto, respeitando-se sempre o cálculo do valor devido (RMI).

            Isso porque, se aceitarmos interpretação contrária estaremos aceitando o enriquecimento ilícito do Instituto, que deveria pagar mais ao segurando e somente não o fez por determinação legal.

            Ora, se a lei aumenta o limite, todos aqueles que deveriam estar recebendo a mais devem passar a receber de acordo com a nova limitação. Esse aumento não deve ser entendido como reajuste, porque o direito já existia anteriormente. É apenas uma readequação do valor do benefício à nova limitação legal.

            Cumpre salientar que o raciocínio adotado para a evolução dos benefícios feita acima (sempre partir da RMI reajustada para após aplicar o limitador) é praticado pelo próprio INSS ou, pelo menos, vinha sendo praticado regularmente até o reajuste de 1997. Ademais, trata-se do procedimento mais lógico e justo, que não encontra vedação na Lei 8.213/91.

            Entretanto, contrariando o bom sendo e a justiça, o INSS, em desacordo com a reforma trazida pela EC n.º20/98, continuou a pagar todos os benefícios anteriores a 16/12/1998 de acordo com o limite de R$1.081,50. Para tanto, o Ministério da Previdência e Assistência Social editou, na data imediatamente posterior à EC n.º 20/98, norma interna que estabeleceu que:

            Art. 6º. O limite do valor dos benefícios do RGPS, a serem concedidos a partir de 16 de dezembro de 1998, é de R$1.200,00 (um mil e duzentos reais), inclusive do benefício de que tratam os art. 91 a 100 do Regulamento de benefícios da Previdência Social – RBPS, aprovado pelo Decreto n.º2.172, de 5 de março de 1997, e dos benefícios de legislação especial pagos pela Previdência Social, mesmo que à conta do Tesouro Nacional.

            Tal norma é inaplicável posto que estabelece regra diferente da trazida pela EC n.º20/98, fixando dois limitadores para os benefícios mantidos pelo RGPS. Importante ressaltar que tal duplicidade de limitadores não está prevista na Constituição Federal de 88, tampouco na Lei 8.213/91, e, portanto, não possui qualquer amparo legal.

            Nossa constituição, em várias partes de seu texto, busca garantir a todos um tratamento com igualdade e justiça. Assim o faz em seu artigo 5o. estabelecendo o princípio geral da isonomia. Mas, em se tratando de direito previdenciário, o Constituinte se preocupou em reassegurar essa igualdade, dispondo:

            Art. 201º. (...)

            §

1o. É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos beneficiários do regime geral de previdência social, ressalvados os casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, definidos em lei complementar.

            Ora, se a EC 20 não trouxe qualquer distinção entre os que já estavam aposentados e os que iriam se aposentar, portanto, não estabelecendo nenhum critério diferenciador entre os beneficiários, não cabe ao MPAS criar norma que fira o ditame constitucional.

            No intento de diminuir os gastos, o que parece ser sua única preocupação, o MPAS feriu o princípio da isonomia, tentado criar critérios diferenciados para a concessão de aposentadorias que, por ordem legal, deveriam seguir as mesmas regras.

            Esse é também o entendimento de nosso judiciário:

            "Como se percebe, o INSS estabeleceu que o limite máximo fixado pela EC n.20/98 (R$1.200,00) será aplicado tão somente para benefícios deferidos após 16-12-1998. Para os anteriores, mantido o limite máximo então vigente (R$1.081,50). Ambos sofreram idênticos reajustes a partir de 06/1999.

            Tenho porém, que a Lei n.º8213/91, ou mesmo a CF/1988, em momento algum autorizaram a existência de dois limitadores para os benefícios mantidos pelo RGPS. O novo limite fixado pela EC n.º20/98 aplica-se a todo o RGPS, já que a própria reforma não fez tal distinção."

(Juizado Especial Federal de Florianópolis-SC – Juíza Eliana Paggiarin Marino - autos n.º2002.72.00.053536-1 – 12/11/2002)

            Segue o mesmo entendimento:

            "Verifica-se, portanto, que a autarquia previdenciária extrapolou seu poder de regulamentar a norma constitucional, porquanto estabeleceu dois limites máximos para os benefícios previdenciários, um a ser aplicado até 16.12.1998 (R$ 1.081,50) e outro a ser deferido após esta data (R$ 1.200,00), distinção esta não levada a efeito pela norma constitucional.

            Outrossim, a partir de junho de 1999, a Administração aplicou reajustes idênticos a ambos os "tetos", criando, desta forma, dois limites aos benefícios previdenciários. Em verdade, dois tetos, um aos benefícios concedidos anteriormente à dezembro de 1998, e outro a partir desta data.

            Neste contexto, uma vez que a norma constitucional não fez distinção alguma entre os benefícios anteriores e posteriores à EC n.º20/98, tenho que o novo limite fixado por esta aplica-se a todo o RGPS. (...)

            Não há que se falar, portanto, em reajuste, mas tão-somente em adequação ao novo limite máximo da renda mensal, podendo ser superior ao antigo teto de R$ 1.081,50, mas não necessariamente resultar em valor igual ao novo teto de R$ 1.200,00.".

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(Juizado Especial Federal de Lages-SC – Juíza Gabriela Pietsch Serafin - autos n.º 2003.72.06.053726-3 – 12/01/2004).

            Cabe-nos ressaltar que a Turma Recursão do Estado de Santa Catarina tem firmado entendimento no sentido favorável ao pedido fundamento da presente ação, como se pode observar das decisões nos processos: 2003.72.03.202562-9, 2003.72.09.052561-5, 2003.72.03.202565-4, 2003.72.09.052563-9 entre muitos outros.

            Assim, a Turma Recursal do Estado de Santa Catarina tem garantido o direito da revisão do benefício, com a aplicação como limitador máximo da renda mensal reajustada, após 12/1998, o valor fixado pela EC n.º 20/98 (R$1.200,00).

            Resta comprovado o erro cometido pelo INSS ao estipular, ao arrepio da lei, dois limitadores para os pagamentos previdenciários. E, como sabemos, a existência de dois limitadores é contrária ao princípio da isonomia presente em nossa Carta Magna.

            Façamos uma comparação simples. Suponhamos que existam dois indivíduos, ambos com os mesmos salários de contribuição e o mesmo período contributivo, ou seja, em situação idêntica frente ao INSS. Se um deles requereu sua aposentadoria em 14/12/98, terá seu benefício concedido com limitação ao teto antigo, passando a receber por mês 1.081,50. Já se o segundo requereu sua aposentadoria em 17/12/98, este terá seu benefício limitado ao novo teto da EC. 20, passando a receber 1.200,00.

            Até em uma análise superficial fica claro o erro que cometeu o INSS. Não se pode tratar de maneira tão desigual aqueles que possuem direitos iguais.

            Destaca-se que como o INSS não procedeu a revisão dos benefícios vigentes, a única maneira para readaptar a RMA do beneficiário é através do Judiciário.

            Nesses casos, o Magistrado, ao reconhecer a agressão ao direito individual e de aplicação da norma constitucional, restabelecerá a ordem jurídica, ordenando ao INSS que modifique a renda atual do beneficiário, de acordo com os valores reais, frente ao novo teto limitador de pagamentos.

            As normas constitucionais impõem um dever-ser, não são simples declarações de intenção. Se contemplarem direitos, não será o legislador infraconstitucional, muito menos um órgão público, através de uma ordem interna, que poderá confrontar seus ditames.

            A norma apontada pela EC nº. 20 não admite interpretação para mais ou para menos. É clara em apontar todos os aposentados atingidos pelo teto de benefício, como seus beneficiários. É regra jurídica impositiva de cumprimento pelo legislador, na forma binária de um tudo ou nada, sem abstração, ponderação ou interpretação, muito menos restritiva.


Conclusão

            Com o advento da Emenda Constitucional n.º 20, todos os benefícios concedidos anteriormente a sua vigência e que possuíam o valor de salário de benefício superior ao teto da época da concessão deverão ter seus valores atuais revistos, para que sejam limitados pelo novo teto, que, em dezembro de 1998 era de 1.200,00.

            Isso porque a EC nº.20 não trouxe em seu texto qualquer limitação da aplicabilidade do novo limite máximo de pagamentos aos benefícios em curso, ao contrário do que quer fazer parecer o INSS.

            Assim, todos os beneficiários que tiverem Data de Início do Benefício (DIB) anteriores a 16/12/1998 e que tiverem salário de benefício superior ao teto máximo da época da concessão devem recorrer ao Judiciário para terem suas rendas mensais atuais revistas, de acordo com o novo limitador trazido pela Emenda Constitucional nº. 20.

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Sobre a autora
Gisele Kravchychyn

Advogada em Santa Catarina, Paraná e Sergipe. <br>Presidente da Comissão de Seguridade Social da OAB/SC<br>Diretora de Atuação Judicial do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário - IBDP<br>Pós Graduada em Direito Previdenciário. <br>Pós Graduada em Gestão de Previdência Privada. <br>Autora de “Prescrição e Decadência no Direito Previdenciário” <br>E de “Prática Processual Previdenciária”.<br>Sócia da Kravchychyn Advocacia e Consultoria.<br>

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

KRAVCHYCHYN, Gisele. Emenda Constitucional nº 20/98:: aplicabilidade do novo limitador de pagamento previdenciário aos benefícios concedidos em data anterior a 16/12/1998. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1386, 18 abr. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/9753. Acesso em: 28 mar. 2024.

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Título original: "A aplicabilidade do novo limitador de pagamento previdenciário trazido pela Emenda consititucional nº. 20 para os benefícios concedidos em data anterior a 16/12/1998".

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