Capa da publicação Revisão da vida toda: não incidência do prazo decadencial de 10 anos
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Não incidência do prazo decadencial de 10 anos nas ações denominadas de revisão da vida toda

não incidência prazo decadencial - alteração jurisprudencial

14/05/2022 às 13:37
Leia nesta página:

Revisão da Vida Toda e não incidência do prazo decadencial.

O novo artigo 23 da Lindb (Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro), incluído pela Lei nº 13.655, de 2018, dispõe acerca de decisões judiciais, como no caso em exame, que estabelecem orientação nova, impondo dever ou condicionamento de direitos, in verbis:

Art. 23.  A decisão administrativa, controladora ou judicial que estabelecer interpretação ou orientação nova sobre norma de conteúdo indeterminado, impondo novo dever ou novo condicionamento de direito, deverá prever regime de transição quando indispensável para que o novo dever ou condicionamento de direito seja cumprido de modo proporcional, equânime e eficiente e sem prejuízo aos interesses gerais. (Destacamos)

Desse modo, sempre que houver a fixação de teses jurídicas de interpretação de demandadas repetitivas e vinculante para a administração pública, deve ser estabelecido o regime de transição.

O regime de transição que fixa teses jurídicas de repercussão geral ou de recursos em regime de incidente de demandas repetitivas quando impactam o direito dos interessados, devem ser observados a proporcionalidade, equidade e evitar prejuízo de interesse geral.

Nesse sentido estabelece o Ilustre Jurista Flávio Tartuce, em sua obra Manual de Direito Civil, 11ª edição, 2021, dispõe da seguinte forma:

Sobre o regime de transição, o novo art. 23 da Lei de introdução dispõe que a decisão administrativa, controladora ou judicial que estabelecer interpretação ou orientação nova sobre norma de conteúdo indeterminado, impondo novo dever ou novo condicionamento de direito, deverá prever regime de transição quando indispensável para que o novo dever ou condicionamento de direito seja cumprido de modo proporcional, equânime e eficiente e sem prejuízo aos interesses gerais. O objetivo é de não surpreender o agente público o que representa aplicação da boa-fé objetiva no plano administrativo. Há aqui outra influência do CPC/2015, em especial do seu art. 927, §3º, in verbis: na hipótese de alteração de jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos, pode haver modulação dos efeitos da alteração da alteração no interesse social e no da segurança jurídica. (Destacamos)

Assim, o Superior Tribunal de Justiça ao julgar o IRDR (Incidente de Resolução de Demanda Repetitiva), n. RECURSO ESPECIAL Nº 1.648.336 - RS (2017/0009052-4), afetado, julgado em 22/05/2019, Tema Repetitivo n. 975, fixou a seguinte tese:

APLICA-SE O PRAZO DECADENCIAL DE DEZ ANOS estabelecido no art. 103, caput, da Lei 8.213/1991 ÀS HIPÓTESES EM QUE A QUESTÃO CONTROVERTIDA NÃO FOI APRECIADA NO ATO ADMINISTRATIVO de análise de concessão de benefício previdenciário.

Com base na premissa da fixação do regime de transição, essa tese jurídica em recurso repetitivo, ao pacificar o entendimento oscilante no próprio tribunal aparentemente inviabilizou o ingresso de demandas acerca da revisão da vida toda que já decorreram o prazo de 10 anos.

Porém, ao examinar o Recurso Paradigma, RECURSO ESPECIAL Nº 1.648.336 - RS (2017/0009052-4), não foi exposto o regime de transição, o que com base nesse entendimento restou PREJUDICADO O INTERESSE PÚBLICO, A SEGURANÇA JURÍDICA, A BOA-FÉ OBJETIVA E A IMPOSSIBILIDADE DE DECISÕES SURPRESA.

O Entendimento do E. STJ sobre a não incidência do prazo decadencial nos termos do artigo 103, da Lei 8.213/1991, consistia, sucintamente, dos seguintes fundamentos: não apreciação pelo ente da administração pública da matéria controvertida, e pelo PRINCÍPIO DA ACTIO NATA, in verbis:

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. BENEFÍCIO ANTERIORMENTE RECEBIDO PELO INSTITUIDOR. REVISÃO DE VALORES. DECADÊNCIA. NÃO INCIDÊNCIA. PRINCÍPIO DA ACTIO NATA. 1. É entendimento assente na Segunda Turma deste Superior Tribunal de que o início do prazo decadencial para revisão do valor do benefício originário da pensão por morte se dá após o deferimento desta, em decorrência do princípio da actio nata, tendo em vista que apenas com o óbito do instituidor adveio a legitimidade da pensionista para o pedido de revisão, já que, por óbvio, não era titular do benefício originário de seu marido, direito personalíssimo. Precedente. 2. Recurso especial a que se nega provimento. (REsp 1.675.120/SC, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 3/8/2017, DJe de 9/8/2017)

PREVIDENCIÁRIO. DECADÊNCIA. QUESTÕES NÃO APRECIADAS PELA ADMINISTRAÇÃO. NÃO INCIDÊNCIA DO ART. 103, CAPUT, DA LEI N. 8.213/91. 1. Em se tratando de instituto destinado ao controle de legalidade de ato administrativo, a decadência prevista no caput do art. 103 da Lei n. 8.213/91 não pode atingir questões inerentes à matéria probatória relativas a tempo de serviço que não foram apreciadas pela Administração no momento da concessão de benefício. 2. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no REsp 1.553.676/PR, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/4/2017, DJe de 27/4/2017)

Portanto, a tese de repercussão geral tema n 975, ao pacificar a divergência do próprio tribunal sem observar o regime de transição viola os termos do artigo 23 da Lei de introdução ao direito brasileiro e inviabiliza indevidamente o exercício de direito pelo entendimento da jurisprudência, o que deve ser afastada para as ações de revisão da vida toda.

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DA ALTERAÇÃO DO ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL E DA POSSIBILIDADE DO INGRESSO COM A AÇÃO APÓS O DECURSO DE 10 ANOS.

 

Verifica-se que as AÇÕES PREVIDENCIÁRIAS DENOMINADAS DE REVISÃO DA VIDA TODA ganharam maior proporção após o julgamento da RECURSO ESPECIAL Nº 1.596.203 - PR (2016/0092783-9), afetado, precedente repetitivo tema n. 999, julgado em 11 de dezembro de 2019.

O Recurso Especial afetado para o incidente de resolução de demanda repetitiva foi julgado o ENTENDIMENTO SOBRE AS REGRAS DE TRANSIÇÃO DO NOVO REGIME DE PREVIDÊNCIA estabelecido pela Lei 9.876/1999, §3º, que culminou de forma definitiva no artigo 29, I e II da Lei 8.213/91, alterado pela redação dada pela Lei nº 9.876, de 26.11.99.

Que consolidou o seguinte entendimento:

RECURSO ESPECIAL Nº 1.596.203 - PR (2016/0092783-9) PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL AFETADO COMO REPETITIVO. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 3/STJ. REVISÃO DE BENEFÍCIO. SOBREPOSIÇÃO DE NORMAS. APLICAÇÃO DA REGRA DEFINITIVA PREVISTA NO ART. 29, I E II DA LEI 8.213/1991, NA APURAÇÃO DO SALÁRIO DE BENEFÍCIO, QUANDO MAIS FAVORÁVEL DO QUE A REGRA DE TRANSIÇÃO CONTIDA NO ART. 3o. DA LEI 9.876/1999, AOS SEGURADOS QUE INGRESSARAM NO SISTEMA ANTES DE 26.11.1999 (DATA DE EDIÇÃO DA LEI 9.876/1999). CONCRETIZAÇÃO DO DIREITO AO MELHOR BENEFÍCIO. PARECER DO MPF PELO DESPROVIMENTO DO FEITO. RECURSO ESPECIAL DO SEGURADO PROVIDO. A Lei 9.876/1999 adotou nova regra de cálculo dos benefícios previdenciário, ampliando gradualmente a sua base de Página 8 de 16 cálculo dos benefícios que passou a corresponder aos maiores salários de contribuição relativos a 80% de todo o período contributivo do Segurado, substituindo a antiga regra que determinava o valor do benefício a partir da média aritmética simples dos 36 últimos salários de contribuição dos meses anteriores ao do afastamento do Segurado da atividade ou da data da entrada do requerimento administrativo. A nova lei trouxe, também, uma regra de transição, em seu art. 3o., estabelecendo que no cálculo do salário de benefício dos Segurados filiados à Previdência Social até o dia anterior à data de publicação da Lei 9.876/1999, o período básico de cálculo só abarcaria as contribuições vertidas a partir de julho de 1994 (estabilização econômica do Plano Real). A regra transitória deve ser vista em seu caráter protetivo, como é típico do Direito Previdenciário. O propósito do art. 3o. da Lei 9.876/1999 e seus parágrafos foi estabelecer regras de transição que garantissem que os Segurados não fossem atingidos de forma abrupta por regras mais rígidas de cálculo dos benefícios. Nesse passo, não se harmoniza com o Direito Previdenciário admitir que tendo o Segurado recolhido melhores contribuições antes de julho de 1994, tais pagamentos sejam simplesmente descartados no momento da concessão de seu benefício, sem analisar as consequências da medida na apuração do seu valor (do benefício), sob pena de infringência ao princípio da contrapartida. É certo que o sistema de Previdência Social é regido pelo princípio contributivo, decorrendo de tal princípio a consequência de haver, necessariamente, uma relação entre custeio e benefício, não se afigurando razoável que o Segurado realize contribuições e não possa se utilizar delas no cálculo de seu benefício. A concessão do benefício previdenciário deve ser regida pela regra da prevalência da condição mais vantajosa ou mais benéfica ao Segurado, nos termos da orientação do STF e do STJ. Assim, é direito do Segurado o recebimento de prestação previdenciária mais vantajosa dentre aquelas cujos requisitos cumpre, assegurando, consequentemente, a prevalência do critério de cálculo que lhe proporcione a maior renda mensal possível, a partir do histórico de suas contribuições. Desse modo, impõe-se reconhecer a possibilidade de aplicação da regra definitiva prevista no art. 29, I e II da Lei 8.213/1991, na apuração do salário de benefício, quando se revelar mais favorável do que a regra de transição contida no art. 3o. da Lei 9.876/1999, respeitados os prazos prescricionais e decadenciais. Afinal, por uma questão de racionalidade do sistema normativo, a regra de transição não pode ser mais gravosa do que a regra definitiva. Com base nessas considerações, sugere-se a fixação da seguinte tese: Aplica-se a regra definitiva prevista no art. 29, I e II da Lei 8.213/1991, na apuração do salário de benefício, quando mais favorável do que a regra de transição contida no art. 3o. da Lei 9.876/1999, aos Segurado que ingressaram no Regime Geral da Previdência Social até o dia anterior à publicação da Lei 9.876/1999. Recurso Especial do Segurado provido. 11 de dezembro de 2019 (Data do Julgamento). (Destacamos)

Verifica-se, assim, o que MUDOU FOI A INTERPRETAÇÃO ACERCA DA LEI, E NÃO O CONHECIMENTO OU DESCONHECIMENTO DA LEI, nos termos ao artigo 3º da Lindb.

 

Art. 3o. Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece. (Destacamos).

O Debate sobre a divergência de entendimento é tão controverso que chegou ao Supremo Tribunal Federal, no RE 1.276.977, reconhecida a Repercussão Geral, Tema 1102, de Relatoria do Ex-Ministro Marco Aurélio.

() que negava provimento ao recurso extraordinário e propunha a fixação da seguinte tese (tema 1.102 da repercussão geral): Na apuração do salário de benefício dos segurados que ingressaram no Regime Geral da Previdência Social até o dia anterior à publicação da Lei nº 9.876/1999 e implementaram os requisitos para aposentadoria na vigência do diploma, aplica-se a regra definitiva prevista no artigo 29, incisos I e II, da Lei nº 8.213/1991, quando mais favorável que a norma de transição. (Destacamos)

A divergência acirrada que ainda paira na Suprema Corte contou com a apertada votação de 5(cinco) votos contra os segurados e 6 (seis) votos a favor dos segurados, e que ainda não teve o trânsito em julgado, até o momento.

O que demonstra que não se trata de mero conhecimento da Lei e sim de interpretação da Lei que compete ao Poder Judiciário e não aos assegurados. Assim, deve ser observada as regras de transição ou efeitos de modulação da decisão o que não ocorreu no julgamento das Corte Superiores.

Portanto, diante do contexto em exame e pela alteração de orientação da jurisprudência do Tribunais e a fim de evitar prejuízo aos segurados que nenhuma gerencia dispõe sobre o tema controvertido deve ser afastada a regra do artigo 103 da Lei 8.213/91 e a consequente inaplicabilidade do prazo decadencial de 10 anos.

 

 

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Sobre o autor
Brener Castro de Paiva

Advogado, há mais de 10 anos, pelo Escritório de Advocacia Paiva & Rocha Consultoria jurídica.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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