Bloqueio de contas bancárias de investidores e vendedores de criptomoedas P2P, o que fazer?

22/08/2022 às 18:18
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No universo das criptomoedas, o Peer-to-peer (P2P) é um tipo de transação que ocorre diretamente entre os usuários, sem a intermediação de uma terceira parte. Neste tipo de negociação, o valor da criptomoeda é negociado diretamente entre as duas partes, por um acordo de vontades, algo um pouco diferente do processo que comumente é visto em corretoras de criptoativos (exchanges), que possuem um livro de ofertas. 

Realizado os detalhes da negociação, os prazos e forma de pagamento são definidos e, para tanto, é necessário o uso de uma conta bancária para o recebimento, momento onde se inicia uma terceira relação: a do negociante P2P com uma determinada instituição financeira.

Entretanto, existem casos de negociantes que exercem a P2P como atividade empresarial e que estão sendo surpreendidos pelo bloqueio de suas contas bancárias por conta das transações envolvendo criptomoedas.

Isso pode gerar uma situação de transtorno grave ao negociante, com o consequente prejuízo moral e financeiro.

Em situações flagrantemente irregulares praticadas pela instituição financeira, é necessário que o negociante tenha pleno conhecimento de seus direitos e saber como proceder.

Desta forma, elencamos alguns pontos cruciais para auxílio caso você, negociante e/ou investidor se encontre em uma situação como esta:

SUMÁRIO

  1. Por que a minha conta foi bloqueada?

  2. O banco pode bloquear a minha conta sem avisar?

  3. Tentei resolver diretamente com o banco e não tive solução. O que fazer?

​1. Por que a minha conta foi bloqueada?

O Brasil é um país que ainda não possui leis que regulamentem as criptomoedas de forma geral, e esta falta institucional traz certa insegurança jurídica em vários aspectos, dentre elas, transações que envolvam instituições financeiras. Sendo assim, bancos encerram contas de pessoas e empresas que estão envolvidas com criptoativos (ou moedas digitais) muitas vezes por desconhecimento deste mercado, alegando políticas de segurança.

É bem comum as instituições financeiras utilizarem como justificativa argumentos como:

  1. O contrato entre as partes (banco e negociador) prevê a possibilidade de rescisão unilateral por qualquer uma das partes, com o consequente bloqueio e encerramento da conta;

  2. Que o bloqueio da conta se deu por uma identificação de alguma transação suspeita.

De fato, a maioria dos contratos estipulados pelas instituições financeiras, guardam uma cláusula de possibilidade de bloqueio da conta quando identificada alguma situação de irregularidade.

Entretanto, neste momento que entra a importância de conhecer os seus direitos e de procurar um profissional qualificado em sua defesa: O banco deve cumprir alguns deveres dispostos na lei e no próprio contrato, independentemente do tipo de transação envolvida, se relacionado a moedas digitais ou não e, caso não cumpra, será responsabilizado.

Dentre os deveres da instituição financeira, está o de demonstrar o motivo que levou o bloqueio/encerramento da conta, principalmente com provas suficientes para tanto.

É importante ressaltar que, se trata de uma obrigação do Banco como prestadora de serviços, conforme o Código de Defesa do Consumidor e jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.

A Resolução nº 2025 do Banco Central prevê duas hipóteses para o encerramento unilateral de conta por iniciativa da instituição financeira: a) figurar ou ter figurado o titular da conta no Cadastro de Emitentes de Cheques sem Fundos (CCF); b) verificar irregularidades de natureza grave nas informações prestadas, comunicando, de imediato, o fato ao Banco Central (arts. 10 e 13).

Sendo assim, o banco prestador de serviços deve provar, de forma inequívoca, a situação irregular que levou ao bloqueio e/ou encerramento da conta, de acordo com o disposto na resolução do Banco Central, caso contrário, restará configurado ato ilícito, podendo ensejar restituição pecuniária e indenização por danos morais.

​2. O Banco pode bloquear a minha conta sem avisar?

Como já exposto, é bem comum encontrar em contratos bancários uma cláusula de rescisão unilateral. Isso quer dizer que, pode o banco, quando bem entender, desfazer o contrato com o cliente e encerrar a sua conta.

O ordenamento jurídico não obriga a instituição financeira a celebrar ou manter contrato de qualquer natureza, mas desde que esta rescisão seja realizada nos termos do contrato, lei e resoluções do Banco Central (BACEN).

Neste sentido, dispõe o art. 12 da Resolução 2.747/00 do Banco Central:

Art. 12. Cabe à instituição financeira esclarecer ao depositante acerca das condições exigidas para a rescisão do contrato de conta de depósitos à vista por iniciativa de qualquer das partes, devendo ser incluídas na ficha proposta as seguintes disposições mínimas: I- comunicação prévia, por escrito, da intenção de rescindir o contrato; II- prazo para adoção das providências relacionadas à rescisão do contrato [...]

Este artigo 12 faz com que as instituições financeiras já se antecipem e disponham em seus contratos, junto à cláusula de rescisão unilateral, um prazo para comunicação prévia do titular da conta sobre o encerramento, e para que o mesmo possa fazer a retirada de valores disponíveis em sua conta, se houver.

Caso a comunicação prévia não seja feita, ou este prazo não seja respeitado, caracteriza-se a atitude do Banco como parcial e abusiva, desrespeitando à lei, pois deixou de oportunizar ao titular da conta tempo para realocação de seus valores, prejudicando o seu patrimônio e honra.

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​3. Tentei resolver diretamente com o banco e não tive solução. O que fazer?

Caso não consiga solução de forma amistosa, em caso de ilegalidade, reúna todos os possíveis documentos que possam comprovar isso, e busque um advogado para adentrar com uma ação judicial solicitando o desbloqueio da conta, ou restituição dos valores, cumulado com uma indenização por danos morais, se for o caso. 

É preciso ter muita atenção em situações como esta, pois instituições financeiras constantemente praticam atos ilícitos, utilizando pretextos contratuais, e que estariam cumprindo sua política de gerenciamento de riscos, sendo que, na verdade, estão se apropriando indevidamente de valores destes investidores e devem ser responsabilizadas por isso.

Saiba dos seus direitos e sempre busque um advogado especializado para a melhor defesa destes.



Sobre o autor
Raphael Souza

Advogado especialista em crimes virtuais. Contatos: https://raphaelsouza.com.br/ | [email protected] |

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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