Prezados,

Muito boa tarde.

Relendo algus dispositivos do Código Penal deparei-me com uma dúvida. No caso do artigo 150, § 4º, III do diploma penal pátrio, poder-se-ia considerar veículos, quando utilizados no exercício de profissão ou atividade, como domicílio?

Imagine-se a seguinte situação hipotética:

1 - "A" é advogado e vale-se de seu automóvel para ir a uma audiência em outro município, logo utilizado-se o veículo no exercício de profissão e em razão dela;

2 - Durante o trajeto "A" é abordado por policiais rodiviários objetivando a realização de busca no veículo;

3 - É lícito a "A" opor-se à busca se ausente ordem judicial para tanto?

4 - Caso haja o ingresso forçado no veículo ou qualquer outra forma de coerção para a realização de tal busca, é possivel a responsabilização dos agentes pela invasão de domicílio?

Saliento que a jurisprudência resta silente quanto à temática, ao menos dentre os tribunais onde busquei tal informação.

Respostas

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    J

    jptn Sábado, 08 de novembro de 2008, 17h29min

    Na minha opinião e visão não é lícito o advogado opor-se à busca feita pela policia rodoviária federal alegando que seu veículo não pode ser revistado sem mandado judicial. Para tanto vejamos o conceito de domicilio para fazermos um juízo de valor acerca do tema proposto.

    Conceito

    "É a sede jurídica da pessoa onde ela se presume presente para efeitos de direito e onde exerce ou pratica, habitualmente, seus atos e negócios jurídicos" (Washington de Barros Monteiro). Para Orlando Gomes, "domicílio é o lugar onde a pessoa estabelece a sede principal de seus negócios (constitutio rerum et fortunarum), o ponto central das ocupações habituais". Em nosso Código Civil encontramos a indicação de qual seria, como regra geral, o domicílio da pessoa natural (note-se que o Código não fornece um conceito de domicílio):

    Art. 70. O domicílio da pessoa natural é o lugar onde ela estabelece a sua residência com ânimo definitivo.

    Cumpre ressaltar que domicílio e residência podem ou não coincidir. A residência representa o lugar no qual alguém habita com intenção de ali permanecer, mesmo que dele se ausente por algum tempo. Já o domicílio, como define Maria Helena Diniz, "é a sede jurídica da pessoa, onde ela se presume presente para efeitos de direito e onde exerce ou pratica habitualmente seus atos e negócios jurídicos". A chamada moradia ou habitação nada mais é do que o local onde o indivíduo permanece acidentalmente, por determinado lapso de tempo, sem o intuito de ficar (p. ex., quando alguém aluga uma casa para passar as férias).

    Estão presentes no conceito de domicílio dois elementos: um subjetivo e outro objetivo. O elemento objetivo é a caracterização externa do domicílio, isto é, a residência. O elemento subjetivo é aquele de ordem interna, representado pelo ânimo de ali permanecer. Logo, domicílio compreende a idéia de residência somada com a vontade de se estabelecer permanentemente num local determinado.

    Assim, não pode o veículo ser considerado domicilio, pois ali não se recebe citações e intamações ou notificações, contas, boletos, correspondências e afins. No veículo voce permanece somente durante o trajeto de origem para o destino, não ficamos o tempo todo dentro dele, não peticionamos dentro dele, não criamos dentro dele, etc.

    Veículo é para circular, para transportar, é uma ferramenta de trabalho não o local de trabalho.

    Com essas humildes e singelas argumentações é que não considero veículo como domicílio seja pra quem quer que fôr, advogado, engenheiro, médico etc.

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    C

    Carlos Rossi Sábado, 08 de novembro de 2008, 21h51min

    Na realidade o automóvel não é considerado "domicílio". Como bem salienta Luís Gustavo Grandinetti Castanho de Carvalho, quando diz que a pessoa que transita em via pública cede parcela de sua proteção constitucional, por conseguinte, não se pode aproveitar a proteção ao domicílio para os veículos de transporte público ou particular (Processo penal e constituição; princípios constitucionais do processo penal, 4.ed., Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2006, p. 86). "Em conseqüência, a proteção a quem transite em um automóvel deve ser a mesma de quem transita na rua, a pé, estando regulada pelo artigo 244, do Código de Processo Penal, que disciplina a busca pessoal", aduz o autor, que assim conclui: "é lícita a busca em automóveis quando houver fundada suspeita de seu uso no transporte de armas e de objetos que constituam corpo de delito, ou nos quais esteja sendo praticada alguma infração penal em estado de flagrância".
    Em sentido oposto, representando a corrente minoritária, Grandinetti Gustavo cita Alberto Binder (Introdução ao direito processual penal, Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2003, p. 139-41).
    É de se considerar, entretanto, a proteção do "domicílio" quando se tratar, por exemplo, de trailers ou de embarcações que sirvam como moradia. E até, eventual, mas improvavelmente, um caminhão (vide ressalvas acima).
    Assim sendo, pode, qualquer agente de força policial, estadual ou federal, ingressar no veículo, que certamente não goza da mesma proteção que a norma que garante a inviolabilidade do "domicílio". Casa (residência) é casa, automóvel é automóvel. É a velha máxima de quem pode mais, pode o menos. Se o policial pode ingressar no imóvel sem mandado judicial nas hipóteses previstas em lei, poderá igualmente fazê-lo no veículo automotor, considerando, ainda, principalmente, que a lei não confere ao proprietário ou detentor de veículo automotor a mesma proteção conferida ao titular do direito real sobre um bem imóvel. Veja bem, ocorrendo a fundada suspeita, o policial poderá ingressar no automóvel, mesmo sem a autorização do condutor, e revistar o seu interior. Tendo em vista que "fundadas suspeitas" é percepção subjetiva na visão do profissional de polícia, a abordagem condiciona-se aos requisitos de oportunidade e conveniência, não necessitando da autorização do proprietário ou detentor do veículo.
    O exemplo que você citou é totalmente incabível, já pensou o motorista de táxi?

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