Igor:
Uma única conduta supostamente ilícita pode gerar dois ou mais procedimentos punitivos disciplinados por regimes jurídicos distintos. Quando ainda não estava em vigor a nova Lei Federal 12.760/2012, cujo texto normativo alterou, dentre outros, o artigo 165 e 306 do Código de Trânsito Brasileiro, o resultado do teste do etilômetro - popularmente conhecido por "bafômetro" - igual ou superior a 0,3 miligramas de álcool por litro de ar alveolar expelido dos pulmões do condutor, conforme entendimento do STF, servia como prova material do crime previsto no artigo 306 do CTB, em pé de igualdade com o exame hematológico que constatasse a presença de 6 decigramas de álcool por litro de sangue. Todavia, como existia e ainda existe um princípio (norma) de índole constitucional que assevera o fato de que ninguém pode ser obrigado a produzir prova contra sim mesmo, o motorista que se negasse a fazer o teste do "bafômetro", como também se recusasse a fornecer material sanguíneo para análise, jamais seria forçado a tanto, restando impune na seara penal, uma vez que o processo não teria a prova necessária para condenar o réu. Portanto, no meu singelo entendimento, o policial que lhe prestou tal informação foi "camarada", eis que a ele cabia apenas o dever de lhe perguntar sobre a possibilidade de autorizar a realização do teste, não sendo sua atribuição legal prestar orientações jurídicas em casos concretos que ele próprio estivesse atuando (isso é serviço que incumbe ao seu advogado). A título de informação, o crime de embriaguez, comprovado definitivamente em juízo, gerava uma pena de detenção, de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.
Agora vou explicar a respeito da infração de trânsito e do seu respectivo procedimento administrativo. É um pouco mais complicado. Aliás, é bem mais complicado, porquanto uma infração de trânsito pode dar ensejo a mais de uma penalidade, e o que a torna diferente, principalmente, do crime, é o fato de que cada uma das penalidades é aplicada por meio de processos distintos e peculiares, regidos por resoluções do CONTRAN e, às vezes, por portarias do CONTRAN e dos DETRANs de cada Estado. Quanto a prova da infração de trânsito, por força do antigo parágrafo 2 do artigo 277 do CTB, era admissível, mesmo frente a recusa do condutor, que o agente de trânsito, por meio de outras provas em direito admitidas, considerando os notórios sinais de embriaguez, lavrasse o auto de infração, valendo como peça inicial para deflagrar os sobreditos processos administrativos punitivos. Em regra, o agente de trânsito (policial) elaborava um relatório acerca das mencionadas evidências e, solicitava a duas testemunhas, que haviam presenciado o condutor dirigindo embriagado, que assinassem o relatório junto com ele. Isso com base na Resolução CONTRAN 206/2006. Assim, mesmo frente a recusa do suposto condutor embriagado, ele poderia ser punido com as sanções administrativas que são: a multa e a suspensão da CNH por 12 meses.
Logo, são duas situações distintas: Uma você já escapou de ser penalizado, ou seja, a que é realizada por meio do processo penal (crime); a outra, referente ao processo administrativo (infração de trânsito), você já foi penalizado com o pagamento da multa de trânsito, significando que ou você não apresentou a defesa da autuação ou apresentou e a autoridade de trânsito não acatou sua defesa, aplicando a pena; Mas não é só isso, como você mesmo constatou, além da multa, foi iniciado o processo de suspensão da CNH, processo esse administrativo que ou está pendente ou você já perdeu o prazo para se defender e agora não tem mais jeito, vai ser suspensa a sua CNH, só existindo um caminho, mais difícil e demorado que é uma ação judicial de conhecimento.
Sugiro que você observe se a notificação recebida é a que lhe concede o prazo para se defender do processo ou a que lhe dá ciência da penalidade de suspensão aplicada. Se for a notificação para se defender, ainda há oportunidade processual de você não ser punido, devendo atacar não só o mérito (dizer que não estava embriagado e apresentar testemunhas), como também os vícios formais (não atendimento dos requisitos da Resolução CONTRAN 206/2006, como o não arrolamento de testemunhas que observaram em você os sinais da embriaguez). Para isso você deve requerer cópias do auto de infração e do RIASP também chamado de relatório de constatação de sinais de embriaguez. Se tiver condições procure um advogado especialista na área.
Um abraço, espero ter lhe ajudado.
Gustavo (Delegado de Polícia, Diretor de Ciretran e Professor Universitário).