Achei esta belíssima carta no Blog do Promotor.

Como ela serve a todos os que devem se pautar com probidade, lealdade, urbanidade e, acima de tudo, com ÉTICA reproduzo com a devida identificação.

Carta a um Jovem Promotor de Justiça

Caro Promotor: em resposta às indagações que me fizeste, segue o que penso a respeito.

Bem sabes que, dentre as relevantes funções que agora exerces, está a de acusar, tarefa das mais graves e difíceis, por certo. Pois bem, quando acusares – e tu o farás muitas vezes, pois o teu dever o exige – não esqueças nunca que sob o rótulo de “acusado”, “réu”, “criminoso” etc. há sempre um homem, nem pior nem melhor do que ti; lembra que nosso crime em relação aos criminosos consiste em tratá-los como patifes (Nietzsche). Evita incorrer nessa censura!

Acusa, pois, dignamente, justamente, humanamente!

Lembra que, entre os teus deveres, não está o de acusar implacavelmente, excessivamente, irresponsavelmente. Se seguires a Constituição, como é teu dever, e não simplesmente a tua vontade, atenta bem que a tua função maior reside na defesa da ordem jurídica e do regime democrático (CF, art. 127), e não da desordem jurídica, nem da tirania. E defendê-la significa, entre outras coisas, fazer a defesa intransigente dos direitos e garantias do acusado, inclusive; advogá-lo é guardar a própria Constituição, é defender a liberdade e o direito de todos, culpados e inocentes, criminosos e não criminosos.

Por isso, sempre que te convenceres da inocência do réu, não vacila em pugnar por sua pronta absolvição, ainda que tudo conspire contra isso; faz o mesmo sempre que a prova dos autos ensejar fundada dúvida sobre a culpa do acusado, pois, como sabes, é preferível absolver um culpado a condenar um inocente.

Ousa, portanto, defender as garantias do réu, ainda que te acusem de mau-acusador, ainda que isso te custe a ascensão na carreira ou a amizade de teus pares. Assim, sempre que o teu dever o reclamar, não hesita em impetrar habeas corpus, em recorrer em favor do condenado, em endossar as razões do réu, e jamais te aproveita da eventual deficiência técnica do teu (suposto) oponente: luta, antes, pela Justiça! Lembra, enfim, que és Promotor de Justiça, e não de injustiça!

E quando te persuadires da correção do caminho a trilhar, segue sempre a tua verdade, a tua consciência, não cede à pressão da imprensa, nem de estranhos, nem de teus pares; sê fiel a ti mesmo, pois quem é fiel a si mesmo não trai a ninguém (Shakespeare), porque não cria falsas expectativas nem ilusões.

Trata a todos com respeito, com urbanidade; sê altivo com os poderosos e compreensivo com os humildes; lembra que quem se faz subserviente e se arrasta como verme não pode reclamar de ser pisoteado (Kant).

Evita o espetáculo, pois não és artista de circo nem parte de uma peça teatral; sê sereno, sê discreto, sê prudente, pois não te é dado entregares a tais veleidades;

Estuda, e estuda permanentemente, pois não te é lícito o acomodamento; não esqueças que toda discussão tecnológica encobre uma discussão ideológica; lê, pois, e aplica as leis criticamente; não olvidas que teu compromisso fundamental é com o Direito e a Justiça e não só com a Lei;

Não te julgues melhor do que os advogados, servidores, policiais, juízes e partes, nem melhor do que teus pares;

Não colocas a tua carreira acima de teus deveres éticos nem constitucionais;

Vigia a ti mesmo, continuamente, mesmo porque onde houver uso de poder haverá sempre a possibilidade do abuso, para mais ou para menos; antes de denunciar o argueiro que se oculta sob olhos dos outros, atenta bem para a trave que te impede de te ver a ti mesmo e a teus erros; lembra que as convicções são talvez inimigas mais perigosas da verdade que as mentiras, e que a dependência patológica da sua óptica faz do convicto um fanático (Nietzsche);

Não te esqueças de que, por mais relevantes que sejam as tuas funções, és servidor público, nem mais, nem menos, por isso sê diligente, sê probo, sê forte, sê justo!

Por Paulo Queiroz, Procurador Regional da República – 1ª Região / Professor universitário (UniCEUB), Autor, entre outros, do livro Direito Penal, Parte Geral, Ed. Saraiva.

Respostas

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    pensador Quinta, 03 de março de 2011, 11h47min

    Parabéns.
    Assino embaixo.

    (se eu não soubesse que não fui eu quem escreveu, até acharia que poderia tê-lo escrito, tamanha a similaridade com o meu pensamento rsrs).

    Abraços Dr. Vanderley.

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    Adv. Nicolás Baldomá - RIO/RJ - - [email protected] Quinta, 03 de março de 2011, 11h53min

    Paulo Queiroz é sensacional. Recomendo a todos, mesmo os civilistas, a ler Do Carater Subsidiário do Direito Penal, de sua autoria.

    Pena o irmão não ter lido.

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    PAI, apenas... Quinta, 03 de março de 2011, 12h13min

    Caro Pensador ou Dr. Wanderley,

    Aproveito o ensejo para lhe perguntar, dado Douto advogado e brilhante Operador do Direito, qual sua tese em relação à seguinte afirmação: A Filosofia Aplicada no Cotidiano: Uma Visão sobre o Pensamento Platônico trazida aos Tempos Atuais, Sua Percepção pelo Homem e a Inflência no Direito Moderno, sendo esta minha teses de Iniciação Científica junto ao Curso de Direito em minha faculdade.

    Desde já, elevados votos de estima e consideração.

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    pensador Quinta, 03 de março de 2011, 13h12min

    Prezado Pai.
    Imagino que este deva ser o título do artigo que pretende escrever (apesar de no meu tempo nunca ter ouvido falar em tese de iniciação científica para bacharelado, nem mesmo artigos de iniciação científica. Com certeza o nome esteja equivocado, pois teses usualmente são para doutorados e dissertações para mestrado).

    Apenas com o título do artigo (ou tese, ou dissertação) fica difícil opinar. A contribuição direta do pensamento platônico ao direito (moderno ou antigo) é pequena, muitas vezes não constando das obras de filosofia do direito. Seu campo mais fértil relacionado ao direito seria no campo da ética.
    Apenas com Aristóteles, teremos uma filosofia grega diretamente relacionada ao direito (Ética a Nicômaco). Os temas recorrentemente estudados em Platão, são sua metafísica e a questão ética e política (para metafísica vide segunda navegação de Platão).
    Seria bom se já tivesse uma estrutura do artigo ou seu resumo para podermos ler, bem como indicação da bibliografia que irá utilizar.

    Saudações cordiais,

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    PAI, apenas... Quinta, 10 de março de 2011, 9h42min

    Grato, Dr. Assim que a mesma tiver um corpo mais definido, entrarei em contato. Com os mais altos votos de estima e consideração.

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