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Sistema penitenciário brasileiro: aspectos sociológicos

Sistema penitenciário brasileiro: aspectos sociológicos

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CONCEITO


Direito Penitenciário, Ciência Penitenciária e Penologia


O art. 24 da Constituição Federal Brasileira optou pela denominação de "Direito Penitenciário" eliminando outras denominações como "Direito da Execução Penal" ou "Direito Penal Executivo".

O Direito Penitenciário é o conjunto de normas jurídicas que disciplinam o tratamento dos sentenciados, é disciplina normativa. A construção sistemática do Direito Penitenciário deriva da unificação de normas do Direito Penal, Direito Processual Penal, Direito Administrativo, Direito do Trabalho e da contribuição das Ciências Criminológicas, sob os princípios de proteção do direito do preso, humanidade, legalidade, jurisdicionalidade da execução penal.

Já a Ciência Criminológica ou Penologia, é o estudo do fenômeno social, cuida do tratamento dos delinqüentes, e o estudo da personalidade dos mesmos, sendo uma ciência causal-explicativa inserindo-se entre as ciências humanas. O objeto da Ciência Criminológica antigamente, limitava-se ao estudo científico das penas privativas de liberdade e de sua execução, atualmente compreende ainda o estudo das medidas alternativas à prisão, à medidas de segurança, o tratamento reeducativo e a organização penitenciária.



HISTÓRICO DO DIREITO PENITENCIÁRIO E
A CONSEQÜENTE EVOLUÇÃO DA PENA DE PRISÃO

A Antigüidade


A antigüidade desconheceu totalmente a privação de liberdade, estritamente considerada sanção penal. Mesmo havendo o encarceramento de delinqüentes, este não tinha caráter de pena, e sim de preservar os réus até seu julgamento ou execução. Recorria-se à pena de morte, às penas corporais e às infamantes.

Durante vários séculos a prisão serviu de contenção nas civilizações mais antigas ( Egito, Pérsia, Babilônia, Grécia, etc. ), a sua finalidade era: lugar de custódia e tortura.

A primeira instituição penal na antigüidade, foi o Hospício de San Michel, em Roma, a qual era destinada primeiramente a encarcerar "meninos incorrigíveis", era denominada Casa de Correção.

Platão propunha o estabelecimento de três tipos de prisões: uma na praça do mercado, que servia de custódia; outra na cidade, que servia de correção, e uma terceira destinada ao suplício. A prisão, para Platão, apontava duas idéias: como pena e como custódia.

Os lugares onde se mantinham os acusados até a celebração do julgamento eram diversos, já que não existia ainda uma arquitetura penitenciária própria. Utilizavam-se calabouços, aposentos em ruínas ou insalubres de castelos, torres, conventos abandonados, palácios e outros edifícios.

O Direito era exercido através do Código de Hamurabi ou a Lei do Talião, que ditava: "olho por olho, dente por dente" tinha base religiosa (Judaísmo ou Mosaísmo) e moral vingativa.

A Idade Média


As sanções da Idade Média estavam submetidas ao arbítrio dos governantes, que as impunham em função do "status" social a que pertencia o réu. A amputação dos braços, a forca, a roda e a guilhotina constituem o espetáculo favorito das multidões deste período histórico.

Penas em que se promovia o espetáculo e a dor, como por exemplo a que o condenado era arrastado, seu ventre aberto, as entranhas arrancadas às pressas para que tivesse tempo de vê-las sendo lançadas ao fogo. Passaram a uma execução capital, a um novo tipo de mecanismo punitivo.

Com o Império Bizantino (aglomerado étnico de até 20 povos diferentes: civilização cristã, direito romano e cultura grega com influência helenística) fora criado o Corpus Juris Civilis, pelo imperador Justiniano, restabelecendo a ordem com suas obras: Código, Digesto, Institutas e Novelas

A Idade Moderna


Durante os séculos XVI e XVII a pobreza se abate e estende-se por toda a Europa.

E contribuíram para o aumento da criminalidade: os distúrbios religiosos, as guerras, as expedições militares, as devastações de países, a extensão dos núcleos urbanos, a crise das formas feudais e da economia agrícola, etc.

Ante tanta delinqüência, a pena de morte deixou de ser uma solução adequada. Na metade do século XVI iniciou-se um movimento de grande transcendência no desenvolvimento das penas privativas de liberdade, na criação e construção de prisões organizadas para a correção dos apenados.

A suposta finalidade das instituições consistia na reforma dos delinqüentes por meio do trabalho e da disciplina. Tinham objetivos relacionados com a prevenção geral, já que pretendia desestimular a outros da vadiagem e da ociosidade.

Antes das casas de correção propriamente ditas, surgem casas de trabalho na Inglaterra (1697) em Worcester e em Lublin (1707), ao passo que em fins do século XVII já haviam vinte e seis. Nessas casas, os prisioneiros estavam divididos em 4 classes: os explicitamente condenados ao confinamento solitário, os que cometeram faltas graves na prisão e a última aos bem conhecidos e velhos delinqüentes.

A mais antiga arquitetura carcerária em 1596, foi o modelo de Amsterdã RASPHUIS, para homens, que se destinava em princípio a mendigos e jovens malfeitores a penas leves e longas com trabalho obrigatório, vigilância contínua, exortações, leituras espirituais. Historicamente, liga teoria a uma transformação pedagógica e espiritual dos indivíduos por um exercício contínuo, e as técnicas penitenciárias imaginadas no fim do século XVII, deu direcionamento às atuais instituições punitivas.

Em 1597 e 1600, criaram-se também em Amsterdã a SPINHIS, para mulheres e uma seção especial para meninas adolescentes, respectivamente.

Já as raízes do Direito Penitenciário começaram a formar-se no Século XVIII, com os estudos de BECARIA e HOWARD. Durante muito tempo o condenado foi objeto da Execução Penal e só recentemente é que ocorreu o reconhecimento dos direitos da pessoa humana do condenado, ao surgir a relação de Direito Público entre o Estado e o condenado.

Realmente, o Direito Penitenciário resultou da proteção do condenado. Esses direitos se baseiam na exigência Ética de se respeitar a dignidade do homem como pessoa moral.

Os dois métodos aplicados no Direito Penitenciário são: método científico - é um dos elementos da planificação da política criminal, especialmente quanto ao diagnóstico do fenômeno criminal, a verificação do custo econômico-social, e a exata aplicação do programa. Já a estatística criminal é estudada pelo método estatístico, o qual destina-se a pesquisa da delinqüência como fenômeno massa. Estas estatísticas dividem-se em três ordens: policiais, judiciais e penitenciárias.

Somente no Século XX avultou a visão unitária dos problemas da Execução Penal, com base num processo de unificação orgânica, pelo qual normas de Direito Penal e normas de Direito Processual, atividade da administração e função jurisdicional obedeceram a uma profunda lei de adequação às exigências modernas da Execução Penal.

Todo esse processo de unificação foi dominado por dois princípios do Código Penal de 1930: a individualização da execução e o reconhecimento dos direitos subjetivos do condenado.

BECARIA e HOWARD deram causa a uma grande evolução da doutrina de Execução Penal, com a produção de longa série de tratados e revistas especializadas (DE BEAUMONT, TOCQUEVILLE, DUCPETIAUX, PESSINA, VIDAL e CUCHE).

Sucessivamente realizaram-se congressos sobre o assunto, os quais já assumiam caráter internacional, como o de Londres em 1872.

Dá-se a devida importância à criação da Comissão Penitenciária Internacional, que se transformou na Comissão Penal e Penitenciária (1929), que deu origem à elaboração das Regras Mínimas da ONU.

Após a 2ª Guerra Mundial, surgem em vários países a Lei de Execução Penal (LEP), como na Polônia, Argentina, França, Espanha, Brasil, e outros estados-membros da ONU.

No Brasil, com o advento do 1º Código Penal houve a individualização das penas. Mas somente à partir do 2º Código Penal, em 1890, aboliu-se a pena de morte e foi surgir o regime penitenciário de caráter correcional, com fins de ressocializar e reeducar o detento.

Com o reconhecimento da autonomia do Direito Penitenciário pela Constituição Brasileira (art. 24, I ), todas as Universidades terão de adotar o ensino do direito penitenciário. A reforma penal não se fará sem a renovação do ensino universitário das disciplinas relacionadas com o sistema penal.

Dentre os mais modernos estabelecimentos carcerários encontram-se: Walnut Street Jail, na Filadélfia (1829); Auburn, Nova York, em (1817); e o sistema da Pensylvânia, todos nos Estados Unidos da América. Consideram-se modernos pois instalam a disciplina, removem a tentação da fuga e reabilitam o ofensor. No sistema de Auburn, os prisioneiros dormem em celas separadas, mas trabalham, durante o dia, em conjunto com os demais prisioneiros. Este método de sistema está sendo implantado em todo os EUA. Já o sistema da Pensylvânia, o ofensor é isolado durante todo o período do confinamento.

Todos estes sistemas são baseados na premissa do isolamento, na substituição dos maus hábitos da preguiça e do crime, subordinando o preso ao silêncio e a penitência para que encontre-se apto ao retorno junto à sociedade, curado dos vícios e pronto a tornar-se responsável pelos seus atos, respeitando a ordem e a autoridade.

A Conferência Nacional Penitenciária ( National Prison Conference), realizada em Cincinnati, Ohio - EUA, em 1870, foi o primeiro sinal da reforma carcerária. Encorajados pelo recente estabelecimento da condicional, a conferência abordou em seu tema principal a prisão perpétua. Escolheu uma corte específica para os casos de prisão perpétua, a qual delimitará o tempo mínimo e máximo para todas os tipos de penas. É acreditável que este tipo de sentença dará ao ofensor maior incentivo à sua reabilitação, o que determinará uma satisfatória mudança nos cárceres atuais.

A detenção se tornou a forma essencial de castigo. O encarceramento passou a ser admitido sob todas as formas. Os trabalhos forçados eram uma forma de encarceramento, sendo seu local ao ar livre. A detenção, a reclusão, o encarceramento correcional não passaram, de certo modo, de nomenclatura diversa de um único e mesmo castigo.



DOS ESTABELECIMENTOS PENAIS


Os art. 82 a 86 da LEP - Lei de Execução Penal tratam das disposições gerais sobre o estabelecimento penitenciário. O art. 82 prevê diferentes tipos de estabelecimentos penais, os quais se destinam à execução da pena privativa de liberdade; à execução da medida de segurança; à custódia do preso provisório e aos cuidados do egresso. A LEP atendeu ao princípio da classificação penitenciária, que é prevista na Constituição Federal, art. 5º, inciso XLVIII.

O art. 83 prevê para o estabelecimento penitenciário, dependências com áreas de serviços para as atividades do tratamento reeducativo, sobrepondo-se às imposições de segurança.

Os estabelecimentos penais classificam-se segundo as diferentes fases do regime progressivo de cada detento:

1ª fase - prisão provisória;

2ª fase - condenado;

3ª fase - sujeito a medida de segurança;

4ª fase - liberdade condicional;

5ª fase - egresso.

E são assim distribuídos:

1 - Centro de Observação - o qual corresponde ao exame criminológico do condenado destinando-o ao regime de liberdade em que "melhor se enquadra" (art. 96 LEP);

2 - A Penitenciária - destina-se ao regime fechado (art. 87 LEP); Sob o enfoque de segurança, a penitenciária se define como estabelecimento de segurança máxima. Segundo C. Cálon, nas prisões de segurança máxima, as quais predomina a idéia de prevenção contra fuga, os edifícios são de forte e sólida construção, rodeados de alto muro, intransponível e dotados de torre, com guardas fortemente armados, bem como refletores para prevenção de fuga à noite.

3 - A Colônia Agrícola ou Industrial - regime semi-aberto;

4 - A Casa do Albergado - regime aberto;

5 - A Cadeia Pública - à custódia do preso provisório e cumprimento de pena de breve duração (art. 102 LEP). Este estabelecimento poderá contar com salas para o trabalhador social ou Sociólogo, para o Psicólogo e Psiquiatra, além de salas para o pessoal administrativo, advogados e autoridades.

6 - Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico - destina-se aos inimputáveis, e o condenado depende de substâncias químicas entorpecentes, causando dependência física e mental;

7 - Penitenciária para mulheres;

8 - Penitenciária para o Jovem adulto - destina-se ao menor de 21 anos, que poderá permanecer no estabelecimento por necessidade do tratamento reeducativo e problemas de personalidade. Está sujeito a regime aberto e semi-aberto.

As "orientações" do Ministério da Justiça prevêem para todo projeto de estabelecimento penal os seguintes locais:

a) instalações de administração, com salas para serviço jurídico, social, psicológico;

b) assistência religiosa e culto ( capela ecumênica e auditório);

c) escola e biblioteca;

d) prática de esporte e lazer;

e) oficinas de trabalho;

f) refeitório;

g) cozinha;

h) lavanderia;

i) enfermaria;

j) palratório;

k) visitas reservadas aos familiares;

l) cela individual.

A cela individual e a construção em horizontal da prisão constituem as duas idéias essenciais do estabelecimento penal moderno.



ALGUMAS CONSEQÜÊNCIAS DA
INEXISTÊNCIA DE ESTABELECIMENTOS PENAIS


  • Cadeias Públicas segregam presos a serem condenados e com condenações definitivas, em virtude da inexistência de vagas nas poucas penitenciárias em atividade;
  • A superlotação dos estabelecimentos penais em atividade, acarreta a violência sexual entre os presos, a presença de tóxico, a falta de higiene que ocasionam epidemias gastrointestinais, etc.;
  • Presos condenados a regime semi-aberto recolhem-se a Cadeia Pública para repouso noturno, gerando revolta entre os demais que não gozam de tal benefício, pela inexistência de um grande número de Colônias Agrícolas;
  • Doentes mentais, mantidos nas Cadeias, contribuem para o aumento da revolta dos presos, os quais têm de suportar a perturbação durante o dia e no repouso noturno, de tais doentes.
  • As condições em que se encontram os estabelecimentos penais em atividade (superlotação, falta de higiene, tóxico, violências sexuais) não fazem mais do que incentivarem o crime.


O PROBLEMA SEXUAL NAS PRISÕES


O estado em que vivem os detentos é calamitoso, de sorte que, muitas vezes a não obediência ao Código Penal, é a causa do surgimento da promiscuidade. O problema sexual nas prisões surge com a imaginação exacerbada, provocando então, a introspecção.

A abstinência sexual resulta em conseqüências graves no comportamento dos reclusos e a escassez da atividade sexual nas prisões é conseqüência direta das condições objetivas à forma da vida carcerária que não estimula a sua prática.

A privação das relações sexuais nos cárceres só pode acarretar conseqüências negativas diversas, propiciando a perversão da personalidade do indivíduo. Além disso, contribui para diversas práticas, tais como:

O Onanismo


É tido como um desvio para que se acalme o instinto sexual. Possui ainda, uma estreita vincularão com o homossexualismo ( oculta um homossexualismo inconsciente ). Serve como uma alternativa à repressão sexual.

O Homossexualismo


A homossexualidade é a preferência ou orientação pela filiação e atividade sexual com pessoas do mesmo sexo. Para modernos psiquiatras, a possibilidade da homossexualidade parece fazer parte da sexualidade humana como uma escolha ou opção ou até como estudos mais recentes nos comprovam, da possibilidade genética.

Mas não é este o enfoque que preocupa psicólogos, sociólogos e criminalistas do mundo inteiro; e quando o sexo é violento ou então forçado?

De caráter universal, o atentado violento ao pudor é uma prática comum nas prisões tendo como conseqüência circunstâncias desumanas e anormais da vida prisional e supressão da heterossexualidade.

O Stuprum Violentum ocorre quase sempre na presença de terceiros, e os reclusos mais jovens são as maiores vítimas. É claro que há a resistência, mas no final e sem saída o jovem acaba cedendo pelo temor que lhe é causado. Casos há em que o detento é "passado" por todas os demais detentos das celas. São casos deprimentes que, muitas vezes, se repete pelo consentimento dos próprios guardas, em troca de propinas.

O silêncio e o suicídio são os resultados, pois não é decente esquecer que as vítimas pouco se queixam de violência, para assim, evitar a desmoralização. E o suicídio nada mais é do que o medo e o desespero do recluso.

Emile DURKHEIM, defende em sua Teoria Sociológica dos Tipos de Suicídio (Sociological Theories of Suicide Types), já revista por outros teoristas, que: " é claro que o suicídio é o resultado da combinação de fatores severos, ou seja, sua origem é multicausal, englobando hoje, componentes sociais, psicológicos e biológicos". Para aprofundar-mos um pouco mais no assunto, abordaremos sobre a referida teoria de Durkheim, haja vista a sua influência nas concepções atuais:

Durkheim posicionou três primários tipos de suicídios: egoísta, altruísta, e o alienado. Esta tipologia, com diferentes causas de suicídio é produzida pelas circunstâncias de integração com a sociedade e suas maiores instituições.

O suicídio egoísta ocorre quando falta uma adequada integração do indivíduo com a sociedade. A pessoa não envolve-se na sociedade, cria suas próprias regras de conduta e age conforme seus próprios interesses.

Ao contrário, o suicídio altruísta resulta da excessiva integração com a sociedade e insuficiente individualização, sua personalidade é determinada pelo grupo social com o qual convive.

Já o terceiro e maior tipo de suicídio, o alienado, é quando ocorre a falta de regulamentos sociais ou normas sociais, pois os regulamentos sociais impõem um censo de equilíbrio e também limites. O que ocorre então é a falta de equilíbrio em algumas circunstâncias que o fazem levar ao suicídio.

A violência para o agredido, pode destruir sua auto imagem e auto estima, causando ainda problemas psíquicos e físicos, desajustes graves que impedem ou dificultam o retorno a uma vida sexual normal e a destruição da relação conjugal do recluso.

Na prisão, o homossexualismo pode ter duas origens distintas:

a) ser conseqüência de atos violentos;

b) resultar das relações consensuais; ocorrem sem que haja violência, consistindo apenas uma manifestação de adaptação ao ingresso na prisão.

Soluções para o problema sexual nas prisões:


Há o que chama-se de solução tradicional. São os exercícios físicos, o trabalho, o regime alimentar, a proibição de figuras, leituras e imagens, dentre outros. Tais soluções são até consideradas, podendo no máximo reduzir o problema.

Mas qualquer tentativa de sublimar a sexualidade, implicarão numa posição coativa, o que não se contará com o consentimento da sociedade. Como por exemplo:

- A utilização de Drogas: não produz nem moral nem juridicamente uma resposta satisfatória ao conflito sexual prisional. Utilizam-se sedativos, derivados humanos, anestesia sexual através de drogas, etc. Efetivamente tal atitude resolverá o problema sexual, pois desestimula o apetite sexual do indivíduo e não converterá em prática generalizada.

- Visita íntima: permite a entrada temporária na prisão dos cônjuges ou companheiras (os) dos detentos (as). Deve-se entender que seus respectivos cônjuges não deixam de estar à castidade forçada. Proibi-las do ato sexual é coagi-las psicologicamente ao caminho do adultério ou prostituição. Isso pode ocasionar filhos adulterinos. Para evitar tal desequilíbrio, tem-se uma solução viável: permissão para o ato amoroso. Por si só, a visita íntima é insuficiente. Mas pode converter-se numa adequada solução da sexualidade.

- Prisão aberta: grande alternativa para o problema sexual carcerário. Não só resolve, mas também permite a solução de graves inconvenientes que surgem numa prisão tradicional. Como maior defeito, tem-se o de beneficiar apenas a minoria.

- Prisão Mista: poder-se-á lembrar como uma das vítimas alternativas a uma solução adequada. Incertezas ainda são marcantes, mas não justificam o abandono total desta alternativa.



JUSTIÇA CRIMINAL ALTERNATIVA - ALTERNATIVAS PARA A PRISÃO


A prisão em si, é uma violência à sombra da lei. O problema da prisão tem sua raiz na estrutura econômica, política e social do país.

A legislação brasileira autoriza a aplicação de somente 03 tipos de penas alternativas: a prestação de serviços comunitários, a limitação de algum direito, e a reclusão no fim de semana. Porém, apenas 1.2% dos condenados brasileiros cumprem penas alternativas.

Na Inglaterra, o índice é de 50%. Nos EUA, 68% e na Alemanha, só 2% dos condenados estão na prisão, todos os outros cumprem penas alternativas.

O governo brasileiro está concluindo um projeto que amplia para 19 os tipos de penas alternativas, o que aumenta a possibilidade de sua aplicação para condenações de até 04 anos. O projeto resultaria na retirada de 44.000 presos das penitenciárias brasileiras.

O pretendido tratamento, a ressocialização, é incompatível ao encarceramento. O que se observa, em toda parte, é que a prisão exerce um efeito devastador sobre a personalidade, reforça valores negativos, cria e agrava distúrbios de conduta, é uma escola do crime.

O isolamento forçado, o controle total da pessoa do preso não podem constituir treinamento para a vida livre, posterior ao cárcere. Para tudo agravar, o estigma da prisão acompanha o egresso, dificultando seu retorno à vida social.

Congressos de especialistas, documentos internacionais de direitos humanos e vozes autorizadas de grupos, vem recomendando, incansavelmente, que se elimine, ou que se reduza drasticamente o aprisionamento de pessoas, substituindo-o por outros mecanismos, como a prisão provisória ou somente como medida de sanção.

Na 1ª Vara Criminal de Vila Velha - PR, o Juiz de Direito Dr. João Batista Herkenhoff, acolheu este clamor de ciência e humanidade reduzindo o aprisionamento de pessoas a casos extremos, de gravidade excepcional, já pensando em realizar uma pesquisa sócio-jurídica, com base em sua experiência.



AS REBELIÕES


As prisões são cenários de constantes violações dos direitos humanos e consequentemente dos direitos dos presos. São freqüentes o enfrentamento entre presos e carcereiros, assim como brigas de ajuste de contas entre os próprios presos.

O desespero dos presos acaba gerando conflitos, onde milhares deles amotinam-se para exigir melhores condições de vida em troca da liberdade de reféns.

Há um pequeno número de delegados da Polícia Federal com treinamentos feitos em grupos tarimbados no exterior, como Swat americana, a SAS inglesa ou a GSG9, da Alemanha. Em alguns estados como São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia, Paraná e Rio Grande do Sul, há grupos especializados, mas em geral, eles somente são chamados para dar palpite, nunca para comandar a cena.

As blitz ou "batidas" são realizadas periodicamente nas prisões com o intuito de retirar armas brancas, vulgarmente chamadas de "estoques" pelos presos.



CENSO PENITENCIÁRIO BRASILEIRO


A revista VEJA, publicada em 23 de outubro de 1996, apresenta em 1ª mão os resultados do censo penitenciário feito pelo Ministério da Justiça, sob a responsabilidade de Paulo Tonet Camargo, esclarecendo os principais problemas enfrentados pela atual realidade do sistema carcerário brasileiro: " são números horripilantes e vergonhosos, com dados estarrecedores. O senso mostra que os presos brasileiros são tratados feito animais" ressaltando que "a construção de penitenciárias, além do custo muito elevado, é um sistema comprovadamente ineficaz" e destaca:

- O país tem hoje 150.000 presos, 15% a mais do que em 1994, data em que fora realizada a última pesquisa;

- A massa carcerária cresce ao ritmo de um preso a cada trinta minutos;

- A AIDS prolifera entre os detentos com a rapidez de uma peste. Cerca de 10% a 20% dos presos estão contaminados. Um número tão assustador que o governo evita divulgá-lo para não provocar rebeliões;

- 48.4% dos seqüestradores presos estão no Rio de Janeiro - RJ;

- Os homens representam 95.5% da massa carcerária, e a maioria cumpre pena por assalto, furto ou tráfico de drogas.

- Hoje existem 50.000 - homens e mulheres - estão confinados irregularmente em celas de delegacias e cadeias públicas.

- Há outro tipo de prisão irregular no brasil, mas o censo não tabulou, são aquelas pessoas que já deveriam ser libertadas embora continuem presas.

Uma pesquisa realizada em 1964, demonstra-nos que 90% dos ex-detentos pesquisados procuram trabalho nos 02 primeiros meses, após a conquista da liberdade. Depois de encontrarem fechadas todas as portas, voltaram a praticar novos delitos. Estudos mostram que, em média, 70% daqueles que saem das cadeias, reincidem no crime.

A questão para mais este problema é: Para um ex-preso, sem documentos, com antepassado criminal, viciados em nada fazer, rejeitados pela sociedade, o que resta?



ESTATUTO JURÍDICO DO PRESO


O art. 41 da LEP enuncia os direitos do preso. Os direitos humanos do preso estão previstos em vários documentos internacionais e nas Constituições modernas. A Constituição Brasileira nada cita em seu contexto, somente o Código Penal, em seu art. 38 que reza:

Direitos do Preso


Art. 38. O preso conserva todos os direitos não atingidos pela perda da liberdade, impondo-se a todas as autoridades o respeito à sua integridade física e moral.

O preso não só tem deveres a cumprir, mas é sujeito de direitos, que devem ser reconhecidos e amparados pelo Estado. O recluso não está fora do direito, pois encontra-se numa relação jurídica em face do Estado, e exceto os direitos perdidos e limitados a sua condenação, sua condição jurídica é igual à das pessoas não condenadas. São direitos e deveres que derivam da sentença do condenado com relação a administração penitenciária.

  • Ao direito à vida, corresponde a obrigação da administração quanto à assistência material, à assistência à saúde, à assistência jurídica e religiosa (art. 41 LEP).
  • Quanto aos direitos civis, mantém o preso o direito de propriedade, o direito de família, dentro das limitações da prisão;
  • O preso tem direito de orientar a educação dos filhos, se a sentença não se referiu expressamente a esse direito;
  • A presa tem o direito de manter consigo o filho até a idade pré-escolar;
  • Relativamente, aos direitos sociais: direito à educação e ao trabalho remunerado, juntamente com os benefícios da seguridade social, descanso, pecúlio e recreação;
  • Direito à seguridade social, como direito adquirido, que não se suspende com o rompimento da relação de emprego no meio livre.
  • Direito ao tratamento reeducativo (é direito fundamental, do qual derivam os demais direitos);
  • Direito a cela individual (!);
  • Direito a alojamento com condições sanitárias;
  • Direito ao processo disciplinar, quando lhe for suposta infração disciplinar, não tipificada ou sem justificativa;
  • Direito à qualidade de vida;
  • Direito à progressão e afetação do regime apropriado, e ao estabelecimento que lhe for indicado pelo Centro de Observação;
  • Direito do egresso à assistência pós-penal, que decorre da obrigação do Estado de assistir moral e materialmente o recluso na sua volta ao meio livre.
  • Direito de propor ação judicial para defesa de seus direitos por intermédio de Defensoria Pública ou advogado constituído.

Numa visão global da situação carcerária brasileira, hoje destacam-se dois grupos com as principais violências contra o preso:

1. Violência quanto à ilegalidade da prisão, ou duração excessiva da pena;

2. Violência quanto à maneira de execução da prisão;

No 1º caso, enquadram-se as prisões absolutamente arbitrárias, praticadas pela polícia: falta de documentos, prisão para averiguações, prisões correcionais, por suposta vadiagem, e por batidas ou blitz policiais; prisões que ultrapassam o cumprimento da pena; prisões que se prolongam por simples falta de conveniência do advogado; etc.

No 2º caso, enquadram-se: superlotação das celas; falta de higiene e sanitários; ociosidade dos presos; castigos arbitrários; o estupro; os espancamentos, maus tratos, torturas; etc.

Contemplando uma análise sociológica-política da prisão, constatamos que: os pobres e/ou negros constituíam quase que absolutamente o quadro de detentos. Só a prisão política atingiu, no Brasil, as famílias de classe média e superior. Os presos políticos contribuíram para que os presos comuns adquirissem a consciência de seus direitos humanos e deram repercussão à denúncia da barbaridade do sistema carcerário, sobretudo através de greves de fome e de livros publicados após a reconquista da liberdade. Hoje, o censo carcerário demonstra que 54% dos presos são brancos, 27.5% mulatos e 18.5% negros.

DI GENNARO e VETERE diferenciam os direitos inerentes ao "status" de cidadão dos direitos do preso: os presos conservam o gozo dos direitos civis e sociais que lhes competiam como cidadãos antes da condenação, cujo exercício não se torne materialmente impossível pelo estado da prisão.



DO TRATAMENTO REEDUCATIVO


A educação tem por objetivo formar a pessoa humana do recluso, segundo sua própria vocação, para reinserí-lo na comunidade humana, no sentido de sua contribuição na realização do bem comum.

O tratamento reeducativo é uma educação tardia do recluso, que não a obteve na época oportuna. A esse direito corresponde a obrigação da assistência educativa, prevista no art. 17 da LEP.

O legislador não adotou o termo "Tratamento Penitenciário", preferindo a denominação "Assistência Penitenciária" que, segundo o art. 10 da LEP, tem por objetivo a reinserção social do preso e prevenção da reincidência. São instrumentos do tratamento penal:
 

1. Assistência;

2. Educação;

3. Trabalho;

4. Disciplina.

O tratamento reeducativo é o termo técnico usado no Direito Penitenciário, na Criminologia Clínica e na Legislação Positiva da ONU. Segundo a concepção científica, o condenado é a base do tratamento reeducativo e nele observa-se: sua personalidade, através de exames médico-biológico, psicológico, psiquiátrico; e um estudo social do caso, mediante uma visão interdisciplinar e com a aplicação dos métodos da Criminologia Clínica. É ponto de união entre o Direito Penal e a Criminologia.

Com efeito, o tratamento compreende um conjunto de medidas sociológicas, penais, educativas, psicológicas, e métodos científicos que são utilizados numa ação compreendida junto ao delinqüente, com o objetivo de tentar modelar a sua personalidade para preparar a sua reincersão social e prevenir a reincidência.

"Não haverá desenvolvimento na personalidade do delinqüente sem condições materiais, de saúde ou proteção de seus direitos, bem como instrução escolar e profissional e assistência religiosa."



AS REALIDADES DO SISTEMA:


  • Um em cada três presos está em situação irregular, ou seja, deveriam estar em presídios, mas encontram-se confinados em delegacias ou em cadeias públicas.
  • De 10% a 20% dos presos brasileiros podem estar contaminados com o vírus da AIDS.
  • A maioria dos presos cumprem penas de quatro a oito anos de reclusão, por crimes como: roubos, furtos, tráfico de drogas etc.
  • Para solucionar o problema da superlotação nos presídios, seria necessário construir 145 novos estabelecimentos, a um custo de 1.7 bilhões de Reais.
  • Os crimes mais comuns no Sul e Sudeste do Brasil são roubo e furto, enquanto que no Amazonas e no Acre o crime mais comum é o tráfico de drogas. Alagoas é o estado onde há mais presos por homicídio. Chegam ao número expressivo de 56,8% da massa carcerária.
  • Já no Nordeste e Centro-Oeste, a maioria das prisões ocorre por assassinato.
  • São Paulo é a cidade onde há maior número de presos por habitantes e também a pior situação carcerária: 174 presos para cada grupo de 100.000 habitantes.
  • Em Alagoas, por outro lado, há apenas 17 presos para cada 100.000 habitantes, os dados não são animadores, apenas refletem a impunidade que prevalece no estado. Mais da metade dos presos alagoanos são homicidas.
  • O estado do Rio Grande do Sul é que reúne as melhores condições carcerárias. Não há preso em situação irregular.
  • Hoje o número de detentos na Prisão Federal dos EUA é de 628.000, sendo que 90% possuem pena de no mínimo 08 anos. A população carcerária aumentou 7% desde 1988.
  • O governo da Suécia despende US$ 61.000 dólares/ano por preso.
  • O governo dos EUA destina US$ 25.000 a 30.000 dólares/ano para a manutenção da prisão e salário para o prisioneiro. Sendo que a prisão de Massachusetts, oeste da Virgínia, recebe algo próximo a US$ 140.000.
  • O governo do Brasil destina US$ 4.300,00 dólares/ano a cada preso. Cerca de 06 vezes menos que o americano.
  • O presídio de Cascavel/PR recebe R$ 0.14 mensais, para manutenção, alimentação, limpeza, e "salário" para o prisioneiro! Mesmo com este absurdo, os presos não se queixam da alimentação, e ainda ressaltam: "comemos melhor do que muita gente lá fora. Aqui tem carne todos os dias".
  • O referido presídio encontra-se em péssimas condições de administração, contando apenas com 01 funcionário público, o carcereiro. O restante dos ajudantes no cárcere, num total de 08 são presos considerados de "confiança".
  • É bem verdade que não podemos atribuir como causa da reincidência, somente o fracasso da prisão. Temos que levar em consideração a contribuição de outros fatores pessoais, políticos e sociais.
  • O direito à salvaguarda da dignidade, o direito ao respeito da pessoa humana, o direito à intimidade são os direitos mais agredidos na maior parte das prisões do mundo. Desde a admissão, começa o despojamento da personalidade do preso, algemas nos pulsos, revista no corpo nu, à vista de todos, a troca de traje pessoal e uso de chuveiros na presença de guardas, etc.
  • O direito à informação, já enunciado no art. 26 da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, é de vital importância para a ressocialização do detento, pois tanto humaniza o regime penitenciário, como concorre para o aprimoramento cultural do recluso. O direito à comunicação com o mundo exterior abre a prisão ao mundo livre e visa à desinstitucionalização da prisão. O condenado não pode perder o contato com a sociedade, para qual se prepara gradativamente.
  • A liberação sem o prévio preparo, como o tratamento reeducativo, e sem colaboração da sociedade na reinserção social do preso, é traumatizante e fator de delinqüência.
  • A importância do papel do advogado é bastante percebida pelos entrevistados, presos ou não-presos. Reconhecem que a sorte do processo depende, em grande parte, da atuação dos causídicos. Depositam grande esperança nas mãos do advogado e do juiz.
  • O Departamento Penitenciário Brasileiro vem realizando um programa nacional de formação e aperfeiçoamento do servidor, mediante convênios com os Estados, cursos de formação do pessoal penitenciário e de extensão universitária para diretores e pessoal de nível superior, juntamente com cursos de especialização e pós-graduação do pessoal do sistema penal em todo o território nacional.
  • O Ministério da Justiça, desde a sua primeira programação penitenciária, vem construindo estabelecimentos penitenciários em todas as unidades da Federação, de acordo com o Programa de Reformulação e Sistematização Penitenciária, que determina perspectivas inéditas à arquitetura carcerária nacional. O moderno estabelecimento deve permanecer ao nível da dimensão humana.

O criminologista Gresham Sykes, o qual é autor de "Sofrimentos no Cárcere", enumera que: o primeiro sofrimento do preso está na privação de liberdade; o segundo sofrimento é aquele no qual o preso está privado de todos os bons serviços que o "outro lado do mundo" oferece, o que poderia reeducá-lo naturalmente; o terceiro e maior sofrimento está na abstenção de relações heterossexuais; o quarto sofrimento é aquele em que o preso está submetido a regras institucionais designadas a controlar todo os seus movimentos; e o quinto e último sofrimento enumerado por Sykes é aquele causado pelo preso, ou seja, a cultura da prisão refletirá na cultura da sociedade, quando aquele levá-la consigo para fora do estabelecimento penal.



ANÁLISE DA REALIDADE SOCIOLÓGICA-JURÍDICA:


A prisão tem sido nos últimos séculos a esperança das estruturas formais do Direito em combater o processo da criminalidade. Ela constituía a espinha dorsal dos sistemas penais de feição clássica. É tão marcante a sua influência em todos os setores das reações criminais que passou a funcionar como centro de gravidade dos programas destinados a prevenir e a reprimir os atentados mais ou menos graves aos direitos da personalidade e aos interesses da comunidade e do Estado.

A prisão é o monoacordo que se propõe a executar a grande sinfonia do bem e do mal. Nascendo geralmente do grito de revolta das vítimas e testemunhas na flagrância da ofensa, ela é instrumento de castigo que se abate sobre o corpo do acusado e o incenso que procura envolver a sua alma caída desde o primeiro até o último dos purgatórios.

A recuperação social do condenado não seria um mito redivivo, assim como um estágio moderno de antigos projetos de redenção espiritual?

Somos herdeiros de um sistema que encontrou o seu apogeu no século das luzes quando o reconhecimento formal dos direitos naturais, inalienáveis e sagrados do Homem, impunha a abolição das penas cruéis. E a prisão não seria, portanto, uma pena cruel principalmente porque ela mantinha a vida que tão freqüentemente era o preço do resgate para o crime cometido.

Reconhecendo a imprestabilidade da pena capital para atender aos objetivos de prevenção e avaliando o sentimento popular, o legislador brasileiro viu na prisão uma forma de reação penal condizente com os estágios de desenvolvimento cultural e político do próprio sistema.

Na atualidade se promove em nosso país uma grande revisão em torno da eficácia das sanções penais de natureza institucional. Tal processo de abertura rompeu com a oposição funesta entre o Direito Penal e a Criminologia no concerto das demais ciências do homem, que o pensamento italiano fascista implantou a partir de 1910 e que se projetou para a América Latina.

A Comissão Parlamentar de Inquérito destinada a proceder o levantamento da situação penitenciária nacional, instituída na Câmara dos deputados em 1975, colheu um vasto material que caracteriza o retrato fiel do antagonismo marcante entre os ideais desenhados pela lei e as violências do cotidiano.

O relatório daquela investigação reconheceu que "grande parte da população carcerária está confinada em cadeias públicas, presídios, casas de detenção e estabelecimentos análogos, onde os prisioneiros de alta periculosidade convivem em celas superlotadas com criminosos ocasionais , de escassa ou nenhuma periculosidade e pacientes de imposição penal prévia ( presos provisórios ou aguardando julgamento) para quem é um mito, no caso, a presunção de inocência".

E mais incisivamente foi dito que em tais ambientes de estufa a ociosidade é a regra; a intimidade, inevitável e profunda. "A deteriorização do cárcere resultante da influência corruptora da subcultura criminal, o hábito da ociosidade, a alienação mental, a perda paulatina da aptidão para o trabalho, o comprometimento da saúde, são conseqüências desse tipo de confinamento promiscuo, já definido alhures como "sementeiras de reincidência", dados os seus efeitos criminógenos".

Torna-se urgente a necessidade de revisão da qualidade e quantidade das sanções, não apenas quanto aos mo mentos da cominação e da aplicação, em torno dos quais se levantou uma pirâmide monumental de teorias, mas também em referência à execução e seus incidentes que se acomodam nos códigos e arquivos mal cuidados dos cartórios.

A esperança (honesta ou simulada) de alcançar a "recuperação", "ressocialização", "readaptação", "reinserção" ou "reeducação social" e outras designações otimistas de igual gênero, penetrou formalmente em sistemas normativos com proclamações retóricas em modernas constituições, códigos penais e leis penitenciarias sem que a execução prática das medidas corresponda aos anseios de "recuperação" que não raramente se exaurem na literalidade dos textos. A ideologia da salvação do condenado tem sido incensada às alturas, mas também denunciada como um dos grandes mitos dos projetos de prevenção.

Nos dias presentes se questiona com bastante insistência sobre um importantíssimo ângulo do problema da pena-emenda. Tem o Estado do direito de oprimir a liberdade ética do preso, impondo-lhe autoritariamente uma concepção de vida e um estilo de comportamento através de um programa de "reeducação" que não seja condizente com a sua formação e convicções? A tentativa de "retificar" a personalidade não seria uma das formas de lavagem cerebral? O poder público pretende, às vezes, sob a capa da redução invadir esferas totalmente alheias à sua competência e usar as pessoas como meros objetos.

Uma das demonstrações evidentes de que o encarceramento, na forma como está sendo posto em prática, não tem condições de melhorar a situação pessoal do condenado, se deduz do próprio espírito que orientou a Reforma penal e penitenciária decorrente da lei Nº 6.416 de 24 de maio de 1977. A exposição de motivos da mensagem revelou a preocupação de "resolver o problema da superlotação das prisões".

A sobrecarga das populações carcerárias, como antagonismo diuturno aos ideais de classificação dos presidiários e individualização executiva da sanção, é uma denuncia freqüente na doutrina, nas comissões de inquérito parlamentar e nos relatórios oficiais.

A prisionalização é terapia de choque permanente, cuja natureza e extensão jamais poderiam autorizar a tese enfadonha de que constitui uma etapa para a liberdade, assim como se fosse possível sustentar o paradoxo de preparar alguém para disputar uma prova de corrida, amarrando-o a uma cama.

Relatando as suas memórias do cárcere, na intensidade dos maiores sofrimentos, Dostoiewiski escreveu que "o famoso sistema celular só atinge, estou disto convencido, um fim enganador, aparente. Suga a seiva vital do indivíduo, enfraquece-lhe a alma, amesquinha-o, aterroriza-o, e, no fim, apresenta-no-lo como modelo de correção, de arrependimento, uma múmia moralmente dissecada e semi-louca.

A degradação do sistema penitenciário a níveis intoleráveis vem sendo freqüentemente retratada com a opinião de que os presídios brasileiros são verdadeiros depósitos de pessoas e permanentes fatores criminológicos.

Já em 1973, na Moção de Goiânia, foi elaborado por penalistas de prestígio, um documento que afirma alguns princípios básicos para a prevenção da criminalidade. Destacam-se:

a) substituição do vigente sistema de penas;

b) melhores condições de dignidade para o tratamento dos presos;

c) o reconhecimento de que a pena privativa de liberdade tem se mostrado inadequada em relação aos seus fins, tanto sob o ângulo retributivo como sob os aspectos preventivos;

d) a necessidade de se reservar a prisão penal para os casos de maior gravidade;

e) a recomendação da efetiva aplicação do regime de prisão-aberta e outras medidas substitutivas da prisão.

Mas a decadência da instituição carcerária é somente a ponta do iceberg a mostrar a superfície da crise geral do sistema, para o qual convergem muitos outros fatores.

O espancamento dos princípios e das regras que empreitam significação à ciência pode brotar não somente dos profissionais que com ela trabalham na sua aplicação prática, como também de outras camadas populares, sejam ou não funcionários a serviço do processo, testemunhas ou partes. Perante o conceito popular o processo penal social de prevenção e repressão à violência e à criminalidade será objeto de satisfação ou repúdio em sua perspectiva total sem que a crítica faça distinções entre os ramos jurídico que formam a estrutura.

Teoricamente a NORMA JURÍDICA deveria provir do FATO SOCIAL, assim regulamentando-o. Entretanto àquela se afasta muito das necessidades sociais, não alcançando seus objetivos básicos, nem satisfazendo a contento as necessidades da sociedade.

A garantia penal processual da motivação da sentença é negada ostensivamente quando, além de carência formal, o ato de julgamento em si mesmo é viciado pela distância profunda, um abismo entre o magistrado e o réu, ou entre o magistrado e as testemunhas, posto que não se adota no processo criminal a regra da identidade física.

A crise aberta que corrói até o cerne o prestígio do antigamente chamado magistério punitivo não será evidentemente contornada através do recuso à legislação de impacto ou das promessa de um direito penal do terror. É necessário cumprir etapas prévias, a começar pela denúncia, apontando a falência dos procedimentos e mecanismos obsoletos quanto à forma e antagônicos à realidade, quanto ao fundo. A inflação legislativa criticada freqüentemente nos últimos anos é também responsável pelo descrédito da intimidação que poderia gerar o ordenamento positivo, principalmente porque o fenômeno abateu um poderoso dogma: o dogma da presunção do conhecimento da lei.

A marginalidade social envolvendo uma vasta gama de menores é um dos pontos nevrálgicos da questão a preocupar intensamente a moderna orientação da Política Criminal, que reconhece a necessidade de respostas interdiciplinares para a delinqüência juvenil em lugar de rebaixar o limite de idade para estabelecer a capacidade penal.

Finalmente, o sistema está em regime de insolvência, sem poder quitar as obrigações sociais e os compromissos assumidos individualmente. E para este debitum não remido contribuiu também o desinteresse em tratar com o necessário rigor cientifico as figuras do réu e da vítima, os protagonistas, enfim, do fenômeno criminal em toda a sua inteireza. Antes, durante e depois da intervenção punitiva do Estado.



ALCATRAZ - A TEMIDA PRISÃO


Alcatraz é uma ilha na Bahia de São Francisco - USA, local da mais famosa prisão que leva o seu mesmo nome. A ilha fora descoberta por Espanhóis em 1545, e nomeada em 1775 de "alcatraces" (pelicanos, em Espanhol).

Designada para reserva militar dos EUA, em 1850 foi fortificada e utilizada por prisioneiros militares durante a Guerra Civil. Oficialmente tornou-se prisão militar em 1907 e, em 1933 tornou-se prisão federal.

A prisão era considerada anti-fugas pois sua estrutura era realmente forte, rodeada de correntes marítimas frias e um sistema policial altamente qualificado. Mas o outro lado de Alcatraz, o mesmo que inspirou filmes como: "Assassinato em 1º Grau", mostra-nos atos desumanos, frios e cruéis, onde os castigos e torturas eram a lei daquele lugar.

Devido sua fama de ser intransponível, após o acontecimento de uma única fuga, fora fechada em 1963. Sua estrutura vazia fora confiscada por um grupo de indígenas em novembro de 1969.

Eles mantiveram-na até junho de 1971. Com o fracasso da reivindicação de obtê-la do governo norte-americano, a ilha fora aberta novamente em 1972 para o público e faz parte do Golden Gate Área de Recreação Nacional (GOLDEN GATE NATIONAL RECREATION AREA).



CONCLUSÃO


Como já dito, as prisões são cenário de constantes violações dos direitos humanos. Os principais problemas enfrentados são: a superlotação; a deterioração da infra-estrutura carcerária; a corrupção dos próprios policiais; a abstenção sexual e a homossexualidade; o suicídio; a presença de tóxico; a falta de apoio de autoridades governamentais; as rebeliões; a má administração carcerária; a falta de apoio de uma legislação digna dos direitos do preso-cidadão; a falta de segurança e pessoal capacitado para realizá-la, e a reincidência que é de vital importância para às vistas da sociedade; demonstram que o Brasil está torturando presos em penitenciárias, aniquilando qualquer possibilidade que venham a se recuperar, ao mesmo tempo que gasta dinheiro à toa. É preciso, urgentemente, mudar esse sistema cruel que forja mais criminosos.

O direito à educação e ao trabalho, que estão vinculados à formação e desenvolvimento da personalidade do recluso. São os direitos sociais de grande significação, pois o trabalho é considerado reeducativo e humanitário; colabora na formação da personalidade do recluso, ao criar-lhe hábito de autodomínio e disciplina social, e dá ao interno uma profissão a ser posta a serviço da comunidade livre. Na participação das atividades do trabalho o preso se aperfeiçoa e prepara-se para servir à comunidade. Porém, o nosso sistema penitenciário ainda mantém o trabalho como remuneração mínima ou sem remuneração, o que retira do trabalho sua função formativa ou pedagógica e o caracteriza como castigo ou trabalho escravo.

Prisão: violência ou solução?


A prisão é uma universidade do crime. O sujeito entra porque cometeu um pequeno furto e sai fazendo assalto a mão armada.

A violência não é um desvio da prisão: violenta é a própria prisão. Não é possível eliminar a violência das prisões, senão, eliminando as próprias prisões. Mas a supressão das prisões será somente possível numa sociedade igualitária, na qual o homem não seja opressor do próprio homem e onde um conjunto de medidas e pressuposto anime a convivência sadia e solidária entre as pessoas.

Se a prisão de indivíduos condenados pela Justiça é sempre uma violência, violência ainda maior é a prisão de quem ainda não foi julgado, é o encarceramento sob respaldo dos decretos de prisão preventiva.

Para diminuir a violência da prisão, a medida mais eficaz é a redução drástica do aprisionamento. A prisão em si é uma violência amparada pela lei. O desrespeito aos direitos do preso é uma violência contra a lei.

É visível a incompetência geral do sistema penitenciário que, além de não recuperar os detentos, agora os "devolve" à sociedade sem que haja um aprimoramento psicológico e sociológico suficiente para que o mesmo possa enfrentar uma nova realidade.

Não pode haver mais dúvidas de que o sistema penitenciário brasileiro rigorosamente está falido, além de inútil como solução para os problemas da criminalidade, nele há um desrespeito sistemático aos direitos humanos garantidos pela Constituição, inclusive aos condenados.

Diante das lamentáveis condições penitenciárias, o discurso que prega a reclusão como forma de ressocialização de criminosos, ultrapassa a raiz da hipocrisia tolerável.



BIBLIOGRAFIA


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6. PASTORE, Alfonso Pe. O Iníquo Sistema Carcerário, São Paulo, 1991, Edições Loiola.

7. REVISTA VEJA, 23 de Outubro de 1996, Paulo Tonet Camargo


Autor


Informações sobre o texto

Este trabalho é parte da tese apresentada pela autora como trabalho da disciplina Sociologia Jurídica

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MAGNABOSCO, Danielle. Sistema penitenciário brasileiro: aspectos sociológicos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 3, n. 27, 23 dez. 1998. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1010. Acesso em: 19 mar. 2024.