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Responsabilidade civil do advogado

Responsabilidade civil do advogado

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Sumário: Introdução. 1 Da responsabilidade civil. 1.1 Histórico da evolução da responsabilidade civil. 1.2 Conceito de responsabilidade civil.1.3 Pressupostos da responsabilidade civil. 1.3.1 Conduta (ação) . 1.3.1.1 Responsabilidade subjetiva e objetiva - considerações preliminares. 1.3.1.2 Responsabilidade subjetiva - culpa como fundamento da responsabilidade civil. 1.3.1.3 Responsabilidade objetiva - responsabilidade civil sem culpa.1.3.2 Dano. 1.3.2.1 Dano patrimonial. 1.3.2.2 Dano moral. 1.3.3 Nexo causal. 1.3.3.1 Excludentes do nexo causal. 1.4 Responsabilidade contratual (negocial) e extracontratual (extranegocial) . 1.5 Sentença criminal e responsabilidade civil. 1.5.1 Execução da sentença criminal condenatória. 1.5.2 Sentença criminal absolutória. 1.6 Responsabilidade civil no Código de Defesa do Consumidor. 1.6.1 Relação de consumo e responsabilidade civil. 1.6.2 Reparação de danos. 2 Do exercício da advocacia. 2.1 A atividade de advocacia. 2.2 Os direitos do advogado. 2.3 Os deveres do advogado. 2.4 A inscrição do bacharel junto à Ordem dos Advogados do Brasil. 2.5 A sociedade de advogados. 2.6 O advogado empregado. 2.7 Os honorários advocatícios. 2.8 As incompatibilidades e os impedimentos. 2.9 As infrações e as sanções disciplinares. 2.9.1 Infrações disciplinares puníveis com censura. 2.9.2 Infrações disciplinares puníveis com suspensão. 2.9.3 Infrações disciplinares puníveis com exclusão. 2.9.4 Reincidência. 2.9.5 Reabilitação. 2.9.6 Prescrição. 3 Da responsabilidade civil do advogado. 3.1 Introdução. 3.2 Natureza jurídica da responsabilidade civil do advogado e o dever de diligência. 3.3 Inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor e a não influência da inversão do ônus da prova contida em seu art. 6º, VIII. 3.4 Erro de fato, erro de direito, erro escusável e erro inescusável. 3.5 Desobediência às instruções do cliente. 3.6 Responsabilidade por conselhos e pareceres. 3.7 A não obrigatoriedade de sempre recorrer da decisão. 3.8 Ajuizamento de lide temerária. 3.9 Violação do sigilo profissional. 3.10 Imunidade judiciária e as ofensas irrogadas a outrem em juízo. 3.11 Responsabilidade pela execução de títulos de créditos emitidos para a retribuição dos serviços.3.12 Atuação na Justiça Criminal e a questão da prisão pelo não pagamento de dívida alimentícia pretérita. 3.13 Responsabilidade do advogado empregado e da sociedade de advogados. 3.14 Perda de uma chance. 3.14.1 A teoria da causalidade adequada. 3.14.2 A perda de uma chance e a teoria da causalidade adequada. 3.14.2.1 Demonstração judicial da perda de uma chance e do dano. 3.14.2.2 Demonstração judicial do nexo causal. 3.14.3 A posição doutrinária acerca da perda de uma chance no direito brasileiro. 3.14.4 A posição jurisprudencial acerca da perda de uma chance no direito brasileiro. 3.14.4.1 A perda de uma chance como modalidade de dano moral. 3.14.4.2 Mera possibilidade não é passível de indenização. 3.14.4.3 A quantificação do dano da perda da chance. 3.15 Perda de prazo. 3.16 Omissão de providências. 3.17 Falta de propositura de ação judicial. 3.18 Pedido não formulado. 3.19 Omissão na produção de prova necessária. 3.20 Extravio de autos. 3.21 Não conhecimento de recurso por falta de preparo. 3.22 A sistemática do agravo de instrumento, a interposição de recurso inadequado, o pedido de reconsideração e o protocolo integrado à luz da perda de uma chance. 3.23 Ausência de contra-razões ao recurso. 3.24 Ausência de sustentação oral ao recurso. 3.25 Não interposição de recursos de natureza extraordinária. 3.26 Execução impossível. 3.27 Ação rescisória não interposta. Considerações finais. Referências. Anexo - Jurisprudências


Introdução

O advogado exerce uma atividade essencial no âmbito judiciário, tanto que a própria Constituição Federal assim estabelece, referindo-se a este profissional como sendo indispensável à administração da justiça. E nada mais justo do que este reconhecimento, uma vez que incumbe ao profissional da advocacia zelar pelos direitos da sociedade e pelos direitos do cliente que o contrata para defender seus interesses particulares.

Todavia, o que se percebe é a transformação da advocacia em atividade mercantil, o que é expressamente vedado pelo Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil. Isto pode ser percebido se se observar os grandes escritórios de advocacia, que agrupam grande número de advogados que se associam, captando maior número de clientela, ajuizando milhares de ações e obtendo lucros exorbitantes, deixando de respeitar princípios basilares dessa atividade e até mesmo não dando a devida atenção a quem os contrata. Mas não só nos grandes escritórios é possível perceber a "comercialização" da atividade da advocacia, visto que a captação de clientela (geralmente em ações de interesses coletivos, onde há o litisconsórcio) ocorre com freqüência, desrespeitando as disposições da Lei nº 8.906/94 (Estatuto da Advocacia).

Mais do que o desrespeito ao seu próprio Estatuto, o que se tem visto é o desrespeito, por parte de muitos advogados, aos seus clientes. As condutas desonrosas desses profissionais são consubstanciadas em erros grosseiros, como perda de prazo para recurso, não ajuizar ação e deixar transcorrer o prazo prescricional, não tomar providências cabíveis e necessárias, extraviar autos ou retê-los por tempo indevido, entre outros. Enfim, o que parece estar ocorrendo é a valorização da quantidade e o esquecimento da qualidade. Lamentavelmente, captar clientes e receber honorários parece ser o objetivo da atividade, ficando em segundo plano as obrigações e o dever de diligência que todo advogado deve observar.

Talvez esta lamentável realidade seja conseqüência da falta de qualidade do ensino superior. Os métodos adotados para avaliar as instituições de ensino superior não se mostram suficientes e geralmente concedem títulos de qualidade a quem não os comporta, gerando uma ilusão de que o ensino caminha muito bem no Brasil, quando, na verdade, não é isso que se tem. Outro fator importante é a falta de investimentos e o descaso que o governo tem com a educação como um todo, o que acaba por afetar, logicamente, o ensino superior, pois quanto menos instruída for a população, menor será a cobrança de seus direitos.

Enfim, difícil é enumerar os problemas que conduzem à falta de qualidade dos profissionais da advocacia que estão adentrando o mercado de trabalho. E com tanto despreparo, a conseqüência lógica só pode ser a má atuação e a ocorrência dos mencionados erros grosseiros, sendo que esses últimos acabam por gerar danos aos que se utilizam dos serviços do advogado, ou seja, o cliente.

Este trabalho tem por escopo demonstrar as situações mais corriqueiras de erros do advogado no exercício de sua profissão, analisando a sua responsabilidade diante de sua falha, responsabilidade esta que pode ser, além da civil, que é o alvo deste estudo, administrativa e penal.

É preciso deixar claro que este trabalho não visa criticar a advocacia e os profissionais dessa área, mas antes mostrar os problemas no exercício dessa atividade e enaltecer o bom profissional, o qual acaba por ter a imagem muitas vezes prejudicada, assim com acontece com toda a classe de advogados, que fica mal vista perante a sociedade em razão da má atuação de certos colegas de profissão.

O objeto principal a ser analisado é a relação entre o advogado e o cliente e os danos que a atuação desse profissional, seja por conduta comissiva ou omissiva, pode proporcionar ao constituinte. Vale ressaltar que o foco deste estudo é o advogado individualmente considerado e não a sociedade de advogados, nem o advogado empregado, o advogado servidor público ou o advogado que presta assistência judiciária. A relação aqui estudada é a existente entre o advogado que é contratado para defender os direitos de uma pessoa e essa última, a qual passa a ser seu cliente. Mesmo que em alguns trechos do trabalho se comente ou analise alguns aspectos da responsabilidade do advogado empregado, da sociedade de advogados ou ainda de advogado servidor público, ressalta-se que estas formas de atuação não são o objeto em análise, mas, por se tratar de prestação de serviço advocatício, acaba por receber um pequeno tratamento, merecendo algumas considerações.

Feitas estas considerações preliminares, passa-se a apresentar os capítulos deste trabalho, comentando os assuntos abordados em cada um deles.

O primeiro capítulo tratará da responsabilidade civil. Nele será trazido, inicialmente, um breve histórico deste instituto do direito civil. Na seqüência, adentrar-se-á no estudo da responsabilidade civil e apresentar-se-á o seu conceito, o qual é de difícil determinação.

A partir de então, serão estudados os pressupostos da responsabilidade civil, dentre os quais está a ação ou conduta, analisando a responsabilidade subjetiva (fulcrada na idéia de culpa – regra) e a objetiva (que não considera a culpa para restar caracterizada a responsabilidade civil – exceção). Dano e nexo causal compõem os pressupostos necessários para se caracterizar a responsabilidade civil. As excludentes desse último também serão analisadas.

Num momento posterior, serão estudadas a responsabilidade contratual e a extracontratual. Será feita uma análise da eficácia da sentença criminal e sua relação com a responsabilidade civil. E, por último, será trazido ao trabalho um comentário sobre a responsabilidade civil no Código de Defesa do Consumidor, já que no terceiro e último capítulo será abordada a questão da responsabilidade civil do advogado e o referido diploma legal.

O segundo capítulo disporá acerca do exercício da advocacia, tendo como alicerce a Lei nº 8.906/94 (Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil). Assim, constarão no supracitado capítulo os direitos do advogado, os seus deveres (ou regras deontológicas), a forma de inscrição junto à Ordem dos Advogados do Brasil, comentários sobre a sociedade de advogados e o advogado empregado, noções sobre os honorários advocatícios, as incompatibilidades e os impedimentos ao exercício da advocacia e, por fim, serão listadas as punições administrativas que poderão ser aplicadas pela Ordem.

O terceiro capítulo merecerá maior destaque, uma vez que é nele que se encontrará o assunto alvo desse estudo, qual seja, a responsabilidade civil do advogado. No mesmo serão abordadas as situações que podem gerar responsabilidade civil para o advogado que atuar de maneira a produzir um dano ao cliente. Esse dano pode ser conseqüência de uma ação comissiva ou omissiva. Primeiramente serão examinados casos de responsabilidade por condutas comissivas. Num segundo momento, analisar-se-ão os casos em que a conduta omissiva é que irá produzir um dano, isto é, a abstenção de algo que deveria ter sido feito e que, não o sendo, produz um dano ao cliente.

Dentre os diversos aspectos a serem analisados, alguns apresentam importância destacadas. É o caso da não aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor à relação de consumo existente entre advogado e cliente, enaltecendo a idéia de ser necessária a culpa para a caracterização da responsabilidade civil desse profissional. Outro destaque é a teoria da perda de uma chance, para os casos em que o advogado responde pelo dano que causar em razão de deixar de fazer algo que deveria ter sido feito, perdendo, o cliente, a chance de ver um interesse seu ser defendido mediante todos os meios existentes, possíveis e legais. Essa teoria, por ser relativamente nova, ainda traz discussões sobre a forma correta de sua aplicação, o que se abordará no momento adequado.

Ao término do trabalho, serão anexadas algumas jurisprudências, que trarão julgados realizados acerca da matéria tratada, sobre diversos casos das hipóteses estudadas.

Visto estas preliminares a respeito do trabalho, ter-se-á início a análise da responsabilidade civil do advogado pelos danos que produzir ao seu cliente durante a relação estabelecida entre ambos. É o que se passa a estudar.


1 Da responsabilidade civil

Antes de se iniciar o estudo acerca da responsabilidade civil, faz-se necessário um retrocesso no tempo para trazer alguns aspectos deste instituto, podendo-se dizer que sua evolução se deu quanto ao seu histórico, seus fundamentos, sua área de incidência e sua profundidade.

É natural do ser humano reagir à ofensa que sofra de alguém. Assim já era em tempos remotos, no início da civilização humana, onde o homem vivia em grupos e a força pessoal imperava, sendo que o dano causado era ressarcido por uma ação coletiva baseada na força, na violência, pelo grupo em que o agente causador do dano convivia. Mesmo sem regras claras, pela própria inexistência do Estado, os homens, em seus primórdios, já buscavam a reparação de um dano.

Num momento seguinte, a forma de se reparar um dano sofrido evoluiu, passando, o homem, a utilizar-se da reação individual como meio de solucionar o mal sofrido, tendo como fundamento de sua retaliação a Lei de Talião, a qual pregava o "olho por olho, dente por dente", exprimindo, por meio dessa reação, uma forma de reparar um dano sofrido, sendo a responsabilidade objetiva, não dependendo da culpa. Era a reparação do mal pelo mal, sendo que o Estado apenas intervinha para definir o momento e a forma de retaliação da vítima. Neste ponto, esclarece Maria Helena Diniz, sobre a intervenção estatal nesta forma de reparação do mal sofrido:

Para coibir abusos, o poder público intervinha apenas para declarar quando e como a vítima poderia ter o direito de retaliação, produzindo na pessoa do lesante dano idêntico ao que experimentou. Na Lei das XII Tábuas, aparece significativa expressão desse critério na tábua VII, lei 11ª: ‘si membrun rupsit, ni cum eo pacit, tálio esto’ (se alguém fere a outrem, que sofra a pena de Talião, salvo se existiu acordo). A responsabilidade era objetiva, não dependia da culpa, apresentando-se apenas como uma reação do lesado contra a causa aparente do dano. [01]

O próximo estágio evolutivo da responsabilidade civil é o da composição, pois essa forma de reparar o dano era mais conveniente do que a vingança privada, visto que a solução baseada na Lei de Talião nada mais fazia do que produzir um novo dano. Por ocasião da fundação de Roma, no século XI a.C., na tentativa de afastar os efeitos negativos da vingança privada, Lúcio Aquílio propôs e obteve aprovação para que o Estado se sub-rogasse no lugar do lesionado, proibindo a vítima de fazer justiça com as próprias mãos. Essa norma passou a ser chamada de Lex Aquilia de damno e cristalizou a idéia de reparação pecuniária do dano, impondo ao patrimônio do lesante o ônus da reparação. Surge, neste momento, uma noção de culpa, com fundamento na responsabilidade extracontratual, criando uma forma pecuniária de indenização do prejuízo, com base numa espécie de tabela que estabelecia o quantum a ser indenizado. O grande problema é que esta norma não fazia distinção entre responsabilidade civil e penal.

A Lex Aquilia, do clássico direito romano da época de Justiniano, é apontada como a gênese da atual responsabilidade extracontratual, uma vez que de sua interpretação se extrai o princípio pelo qual se pune a culpa pelos danos provocados injustamente. Assim expõe Silvio de Salvo Venosa:

De qualquer forma, a Lex Aquilia é o divisor de águas da responsabilidade civil. Esse diploma, de uso restrito a princípio, atinge dimensão ampla na época de Justiniano, como remédio jurídico de caráter geral; como considera o ato ilícito uma figura autônoma, surge, desse modo, a moderna concepção da responsabilidade extracontratual. [02]

Por este motivo, utiliza-se, até os dias atuais, a expressão responsabilidade aquiliana como sinônimo de responsabilidade extracontratual.

Apenas na Idade Média, com a estruturação da idéia de culpa stricto sensu e do dolo e com a subseqüente elaboração dogmática da culpa, é que se diferenciou a responsabilidade civil da penal.

Mais adiante, o Direito Francês aprimorou as idéias românicas, por dominante influência do jurista francês Domat (Lois Civiles, Livro VIII, Seção II, artigo 1º). Foram estabelecidos princípios fundamentais para a responsabilidade civil, a qual passa a ter desenvoltura maior, principalmente quando se estabeleceu a teoria da responsabilidade civil, por obra da doutrina. Posteriormente, com a evolução do fundamento da responsabilidade civil, que passa a se embasar não só na noção de culpa, mas também no risco, as indenizações ampliam-se, visto não ser mais a culpa o único fundamento da responsabilidade, podendo o dano ser reparado sem que se cogite a existência daquela.

Todavia, a responsabilidade civil também evoluiu em relação ao fundamento (razão por que alguém deve ser obrigado a reparar um dano), baseando-se o dever de reparação não só na culpa, hipótese em que será subjetiva, como também no risco, em que passará a ser objetiva, ampliando-se a indenização de danos sem a existência de culpa. [03]

Com o passar dos anos, a culpa já não era motivo suficiente para gerar o dever de reparar os danos causados. Aliado a isso, a evolução da tecnologia, o aparecimento das indústrias e o desenvolvimento constante das mesmas, o número crescente de pessoas que passaram a se locomover e se transportar por meio de veículos automotores, enfim, com o desenvolvimento natural da sociedade, o número de acidentes, seja no trabalho, seja no trânsito, ou qualquer outro tipo de lesão ou dano, também aumentou, sendo necessário que as teorias e as formas de averiguação da responsabilidade fossem, conjuntamente, desenvolvidas pelos estudiosos, a fim de possibilitar a defesa das vítimas das novas e numerosas condutas lesivas da sociedade moderna. Com tantos riscos com os quais as pessoas passam a conviver nessa sociedade, a responsabilidade objetiva ganha muito espaço, afinal, todo dano deve ser ressarcido, pois muitos estão se beneficiando, principalmente sob o aspecto financeiro, do risco que assumem, e não se pode deixar aqueles que sofrem lesões aos seus direitos à mercê da possibilidade de se provar a culpa de quem assume o risco pela sua atuação. Entretanto, a culpa ainda é o âmago da responsabilidade civil, mas tem ao seu lado, como fundamento dessa, o risco, o qual também a fundamenta. É nesse sentido a lição de Maria Helena Diniz, quando preleciona que "é preciso deixar bem claro que a culpa continua sendo o fundamento da responsabilidade civil, que o risco não a anulou, constituindo-se, ao seu lado, também como fundamento da responsabilidade civil". [04]

Nos últimos tempos, a responsabilidade civil expandiu-se muito em sua área de incidência, ou seja, aumentou-se o número daqueles que podem ser responsabilizados, dos que podem ser beneficiados e os acontecimentos que ensejam a sua aplicação. Passa-se a consagrar a indenização não apenas por danos patrimoniais, mas também por danos morais, desvinculados de ofensa a interesses que possuam valor econômico.

Quanto à profundidade ou densidade, o princípio que rege a responsabilidade civil é o da responsabilidade patrimonial, isto é, pelos prejuízos provocados, responde, o ofensor, com o seu patrimônio, salvo casos em que a execução deva ser pessoal ou haja necessidade de intervenção de terceiro para o cumprimento da obrigação, sendo essas exceções encontradas com maior facilidade no campo das obrigações contratuais.

1.2 Conceito de responsabilidade civil

Grande é a dificuldade de definir responsabilidade civil, sendo encontrada diversas tentativas e posicionamentos na doutrina. Alguns autores, nesta tentativa, baseiam-se na idéia de culpa para conceituá-la. Outros preferem vê-la sob outro aspecto, mais amplo, além da culpabilidade, mas antes na idéia de repartição de prejuízos e de equilíbrio de direitos e interesses.

Assim, a responsabilidade civil possui duas vertentes, sendo elas a objetiva, onde predomina o risco criado por uma atividade ou conduta, e outra subjetiva, onde se sobressai a culpa, quando se cogita a existência de conduta ilícita.

Ressalvados outros entendimentos acerca da compreensão do que vem a ser responsabilidade civil, importante a definição trazida por Maria Helena Diniz:

[...] poder-se-á definir a responsabilidade civil como a aplicação de medidas que obriguem alguém a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros em razão de ato do próprio imputado, de pessoa por quem ele responde, ou de fato de coisa ou animal sob sua guarda (responsabilidade subjetiva), ou, ainda, de simples imposição legal (responsabilidade objetiva). [05]

1.3 Pressupostos da responsabilidade civil

Outro tema que traz diversos pensamentos é este relativo aos pressupostos necessários à configuração da responsabilidade civil, visto que os doutrinadores apontam diferentes pressupostos, criando uma grande divagação ante o assunto.

Trata-se, aqui, dos seguintes pressupostos tidos como necessários e essenciais para se caracterizar a responsabilidade civil. Primeiro, é preciso que haja uma conduta (ação), comissiva ou omissiva, a qual se apresenta como um ato lícito ou ilícito. Em segundo lugar, deve ocorrer um dano à vítima, seja ele moral ou patrimonial, provocado pela conduta do agente, seja ela comissiva ou omissiva. Por fim, entre a ação e o resultado danoso, deve estar presente um liame, sendo esse o fato gerador da responsabilidade, ou seja, o dano experimentado pela vítima deve ser conseqüência da atitude do ofensor. Essa ligação entre ação e dano é o nexo causal.

Há, na doutrina, quem defenda ser, a culpa, um dos pressupostos da responsabilidade civil, o que parece não se adequar ao atual estágio desse tema, visto que há responsabilidade sem culpa, pois fundamentar-se apenas nela é insuficiente para solucionar todos os danos.

1.3.1 Conduta (ação)

Segundo Maria Helena Diniz, ação é "o ato humano, comissivo ou omissivo, lícito ou ilícito, voluntário e objetivamente imputável, do próprio agente ou de terceiro, ou o fato de animal ou coisa inanimada, que cause dano a outrem, gerando o dever de satisfazer os direitos do lesado".

A conduta comissiva é a prática de determinado ato que não deveria ser realizado, ou que foi realizado de forma incorreta. Já a conduta omissiva é o desrespeito a um dever de agir, sendo que quando essa ação se faz necessária, ocorre uma abstenção.

A voluntariedade do ato diz respeito à possibilidade de ser passível de controle pela vontade do agente.

A ação ilícita que proporcionar um dano será fonte de responsabilidade fulcrada na culpa, ou seja, responsabilidade civil subjetiva. Já os danos causados por conduta lícita, terão responsabilidade fundada no risco, ou responsabilidade civil objetiva.

O que se passa a estudar na seqüência é o tipo de responsabilidade que a conduta pode gerar. Se ilícita, subjetiva, fundada na culpa. Se lícita, objetiva, fundada na teoria do risco, sendo os casos autorizados expressos em lei.

1.3.1.1 Responsabilidade subjetiva e objetiva - considerações preliminares

O termo responsabilidade, que traz a noção daquele que pode sofrer uma sanção por determinado ato ou fato ao qual esteja ligado ou tenha contribuído para seu acontecimento, pode denotar tanto a responsabilidade direta, ou seja, referente ao próprio causador do dano, quanto a indireta, quando recaia sobre terceira pessoa que, de alguma forma, encontra-se atrelada ao ofensor. A responsabilidade subjetiva é aquela decorrente do ato ilícito praticado, causador de dano, seja ele moral ou material, a alguém, seja pessoa física ou jurídica, gerando a obrigação de indenizar o prejuízo sofrido, buscando o restabelecimento do status quo ante.

O artigo 927 do Código Civil (CC) é o que exprime a idéia de responsabilidade civil extracontratual, fazendo menção ao ato ilícito, cuja definição encontra-se no artigo 186 do mesmo diploma. Ocorrido este ato e havendo um dano à esfera jurídica de outrem, nascerá a obrigação de indenizar por parte daquele que agira na produção da lesão. Os requisitos para que haja o dever de indenizar são a ação ou omissão voluntária, o nexo causal, o dano e a culpa.

A culpa é o elemento característico da responsabilidade subjetiva, a qual leva em consideração o modo de agir daquele que causa o dano a outrem, devendo ser demonstrada para haver a responsabilização do causador do dano. O que vem acontecendo é que o conceito de culpa está sofrendo uma elasticidade, para abranger muitas outras situações antes não abarcadas, não protegidas pela legislação. E mais, passou a ser até mesmo desconsiderada, a culpa, para se ver estabelecido o dever de indenizar, dando espaço a teoria do risco, "que sustenta ser o sujeito responsável por riscos ou perigos que sua atuação promove, ainda que coloque toda diligência para evitar o dano". [06]

Diante disso, vê-se que a teoria da responsabilidade civil ganha outro fundamento ao lado do ato ilícito, qual seja, o risco oriundo da atuação do causador do dano, independentemente de culpa, conforme se pode notar pelo que vem estabelecido no parágrafo único do artigo 927 do CC. A responsabilidade extracontratual está ultrapassando o limite de se embasar apenas na ocorrência de ato ilícito, buscando em outros fundamentos que danos deixem de ser reparados.

Assim, tem-se que a responsabilidade subjetiva ainda norteia a responsabilidade extracontratual, conforme a regra do mencionado artigo 927 do CC, ou seja, na apuração da existência do dever de indenizar, deve-se demonstrar a conduta imprudente, negligente ou imperita do causador do dano, ficando a responsabilidade objetiva, a qual não leva em consideração a culpa do agente para se caracterizar o dever de indenização, utilizada nos casos em que a lei expressamente autorizar, pois não havendo essa previsão, a responsabilidade pelo ato ilícito se verificará na forma subjetiva.

É o que se passa a analisar.

1.3.1.2 Responsabilidade subjetiva - culpa como fundamento da responsabilidade civil

Em nosso ordenamento jurídico, o dever de reparar o dano decorrente de prática de ato ilícito decorre da culpa do agente em seu comportamento. O ato ilícito qualifica-se pela culpa, pois o CC estabelece em seu artigo 186 que quem agir com imprudência ou negligência (culpa), causando dano a outrem, comete ato ilícito, ficando obrigado a repará-lo. O ilícito é fonte da obrigação de indenizar o prejuízo proporcionado à vítima.

Diante disso, tem-se que, havendo uma conduta, a qual desrespeita um dever ou um preceito legal, e disso ocorre um dano a outrem, nasce a responsabilidade do agente e conseqüente dever de indenizar. Esta responsabilidade pela prática de um ato ilícito funda-se na culpa, a chamada responsabilidade subjetiva. Tem, o lesado, o direito de pleitear o ressarcimento do prejuízo sofrido, cabendo ao agressor reparar o seu ato lesivo. Se mais de um agente que ocasionou o dano, todos são solidariamente responsáveis, podendo, a vítima, se voltar contra um ou todos eles em busca de indenização.

Para se caracterizar o ilícito, deve haver um descumprimento de uma norma jurídica preexistente que proteja interesses ou direitos e é necessário que o infrator tenha conhecimento da ilicitude de seu ato, assim agindo com dolo se tem a intenção de provocar um dano, ou com culpa se sabe dos prejuízos que seu ato pode gerar e mesmo assim prossegue em sua conduta, mesmo que sem a intenção de lesionar outrem. Deve-se analisar se o agente é imputável. Importante, também, é ter a noção de que culpa é diferente de ilicitude, pois essa considera a conduta do autor do dano em sua objetividade, se é ou não contrária ao ordenamento, enquanto aquela se atém aos aspectos subjetivos, referentes ao próprio agente.

A culpa em sentido amplo abrange tanto o dolo, que é a violação intencional de um dever jurídico, quanto a culpa em sentido estrito, que se caracteriza pela imprudência, negligência e a imperícia, sem qualquer intenção em violar um dever. O fato de não ter havido dolo na conduta e o resultado danoso ser fruto de culpa no sentido estrito não impede que seja responsabilizado pelo dano quem o provocou, mesmo que sem intenção. Entretanto, não haverá responsabilidade sem culpa, salvo os casos expressos de responsabilidade objetiva, contidos em lei.

A culpa aqui tratada é a stricto sensu e é assim descrita por Maria Helena Diniz:

[...] a culpa abrange a imperícia, a negligência e a imprudência. A imperícia é falta de habilidade ou aptidão para praticar certo ato; a negligência é a inobservância de normas que nos ordenam agir com atenção, capacidade, solicitude e discernimento; e a imprudência é precipitação ou o ato de proceder sem cautela. [07]

A culpa pode ser classificada em função da natureza do dever violado, quanto à sua graduação, relativamente aos modos de sua apreciação e quanto ao conteúdo da conduta culposa.

No primeiro caso, tem-se a culpa contratual, se o dever violado se fundar num contrato; e a culpa extracontratual, se o dever violado for um preceito geral de direito.

A segunda classificação distingue a culpa em grave, leve e levíssima. A conduta culposa grave, pelo forte aspecto grosseiro que apresenta, é próxima do dolo, incluindo, naquela, a culpa consciente, onde o agente assume o risco por um dano que sua atitude possa gerar, o qual ele acredita que não se realizará. A culpa leve é a infração de um dever de conduta que deveria ser do conhecimento e possível de ser observada pelo homem médio, sendo que uma atenção ordinária poderia evitar o dano. A culpa levíssima seria aquela resultante de uma conduta que somente os extremamente atentos e cuidadosos não infringiriam.

Relativamente aos modos de sua apreciação, tem-se a culpa in concreto, que analisa a imprudência, negligência ou imperícia do agente do caso em questão, concreto, acontecido; e também se apresenta a culpa in abstracto, quando há uma comparação da conduta do agente no caso concreto com a conduta que teria o homem médio.

Por fim, a doutrina classifica a culpa quanto ao conteúdo da conduta culposa. Aqui, apresenta-se a culpa in committendo ou in faciendo, quando o agente pratica conduta comissiva, ato positivo; e culpa in omittendo quando a conduta é omissiva, uma abstenção. Há a culpa in eligendo, que advém da má escolha daquele a quem se confia a prática de um ato ou o cumprimento de uma obrigação. A culpa in vigilando decorre da falta de atenção com o procedimento de outrem. A culpa in custodiendo é a falta de cautela ou atenção com animais ou objetos. Entretanto, algumas dessa culpas podem ser desconsideradas em casos em que a responsabilidade civil é objetiva e independe de culpa.

Um outro aspecto da culpa, na verdade, um elemento constitutivo dela, é a imputabilidade, que diz respeito às condições pessoais daquele que praticou um ato danoso, relativamente à sua consciência e vontade. É a possibilidade de atribuir um ato a alguém quando sua conduta se mostrar livre e consciente.

"Imputar é atribuir a alguém a responsabilidade por algum fato ou ato. Desse modo, a imputabilidade é pressuposto não só da culpa, mas da própria responsabilidade". [08] Pode, assim, haver imputação tanto quando se leve em consideração a culpa, quanto quando não a considere.

Para que haja imputabilidade é preciso, então, que aquele que cometa o ato lesivo tenha consciência (discernimento) e capacidade de autodeterminação.

Há situações, porém, em que a imputabilidade sofre exceções, não se podendo atribuir responsabilidade às pessoas que se encontram nas condições infra analisadas.

Os menores de 18 anos são inimputáveis, porém os atos lesivos que praticarem geram responsabilidade objetiva para quem tiver a incumbência de instruí-los, seja o pai ou o tutor, devendo reparar o prejuízo causado pelo menor, podendo reaver o que pagou se o menor não for seu descendente. Se o responsável legal pelo inimputável não tiver recursos para reparar o dano, poderá, excepcionalmente, o menor fazê-lo, desde que não fique privado do essencial para sua subsistência.

Os portadores de insanidade mental também são inimputáveis, não sendo responsáveis pelos atos lesivos que praticarem. Essa responsabilidade será de quem tiver a sua guarda, sendo uma responsabilidade objetiva, independente de culpa in vigilando, que, conforme dito, perde espaço para esse tipo de responsabilidade. Uma vez reparado o prejuízo, o representante do incapaz que o fez poderá reaver o que pagou. Há um caso excepcional em que a vítima poderá ficar sem reparação, quando o representante não puder assumir esse encargo por falta de recursos financeiros e o inimputável não puder fazê-lo sem que se prive do necessário à sua subsistência e daqueles que do mesmo dependam.

Quando houver anuência da vítima, sendo livre a vontade e a pessoa capaz, compreendendo os riscos a que se expõe, por ato de vontade interna ou optando por um de seus interesses em detrimento de outro, não haverá ilicitude na conduta lesiva e nem dever de indenizar. Essa anuência pode ser direta, quando não resta dúvida que optou em sacrificar um bem seu, concordando expressamente com o ato de outrem; ou indireta, quando se aceita os riscos normais de uma atividade.

No exercício normal de um direito, havendo prejuízo a outrem, não haverá imputabilidade a quem o provocou e nem responsabilidade, visto estar agindo dentro de um direito seu que é reconhecido, sendo sua conduta lícita. Só haverá responsabilidade se houver abuso de direito ou exercício irregular do mesmo.

No que tange à legítima defesa, a qual é tida como excludente da imputabilidade, tem-se que o autor de ato lesivo, que o faça em legítima defesa, não tem responsabilidade pelo prejuízo provocado, pois a agressão do lesado é injusta, não fazendo ele jus à indenização. Porém, se em sua defesa ou na defesa de outrem o agente provoca dano a um estranho a essa relação, deverá indenizá-lo, podendo reaver o que pagou junto aquele que foi a vítima, no caso de estar defendo outra pessoa que não a si mesmo.

Quando a ofensa a um direito alheio decorre de ato praticado em estado de necessidade, em regra, estará excluída a responsabilidade. Porém, é preciso delinear o que vem a ser estado de necessidade, que consiste no ato realizado para remover perigo iminente, sendo extremamente necessário que assim se proceda, desde que não se exceda os limites do indispensável para que o perigo seja afastado. Geralmente o perigo resulta de acontecimento fortuito, criado por outra pessoa que não o causador do dano ou até mesmo um acontecimento natural (caso fortuito ou força maior). A conduta de quem produz o dano não é ilícita, porém não afasta o dever de indenizar, salvo se o prejudicado tiver provocado a situação de perigo que gerou o estado de necessidade (culpa exclusiva da vítima). Elucidativo é o exemplo de Maria Helena Diniz:

Se A, dirigindo cautelosamente seu carro, para não ferir B, que atravessa a rua distraidamente, lança seu veículo sobre o carro de C, estacionado regularmente. Como C não agiu culposamente, deverá ser indenizado. Logo, sendo B o culpado, A, após pagar o prejuízo sofrido pelo dono do veículo estacionado, poderá reembolsar-se do que pagou junto a B (CC, art. 930). Se o proprietário do carro abalroado o tivesse estacionado em local proibido, sua culpa teria o condão de excluir o direito à reparação junto ao autor do dano. [09]

1.3.1.3 Responsabilidade objetiva - responsabilidade civil sem culpa

Além dos casos de responsabilidade por ato ilícito, embasada na culpa do agente (responsabilidade subjetiva), que viola direitos e deveres contratuais e extracontratuais, vislumbra-se a responsabilidade objetiva, independente de culpa e de conduta ilícita, respondendo, o autor do dano, por ato lícito que pratique, em função de se considerar o risco assumido pelo agente como fato gerador da obrigação de reparar o dano, visando não ficar a vítima prejudica em certas situações onde a culpa não se faz presente na conduta lesiva. É o que dispõe o parágrafo único do artigo 927 do CC, que consagra essa espécie de responsabilidade e conseqüente dever de reparar o dano. Nesse ponto, esclarece Maria Helena Diniz:

Como em certos casos a teoria da culpa, que funda a responsabilidade civil na culpa, caracterizada como uma violação de um dever contratual ou extracontratual, não oferece solução satisfatória, devido, p. ex., aos progressos técnicos, que trouxeram um grande aumento de acidentes, a corrente objetivista desvinculou o dever de reparação do dano da idéia de culpa, baseando-se na atividade lícita ou no risco com o intuito de permitir ao lesado, ante a dificuldade de prova da culpa, a obtenção de meios para reparar os danos experimentados. [10]

Desta forma, nos casos estabelecidos no ordenamento jurídico, o agente responderá pelos danos que proporcionar a outrem mesmo sem culpa, pois o simples fato de o ato que realiza gerar prejuízo é justificativa do dever de indenizar, sendo a responsabilidade imposta por lei e não decorrente de ação culposa, não se cogitando a imputabilidade da conduta.

A responsabilidade objetiva é embasada em um princípio de eqüidade, segundo o qual aquele que lucra com uma situação deve responder pelo risco ou pelas desvantagens dela resultantes, que já os romanos consagravam como ubi emolumentum,ibi onus; ubi commoda, ibi incommoda. O que se leva em conta é a potencialidade do dano existente na atividade exercida.

Logo, todo aquele que desenvolve atividade lícita que possa gerar perigo para outrem deverá responder pelo risco, exonerando-se o lesado da prova da culpa do lesante. A vítima deverá apenas provar o nexo causal, não se admitindo qualquer escusa subjetiva do imputado. [11]

No direito brasileiro, a responsabilidade fundada na teoria do risco, decorre, por exemplo, de acidentes de trabalho; acidentes resultantes do exercício de atividades perigosas; furto de valores praticado por empregados de hotéis contra hóspedes; atuação culposa de preposto ou serviçal, no exercício de seu trabalho; queda de coisas de uma casa ou seu lançamento em lugar indevido; pagamento de cheque falsificado por banco; comportamentos administrativos prejudiciais a direito de particular; atos praticados no exercício de certos direitos.

1.3.2 Dano

"Dano consiste no prejuízo sofrido pelo agente". [12] Ou, de forma um pouco mais detalhada, tem-se que "dano pode ser definido como a lesão (diminuição ou destruição) que, devido a um certo evento, sofre uma pessoa, contra sua vontade, em qualquer bem ou interesse jurídico, patrimonial ou moral". [13] Esse é mais um pressuposto da responsabilidade civil, contratual ou extracontratual, visto que se não ocorrer prejuízo não se cogita direito à indenização. Só há responsabilidade civil se houver dano, pois uma vez caracterizada a responsabilidade de alguém, resulta o dever de indenizar, mas tanto para aquela quanto para esse existirem, é preciso que a conduta do imputado tenha lesionado direito alheio, devendo ser demonstrada essa lesão para que se repare o prejuízo.

Há casos, principalmente na responsabilidade contratual, que o dano é presumido, não sendo necessário o lesado provar que o tenha sofrido, pois a lei presume sua existência.

A doutrina apresenta alguns requisitos imprescindíveis, os quais devem estar presentes para que haja dano indenizável, como a diminuição ou destruição de um bem jurídico, patrimonial ou moral, pertencente a uma pessoa; a efetividade ou certeza do dano; a causalidade; subsistência do dano no momento da reclamação do lesado; legitimidade; ausência de causas excludentes de responsabilidade. Passa-se a analisar, sucintamente, cada um desses requisitos.

A diminuição ou destruição de um bem jurídico deve acontecer, independentemente se a lesão atinge bens econômicos ou não, pois a noção de dano pressupõe que exista um lesado, não havendo dano sem que um bem juridicamente protegido, seja ele qual for, sofra alterações prejudiciais.

O dano não pode ser hipotético, possível de acontecer, deve ser real, concreto, efetivo, pois a sua demonstração é necessária para que seja possível indenizá-lo, salvo casos de dano presumido, onde não é preciso comprová-lo. A certeza é referente à sua existência e não ao seu montante ou atualidade. Há que se ressaltar que o dano pode ser atual ou futuro, desde que nesse caso seja uma conseqüência necessária e certa do ato lesivo.

Deverá haver causalidade entre o dano e a conduta do lesante. O dano poderá ser direto, se resultar imediatamente da ação, resultante do ato lesivo. E poderá ser indireto, quando resultar do prejuízo diretamente produzido, agravando-o, sendo uma causa superveniente, chamado de dano reflexo.

O dano deve subsistir no momento em que a vítima o reclama, pois se já tiver sido reparado não há prejuízo para se reclamar, salvo se a própria vítima o reparou, subsistindo o prejuízo, devendo o agente ressarci-la. O mesmo se diga quando um terceiro reparou o dano, ficando sub-rogado no direito da vítima.

Quem reclama o prejuízo deve ser titular do direito lesado, ou seja, deve ter legitimidade para pleiteá-lo.

Existem danos que não geram o dever de indenizar, pois não se pode atribuir responsabilidade ao causador do dano em certas circunstâncias. Assim, não pode existir alguma das excludentes de responsabilidade para que seja possível cobrar a reparação do mal sofrido.

1.3.2.1 Dano patrimonial

Para se obter uma definição do que é o dano patrimonial, é preciso, antes, compreender o significado do termo patrimônio, o qual pode ser entendido como a universalidade jurídica constituída pelos bens de uma pessoa, ou ainda, a totalidade de bens que tenham valor econômico e se encontrem sob o poder de disposição de uma pessoa.

Após esse sucinto entendimento sobre patrimônio, tem-se que "o dano patrimonial vem a ser a lesão concreta, que afeta um interesse relativo ao patrimônio da vítima, consistente na perda ou deterioração, total ou parcial, dos bens materiais que lhe pertencem, sendo suscetível de avaliação pecuniária e de indenização pelo responsável". [14]

O dano patrimonial mede-se pela diferença entre o valor atual do patrimônio e o valor que o mesmo teria atualmente se não tivesse ocorrido o dano. Entretanto, se for possível o restabelecimento do status quo ante através de uma reconstituição natural, não será necessário calcular o valor do prejuízo, visto que há uma restituição natural do bem lesado. Assim, o dano patrimonial pode ser reparado de duas formas: ou pela reparação natural, por exemplo, a entrega da própria coisa ou de outra de mesma espécie; ou pela indenização pecuniária.

Dentre os vários ensinamentos apresentados pela doutrina ao dano patrimonial, serão abordados apenas o dano emergente e o lucro cessante, visto não ser o escopo deste trabalho o estudo específico sobre esta espécie de dano.

Dano emergente, ou positivo, é o prejuízo real, concreto, efetivo, experimentado pela vítima, ocorrendo diminuição de seu patrimônio, tanto pela redução de seu ativo quanto pelo aumento de seu passivo, incluídos, além da própria deterioração do bem, os valores gastos pelo dono do patrimônio lesado em função do dano sofrido. Vale lembrar que danos eventuais ou potenciais não são passíveis de indenizações, salvo se forem conseqüência inevitável, certa, decorrente da ação lesiva. Aqui, o condenado à indenização pode restaurar o bem danificado ou pagar o valor das obras necessárias à reparação do dano, sendo essas as duas formas de se proceder à indenização em caso de danos emergentes.

O lucro cessante, ou dano negativo ou frustrado, é a privação do lesado de obter um ganho, o lucro que ele deixa de perceber em função da conduta lesiva de outrem. Não é suficiente, para que se caracterize a hipótese de lucro cessante, a mera possibilidade, mesmo que a certeza absoluta não seja exigida. Porém, deve haver uma probabilidade objetiva de que aquele ganho seria obtido caso não houvesse a conduta danosa. É preciso diferenciar a possibilidade da probabilidade para se cogitar a existência do lucro cessante. Uma vez caracterizado o lucro cessante, tem-se a necessidade de vislumbrar a proporção do prejuízo para se determinar o quantum a ser indenizado. O lucro cessante refere-se a perda de uma chance, isto é, indeniza-se a vítima não pelo que ela perdeu, mas sim pela sua expectativa de obter um ganho que é frustrada por causa do ato lesivo, devendo o dano ser avaliado conforme o maior ou menor de grau de probabilidade de se tornar certo.

Quando vem à baila o conceito de chance, estamos em face de situações nas quais há um processo que propicia uma oportunidade de ganhos a uma pessoa no futuro. Na perda de uma chance ocorre a frustração na percepção desses ganhos. A indenização deverá fazer uma projeção dessas perdas, desde o momento do fato jurídico que lhe deu causa até um determinado tempo final, que pode ser uma certa idade para a vítima, um certo fato ou uma a data da morte. Nessas hipóteses, a perda da oportunidade constitui efetiva perda patrimonial e não mera expectativa. [15]

1.3.2.2 Dano moral

"O dano moral vem a ser a lesão de interesses não patrimoniais de pessoa física ou jurídica (CC, art. 52; Súmula 227 do STJ), provocada pelo fato lesivo". [16]

O dano moral não é a dor, a angústia, a humilhação, ou qualquer outro sentimento similar, visto que eles são conseqüências do dano experimentado. O direito não repara os sentimentos, mas sim a privação a um bem jurídico que a vítima tinha direito, sendo este reconhecido juridicamente, como o direito à vida, à saúde, à integridade física, à dignidade da pessoa humana, à liberdade, entre tantos outros. O que se pede mediante indenização pecuniária, ocorrendo dano moral, não é a equivalência em dinheiro à dor sofrida, pois aquela indenização é apenas um meio de atenuar, em parte, as conseqüências do prejuízo experimentado.

Assim como o dano patrimonial, o dano moral comporta estudos mais aprofundados. Faz-se, aqui, apenas uma análise acerca do dano moral direto e indireto.

Dano moral direto é a lesão a um interesse que se tem em um bem jurídico extrapatrimonial, como os direitos de personalidade (vida, integridade física e psíquica, honra, liberdade, intimidade, imagem, etc.), ou atributos pessoais (nome, capacidade, entre outros) e ainda dignidade da pessoa humana.

O dano moral indireto consiste em lesão a um interesse não patrimonial devido a uma lesão a um bem patrimonial da vítima, por exemplo, no caso de alguém destruir um bem de valor econômico de outrem, sendo que o mesmo também possui valor afetivo inestimável, ocorrendo um dano moral (dor da perda do bem que possuía valor sentimental) em função do dano material (diminuição patrimonial, pois o bem tinha valor econômico).

Visto isso, tem-se que pode ocorrer tanto o dano patrimonial como o moral isolados, ou ainda podem ocorrer ambos quando há lesão de interesses patrimoniais e não patrimoniais simultaneamente. Desta forma, "o caráter patrimonial ou moral do dano não advém da natureza do direito subjetivo danificado, mas dos efeitos da lesão jurídica", [17] pois lesões a interesses patrimoniais podem acarretar prejuízos de ordem moral (dano moral indireto) e danos a bens jurídicos não patrimoniais podem resultar em diminuição patrimonial.

1.3.3 Nexo causal

O nexo causal, que entre outras denominações dadas pela doutrina, também pode ser conhecido como nexo de causalidade ou relação de causalidade, "é o liame que une a conduta do agente ao dano", [18] é o vínculo existente entre a conduta lesiva e o dano provocado, sendo que esse deve ser conseqüência daquela, ou seja, a produção de um dano deve estar ligada à conduta de quem o gerou, podendo ser o prejuízo resultado direto ou conseqüência inevitável daquela ação. Em suma, há uma ação e se dela resultar um dano a outrem, sendo que esse só ocorreu em virtude de ter-se realizado aquela conduta, sendo decorrência direta ou mesmo indireta dela, mas desde que seja uma conseqüência lógica, previsível do ato lesivo, haverá nexo causal entre a conduta e o resultado danoso produzido. Importante é verificar se o dano é decorrência direta da ação, mas se não for, também poderá estar caracterizada a relação de causalidade, desde que se verifique que o dano não ocorreria se o fato não tivesse acontecido, isto é, uma relação causal indireta.

Poderá ocorrer dano indireto, ou seja, um dano decorrente de uma conduta lesiva primitiva, sendo o fato superveniente derivado do fato anterior e havendo nexo causal entre esse e a conduta inicial, se ocorrer outros prejuízos em função do primeiro, serão considerados conseqüências do dano primitivo, ficando caracterizada a relação de causalidade entre o dano superveniente e a conduta lesiva inicial. Para esclarecer o assunto, Maria Helena Diniz traz um exemplo, no caso de "um desordeiro quebrar vitrina de uma loja, deverá indenizar o dono não só do custo do vidro e sua colocação, mas também do valor dos artigos furtados em conseqüência de seu ato, por ser um dano indireto, embora efeito necessário da ação do lesante". [19] Basta o autor ser responsável por uma causa e sempre que dela advier outros danos estará caracterizada a relação causal, pois o nexo causal é uma questão de fato, cabendo sua prova ao autor da demanda que vise o ressarcimento.

Importante ressaltar que nexo de causalidade e imputabilidade não se confundem, pois o primeiro diz respeito aos elementos objetivos e o segundo a elementos subjetivos da ação ou omissão do agente, podendo haver imputabilidade sem que haja nexo causal.

1.3.3.1 Excludentes do nexo causal

Trata-se, aqui, de motivos que excluem, isto é, interrompem o nexo causal, impedindo que ele se caracterize. Deixa de haver um liame entre a conduta e o resultado danoso quando ocorrer um dos motivos que se passa a estudar, não podendo se dizer que o dano é conseqüência da conduta do agente.

Desta forma, traz a doutrina como motivos excludentes do nexo de causalidade os fatos que se derem por culpa exclusiva da vítima, por culpa concorrente, por culpa comum, por culpa de terceiro, por caso fortuito ou força maior e mediante a cláusula de não indenizar. É o que se passa a analisar.

Quando um dano ocorre por culpa exclusiva da vítima, está excluída qualquer responsabilidade do autor da conduta, devendo a própria vítima arcar com os prejuízos, não se cogitando a existência de nexo de causalidade entre a conduta de quem causou o dano e o prejuízo produzido, visto que a ação da vítima é a responsável pelo acontecimento lesivo. Assim, se o dano for oriundo de culpa exclusiva da vítima, não há responsabilidade de quem produziu o dano por não haver nexo causal entre sua conduta e o prejuízo, não havendo direito a ressarcimento por parte da vítima, que arcará com as despesas do dano.

Porém, se o dano advém de ação onde há culpa concorrente, ou seja, quando as duas partes, ofensor e vítima, contribuem para a produção de um prejuízo ao praticarem condutas imprudentes, negligentes ou imperitas, a doutrina apresenta alguns critérios para atribuição de responsabilidade a cada uma das partes e conseqüente aferimento do valor indenizatório, podendo haver compensação das culpas, divisão proporcional dos prejuízos, análise da gravidade da culpa de cada um e análise do grau de participação de cada uma das partes na causa do resultado. Assim, ocorrendo dano onde a culpa é concorrente entre o agente e a vítima, não desaparece o liame causal, havendo apenas uma atenuação da responsabilidade, subsistindo a obrigação de indenizar, devendo ser demonstrada a intensidade de culpa de cada um para que se possa determinar a quota de responsabilidade e, conseqüentemente, o montante indenizatório de cada uma das partes, caso a intensidade da culpa de um seja maior que a de outro. Havendo intensidades idênticas, isto é, se ofensor e vítima causam culposa e conjuntamente o mesmo dano, tem-se a culpa comum e ocorre a compensação, não havendo indenização, visto que as responsabilidades pelo evento se equivalem, ficando cada parte com o seu prejuízo. A indenização é devida de acordo com a responsabilidade atribuída a cada parte.

Em se tratando de dano decorrente de culpa de terceiro, importante, nessa sede, é determinar quem é essa figura. O terceiro é sujeito envolvido em uma relação jurídica, sendo diferente das figuras do ofensor e ofendido. No âmbito das relações contratuais, mais fácil é a sua caracterização, pois ele é o agente provocador do dano que não é parte contratante. Diante deste cenário, sendo demandado a ressarcir um prejuízo cuja existência se atribui exclusivamente à ação de um terceiro, pode a pessoa demandada requerer a exclusão de sua responsabilidade para designá-la ao terceiro, verdadeiro responsável pelo acontecimento lesivo. Mas para que a culpa de terceiro exonere o autor da conduta danosa, é necessário que o prejuízo se ligue à ação do terceiro, isto é, que haja uma relação de causalidade entre o dano e a conduta do terceiro tido como culpado, não podendo haver nexo causal entre a conduta do aparente responsável e o dano. Assim, tem-se que o ofensor (aparente responsável) não pode concorrer em momento algum para o evento e sua ação não pode provocar de forma alguma o fato de terceiro, pois tendo participação no acontecimento terá responsabilidade. Além disso, é preciso que o fato de terceiro seja ilícito, devendo ser o acontecimento imprevisível e inevitável. Então, provada a não existência de nexo causal entre a conduta do aparente responsável, pode, o mesmo, exonerar-se da responsabilidade, a qual é atribuída ao terceiro. Mas, uma vez responsabilizado o ofensor, cabe a esse a ação regressiva contra o terceiro, na hipótese de ocorrer os casos previstos no artigo 188, II do CC, quando se visa remover perigo iminente, ou do artigo 930 e parágrafo único, ambos do mesmo diploma, contra aquele em defesa de quem se causou o dano. Sobre o assunto, adverte a doutrina que apenas excepcionalmente a jurisprudência vem admitindo esta modalidade de excludente de responsabilidade. Isto talvez se deva ao fato de que muitas vezes o terceiro não é identificado e, em função disso, admitir o fato de terceiro como excludente seria deixar a vítima sem ressarcimento pelo dano sofrido.

Outros motivos excludentes do nexo causal são o caso fortuito e a força maior. Ocorrendo dano oriundo de uma das duas hipóteses, não há responsabilidade, pois esses acontecimentos eliminam a culpabilidade, uma vez que são inevitáveis. O caso fortuito e a força maior possuem dois requisitos para se configurarem, sendo um deles objetivo e outro subjetivo. O primeiro é a inevitabilidade do evento e o segundo é a ausência de culpa na produção do mesmo. Na força maior, a causa que dá origem ao acontecimento é um fato da natureza. No caso fortuito, o dano advém de causa desconhecida ou de fato de terceiro – e nesse caso não é possível atribuir a uma única pessoa a culpa pelo ocorrido -, sendo imprevisível e irresistível. Se esses acontecimentos não acarretarem a responsabilidade ao sujeito, não haverá obrigação por sua parte, salvo se se convencionou o pagamento de dano oriundo de caso fortuito ou força maior ou nos casos em que a lei assim determinar (responsabilidade objetiva). Há hipóteses em que o caso fortuito se aproxima do fato de terceiro, porém ressalta-se que são diferentes um do outro. Há que se dizer que nem sempre o caso fortuito e a coisa maior excluem a responsabilidade, pois na obrigação de dar coisa incerta tem-se o princípio de que o gênero nunca perece e assim sendo, se a coisa convencionada não puder ser entregue por causa da ocorrência de caso fortuito ou força maior que a deteriore, não se cogita eximir-se da responsabilidade, visto que por se tratar de algo incerto, pode ser adimplida a obrigação pela entrega de outra coisa de mesmo gênero, o qual não deixa de existir. Mas a doutrina também ensina a hipótese de o gênero ser limitado, restrito, caso em que ocorrendo o perecimento de suas espécies por motivos não ligados ao devedor, a obrigação estará extinta.

Além dessas excludentes do nexo causal, apresenta-se, no âmbito da responsabilidade contratual, a cláusula de não indenizar, que é assim definida por Silvio Rodrigues:

A cláusula de não indenizar é aquela estipulação através da qual uma das partes contratantes declara, com a concordância da outra, que não será responsável pelo dano por esta experimentado, resultante da inexecução ou da execução inadequada de um contrato, dano este que, sem a cláusula, deveria ser ressarcido pelo estipulante. [20]

Note-se que o risco pelo prejuízo é transferido à vítima, que deve concordar em suportá-lo, caso ocorra, para que a cláusula seja válida.

Cláusula de não indenizar e cláusula de irresponsabilidade não se confundem. Essa visa afastar a própria responsabilidade, algo que somente a lei pode fazer, enquanto a primeira afasta tão somente a indenização.

A discussão acerca desta cláusula se apresenta a respeito de sua validade. Alguns entendem que esta cláusula não possui validade, sendo nula. Para outros, ela é perfeitamente aceitável, em vista da autonomia da vontade contratual.

É certo que, se inclusa em um contrato, deve ser fruto do livre consentimento entre ambas as partes e não uma imposição, por isso não sendo aceita em contratos por adesão. Além do que, deve se referir a não indenização de direitos individuais disponíveis, sendo que por essa razão não é admitida nas relações que envolvem os direitos dos consumidores. Não pode, também, infringir preceitos legais e os bons costumes, não é válida contra a ordem pública e nem em casos que envolvam conduta dolosa, pois é aplicada no âmbito contratual e não no delitual. Assim, se for estipulada no contrato a cláusula de não indenizar, excluída estará a responsabilidade do agente, no que tange ao dever de indenizar, não porque o nexo causal é interrompido, mas antes em razão da convenção entre as partes nesse sentido.

Por fim, há doutrina que traz a cláusula de limitação da responsabilidade. Nela, as partes não excluem a responsabilidade, apenas impõem limites à mesma, havendo prévia estipulação do valor máximo que será pago no caso de prejuízo sofrido pela vítima, também só podendo ser admitida, assim como na cláusula de não indenizar, se livremente pactuada entre as partes.

Deve-se observar que essa cláusula deve respeitar as mesmas ressalvas feitas à admissibilidade da cláusula de não indenizar. Dessa forma, cláusula limitativa de responsabilidade que limite o valor da indenização de forma a torná-la irrisória é a mesma coisa que uma cláusula de não indenizar. Então, se isso ocorrer, nos mesmos casos que essa for vedada, deve, aquela, também ser.

1.4 Responsabilidade contratual (negocial) e extracontratual (extranegocial)

Outro ponto relevante nessa introdução ao estudo da responsabilidade civil é a diferenciação entre a responsabilidade que tem sua gênese num negócio jurídico descumprido e a que advém de outra espécie de ato ilícito. A primeira é denominada contratual ou negocial, ao passo que a segunda é conhecida como extracontratual ou extranegocial, ou ainda, por questões históricas, aquiliana. Tanto uma quanto outra espécie merecem um estudo aprofundado, o que não se faz pertinente neste trabalho, sendo, portanto, apenas traçada a diferença essencial entre uma e outra hipótese, tecendo-se alguns comentários outros, para que, por fim, seja tratado minuciosamente um tipo específico de responsabilidade contratual, objeto basilar desse estudo, a responsabilidade civil do advogado.

Frente a uma conduta geradora de dano, importa saber se este ato vem prejudicar uma situação jurídica preexistente, ou seja, um negócio jurídico pré-estabelecido entre aquele que causa e aquele que sofre o dano, ou se lesa um direito de alguém sem haver previa situação jurídica estabelecida. Sobre o fundamento dessas duas ramificações da responsabilidade civil, destaca-se a lição de Henri e Léon Mazeaud, citados por Silvio Rodrigues:

Na hipótese de responsabilidade contratual, antes da obrigação de indenizar emergir, existe, entre o inadimplente e seu co-contratante, um vínculo jurídico derivado da convenção; na hipótese da responsabilidade aquiliana, nenhum liame jurídico existe entre o agente causador do dano e a vítima até que o ato daquele ponha em ação os princípios geradores de sua obrigação de indenizar. [21]

Na responsabilidade contratual, verifica-se o inadimplemento da obrigação assumida, a qual produzirá um dano. Este, levando-se em consideração o nexo causal entre a conduta e o dano e tendo como fundamento, via de regra, a culpa, será ressarcido nos termos e medidas em que foram avençados entre as partes. Já na responsabilidade aquiliana, uma vez que não há relação jurídica preexistente estabelecida, havendo um ato danoso e desde que este e a conduta que o produziu estejam ligados por um nexo causal, aliados, em regra, à culpa do agente, existirá o dever de ressarcir, sendo que caracterizada estará a responsabilidade civil.

Nesse sentido, preleciona Silvio de Salvo Venosa que tanto a responsabilidade contratual quanto a extracontratual se fundam na idéia de culpa, ao dizer que "na culpa contratual, porém, examinaremos o inadimplemento como seu fundamento e os termos e limites da obrigação. Na culpa aquiliana ou extranegocial, leva-se em conta a conduta do agente e a culpa em sentido lato, [...]". [22]

Ocorre que, por vezes, uma relação contratual pode ser de difícil identificação e dizer se essa existia ou não à época em que ocorrera o dano é tarefa dotada de certa complexidade, como, no exemplo da doutrina, o transporte gratuito e o atendimento médico de urgência. Entretanto, demonstrada ou não a existência de um negócio jurídico entre as partes, o dever de indenizar subsiste, independente se a responsabilidade seja gerada pela existência de um contrato ou em função da prática de um ato ilícito que produz um dano.

Há, entre os estudiosos do tema, quem defenda que as duas responsabilidades são a mesma coisa, visto serem vários os pressupostos comuns entre elas. Esta opinião é sustentada com base no argumento de que se a responsabilidade se funda na culpa, não há motivo para distingui-las pela violação de obrigação contratual ou violação de obrigação oriunda de qualquer outra fonte, e ainda no argumento de que as perdas e danos que causador do prejuízo deve indenizar são coisas diversas do dever descumprido, mas antes apenas uma reparação do dano provocado por sua ação ou omissão, fazendo com que a responsabilidade contratual se identifique com a extracontratual. Mas o que se tem é que a tese clássica da divisão entre essas duas espécies prevalece, mesmo que combatida por algumas doutrinas.

Em matéria de prova dos danos, para que surja a responsabilidade civil, o onus probandi é diferente na responsabilidade negocial e na aquiliana. A diferença entre uma e outra também se encontra no que tange à capacidade de responder pelo dano provocado, conforme os ensinamentos de Silvio Rodrigues:

Em matéria de prova, por exemplo, na responsabilidade contratual, demonstrado pelo credor que a prestação foi descumprida, o onus probandi se transfere para o devedor inadimplente, que terá que evidenciar a inexistência de culpa de sua parte, ou a presença de força maior, ou outra excludente da responsabilidade capaz de eximi-lo do dever de indenizar, enquanto, se for aquiliana a responsabilidade, caberá à vítima o encargo de demonstrar a culpa do agente causador do dano.

Em matéria de capacidade também diversas são as posições. Assim, o menor impúbere só se vincula contratualmente assistido por seu representante legal e, excepcionalmente sem ele, se maliciosamente declarou-se maior (CC, art. 180); portanto, só pode ser responsabilizado por seu inadimplemento nesses casos; na responsabilidade aquiliana, entretanto, cumpre-lhe reparar o prejuízo sempre, pois se equipara ao maior quanto às obrigações resultantes de atos ilícitos em que for culpado (CC de 1916, art. 156). [23]

Por fim, vista a diferença entre a responsabilidade contratual e a extracontratual, acrescenta-se que enquanto a primeira é tratada pelos artigos 389 e seguintes do CC, dentro do capítulo "Do Inadimplemento das Obrigações", a segunda vem disciplinada pelo artigo 186 conjugado com o 927, ambos do mesmo diploma legal.

1.5 Sentença criminal e responsabilidade civil

A prática de algumas condutas pode ter sua responsabilidade investigada tanto na esfera cível quanto na criminal, isto é, um ato danoso pode constituir um crime e ao mesmo tempo gerar o dever de indenizar.

A questão poderia ser figurada como dois círculos concêntricos, sendo a esfera do processo criminal um círculo menor, de menor raio, porque a culpa criminal é aferida de forma mais restrita e rigorosa, tendo em vista a natureza da punição e ainda porque, para o crime, a pena não pode ir além do autor da conduta.

A esfera da ação civil de indenização é mais ampla porque a aferição de culpa é mais aberta, admitindo-se a culpa grave, leve e levíssima, todas acarretando como regra o dever de indenizar e ainda porque [...] há terceiros que podem responder patrimonialmente pela conduta de outrem. [24]

Harmonizar as decisões prolatadas no juízo cível e no criminal não é fácil. Há algumas correntes de pensadores que procuram separar totalmente as duas áreas. Outras optam pelo pensamento de que a sentença criminal faz coisa julgada no cível. E há quem procure harmonizar as decisões das duas jurisdições. Em nosso ordenamento, como a jurisdição é una e apenas encontra-se dividida por questões de organização e até mesmo didática, há independência entre a jurisdição cível e a criminal, porém uma independência branda, não tão rígida, visto que há um forte liame entre ambas as áreas.

Por ser una a jurisdição, o que se pretende coibir são sentenças antagônicas, contraditórias umas com as outras. Absurdo seria ocorrer uma condenação ao dever de indenizar por um acidente de trânsito onde se teve uma vítima fatal, um pai de família responsável pelo sustento dessa, enquanto no juízo criminal o motorista é absolvido em razão de a culpa ter sido exclusiva da vítima.

Em suma, tem-se que, apesar de organizadas separadamente, a jurisdição cível e a criminal integram uma jurisdição que é una, em função da soberania e do exercício do poder que é inerente ao Estado. Mas é preciso considerar que esta última exerce influência sobre aquela e assim mantém-se o sistema homogêneo, evitando-se decisões contraditórias.

Esse liame entre as duas jurisdições aqui tratadas aparece consubstanciado na legislação cível, criminal e processual. O Código Civil, em seu artigo 935, pondera que a responsabilidade cível e a criminal são independentes, mas que não se pode discutir, no primeiro juízo, a existência do fato e a autoria do mesmo quando já decido no segundo juízo. O Código Penal, por sua vez, traz como um dos efeitos da condenação nessa esfera jurídica a certeza da obrigação de indenizar o dano causado pelo crime (art. 91, I). E no mesmo caminho se projeta o Código de Processo Civil, que estabelece ser a sentença penal condenatória transitada em julgado um título executivo, ficando a cargo do juízo cível a determinação do quantum debeatur a ser indenizado. Finalmente, o Código de Processo Penal (CPP), seguindo esse entendimento de que as duas jurisdições devem ser homogêneas, expõe em seu artigo 63 que pode ser promovida no juízo cível a sentença penal condenatória transitada em julgado para efeito de reparação de dano.

1.5.1 Execução da sentença criminal condenatória

A sentença penal condenatória transitada em julgado no juízo criminal faz nascer o dever de indenizar, na esfera cível, o dano sofrido pela vítima ou por seus parentes. A referida sentença é um título executivo ilíquido na jurisdição civil. Então, é preciso que nessa sede seja estabelecido o montante indenizatório, através da liquidação de sentença.

Uma questão que se apresenta, visto que o ordenamento não dispõe de regra expressa sobre a matéria, é acerca da possibilidade de se executar sentença penal em casos de responsabilidade civil por fato de terceiro. Esclarecendo, tome-se o exemplo do funcionário na condição de preposto que, exercendo suas atividades, comete um delito e é condenado. A execução da sentença penal não poderá ser promovida contra seu patrão, visto que aquela sentença só gera efeitos para o autor do crime. Nesse caso, a reparação do dano, no juízo cível, deverá correr contra o próprio infrator. Para que um terceiro, no caso a patrão, possa ser chamado a reparar o dano, sob a alegação de que as atividades do preposto são de responsabilidade do empregador, posto que o risco da atividade que exerce é seu, é preciso se valer da actio civilis ex delicto, pois ninguém pode ser condenado sem o devido processo legal, cabendo, nessa ação, a discussão ampla sobre o fato e os danos provocados. É o entendimento da corrente majoritária.

A partir desse entendimento, surge uma controvérsia acerca da rediscussão, no cível, dos fatos julgados na esfera criminal. Há doutrina que entende ser totalmente possível essa rediscussão quando a ação indenizatória se voltar contra o patrão, pois a sentença condenatória é valida contra o réu do processo criminal e não contra o responsável civil. Há, todavia, quem defenda serem os efeitos da sentença criminal, nesse caso, estendidos a terceiros, no caso o patrão, indo de encontro ao princípio da ampla defesa e do contraditório.

Entretanto, se a ação indenizatória for promovida em face do réu condenado, há formação do título executivo e este é válido para a execução no cível, tendo plena eficácia. Não há nova discussão, pois se tem uma sentença que forma coisa julgada.

Concluindo o assunto abordado, importantes são as lições de Silvio Venosa sobre a improcedência da ação civil e a posterior condenação criminal, sobre a absolvição em revisão criminal e a relação dessa com a ação que corre no cível e sobre a prescrição da pretensão executória da sentença criminal e a execução no cível.

Se a pretensão civil for julgada improcedente, com trânsito em julgado, essa decisão é inatacável se o juízo criminal concluir posteriormente pela condenação.

[...] a absolvição obtida por força de revisão criminal não altera a situação da ação civil.

[...] A prescrição da pretensão executória da condenação penal, que somente ocorre após o trânsito em julgado da sentença, não lhe retira a força executiva no âmbito cível. [25]

O direito à indenização independe se o juízo criminal reconheceu ou não o prejuízo, pois a responsabilidade civil é independente da criminal, sendo que entre ambas as jurisdições somente não pode haver decisões antagônicas, mas a cada uma corresponde a averiguação de responsabilidade dentro da esfera que lhe compete.

1.5.2 Sentença criminal absolutória

Ao contrário do que ocorre com a sentença penal condenatória, a sentença desse juízo que absolve não faz coisa julgada no cível. Isso acontece porque o fato discutido e julgado no âmbito penal não fora comprovado, não sendo possível a condenação pelo delito. Entretanto, o fato de a conduta não ter sido considerada como criminosa não quer dizer que não produziu dano a vítima. Deve-se ter cuidado nesse reexame promovido no cível.

O artigo 386 do CPP impõe ao magistrado o dever de mencionar, na parte dispositiva da sentença absolutória, uma das causas contidas naquele dispositivo. Dos seis incisos desse artigo, os quais são motivos através dos quais o magistrado do juízo criminal pode absolver o réu, com base em todos pode a vítima acionar o Judiciário requerendo indenização. Exceção feita ao inciso I, pois se absolvição na esfera criminal se der em função de que está provada a inexistência do fato, não se discutirá, no cível, algo que comprovadamente não ocorreu. Agora, se a conduta no ilícito civil for mais ampla do que a narrada, investigada e julgada no juízo criminal, o que não foi objeto da sentença criminal pode ser objeto de discussão na esfera civil.

Acerca de peças arquivadas, causas de extinção de punibilidade e o fato de não haver condenação criminal, tem-se a seguinte lição:

O simples fato de as peças investigatórias, inquéritos ou equivalente, terem sido arquivadas, não inibe em absoluto a ação indenizatória, pois juízo de valor algum foi feito pelo Judiciário nessa hipótese. A causas de extinção da punibilidade penal, em princípio, da mesma forma, não interferem na ação de ressarcimento: nada tem a ver, por exemplo, o reconhecimento da prescrição do crime para a ação civil. E, por fim, [...] o fato pode não ser crime, mas pode gerar o dever de indenizar, pois o conceito de ilícito civil é muito mais amplo. [26]

1.6 Responsabilidade civil no Código de Defesa do Consumidor

O Código de Defesa do Consumidor (CDC), Lei nº 8.078, de 11-09-1990, representa uma revolução no âmbito da responsabilidade civil e também é considerado um divisor de águas no direito pátrio, trazendo inovações e tendo vasto campo de aplicação. Trata-se de uma codificação moderna.

Esse diploma traz conceitos muito claros, definições objetivas sobre os diversos aspectos que envolvem a relação de consumo, como o que é o consumidor, o fornecedor, a definição do que o CDC considera por serviço, entre outros, na tentativa de evitar imprecisões e distorções interpretativas.

Segundo disposição do artigo 2º do CDC, "consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final". [27] Com base nessa definição, percebe-se que não apenas as pessoas físicas, mas também as jurídicas são consideradas consumidores, ressaltando que entidades despersonalizadas, como o espólio, o condomínio, a massa falida, também estão incluídas nesse conceito. Não se restringe apenas a proteger quem adquire o produto ou serviço, mas da mesma forma o faz com quem dele se utiliza como destinatário final, mesmo que não for o dono. Todavia, aqueles que adquirem produtos para revendê-los não são considerados consumidores, pois não o adquire nem o utiliza como destinatário final, visto que sua atitude não é a de consumir, usufruir o produto, mas antes de repassá-lo a outra pessoa. Não sendo considerado consumidor, em princípio o intermediário não poderia se valer dos direitos do consumidor em caso de vício do produto ou serviço, mas a doutrina esclarece que o artigo 17 da Lei nº 8.078/90, ao equiparar ao consumidor todas as vítimas do evento, acaba por resolver essa questão, autorizando o intermediário a se utilizar do CDC em casos de danos decorrentes de fato dos produtos.

Se de um lado tem-se o consumidor, do outro há o fornecedor, cuja definição está no artigo 3º daquele código:

Art. 3º. Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. [28]

O mesmo artigo traz, em seus parágrafos, o conceito de produto e serviço, o quais são amplos, comportando compreensão muito vasta.

Havendo lesão aos direitos dos consumidores, se mais de um for autor da ofensa, todos respondem solidariamente pelo dano.

O CDC tem ampla abrangência, protegendo as diversas áreas em que se caracteriza a relação de consumo, inclusive o comércio eletrônico, tão difundido hoje, sem que com isso iniba a atividade econômica. O que se pretende com essa legislação é proteger a parte hipossuficiente da relação de consumo, o consumidor, conferindo-lhe mecanismos de defesa em prol de seus direitos, mas sem que essa proteção acarrete um desestímulo e dificuldades para aqueles que exercem as atividades de produção e prestação de serviços. Enfim, o que se busca é o equilíbrio entre essas extremidades, conferindo direitos aos mais vulneráveis na relação de consumo para coibir práticas abusivas do fornecedor, que em tese possui superioridade econômica, investigando e atribuindo responsabilidade a quem cause dano aos direitos do consumidor.

Para concretizar essa proteção ao consumidor, foram criadas Promotorias de Justiça de Defesa do Consumidor, que atuam ao lado das Delegacias de Polícia especializadas em atendimento aos consumidores lesados. Deve, o juiz, estar sempre atento em seu julgamento, considerando o aspecto hipossuficiente do consumidor frente ao fornecedor, que se apresenta como parte mais forte da relação de consumo.

Os direitos básicos dos consumidores vêm definidos no artigo 6º do CDC, sendo relevantes à responsabilidade civil o que dispõem os incisos VI e VII, pois tratam da prevenção e reparação de danos e do acesso ao judiciário e a órgãos administrativos, visando assegurar proteção jurídica a quem sofra prejuízo nas relações de consumo. O inciso VIII preconiza a facilitação da defesa desses direitos, inclusive possibilitando a inversão do ônus da prova, quando o juiz considerar a hipossuficiência do consumidor ou a verossimilhança de suas alegações. A boa-fé e o dever de informação também pautam as relações de consumo.

1.6.1 Relação de consumo e responsabilidade civil

Antes do Código de Defesa do Consumidor, as relações de consumo se regiam, no que tange à responsabilidade de quem produz, fabrica, importa, constrói, comercializa os produtos, pelo antigo artigo 159 do CC. O consumidor se encontrava em uma situação de extrema inferioridade, pois a ele era imposto o dever de provar a culpa subjetiva daquele que produzira um dano, ficando atrelado aos prazos curtos dos vícios redibitórios para poder acionar o fabricante do produto, devendo fazer isso no local onde se encontrava a sua sede. A tecnologia e o crescente vulto das relações de consumo, aliados aos constantes abusos por parte dos fornecedores, induziram o legislador a proporcionar uma proteção diferenciada para os consumidores, não apenas considerados individualmente, mas antes de forma abrangente. E foi isso que a Constituição Federal de 1988 veio fazer, protegendo os direitos transindividuais, criando uma base para o direito dos consumidores. Posteriormente, o CDC surge para evitar esses abusos e danos, contendo princípios de diversos ramos e disciplinas do Direito.

Esse diploma preconiza em seu artigo 12 a responsabilidade do produtor, fabricante, importador, construtor, entre outras espécies de fornecedores, independente de culpa, pelos danos causados por produtos e pela indevida informação a respeito do uso e riscos dos mesmos. Assim, os danos que advierem da falta de qualidade dos produtos e serviços prestados são de responsabilidade de quem os forneceu, sendo necessário prova em contrário para ilidir sua responsabilidade, conforme dispõe o parágrafo 3º do supracitado artigo.

Desse modo, o fornecedor apenas se exonera do dever de reparar pelo fato do produto ou do serviço se provar, em síntese, ausência de nexo causal ou culpa exclusiva da vítima. O fato exclusivo de terceiro também impede que se conclua pela existência de nexo causal. Se houver culpa concorrente, persiste sua obrigação.

[...] Em síntese, a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro desvia a óptica da problemática para a inexistência de defeito e, portanto, para a ausência de nexo causal. [29]

O CDC traz, no mencionado artigo 12, §3º, os casos em que o fornecedor não é responsabilizado, desde que prove que não colocou o produto no mercado; que, embora haja colocado o produto no mercado, o defeito inexiste; ou que a culpa é exclusiva do consumidor ou de terceiro. Assim, não há nexo causal e, conseqüentemente, fica isento de responsabilidade. Havendo culpa concorrente, persiste sua obrigação. Mas uma questão que se apresenta é relativa ao fato de não terem sido mencionados o caso fortuito e a força maior como excludentes do nexo causal nas relações de consumo no referido parágrafo 3º. Isso não pode conduzir à idéia de que não sejam excludentes, pois caracterizada qualquer das duas hipóteses, inexiste nexo causal e não há responsabilidade do fornecedor.

O consumidor lesado poderá acionar, por exemplo, o fabricante do produto que apresenta problemas. Entretanto, quando este não for identificado, poderá acionar aquele que o revendeu, o comerciante. É a responsabilidade do fornecedor aparente, isto é, aquele que se apresenta como fornecedor para o comprador do produto, vinculando-se ao consumidor como se fosse o fabricante daquele. Em síntese, o consumidor lesado, que compra produto com defeito, que lhe é vendido por comerciante que não é o fabricante do mesmo, apenas revendendo-o, pode acionar, visando uma indenização ou outra medida permitida pelo CDC, tanto um quanto outro, pois o comerciante também é fornecedor conforme a definição daquele diploma.

O estudo sobre a responsabilidade dos fornecedores de produtos é por demais abrangente, trazendo, a doutrina, muitos outros ensinamentos acerca do tema, limitando-se, aqui, a uma exposição sucinta.

A legislação defensora dos consumidores trata, em seu artigo 14, da responsabilidade dos fornecedores de serviço, a qual é importante para este trabalho, por ser esta a proteção a ser dada ao cliente do advogado, que, sobre a ótica do CDC, realiza uma atividade vista como de fornecedor de serviços.

Dispõe o supracitado artigo:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação de serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. [30]

Assim como o produto defeituoso, o serviço que apresentar defeito deve ser examinado no momento em que é prestado, ou seja, deve ser analisado se no serviço prestado foi utilizada a melhor técnica existente à época em que se realizou, pois técnicas modernas que são descobertas e utilizadas posteriormente ao serviço que já foi prestado não tornam o mesmo defeituoso.

O prestador de serviço se exonera de responsabilidade quando provar que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; ou quando a culpa for exclusiva do consumidor ou de terceiro. Deve ser considerado, nesta sede, o mesmo quanto ao caso fortuito e a força maior relativos à responsabilidade do fornecedor de produtos, visto que não expressos na legislação.

No tocante à responsabilidade dos profissionais liberais, - e aqui se enquadra o advogado - o CDC apresenta uma regra diferente daquelas que regem os demais fornecedores de serviços, uma vez que para esses profissionais a referida legislação estabelece a responsabilidade subjetiva, isto é, para ser responsabilizado por sua conduta, a vítima deve demonstrar que o profissional liberal agiu com culpa, fato este que não descaracteriza a existência de relação de consumo. Os demais princípios da relação consumerista continuam a serem aplicados, como o da inversão do ônus da prova em favor do consumidor.

O CDC protege tanto o consumidor direto quanto o indireto, ou seja, todos os que podem ser atingidos pelos defeitos dos produtos ou serviços prestados, pois o artigo 17 daquela legislação equipara ao consumidor todas as pessoas que forem vítimas do evento danoso.

1.6.2 Reparação de danos

O nosso sistema adotou a responsabilidade objetiva no campo do consumidor. As indenizações devidas a esse não sofrem limitações, deste modo, os danos provocados aos consumidores devem ser reparados, tanto os materiais quanto os morais.

No que tange a defeito de produtos ou serviço, nem sempre a indenização se dá em pecúnia, pois o CDC autoriza a substituição daquele ou o refazimento desse.

O fornecedor que não se comportar dentro das regras estabelecidas pelo CDC para a sua atividade, ou seja, se proporcionar ao consumidor qualquer prejuízo, fica sujeito à reparação do dano mediante uma das formas eleitas por aquele diploma, constantes no artigo 18, além de estarem sujeitos a sanções administrativas e penais.

Quantos aos vícios (defeitos),quer sejam em produtos, quer sejam em serviços, uma vez caracterizados, é autorizado pelo CDC a reexecução dos serviços sem custo adicional, a restituição imediata da quantia paga (honorários, no caso de serviços advocatícios) ou o abatimento proporcional do preço.

Importante ressaltar que a cláusula de não indenizar é ineficaz nas relações de consumo. O que se discute é a possibilidade de limitar a responsabilidade em se tratando de produtos ou serviços de alta complexidade e de elevado valor, parecendo possível essa forma de se proceder, visto que muitos negócios somente são viáveis se parte do risco for assumido pelo consumidor, visto que em certas situações esse não se encontra em situação de hipossuficiência. No entanto, essa cláusula não pode anular ou tornar ineficaz a proteção ao consumidor.

O CDC ainda estabelece os prazos decadenciais e prescricionais para se reclamar pelos vícios dos produtos e serviços. Os decadenciais são trazidos no artigo 26, que também estabelece, em seus parágrafos, a data em que se inicia e as causas impeditivas da decadência, e os prescricionais no artigo 27 daquele diploma legal.

Enfim, muitas são as regras de proteção e as inovações trazidas pelo Código de Defesa do Consumidor, sendo apenas algumas delas analisadas, sem profundidade, apenas para que se tenha conhecimento superficial da matéria.

Passa-se a analisar, no próximo capítulo, o exercício da advocacia, para que a partir da noção da forma como atua e deve se comportar um advogado, reste mais clara a sua responsabilidade quando infringir qualquer de seus deveres de conduta.


2 Do exercício da advocacia

A profissão do advogado é regida pela Lei Federal n° 8.906/94, que dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil (EAOAB), pelo seu Regulamento Geral, pelo Código de Ética e Disciplina e por Provimentos do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.

Preliminarmente, importante ressaltar que a Lei n° 8.906/94 tem, em muitas passagens, trechos discutidos judicialmente no que tange à sua constitucionalidade, sendo alvo de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn). Algumas dessas ações já foram decididas e certas passagens do texto legal a que se referem foram alteradas. Outras ações ainda encontram-se em trâmite judicial.

A atividade de advocacia apresenta algumas características essenciais, ressaltadas no art. 2° da Lei nº 8.906/94. São elas a indispensabilidade, a inviolabilidade, a função social e a independência.

A Constituição Federal estabelece a indispensabilidade e a inviolabilidade do advogado no exercício de sua profissão em seu artigo 133. Essas duas características foram repetidas pelo artigo 2° do EAOAB, o qual ainda dispõe ser, a atividade do advogado, uma função social e independente.

Quanto à indispensabilidade, tem-se a lição de Haroldo Paranhos Cardella:

[...] o advogado é indispensável à administração da justiça e, ainda, que qualquer postulação a órgãos do Poder Judiciário, incluindo os juizados especiais, deve ser realizada exclusivamente pelo profissional da advocacia, salvo a impetração de habeas corpus, que, como se sabe, pode ser realizada por qualquer pessoa. Porém, o STF excluiu sua aplicação aos Juizados Especiais (até 20 salários mínimos), à Justiça do Trabalho e à Justiça de Paz. Neles, hoje, a parte pode postular diretamente. [31]

Ressalta-se que, a lado do advogado, outros dois profissionais são indispensáveis. "No ordenamento brasileiro, são três os figurantes indispensáveis à administração da justiça: o advogado, o juiz e o promotor. O primeiro postula, o segundo julga e o terceiro fiscaliza a aplicação da lei". [32]

Haroldo Paranhos Cardella ainda preleciona sobre a inviolabilidade do advogado no exercício de suas funções, fazendo uma ressalva quanto a uma de suas imunidades, suspensa por medida liminar do STF (Supremo Tribunal Federal).

[...] no exercício da profissão, o advogado é inviolável por seus atos e manifestações, possuindo imunidade penal referente aos crimes de injúria, difamação e desacato, em decorrência, logicamente, do exercício profissional. Porém, a imunidade referente ao crime de desacato foi suspensa pelo STF, em medida liminar. [33]

O exercício da advocacia é também uma função social, pois, ao contrário dos juízes e promotores, os quais são agentes do Estado e exercem função pública, o advogado não é titular de função pública (estatal), exceto se for vinculado a entidade de advocacia pública, mas o exercício da advocacia é regido pelo direito público. O art. 2º do EAOAB estatui que o advogado, mesmo que exerça ministério privado, presta serviço público e exerce função social.

Múnus público é um encargo a que se não pode fugir, dadas as circunstâncias, no interesse social. A advocacia, além de profissão, é um múnus, pois cumpre o encargo indeclinável de contribuir para a realização da justiça, ao lado do patrocínio da causa, quando atua em juízo. Nesse sentido, é dever que não decorre de ofício ou cargo públicos.

A advocacia, sobretudo quando ministrada em caráter privado, é exercida segundo uma função social intrínseca. A função social é a sua mais importante e dignificante característica. O interesse particular do cliente ou o da remuneração e o prestígio do advogado não podem sacrificar os interesses sociais e coletivos e o bem comum.

[...]

O advogado realiza a função social, quando concretiza a aplicação do direito (e não apenas da lei), quando obtém a prestação jurisdicional e quando, mercê de seu saber especializado, participa da construção da justiça social. [34]

No tocante à independência desse profissional, tem-se que não há hierarquia entre ele e outros figurantes indispensáveis à administração da justiça, visto que todos tem a mesma formação acadêmica, apenas exercendo atividades diferentes, as quais mantêm um relacionamento necessário e em nível de igualdade. É o que ensina Paulo Lôbo:

Cada figurante tem um papel a desempenhar: um postula, outro fiscaliza a aplicação da lei e outro julga. As funções são distintas mas não se estabelece entre elas relação de hierarquia e subordinação. Em sendo assim, mais forte se torna a direção ética que o preceito encerra no sentido do relacionamento profissional independente, harmônico, reciprocamente respeitoso e digno.

[...]

É a um só tempo dever e direito. Dever de comportamento e direito de reciprocidade.

Os profissionais do direito tem a mesma formação (bacharéis em direito) e atuam em nível de igualdade no desempenho de seus distintos e inter-relacionados misteres.

[...]

É seu direito-dever defender as prerrogativas da profissão, legal e eticamente, não podendo ser submisso, omisso ou conveniente. Não pode exceder os limites emergentes da reciprocidade, nem abusar de seu direito isonômico.

[...]

Sem independência, a advocacia fenece. Sem dignidade, ela se amesquinha. [35]

Até o presente momento, foi empregado, em várias passagens, o termo "advogado", sem restar claro quem é esse profissional, quem pode denominar-se advogado. "Para o Estatuto, advogado é o bacharel em direito, inscrito no quadro de advogados da OAB, que realiza atividade de postulação ao Poder Judiciário, como representante judicial de seus clientes, e atividades de consultoria e assessoria em matérias jurídicas". [36] Apenas os bacharéis aprovados no exame da Ordem dos Advogados do Brasil e, por isso, inscritos na OAB podem utilizar a denominação advogado. Ele é uma espécie do gênero profissionais do direito, uma vez que os cursos jurídicos não formam advogados, mas sim bacharéis em direito.

Uma curiosidade que se ressalta aqui é o costume de tratar o advogado por "doutor". Importante distinguir que, embora consuetudinariamente seja tratado dessa forma, doutor é aquele que obtém o título de doutor em direito após defesa de tese, concedido por instituição de pós-graduação apta para assim fazê-lo. "Embora não se possa evitar o tratamento social, o uso indevido do título de doutor em documentos profissionais e nos meios de publicidade configura infração ética". [37]

Os advogados exercem atividades privativas, isto é, atividades que somente a eles competem, encontrando-se dispostas no art. 1º da Lei n° 8.906/94 (enumeração não exaustiva). Qualquer outra pessoa ou profissional que as pratique, até mesmo advogado impedido, suspenso, licenciado ou que exerça atividade incompatível com a profissão da advocacia, comete exercício ilegal da profissão, sendo seus atos nulos. São atividades privativas da advocacia a postulação a qualquer órgão do Poder Judiciário e aos juizados especiais, as atividades de consultoria, assessoria e direção jurídicas.

Quanto à postulação a qualquer órgão do Poder Judiciário, destaca-se que o STF excluiu do âmbito de atividades privativas do advogado pleitear junto aos Juizados Especiais (até 20 salários mínimos), à Justiça do Trabalho e à Justiça de Paz, pois nesses casos, pode a parte interessada atuar diretamente. A impetração de habeas corpus também não exige a atuação do advogado.

Cabe ainda ao advogado visar os atos e contratos constitutivos de pessoa jurídica, para fins de registro. "Esse visto pressupõe o exame das exigências legais do contrato, sob pena de nulidade absoluta do instrumento". [38] O advogado que assina, porém não participa da elaboração do documento, pode cometer infração disciplinar prevista no art. 34, V, do EAOAB.

Fica proibido ao advogado divulgar a atividade de advocacia junto com outra atividade que exerça, tenha ela fins lucrativos ou não. Assim, realizar outra atividade no mesmo espaço físico em que se realiza o labor de advogado colide com a ética, pois o sigilo profissional pode restar comprometido e se configurar a captação de clientela.

Para exercer seu labor, o advogado, que postula em juízo direito alheio, deve receber poderes para assim proceder, isto é, deve estar munido de um mandato judicial, que tem na procuração um "instrumento por meio do qual são dados todos os poderes de representação do cliente ao advogado. A procuração denominada ‘para ao foro em geral’ permite que o advogado pratique todos os atos extrajudiciais e judiciais, salvo quando a lei exigir poderes específicos". [39] A procuração é a prova do mandato. O profissional da advocacia tem o direito de atuar sem ela em casos de urgência pelo prazo de 15 (quinze) dias, prorrogáveis por mais quinze. Poderá, contudo, renunciar ao mandato que lhe fora conferido, não necessitando de fundamentação para essa decisão sua, devendo permanecer no patrocínio da causa por um período de dez dias, se não houver sido substituído antes, comunicando a sua decisão ao cliente e ao juízo da causa. Entretanto, essa renúncia não exclui sua responsabilidade pelos seus atos praticados, caso eles venham a causar prejuízo ao cliente.

Por fim, tem-se que os profissionais que exercem a advocacia pública são regidos, primeiro, pela Lei 8.906/94 e, num segundo plano, pelo seu regime próprio. A advocacia pública, para fins de esclarecimento, é classificada em advocacia estatal (da União, dos Estados-membros, do Distrito Federal, dos Municípios e de suas Autarquias e Fundações Públicas) e defensoria pública (da União, do Distrito Federal e dos Estados-membros).

2.2 Os direitos do advogado

O artigo 6° do Estatuto dispõe não haver hierarquia entre advogados, magistrados e membros do Ministério Público, existindo o dever de consideração e respeito recíprocos. É a característica da independência, já estudada anteriormente. O parágrafo único do supracitado dispositivo legal estende o comando a todos os agentes públicos e serventuários de justiça, com os quais o advogado relaciona-se profissionalmente, cabendo, àqueles, tratar o advogado de forma compatível com a dignidade de seu labor e as condições adequadas ao desempenho de seu mister.

A Lei nº 8.906/94 estabeleceu uma série de direitos (prerrogativas) aos advogados em seu art. 7º. Porém, não se confundem direitos ou prerrogativas com privilégios, como ocorria no passado. Os direitos reconhecidos são de ordem profissional, visando garantir condições que permitam o ideal desenvolvimento das atividades profissionais e não conceder privilégios pessoais.

Se, no passado, prerrogativa podia ser confundida com privilégio, na atualidade, prerrogativa profissional significa direito exclusivo e indispensável ao exercício de determinada profissão no interesse social. Em certa medida é direito-dever e, no caso da advocacia, configura condições legais de exercício de seu múnus público. [40]

Passa-se a analisar as diversas prerrogativas reconhecidas ao advogado para o exercício de sua atividade profissional, contidas no já mencionado art. 7º do Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil.

O advogado tem liberdade de exercício profissional, pois a CF determina o livre exercício de qualquer profissão (art. 5º, XIII), desde que sejam atendidas as qualificações profissionais estabelecidas pela lei, isto é, a liberdade de exercício é condicionada a esses elementos qualificadores, às condições, requisitos e qualidades estabelecidos em lei para que se possa considerar um profissional apto a exercer seu labor. Assim, a liberdade de exercício do advogado é plena em razão do espaço, pois esse profissional pode atuar dentro de todo o território nacional, desde que observado o território do Conselho Seccional onde encontra-se com sua inscrição principal, suplementar ou por transferência. Também é plena em razão da matéria, perante os tribunais federais e superiores, nas causas em que for o patrocinador. O livre exercício profissional é condicionado apenas quando se atua fora do território onde é inscrito, não podendo patrocinar mais de cinco causas por ano.

Há também uma garantia constitucional de inviolabilidade, que atinge uma dimensão positiva e outra negativa. A inviolabilidade do advogado sob a ótica positiva abrange a imunidade profissional por suas manifestações e palavras, a proteção do sigilo profissional e a proteção dos meios de trabalho, incluindo local, instalações, documentos e dados. Sob a dimensão negativa, os limites estabelecidos pela CF referem-se ao poder exclusivo da OAB em punir disciplinarmente os excessos cometidos pelos advogados. Na verdade, o intuito da lei ao conceder imunidade profissional, proteção ao sigilo profissional e aos meios de trabalho é muito mais uma forma de proteção ao cliente, visto ser o segredo que o advogado guarda um interesse do cliente, um direito desse, que o profissional apenas deve manter em sigilo em prol da preservação dos direitos de seu cliente. Por isso justifica-se a inviolabilidade concedida ao advogado no que diz respeito ao seu local de trabalho, seus arquivos e dados, suas correspondências e comunicações, enfim, tudo que se relacione com informações obtidas no exercício de sua atividade. Tal inviolabilidade só perde espaço quando há busca ou apreensão determinada por magistrado, sendo possível a intervenção mediante mandado judicial em casos onde o interesse que se visa preservar excede aos limites profissionais e finalidades lícitas.

A imunidade profissional estabelecida pelo EAOAB é a imunidade penal do advogado pelas suas manifestações, palavras e atos utilizados no exercício da atividade jurídica que possam ser considerados ofensivos a qualquer pessoa ou autoridade, não sendo tutelados os atos que excederem o exercício da advocacia e nem os de natureza pessoal. Essa imunidade não se limita às ofensas proferidas em juízo, mas também às produzidas em qualquer órgão da administração pública e perante qualquer autoridade extrajudicial. Porém, esta imunidade não impede que seja aplicada uma punição ético-disciplinar ao advogado que não tratar o público, os colegas e as autoridades com respeito, discrição e independência, pois assim prescreve o Código de Ética e Disciplina, sendo que apenas a OAB tem competência para realizar essa punição. O advogado que, sem se exceder, faltar com o respeito a promotores e juizes quando estes procederem da mesma forma não comete infração disciplinar. "A imunidade profissional importa ausência de criminalidade, por não haver contrariedade a direito, que caracteriza o ilícito". [41] O Estatuto excluiu a ilicitude dos atos e manifestações dos advogados relativos à injúria e à difamação, sendo que o desacato, incluído no texto legal, foi considerado inconstitucional pela Corte Suprema, não sendo objeto da imunidade. Outro crime contra a honra, a calúnia, não foi imunizado, visto que se assim fosse procedido, estar-se-ia legalizando excessos, os quais não devem ser praticados pelos advogados, nem mesmo em situações extremas, devendo prevalecer a postura desse profissional.

O direito ao sigilo é uma conquista dos povos civilizados, que passou a integrar os direitos fundamentais do cidadão. O sigilo profissional reconhecido ao advogado é, antes de tudo, um dever que tem o mesmo de manter o segredo que tomou conhecimento, pois não protege um segredo próprio, mas de outrem. Desse modo, assegura-se de maneira plena o direito de defesa. Assim, o sigilo profissional é ao mesmo tempo um direito e um dever. Direito porque o advogado não é obrigado a tornar público aquilo que toma conhecimento durante o exercício de sua profissão. Dever porque não pode, em circunstância alguma, em momento algum, repassar informações e segredos que tome conhecimento, independentemente se o seu serviço foi ou não contratado, seja remunerado ou não, haja atuação na esfera judicial ou extrajudicial, e ainda se quem lhe confidenciou foi um cliente, a parte contrária, um colega de profissão, terceira pessoa, enfim, qualquer pessoa, em qualquer circunstância, qualquer segredo deve ser guardado e protegido, salvo no caso de estado de necessidade, proteção dos próprios direitos do advogado ou de iminente perigo contra si ou contra outrem, libertando-se, o advogado, nesses casos, de seu dever de sigilo. O direito-dever de sigilo profissional também se estende ao advogado no que tange à recusa de depor como testemunha sobre fatos relacionados a seus clientes ou ex-clientes, em processo que funcionou ou deva funcionar, dos quais tomou conhecimento no exercício de sua atividade e sob o sigilo profissional. Neste caso, o sigilo só pode ser quebrado se o profissional se ver atacado pelo próprio cliente, devendo utilizar os fatos e documentos sigilosos no limite de sua defesa, a fim de que não venha a responder pelo ilícito cometido por outrem. A revelação de sigilo profissional configura infração disciplinar e crime de violação de segredo profissional.

A inviolabilidade do advogado alcança seus meios de atuação profissional, tais como seu escritório ou locais de trabalho, seus arquivos, seus dados, sua correspondência e suas comunicações. Todos esses meios estão alcançados tradicionalmente pela tutela do sigilo profissional. [42]

Assim, estão protegidos, pelo direito à inviolabilidade, o local de trabalho e os meios de exercício profissional. O local de trabalho pode ser o escritório ou a própria casa do advogado, caso exerça nela o seu labor, ambos protegidos contra violação. Também são tutelados os meios pelos quais o advogado exerce seu ofício, como os dados e arquivos contidos em seu computador, suas ligações telefônicas, suas correspondências, enfim, todo meio que se possa utilizar na atividade que exerce. Porém, a inviolabilidade de seus meios de atuação sofre exceção, no caso de busca e apreensão determinada por magistrado, uma vez que o advogado pode estar utilizando seu direito à inviolabilidade para praticar atos que excedem o exercício profissional e até mesmo cometer delitos. Então, a busca e apreensão limita-se a objetos vinculados à finalidade ilícita, não podendo ter apreendidos os dados, arquivos, documentos, sofrer interceptações telefônicas ou violação a qualquer outro meio de atuação, salvo se houver provas ou forte indício de que se encontra em poder do advogado objeto que constitua elemento do corpo de delito, ou havendo provas de sua participação em prática delituosa. Um representante da OAB sempre deve estar presente, acompanhando o procedimento de busca e apreensão.

Outra prerrogativa do advogado é a comunicação com seu cliente, que não se abala nem mesmo com a prisão ou a incomunicabilidade desse, podendo comunicar-se pessoal e reservadamente com o mesmo, visto ser a assistência de advogado um direito assegurado pela Constituição Federal. Por isso, a inexistência de procuração para defender o cliente, nesses casos, não inibe o direito de comunicação entre o advogado e a pessoa presa.

O Estatuto reserva ao advogado o direito de somente poder ser preso em flagrante, por motivos ligados ao exercício de sua profissão, nos casos de cometer crime inafiançável, visando-se evitar que a má atuação ou a atuação de má-fé e injusta possa por em risco o prestígio e a dignidade profissional do advogado. A prisão em flagrante só será válida se estiver presente o representante da OAB, indicado pela diretoria do Conselho Seccional ou Subseção onde ocorre o fato, independente se o advogado tenha sua inscrição principal nela. Tal presença de representante da OAB foi discutida no STF mediante a interposição de uma ADIn, resultando constitucional essa determinação da Lei 8.906/94, ressalvando-se que a prisão em flagrante será considerada valida se a OAB não enviar representante em tempo hábil.

Em todas as hipóteses em que deva ser legalmente preso, pelo cometimento de crimes comuns, inclusive os não relacionados com o exercício da profissão, e enquanto não houver decisão transitada em julgado, cabe-lhe o direito a ser recolhido à sala de Estado Maior. Por esta deve ser entendida toda sala utilizada para ocupação ou detenção eventual dos oficiais integrantes do quartel militar respectivo. [43]

Essas salas devem dispor de instalações condignas. Não havendo salas com as características previstas em lei, fica o advogado em prisão domiciliar até o trânsito em julgado do processo criminal. Todavia, a expressão "assim reconhecidas pela OAB", que faz alusão às instalações das salas de Estado Maior, contida no inciso V do artigo 7º do EAOAB, foi alvo de uma ADIn. "Na medida liminar concedida pelo STF o reconhecimento das instalações da sala deve ser feito a critério do juízo competente e não da Ordem dos Advogados do Brasil", [44] cabendo a esta instituição ou ao próprio advogado demonstrar em juízo que a sala não possui as instalações condignas exigidas pela legislação.

Segundo disposição contida na Lei nº 8.906/94, artigo 7º, inciso VI, o advogado pode ingressar livremente nos órgãos judiciários e locais públicos a fim de exercer sua atividade profissional, podendo, também, ter livre acesso a locais onde ocorram assembléias ou reuniões em que interesse legítimo de seu cliente possa ser atingido. Então, o advogado pode ingressar livremente nos locais públicos onde a sua atividade assim exija e também em locais onde os interesses de seu cliente estejam sendo alvo de reunião ou assembléia. "O advogado exerce serviço público e não pode ser impedido de ingressar livremente nos locais onde deva atuar". [45] Pode, portanto, adentrar nas repartições públicas em seu horário de funcionamento. No caso de prisões e delegacias, pode ingressar, inclusive, após o horário de funcionamento. Qualquer medida que impeça ou condicione o ingresso do advogado, nos limites legais estabelecidos, caracteriza ilegalidade e abuso de poder.

Uma vez que exerce atividade independente e não havendo hierarquia entre o advogado e as autoridades públicas, como os magistrados, pode, aquele profissional, permanecer sentado ou em pé ou retirar-se de qualquer dependência quando desejar, não podendo lhe ser determinado o local que deva ocupar, caso isto importe desprestígio para sua classe profissional ou imposição arbitrária. O advogado pode, também, dirigir-se diretamente ao magistrado nos locais de trabalho do mesmo, independente de prévio horário marcado, cabendo ao primeiro respeitar a ordem de chegada.

A liberdade da palavra do advogado nas sessões e audiências judiciárias é um dos mais importantes e insubstituíveis meios de sua atuação profissional. [...] A participação oral dos advogados nos tribunais e órgãos colegiados contribuem decisivamente para o esclarecimento e convicção dos julgadores. [46]

Assim sendo, garantido é ao advogado sustentar oralmente as razões de qualquer recurso ou processo, nas sessões de julgamento, após o voto do relator, possibilitando contra-argumentar aquilo que seja desfavorável a seu cliente. Entretanto, o STF concedeu liminar e manteve a sustentação do advogado antes do voto do relator. Esse direito do advogado pode ser exercido em instância judicial e administrativa.

O advogado também pode fazer uso da palavra, pela ordem, em qualquer juízo ou tribunal, de maneira rápida e objetiva, para esclarecer questões relativas a fatos, documentos e afirmações que influam no julgamento, em decorrência do seu dever de vigilância durante o mesmo, podendo manifestar-se, também, quando sofrer acusações ou qualquer outra forma de censura. Trata-se de intervenção extraordinária, ao contrário da intervenção ordinária prevista no inciso IX do art. 7º do EAOAB. É prerrogativa do advogado, ainda no que tange ao uso da palavra para esclarecimentos e reclamações, protestar contra a inobservância de preceito de lei, regulamento ou regimento, por escrito ou verbalmente, perante qualquer juízo, tribunal ou autoridade, podendo fazê-lo sentado ou em pé, pois o inciso XII do supracitado artigo lhe confere o direito de falar sentado ou em pé em juízo, tribunal ou órgão de deliberação coletiva da Administração Pública ou do Poder Legislativo.

Os incisos XIII, XIV, XV e XVI do art. 7° do Estatuto trazem a prerrogativa do advogado examinar autos, findos ou em andamento, mesmo sem procuração, quando não estiverem sujeitos ao segredo de justiça, podendo extrair cópias e tomar apontamentos, ter vista e retirar processos das repartições competentes pelo prazo previsto em lei. Porém, há casos que o direito de retirar autos do cartório não pode ser exercido. Assim o é quando existem documentos originais de difícil restauração ou qualquer outra circunstância relevante que justifique a permanência dos autos no cartório e também quando o advogado deixa de devolver os autos no prazo determinado, não mais podendo fazer nova retirada.

Outro direito do advogado é o desagravo público, ou seja, toda vez que for comprovadamente ofendido em razão de seu exercício profissional ou de cargo ou função da OAB, cabe-lhe a prerrogativa de exigir retratação pública. O desagravo é uma forma de garantir direitos e prerrogativas da classe dos advogados, podendo ocorrer mesmo sem a anuência do ofendido, sendo promovido pelo Conselho Seccional competente. Trata-se de uma sessão solene. Entretanto, "o desagravo público deve ser aprovado, com parcimônia e moderação, para assegurar sua força simbólica e ética, sem risco de banalizá-lo". [47]

Os advogados inscritos nos quadros da OAB podem usar de símbolos privativos da profissão, mas os símbolos do Conselho Federal e do Conselho Seccional são privativos desses órgãos, não podendo ser utilizado em caráter particular pelo advogado.

O inciso XIX do art. 7° do Estatuto assegura ao advogado a recusa de depor como testemunha em processo no qual funcionou ou deva funcionar, ou sobre fato relacionado com pessoas de quem seja ou foi advogado, mesmo quando autorizado ou solicitado pelo constituinte, resguardando com isso a sua independência e o sigilo profissional. Todavia, o sigilo profissional pode ser quebrado quando o advogado necessitar defender-se, seja quando afrontado pelo próprio cliente ou em outras situações indispensáveis, mas sempre no restrito interesse da causa.

Por fim, resguarda-se ao advogado o direito de retirar-se do recinto onde esteja aguardando pregão para ato judicial, mediante comunicação protocolizada em juízo, quando o magistrado se atrasar por mais de trinta minutos do horário designado, não se aplicando essa regra quando o juiz estiver presente e o retardamento se der em virtude de atrasos ou prolongamentos de audiências anteriores.

2.3 Os deveres do advogado

O Estatuto traz um capítulo que dispõe, do artigo 31 ao 33, sobre a ética do advogado. "Nesse capítulo, o Estatuto estabelece regras deontológicas referentes à conduta pessoal do advogado e ao seu dever para com a classe, devendo proceder de forma a torna-se merecedor de respeito e contribuir para com o prestígio da classe e da advocacia". [48]

A ética profissional, nessa sede, é denominada "deontologia jurídica", ou estudo dos deveres dos profissionais do direito, em especial do advogado, cujo exercício profissional é rigidamente preso a deveres éticos. Assim, este capítulo do EAOAB, dispondo sobre a ética do advogado, nos remete ao estudo dos deveres desse profissional no exercício de sua atividade.

O Estatuto estabelece, nos supracitados artigos, princípios gerais de ética do advogado, ficando a cargo do Código de Ética e Disciplina a regulamentação aprofundada sobre a matéria. Os deveres éticos devem ser respeitados e cumpridos pelos advogados, não sendo recomendações cuja observação, por parte daquele profissional, é facultativa.

Os deveres éticos consignados no Código não são recomendações de bom comportamento, mas normas jurídicas dotadas de obrigatoriedade que devem ser cumpridas com rigor, sob pena de cometimento de infração disciplinar punível com censura (art. 36 do Estatuto) se outra mais grave não for aplicável. [49]

A primeira disposição do Estatuto sobre o dever ético do advogado diz respeito à sua conduta pessoal, devendo proceder e se relacionar com todos sempre com respeito, pois seu comportamento na sociedade, em todos os momentos, deve ser compatível com a grandeza de sua profissão, de modo a contribuir com o prestígio da classe dos advogados e com a atividade de advocacia.

Importante ressaltar que, de todas as virtudes éticas que o advogado pode ter, as mais importantes são a probidade e a honestidade, sendo esta última o valor máximo da advocacia, uma vez que o advogado, no exercício de sua profissão, trabalha com interesses econômicos de seus clientes, lidando, muitas vezes, com situações tentadoras, as quais podem desvirtuar o profissional e denegrir a imagem de toda a classe de advogados se a honestidade não prevalecer sobre a tentação. "O advogado não deve apenas parecer honesto, mas ser honesto, como imperativo interior de conduta". [50]

Além da probidade, da honestidade e de tantas outras virtudes que o advogado deve observar, impõe-se a esse profissional os deveres de decoro, urbanidade e polidez, devendo agir sempre de modo respeitoso com todos, inclusive com a parte contrária em uma demanda, para que possa exigir respeito e obter prestígio. Há, ainda, o dever de permanente qualificação, para que possa desenvolver seu mister de forma correta e satisfatória, não gerando prejuízo a seu cliente.

Os parágrafos do artigo 31 do EAOAB ressaltam a importância de o advogado manter sua independência em qualquer circunstância, não devendo temer desagradar magistrados ou qualquer outra autoridade no exercício de seu labor, nem mesmo ter receio de se tornar impopular.

É princípio básico para o pleno exercício profissional da advocacia a independência profissional em qualquer circunstância. Não deve o advogado, no exercício de sua profissão, recear de modo algum desagradar a magistrado ou a qualquer outra autoridade, nem incorrer em impopularidade. [51]

Ainda sobre a independência do advogado e a ética desse profissional no exercício de sua atividade, tem-se a lição de Paulo Lôbo:

A independência do advogado é condição necessária para o regular funcionamento do Estado de Direito.

[...]

A ética do advogado é a ética da parcialidade, ao contrário da ética do juiz, que é da isenção. Contudo, não pode o advogado cobrir com o manto ético qualquer interesse do cliente, cabendo-lhe recusar o patrocínio que viole sua independência ou a ética profissional. [52]

Se de um lado são reconhecidas a liberdade e a independência ao advogado no exercício de sua atividade, por outro lhe é imposta a responsabilidade pelos atos danosos que praticar com dolo ou culpa em seu mister. Essa responsabilidade, pela qual responde o advogado que pratica um ato lesivo, pode ser administrativa, civil e até mesmo penal.

As normas fundamentais que regem a responsabilidade civil do advogado são:

I – o artigo 133 da Constituição Federal, que estabelece a inviolabilidade do advogado por seu atos e manifestações no exercício de sua profissão;

II – o artigo 927 do Código Civil, que dispõe sobre a responsabilidade civil subjetiva, e os artigos 186 e 187 do mesmo diploma legal, os quais disciplinam o que vem a ser ato ilícito, um dos pressupostos da responsabilidade civil subjetiva;

III – o artigo 32 da Lei n° 8.906/94 (Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil), que responsabiliza o advogado pelos atos que, no exercício de sua profissão, praticar com culpa ou dolo; e

IV – o artigo 14, § 4º, do Código de Defesa do Consumidor, o qual estabelece uma exceção ao sistema de responsabilidade civil objetiva, predominante naquele diploma, nas relações de consumo dos fornecedores de serviços, devendo ser demonstrada a culpa ou o dolo do profissional liberal (advogado) para que possa ser responsabilizado pelo ato lesivo.

Assim, a responsabilidade civil do advogado está assentada em alguns elementos, sendo eles: a conduta (ativa ou omissiva), o dano material ou moral, o nexo de causalidade entre o ato e o dano, a culpa ou o dolo do advogado e a imputação da responsabilidade civil ao advogado.

O art. 32 do Estatuto, como dito anteriormente, é o que trata da responsabilidade civil do advogado nessa legislação. Em seu parágrafo único, o mesmo dispõe acerca da lide temerária, atribuindo responsabilidade solidária entre o advogado e o cliente quando se unem para lesar a parte contrária.

Ocorre a lide temerária quando o advogado coligar-se com o cliente para lesar a parte contrária, sendo solidariamente responsável pelos danos que causar. A lide temerária funciona como meio indevido de pressão e intimidação, estando destituída de qualquer fundamento legal, consistindo em instrumentalização abusiva do acesso à justiça, para fins impróprios ou ilícitos. [53]

A responsabilidade civil do advogado pela prática de lide temerária deve ser apurada em ação própria na justiça comum, independentemente da origem daquela. É necessário provar o dolo do advogado em aliar-se ao seu cliente para lesar a parte contrária, não se presumindo a lide temerária, a qual pode ocorrer pela inexperiência ou até mesmo pela simples culpa do advogado.

Sobre o assunto, limita-se a expor esses breves comentários, visto ser a responsabilidade civil do advogado o objeto de estudo central deste trabalho, o qual será examinado em seus pormenores no próximo capítulo.

O artigo 33 do EAOAB estabelece que o advogado obriga-se a cumprir as disposições do Código de Ética e Disciplina, diploma este que, como o próprio nome deixa claro, impõe regras deontológicas ao advogado, ou seja, estabelece os deveres do mesmo ao exercer sua atividade profissional, balizando a conduta do advogado dentro dos parâmetros da ética, da moralidade, da probidade, da honestidade, enfim, traçando o caminho ético que o profissional da advocacia tem a obrigação de trilhar quando realiza sua atividade. Estas regras deontológicas se fazem necessárias, uma vez que, infelizmente, muitos são os profissionais que se desvirtuam do fim precípuo da advocacia, não tendo postura nem conduta ética, resultando no desgaste da imagem e do prestígio de toda a classe de advogados, andando na contramão da importância dessa atividade, pois o advogado é indispensável à administração da justiça e, por esse motivo, deve manter-se íntegro em seu mister para ser merecedor da confiança, da credibilidade e da aceitação popular.

O Estatuto, então, não dispôs sobre as regras éticas de conduta do advogado, deixando essa matéria para o Código de Ética e Disciplina, de forma a evidenciar essas regras deontológicas.

O Estatuto evitou a duplicidade de tratamento legal dos deveres éticos, remetendo-os inteiramente ao novo Código de Ética e Disciplina, editado pelo Conselho Federal da OAB. A duplicidade de tratamentos dos deveres éticos, havida entre o anterior Estatuto e o Código, foi a principal razão para o quase desconhecimento do antigo Código de Ética Profissional no seio dos advogados, com parca aplicação pela própria OAB. [54]

O Código de Ética e Disciplina, além de dispor sobre os deveres éticos do advogado, estabelece normas gerais sobre o procedimento disciplinar na OAB para as infrações que o advogado cometa e que caibam reprimendas administrativas, cuja competência para assim proceder é da OAB, sendo o órgão responsável pelo julgamento dessas infrações punidas administrativamente o Tribunal de Ética e Disciplina, instalado em todos os Conselhos Seccionais.

2.4 A inscrição do bacharel junto à Ordem dos Advogados do Brasil

Já fora mencionado anteriormente que os cursos jurídicos não formam advogados, mas sim bacharéis em Direito. Num momento seguinte, expôs-se os direitos reconhecidos a essa classe profissional e, na seqüência, os deveres da mesma. Entretanto, para ser reconhecido como advogado e poder avocar essas prerrogativas no exercício de sua atividade e dever cumprir as normas deontológicas estabelecidas, o bacharel precisa estar inscrito junto ao Conselho Seccional da OAB em que pretende estabelecer seu domicílio profissional. É sobre esta inscrição que se passa a tratar.

No Brasil, para que o bacharel possa atuar no exercício da advocacia, é preciso inscrição na OAB e essa deve ser realizada no Conselho Seccional (Estado) onde pretende estabelecer seu domicilio profissional. A inscrição visa selecionar os graduados em Direito, evitando-se que pessoas despreparadas adentrem o mercado de trabalho sem o mínimo necessário de condições para atuar nesse ramo profissional. Tenta-se amenizar, desta forma, o desgaste que sofre a imagem dos advogados e da instituição da OAB quando pessoas não capacitadas exercem esse mister, imagem essa que já foi e ainda é abalada demasiadamente em função do desvio de caráter de alguns desses profissionais, deixando, muitas vezes, um sentimento de desconfiança e receio, por parte da sociedade, pairando no ar, prejudicando os dignos e capacitados advogados que laboram em prol do fim precípuo dessa profissão, manchando a reputação de toda uma instituição que trabalha para manter viva a dignidade, o valor e o respeito dessa classe profissional.

Assim, para se inscrever nos quadros da OAB, certos requisitos são exigidos, conforme dispõe o art. 8° do Estatuto. São eles: a capacidade civil, ser graduado em curso de Direito devidamente reconhecido, encontrar-se em situação regular com o serviço militar obrigatório (se do sexo masculino), estar com o título de eleitor em situação regular, ter sido aprovado em exame da Ordem (regulamentado por Provimento do Conselho Federal da OAB), não exercer atividade incompatível com a advocacia, ter idoneidade moral e prestar compromisso solene perante o Conselho Seccional. No caso de estrangeiro ou de brasileiro que tenha se graduado em curso de Direito fora do país, para inscrever-se na OAB deve fazer prova do referido título, devidamente revalidado, além de atender aos demais requisitos supracitados.

A capacidade civil exigida prova-se com documento de identidade (registro geral ou certidão de nascimento), devendo ser maior de 18 anos o interessado na inscrição, pois a maioridade presume a capacidade civil plena. Obviamente, os casos de incapacidade absoluta ou relativa previstos na legislação civil impedem o direito a inscrever-se, visto que nesses casos a capacidade civil não é plena. Por fim, segundo estatui o CC, a graduação universitária é causa de maioridade civil e, nesses casos, o diploma do menor de 18 anos é prova da capacidade civil, cumprindo esse requisito para a inscrição junto a OAB.

O candidato à inscrição na OAB deve comprovar sua graduação com diploma ou certidão expedida pelo órgão responsável pela emissão do diploma, suprindo este na sua falta ou demora em ser emitido. O Regimento Geral determina que se a prova da graduação for feita mediante certidão, anexa a mesma deverá estar o histórico escolar, para que fique comprovado o cumprimento da carga horária e do conteúdo do curso. A instituição de ensino deve estar autorizada a funcionar e, após referida autorização e durante o seu funcionamento regular, deve ser reconhecida pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC) e pelo Conselho Estadual de Educação competente, quando se tratar de instituição mantida com recursos públicos estaduais ou municipais.

O terceiro requisito é a regularidade eleitoral e militar (para o sexo masculino).

Na seqüência, exige-se a aprovação em exame da Ordem, para aferir conhecimentos básicos e de prática profissional do bacharel em direito que deseja exercer a advocacia, sendo atribuição da OAB essa seleção.

O exame é composto por duas provas. A primeira é objetiva, onde se avaliam conhecimentos jurídicos gerais, relacionados às disciplinas curriculares estabelecidas pelo Conselho Nacional de Educação, as quais todos os cursos jurídicos devem observar ao constituírem seus currículos plenos. A segunda prova é prático-profissional, submetendo-se, o candidato, à elaboração de uma peça processual na área que escolher, dentre as previstas para ao exame (direito constitucional, direito civil, direito penal, direito empresarial, direito do trabalho, direito tributário ou direito administrativo, além do correspondente direito processual). A nota mínima exigida na primeira prova equivale ao acerto de cinqüenta por cento das questões objetivas e, atingindo esse requisito, terá o direito de realizar a prova prático-profissional.

Quanto ao local onde pode realizar o exame e, conseqüentemente, obter sua inscrição, tem-se que o interessado presta o exame perante o Conselho Seccional onde concluiu o curso jurídico ou no local de seu domicílio eleitoral. Isto acontece em função de ainda não ser unificado o exame da Ordem, sendo as questões formuladas pela banca examinadora designada por cada Conselho Seccional. Portanto, as avaliações são diferentes umas das outras entre os Estados brasileiros. Frente a isto, o que se pretende com essa limitação do local onde é possível prestar o exame é coibir que os bacharéis acabem, em sua maioria, realizando a prova em locais onde as avaliações são menos rigorosas somente para obter sua inscrição, vindo, posteriormente, a exercer seu labor no local onde concluiu o curso ou onde reside.

Apenas podem prestar o Exame da Ordem aqueles que já estiverem graduados à época da prova, não sendo permitido aos estudantes do curso de Direito fazê-lo. Não tendo o diploma em mãos, poderá realizar o exame comprovando sua graduação mediante certidão, conforme anteriormente explicado.

O bacharel que exercer funções incompatíveis com a advocacia pode realizar o exame de Ordem, sendo que sua certidão de aprovação vale por tempo indeterminado, podendo ser utilizada no pedido de inscrição, após sua desincompatibilização.

O Exame de Ordem é compatível com o princípio de liberdade de profissão, estabelecido no art. 5°, inciso XIII, da CF. O texto constitucional dispõe que o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão é livre, desde que atendidas as qualificações profissionais exigidas em lei. A seleção feita pelo Exame de Ordem é a demonstração da qualificação profissional, sendo o Estatuto a lei que a estabelece. A Constituição Federal não tutela a liberdade profissional daquele que, sem qualificação, pretende exercer uma atividade, mas antes visa garantir o livre exercício profissional daquele que cumpre os requisitos estabelecidos em lei para exercer seu labor, sem por em risco as pessoas que são beneficiadas por sua atuação, pois do contrário não haveriam beneficiados e sim prejudicados pela atuação do profissional desqualificado.

A XVI Conferência Nacional dos Advogados, de 1996, aprovou a recomendação de uniformização da prova objetiva para todo o território nacional, mantendo-se a elaboração e correção das provas prático-profissionais a critério dos Conselhos Seccionais. Todavia, essa recomendação não foi colocada em prática até o presente momento.

Ainda quanto ao mesmo assunto, ressalta-se, por fim, que "o Exame de Ordem [...] não avalia o curso, nem mesmo o estudante, mas tão-somente constitui modo de seleção para o exercício da profissão de advogado, uma entre tantas que o bacharel em direito pode escolher". [55]

Após esse parêntese aberto para comentários acerca do Exame de Ordem, volta-se aos requisitos para a inscrição na OAB.

Outro requisito exigido é não exercer atividade incompatível com a advocacia. As atividades que geram incompatibilidade ou impedimento estão enumeradas no art. 29 do EAOAB, devendo o interessado na inscrição declarar não exercer nenhuma dessas atividades, assumindo as conseqüências dessa declaração, inclusive as penais. Caso a declaração não seja verdadeira, a inscrição será cancelada, além das sanções administrativas, civis e penais cominadas. Os atos praticados pelo falso advogado são nulos e não podem ser convalidados.

A idoneidade moral é outro requisito para a inscrição. Seu conceito é indeterminado, mas determinável. Os parâmetros não são subjetivos. São incompatíveis com a idoneidade moral, por exemplo, os comportamentos do interessado que contaminem sua atividade profissional e desprestigie a advocacia, a demissão de servidor a bem do serviço público, a condenação por crime infamante que atinge a reputação de toda uma classe profissional, entre outras hipóteses. A inidoneidade moral para encontrar-se inscrito pode ser declarada mediante decisão do Conselho com no mínimo dois terços dos votos de todos que compõem o mesmo, assegurado ao interessado o direito de defesa amplo. Esse processo é de natureza administrativa, não se subordinando a eventual pena criminal. Havendo processo judicial contra o interessado, mesmo que não haja decisão transitada em julgado, pode ficar caracterizada a inidoneidade moral, podendo ser negada a inscrição se os fatos forem suficientes para configurá-la. De qualquer forma, após a reabilitação judicial deferida, está desimpedido para inscrever-se.

O último requisito para a inscrição é a prestação de compromisso solene perante o Conselho. Não se trata de mera formalidade que pode ser dispensada, sendo um elemento que integra a inscrição, a qual é considerada nula se o compromisso não for devidamente consignado em ata do Conselho. O compromisso é personalíssimo e indelegável, mesmo que por procuração. O Regulamento Geral, em seu art. 20, regula os termos do compromisso.

O advogado terá sua inscrição principal promovida pelo Conselho Seccional, no território onde o advogado declarar ter seu domicílio profissional. "Esse domicílio, que abrange o território do respectivo Estado-membro ou Distrito Federal, é de livre escolha do interessado, e não se vincula ao Conselho Seccional onde se localize o curso jurídico que lhe graduou ou onde prestou o Exame de Ordem". [56] Essa declaração do advogado deverá ser verdadeira, sob pena de constituir fraude à lei e acarretar, por conseqüência, as sanções legais. Na dúvida em onde declarar o domicílio, visto a pluralidade de centros de atividades, a lei presume ser o domicílio da pessoa física, o advogado, o local onde deva ter a inscrição principal.

O advogado pode exercer sua atividade fora da sede principal (Estado-membro) sem necessidade de inscrever-se em outro Conselho Seccional, porém em número limitado de causas (cinco causas por ano). Excedendo esse limite, o advogado é obrigado a promover sua inscrição suplementar nos Conselhos Seccionais onde atue, pois estará caracterizada a habitualidade de sua atuação em Conselhos onde não possui a inscrição principal.

Caso o advogado mude seu domicílio profissional para outra unidade da Federação, deverá requerer a transferência de sua inscrição para o Conselho Seccional correspondente. O pedido de inscrição suplementar e de transferência não podem ser negados pelo Conselho que o receber, em virtude do princípio da igualdade federativa dos Conselhos Seccionais.

Havendo vício ou ilegalidade na inscrição principal, suspende-se a tramitação do pedido de transferência ou de inscrição suplementar, devendo o fato ser representado ao Conselho Federal, o qual decidirá sobre a validade da inscrição principal.

A lei prevê hipóteses em que o advogado, por ato voluntário, pode e os casos em que deve licenciar-se, sendo, no período de seu licenciamento, desobrigado a pagar as anuidades. A licença pode ocorrer nas hipóteses em que o próprio advogado requer, com justificativa da pretensão, quando vier a exercer atividade incompatível com a advocacia por período temporário e quando sofrer doença mental curável.

O Estatuto regula ainda, em numerus clausus, as hipóteses de cancelamento da inscrição. O cancelamento é ato desconstitutivo, atingindo de forma definitiva a inscrição, desaparecendo o número de inscrição do advogado na OAB. O cancelamento pode ocorrer a pedido do advogado, quando for aplicada a pena máxima de exclusão, por falecimento do advogado, quando vier a exercer atividade incompatível com a advocacia em caráter definitivo, por perda de qualquer dos requisitos para a inscrição, quando for suspenso, pela terceira vez, pelo não-pagamento de anuidades distintas.

A carteira e o cartão emitidos pela OAB aos advogados devidamente inscritos constitui prova de identidade civil para todos os fins legais e não apenas para a atividade profissional. Os documentos assinados por advogado, no seu exercício profissional, devem conter a indicação do nome e do número de inscrição junto à OAB.

2.5 A sociedade de advogados

Outro aspecto do exercício da advocacia a ser analisado é a sociedade de advogados, que é regida, no Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil, pelos artigos 15 a 17, também merecendo tratamento do Regulamento Geral e do Código de Ética e Disciplina, no que couber. Neste trabalho, limita-se a fazer uma analise sucinta sobre o tema proposto, apenas para se obter um esclarecimento superficial sobre a advocacia exercida em sociedade.

Os advogados podem reunir-se em sociedade civil de prestação de serviços de advocacia, regularmente registrada no Conselho Seccional em cuja base territorial tiver sede. A sociedade caracteriza-se pela prática exclusiva da advocacia, não podendo exercer qualquer outra, com finalidade lucrativa ou não. Não podem, ainda, funcionar as sociedades que apresentem forma ou características mercantis e que adotem denominação fantasia, que realizem atividades estranhas à advocacia e que incluam sócio não inscrito ou totalmente proibido de advogar [...]. [57]

O registro das sociedades de advogados não pode ser feito em juntas comerciais e nem em cartórios de registro civil das pessoas jurídicas. Deve ser feito junto ao Conselho Seccional onde tiver sede. Após ter o registro de seus atos constitutivos aprovado, a sociedade adquire personalidade jurídica.

A razão social deve conter o nome de pelo menos um advogado responsável pela sociedade, de forma completa ou resumida, ou ainda seu sobrenome, podendo constar, também, o nome de mais de um e até mesmo de advogado sócio. Se, no ato constitutivo, houver previsão, há a possibilidade de se manter o nome de sócio falecido na razão social da sociedade.

Mesmo fazendo parte de uma sociedade, a atuação dos advogados é individual, devendo, as procurações, serem outorgadas de forma individual ao advogado que patrocina a causa, fazendo menção à sociedade da qual faz parte. Mesmo frente à referida individualidade, não é permitido que advogados de uma mesma sociedade representem, em juízo, clientes com interesses opostos.

As sociedades de advogados podem estabelecer filiais no território do mesmo ou de outro Conselho Seccional a que pertencem, devendo proceder à averbação do ato constitutivo no registro da sociedade e arquivado junto ao Conselho Seccional onde se instalar, cabendo aos sócios a inscrição suplementar. Ao advogado fica defeso fazer parte de mais de uma sociedade com sede ou filial na mesma área territorial do respectivo Conselho.

Além da sociedade, quando a mesma não tiver condições de arcar com a responsabilidade, o sócio responde subsidiária e ilimitadamente pelos danos e prejuízos causados aos clientes no exercício da atividade advocatícia, de forma dolosa ou culposa, por ação ou omissão. Essa responsabilidade não afasta a responsabilidade disciplinar em que possa incorrer por não ter zelado pela sociedade.

O advogado que passar a exercer atividade incompatível com a advocacia deverá solicitar o seu licenciamento, o qual deve ser averbado no registro da sociedade, que não sofre alteração em sua constituição. Mas se o caso for de cancelamento da inscrição, deverá ser excluído do quadro societário, alterando a constituição da sociedade.

2.6 O advogado empregado

Analisam-se, neste momento, alguns aspectos da atuação do advogado como empregado, sendo, ao tema, dedicado um capítulo pelo EAOAB, nos artigos 18 a 21, visto a grande quantidade de profissionais que se subordinam a um vínculo empregatício no país, não podendo ficar sem tutela legal os advogados que assim exercem seu mister.

Nessa relação de emprego, a legislação trabalhista aparece como supletiva da Lei n° 8.906/94 – EAOAB -, uma vez que o Estatuto é lei especial, derrogando lei geral. Os pressupostos dessa relação empregatícia são os mesmos do direito trabalhista comum.

O advogado que se encontra nessas condições mantém sua isenção técnica e sua independência, ou seja, o advogado preserva sua total autonomia no que tange ao modo de proceder em seus atos, meios utilizados, cumprimento de prazos e respeito às técnicas corretas, não sofrendo interferência do empregador e, no que tange à independência, tem-se que essa continua a ser absoluta, não sofrendo restrições frente à existência de uma relação empregatícia, pois sem essa independência profissional, não há advocacia. Quem decide se um ato será praticado é empregador, mas a sua realização é ato do advogado, que deve proceder de acordo com suas convicções e seus conhecimentos, sendo legítima a recusa de patrocínio de causas concernentes à lei ou direito cujas conseqüências lhe sejam aplicáveis de modo favorável ou desfavorável ou de qualquer pretensão do empregador que contrarie orientação sua manifestada anteriormente, sendo essa a disposição do Código de Ética e Disciplina.

A Lei n° 9.527/97 dispôs que as normas protetivas do advogado empregado não se aplicam aos advogados públicos (da administração pública direta, autárquica e fundacional da União, dos Estados e dos Municípios). O Conselho Federal da OAB, então, propôs uma ADIn alegando afronta ao princípio constitucional da igualdade, entendendo, o STF, que as empresas públicas e as sociedades de economia mista que explorem atividade econômica em sentido estrito, sem monopólio, estão sujeitas ao regime próprio das empresas privadas, sendo aplicáveis os artigos 18 a 21 do EAOAB quanto aos seus advogados empregados.

Os atos dos advogados empregados, ou seja, o serviços por eles prestados, são exclusivamente realizados em decorrência da relação de emprego e não do interesse pessoal do empregador. Esse, se necessitar de serviços de advocacia para defesa de interesses que não sejam empresariais e quiser que o patrocínio seja do advogado empregado, deverá pagar a esse último os honorários habituais, que não se confundem com a remuneração ordinária que recebe em sua relação empregatícia com a empresa.

Uma questão tormentosa e de difícil solução é o salário mínimo profissional do advogado. Resultou, no Estatuto, uma gradação de competência para fixar o salário mínimo do advogado empregado, aplicando a posterior na falta da anterior. Assim, é fixado por convenção coletiva do trabalho. Não havendo convenção coletiva ou acordo coletivo, prevalece o acordo individual. Não havendo esse último também, o salário mínimo é fixado por sentença normativa da Justiça do Trabalho em decorrência de dissídio instaurado entre o empregador e os advogados empregados.

A jornada de trabalho diária do advogado empregado será de quatro horas contínuas e de vinte horas semanais, não podendo ser excedida, salvo se houver acordo ou convenção coletiva estabelecendo de modo diverso, ou ainda em caso de dedicação exclusiva do advogado, podendo ser alterada, então, a jornada de trabalho. O período de trabalho é considerado como o tempo em que o advogado encontra-se à disposição do empregador. As horas que excederem a jornada normal de trabalho deverão ser acrescidas de hora extra e até mesmo como trabalho noturno.

Por dedicação exclusiva entende-se o regime de trabalho que for expressamente previsto no contrato individual de trabalho, sendo remuneradas como extraordinárias as horas trabalhadas que excederem a jornada normal de oito horas diárias, por um adicional não inferior a cem por cento sobre o valor da hora normal.

[...]

[...] eventualmente, as horas de serviço prestadas pelo advogado no período das vinte horas de um dia até às cinco horas do dia seguinte serão remuneradas como noturnas, acrescidas de adicional de vinte e cinco por cento. [58]

Nas causas em que for parte o empregador, o advogado empregado terá direito aos honorários de sucumbência, sendo qualquer disposição em contrário nula. Entretanto, o STF suspendeu a validade desse dispositivo, considerando legais os acordos feitos entre o advogado e o empregador no sentido de renunciar aos honorários de sucumbência em favor desse último. Em se tratando de advogado empregado em sociedade, o referidos honorários deverão ser partilhados entre o mesmo e a sociedade, da forma que acordarem. Os defensores públicos não poderão receber honorários de sucumbência e os advogados públicos somente poderão recebê-los quando a legislação específica assim o permitir.

2.7 Os honorários advocatícios

"Honorários advocatícios é a remuneração do profissional pela prestação de serviços advocatícios ao cliente". [59]

O Estatuto dispõe em seus artigos 22 a 26 sobre os honorários advocatícios, aos quais o advogado faz jus pela prestação de serviços que realiza ao patrocinar uma causa, cabendo a esse profissional fixar o valor de seu mister, obedecendo aos limites estabelecidos pela legislação.

O exercício da advocacia é considerado prestação de serviços, devendo o advogado fixar livremente sua remuneração pelo serviço prestado. Entretanto, devem observar os critérios e limites de moderação previstos no Código de Ética e Disciplina e nas tabelas de honorários estabelecidas pelos Conselhos Seccionais. [60]

A assistência judiciária gratuita é dever do Estado, ficando a cargo da defensoria pública. Nos Estados onde não houver a referida assistência judiciária, os advogados poderão ser indicados para patrocinar as causas de pessoas necessitadas que não disponham de recursos financeiros para arcar com as despesas processuais e advocatícias, tendo os honorários fixados pelo magistrado, os quais devem ser pagos pelo Estado.

Existem alguns critérios que os advogados devem observar na fixação dos honorários, os quais são encontrados no artigo 36 do Código de Ética e Disciplina. São eles: moderação, bom senso, prestígio profissional, qualificação, reputação, valor da causa, condição econômica dos clientes, entre outros.

Os honorários podem ser classificados em três espécies. Eles podem ser convencionados, quando acordados por escrito com o cliente. Podem ser, também, arbitrados judicialmente, quando fixados judicialmente, na inexistência de acordo ou pela ocorrência de desentendimento entre o advogado e o cliente. E há os honorários de sucumbência, que são fixados em sentença em favor da parte, pertencendo ao advogado.

Se não houver estipulação em contrário, os honorários devem ser pagos na quantia de um terço logo no início da prestação de serviços, um terço na decisão de primeira instância e o restante no final da ação.

Frente à impossibilidade de o cliente arcar com as despesas de um processo, pode, excepcionalmente, ficar estabelecido em contato de honorários o pacto quota litis, ou seja, no eventual sucesso da causa, o advogado obtém participação em pecúnia sobre o montante da mesma, sendo permitido o pagamento de honorários com bens do cliente apenas em situações excepcionais. Mas o advogado não pode obter vantagem excessiva em relação ao cliente, pois ocorre enriquecimento ilícito, cometendo infração ética o advogado que assim proceder. Desta forma, todo o montante de honorários que o advogado receber não pode ser maior que a vantagem do cliente.

Os honorários advocatícios, quer acordados entre advogado e cliente, quer arbitrados judicialmente ou ainda de sucumbência, constituem crédito privilegiado em favor do advogado, podendo ser promovida a execução desse crédito nos mesmos autos em que o advogado tenha atuado, sendo, portanto, um título executivo.

Quanto aos honorários de sucumbência, tem-se que "receber os honorários relativos à sucumbência é direito do advogado", [61] entendendo, o STF, que é permitida a livre estipulação entre o advogado e o cliente, o que possibilita ao advogado dispor desses honorários, mediante contrato escrito.

O direito de acionar aquele que deve os honorários advocatícios prescreve em cinco anos, contando o início desse prazo a partir do vencimento do contrato, se houver; quando fixados judicialmente (arbitrados ou de sucumbência), a partir do trânsito em julgado da decisão que os fixar; se vier a ser contratado para a prestação de serviço extrajudicial, o prazo será contado a partir do término do serviço; havendo desistência de uma das partes ou transação, começa-se a contá-lo a partir da homologação; e no caso de renúncia do mandato por parte do advogado ou sua revogação por vontade do cliente, o início do prazo é a data desses fatos.

2.8 As incompatibilidades e os impedimentos

A liberdade de profissão é um direito que toda pessoa detém. Todavia, em decorrência de certas situações, pode acontecer que o exercício de duas ou mais atividades profissionais não seja passível de coexistência, visto haver contrariedade entre elas. No âmbito do exercício da advocacia, são as incompatibilidades (permanentes ou temporárias) e os impedimentos, tratadas pelos artigos 27 a 30 do EAOAB.

Conceitua-se incompatibilidade como a proibição plena do exercício da advocacia, podendo ser ela permanente (cancelamento da inscrição) ou temporária (licenciamento da inscrição).

O impedimento enseja apenas a proibição parcial do exercício profissional do advogado, permitindo-se o seu exercício com certas restrições. Havendo incompatibilidade, o profissional não poderá advogar em nenhuma situação, mesmo em causa própria. [62]

Visto ser a incompatibilidade a proibição absoluta e o impedimento a proibição relativa do exercício da advocacia, passa-se a enumerar as hipóteses de cada uma das espécies, esclarecendo os casos em que o advogado encontra-se totalmente proibido de exercer seu mister e os casos em que pode laborar com certas restrições.

A incompatibilidade, isto é, a proibição total de exercer a advocacia, incide sobre:

I – chefes do Poder Executivo e membros das mesas do Poder Legislativo (e os substitutos legais);

II – membros do Poder Judiciário e demais pessoas que exerçam função de julgamento em órgãos de deliberação coletiva da Administração Pública direta ou indireta, além dos membros do Ministério Público e dos Tribunais de Contas. O STF, em medida liminar, entendeu que o dispositivo não se aplica aos membros da Justiça Eleitoral a aos juizes suplentes não remunerados;

III – ocupantes de cargos ou funções de direção, salvo administração acadêmica, ensino jurídico e aqueles que não detenham poder relevante de decisão;

IV – ocupantes de função ou cargo em qualquer órgão do Poder Judiciário, abrangendo todos os seus auxiliares, bem os que prestam serviços notariais e de registro;

V – ocupantes de cargos vinculados à atividade policial;

VI – os militares que estejam na ativa;

VII – ocupantes de atividades de lançamento, arrecadação e fiscalização tributária;

VIII – qualquer pessoa que exerça função de direção ou gerência em instituições financeiras, sendo elas públicas ou privadas.

Quanto ao tempo de permanência da incompatibilidade, tem-se que essa vige até o afastamento ou desligamento total do advogado, ou sua aposentadoria, exoneração ou demissão do cargo, podendo, então, solicitar nova inscrição. Quanto à possibilidade de Procuradores Gerais, Advogados Gerais, Defensores Públicos e dirigentes de órgãos jurídicos da Administração Pública direta, indireta e fundacional poderem exercer a advocacia, tem-se que são legitimados para o exercício da advocacia, desde que quando vinculada à função que exerçam e durante o tempo de sua investidura.

Os impedimentos, ou seja, a proibição parcial de exercer a advocacia, recaem sobre:

I – servidores da Administração Pública direta, indireta e fundacional, contra a própria Fazenda Pública que os remunere ou à qual a entidade empregadora esteja vinculada;

II – os membros do Poder Legislativo, em seus diferentes níveis contra ou a favor de qualquer pessoa jurídica de direito público, empresas públicas, sociedades de economia mista, fundações públicas, entidades paraestatais ou empresas concessionárias ou permissionárias de serviço público.

2.9 As infrações e as sanções disciplinares

Enquanto as regras deontológicas, ou seja, os deveres éticos impostos aos advogados, são delineações da forma como esse profissional deve atuar, as infrações disciplinares regulamentadas em lei são as condutas que o mesmo deve abster-se de realizar.

Diferentemente dos deveres éticos, que configuram conduta positiva ou comportamento desejado, encartados no Código de Ética, as infrações disciplinares caracterizam-se pela conduta negativa, pelo comportamento indesejado, que devem ser reprimidos. Sob a perspectiva da tradicional classificação das normas, são imperativas as que cuidam dos deveres, e proibitivas as que tratam das infrações disciplinares. [63]

Uma vez que as infrações disciplinares são normas que restringem direito, isto é, restringem o direito de atuação do advogado, balizando seu campo de atuação dentro de limites éticos dessa profissão, são taxativamente indicadas em texto legal (EAOAB), não deixando para o Código de Ética essa missão, visando, com essa tipificação das infrações, a garantia do devido processo legal quando o Estado tiver de usar de seu poder sancionatório contra atos indevidos praticados por advogados. As infrações disciplinares não comportam interpretações extensivas ou analógicas, constituindo-se apenas nas indicadas pelo Estatuto, considerando-se, logicamente, as possíveis indeterminações de conceitos que podem surgir em função da evolução dos comportamentos profissionais, devendo haver uma adaptação às mudanças que, inexoravelmente, acontecem.

As infrações disciplinares são tipificadas no artigo 34 do EAOAB, incluindo, o parágrafo único desse dispositivo, mais três condutas incompatíveis. Essas infrações podem ser agrupadas em três espécies, conforme o nível de gravidade da conduta do advogado, sendo punidas com censura, suspensão e exclusão, além de multa, que é uma sanção disciplinar acessória.

Só os advogados, ou seja, bacharéis inscritos na OAB, cometem infrações disciplinares. Os não inscritos, que atuam como se advogados fossem e cometem tais infrações, sujeitam-se à legislação penal comum, por se tratar de exercício ilegal da profissão.

Para compreensão de cada espécie de sanção disciplinar, toma-se a elucidação de Haroldo Paranhos Cardella sobre as mesmas.

a) censura: é a mais branda das sanções, podendo ser reduzida a uma simples advertência, quando existirem circunstâncias atenuantes (falta cometida na defesa de prerrogativa, ausência de punição disciplinar, exercício assíduo de mandato ou cargo em órgão da OAB e prestação de relevantes serviços à advocacia ou à causa pública);

b) suspensão: é a sanção que impede o exercício profissional em todo o território nacional, podendo ser por prazo determinado (o qual pode variar entre trinta dias e doze meses) e por prazo indeterminado, até que satisfaça a exigência legal. Exemplos: até que salde o débito junto à tesouraria da Ordem, até que seja aprovado em novas provas de habilitação, até que preste contas ao cliente ...;

c) exclusão: é aplicável às condutas infracionais mais graves, tornando o advogado infrator passível de eliminação do quadro de inscritos da OAB. Para a aplicação da medida extrema, entretanto, é imprescindível a votação favorável de dois terços dos membros do Conselho Seccional competente;

d) multa: é a sanção disciplinar de caráter sempre cumulativo, fixada em montante que varia de uma anuidade a no máximo dez vezes esse valor, quando existirem circunstâncias agravantes. Não se admite, contudo, sua aplicação isoladamente. [64]

2.9.1 Infrações disciplinares puníveis com censura

As infrações que forem punidas com censura não podem ser objeto de publicidade. É possível a sua conversão em mera advertência quando estiver presente uma circunstância atenuante, por esta se entendendo "o cometimento de falta disciplinar pelo advogado na defesa de prerrogativa profissional, sendo primário, tendo exercido algum cargo ou função na OAB ou prestado relevantes serviços à advocacia ou a qualquer causa de ordem pública". [65] Essa conversão da censura em advertência tem o efeito de não ficar registrado nos antecedentes (assentamentos) do advogado essa última, ao contrário do que ocorre com a primeira.

Isto posto, tem-se que as infrações passíveis da punição de censura são as condutas previstas no Estatuto, nos incisos I ao XVI e XXIX do art.34, além das violações constantes no Código de Ética e Disciplina. As previstas no EAOAB são:

I – exercer a profissão, quando impedido de fazê-lo, ou facilitar, por qualquer meio, o seu exercício aos não inscritos, proibidos ou impedidos;

II – manter sociedade profissional fora das normas e preceitos estabelecidos no EAOAB;

III – valer-se de agenciador de causas, mediante participação nos honorários a receber;

IV – angariar ou captar causas, com ou sem intervenção de terceiros;

V – assinar qualquer escrito destinado a processo judicial ou para fim extrajudicial que não tenha feito, ou em que não tenha colaborado;

VI – advogar contra literal disposição de lei, presumindo-se a boa-fé quando fundamentado na inconstitucionalidade, na injustiça da lei ou em pronunciamento judicial anterior;

VII – violar, sem justa causa, sigilo profissional;

VIII – estabelecer entendimento com a parte adversa sem autorização do cliente ou ciência do advogado contrário;

IX – prejudicar, por culpa grave, interesse confiado ao seu patrocínio;

X – acarretar, conscientemente, por ato próprio, a anulação ou a nulidade do processo em que funcione;

XI – abandonar a causa sem justo motivo ou antes de decorridos dez dias da comunicação da renúncia;

XII – recusar-se a prestar, sem justo motivo, assistência jurídica, quando nomeado em virtude de impossibilidade de Defensoria Pública;

XIII – fazer publicar na imprensa, desnecessária e habitualmente, alegações forenses ou relativas a causas pendentes;

XIV – deturpar o teor de dispositivo de lei, de citação doutrinária ou de julgado, bem como de depoimentos, documentos e alegações da parte contrária, para confundir o adversário ou iludir o juiz da causa;

XV – fazer, em nome do constituinte, sem autorização escrita deste, imputação a terceiros de fato definido como crime;

XVI – deixar de cumprir, no prazo estabelecido, determinação emanada do órgão ou de autoridade da Ordem, em matéria de competência desta, depois de regularmente notificado;

XXIX – praticar, o estagiário (inscrito na OAB como tal), ato excedente à sua habilitação.

2.9.2 Infrações disciplinares puníveis com suspensão

As infrações punidas com suspensão estão previstas pelo Estatuto no art. 34, incisos XVII a XXV, além de casos de reincidência em qualquer infração disciplinar, sendo elas:

XVII – prestar concurso a clientes ou a terceiros para a realização de ato contrário à lei ou destinado a fraudá-la;

XVIII – solicitar ou receber de constituinte qualquer importância para aplicação ilícita ou desonesta;

XIX – receber valores, da parte contrária ou de terceiro, relacionados com o objeto do mandato, sem expressa autorização do constituinte;

XX – locupletar-se (apropriar-se indevidamente), por qualquer forma, à custa do cliente ou da parte adversa, por si ou por pessoa interposta;

XXI – recusar-se, injustificadamente, a prestar contas ao cliente de quantias recebidas dele ou de terceiros por conta dele;

XXII – reter, abusivamente, ou extraviar autos recebidos com vista ou em confiança;

XXIII – deixar de pagar as contribuições, multas e preços de serviços devidos à OAB, depois de regularmente notificado a fazê-lo;

XXIV – incidir em erros reiterados que evidenciem inépcia profissional;

XXV – manter conduta incompatível com a advocacia.

Quanto ao inciso XXV, o EAOAB menciona, em seu parágrafo único, algumas condutas incompatíveis com a advocacia, sendo elas a prática reiterada de jogo de azar, não autorizado por lei; a incontinência pública e escandalosa e; a embriaguez ou a toxicomania habituais. Porém, as condutas incompatíveis com a advocacia não constituem numerus clausus, devendo ser apreciada a conduta do advogado em cada situação concreta.

2.9.3 Infrações disciplinares puníveis com exclusão

São puníveis com exclusão os advogados que realizarem as infrações previstas nos incisos XXVI, XXVII e XXVIII do art. 34 do Estatuto e também quando lhe forem aplicados a pena de suspensão por três vezes. São elas:

XXVI – fazer falsa prova de qualquer dos requisitos para inscrição na OAB;

XXVII – tornar-se moralmente inidôneo para o exercício da advocacia;

XXVIII – praticar crime infamante.

2.9.4 Reincidência

O advogado que pratica uma infração disciplinar, punível com censura ou suspensão, e posteriormente comete outra, independentemente da forma de punição, lhe é aplicada a punição de suspensão. Assim, a reincidência na prática de qualquer infração disciplinar conduz a suspensão do advogado. Nesse sentido, tem-se o exemplo esclarecedor de Haroldo Paranhos Cardella, onde "(censura + censura = suspensão); (censura + suspensão = suspensão); (suspensão + censura = suspensão)". [66]

Com a suspensão, o advogado encontra-se proibido de exercer sua atividade em todo o território nacional por um prazo que pode variar de trinta dias a doze meses, ou então, conforme o caso, permanecer nessa situação até que pratique determinada conduta, como, por exemplo, prestar contas ao cliente, submeter-se a novas provas de habilitação, entre outras.

Mas a reincidência também pode acarretar a exclusão. Isto ocorre quando for aplicada a sanção de suspensão por três vezes ao advogado, sendo, na seqüência, excluído. Conforme decisões do Conselho Federal da OAB, há necessidade de um processo específico para que seja aplicada a sanção da exclusão, o qual só pode ser instaurado após o trânsito em julgado da terceira suspensão, assegurando o amplo direito de defesa ao advogado.

2.9.5 Reabilitação

O advogado punido por qualquer sanção (censura, suspensão ou exclusão) poderá requerer sua reabilitação. Todavia, para que assim proceda, deverá aguardar o prazo de um ano do cumprimento da sanção e apresentar provas de bom comportamento.

Entretanto, se a punição disciplinar for conseqüência da prática de um crime, a reabilitação depende da correspondente reabilitação criminal, deferida pelo Poder Judiciário, de acordo com o que estabelece o art. 41 do EAOAB.

2.9.6 Prescrição

A OAB tem o direito, dentro de um certo prazo, de punir administrativamente os advogados que cometerem infrações disciplinares. Ultrapassado esse prazo, ocorre a extinção da punibilidade pela ocorrência da prescrição, sendo essa "a perda do direito de punir, por quem não cumpriu, no devido tempo, os prazos para a apuração dos fatos e para o seu respectivo julgamento". [67] A prescrição deve ser reconhecida de ofício pela OAB, acarretando o arquivamento do processo disciplinar. O prazo prescricional é de cinco anos contados a partir da constatação oficial do fato, ou seja, a comunicação oficial de sua ocorrência ao Tribunal de Ética e Disciplina, ou ao Conselho Seccional, ou ainda, em casos excepcionais, ao Conselho Federal da OAB.

Há, também, outra forma de prescrição, denominada prescrição intercorrente, que ocorre quando existe um processo instaurado e, por inércia do titular do direito de punir, há paralisação do mesmo por mais de três anos, devendo ser arquivado de ofício ou a requerimento da parte. A responsabilidade pela paralisação, que acarreta a prescrição intercorrente, deverá ser apurada, devendo o órgão da OAB responsável pelo processo tomar sempre muito cuidado com o andamento dos feitos disciplinares.

A prescrição pode ser interrompida nos casos estabelecidos pelos incisos do parágrafo segundo do art. 43 do EAOAB. Então, a prescrição interrompe-se pela instauração de processo disciplinar, pela notificação válida feita diretamente ao representado ou pela decisão condenatória recorrível de qualquer órgão julgador da OAB. Com a interrupção, os prazos são zerados e começam a correr novamente.


3 Da responsabilidade civil do advogado

A responsabilidade civil é um assunto que os grandes doutrinadores, os quais discorrem sobre o tema demonstrando muito conhecimento, parecem concordar em um ponto, a dificuldade que envolve a matéria, pois a mesma possui natureza interdisciplinar, não se restringindo ao campo do direito civil. O campo de investigação da responsabilidade civil é muito vasto, comportando a abordagem de diversos temas e aspectos.

O advogado, no exercício de sua atividade profissional, pode cometer erros e causar danos ao seu cliente, seja pelo uso de técnica errada ou pela omissão de providências, gerando-lhe responsabilidade e dever de repará-los. Essa é a responsabilidade civil do advogado, cuja existência e proporção devem ser analisadas diante de cada caso concreto apresentado à apreciação do Judiciário, observando-se, para isso, a legislação pertinente à responsabilidade civil e ao exercício da advocacia.

Última das profissões liberais, a advocacia é também o mais nobre bastião da liberdade, na luta contra a opressão no Estado Democrático de Direito.

Dada a importância de tal ofício, a possibilidade de ocorrência de danos, seja pela utilização equivocada de técnicas inadequadas ao caso concreto ou simplesmente a omissão nos deveres de defesa dos interesses do cliente, é um elemento concreto que não pode ser desprezado.

Para compreender como tal responsabilização se materializa é preciso entender a natureza jurídica dessa atividade. [68]

A responsabilidade civil do advogado apresenta-se, em razão de ser relativamente pouco estudada, com uma complexidade um tanto quanto grande, pois a doutrina traz algumas discussões acerca de pontos mais relevantes, os quais são alvo de apreciação pelo judiciário, começando a direcionar o caminho a ser seguido, ou seja, a jurisprudência começa a se firmar sobre determinadas matérias levadas aos tribunais, envolvendo o exercício da advocacia e os danos que o advogado, profissional liberal que é, pode causar ao seu cliente ao exercer seu mister. Mas o estudo sobre a responsabilidade civil deste profissional apresenta-se, ainda, em fase inicial, sendo inúmeras as dúvidas e as divergências que o tema suscita frente ao grande número de situações em que os atos dos advogados podem lhes gerar responsabilidade. Muito há que se estudar sobre o tema e muito tende a crescer e se firmar a jurisprudência a esse respeito, direcionando o caminho a ser seguido pelos demais julgados, proporcionando a dinâmica e a atualização da legislação pertinente ao advogado, estabelecendo quando e em que medida deve ser responsabilizado esse profissional.

Rui Stoco afirma ser recente o estudo acerca dessa espécie de responsabilidade, não havendo profundidade na matéria, inclusive no que tange à legislação sobre o tema proposto, o que acarreta a falta de harmonia em posicionamentos e julgados.

A questão relativa à responsabilidade civil do advogado, como autêntico operador do Direito, não se traduz em seara de sua suave colheita, nem encontra equacionamento harmonioso na doutrina e na jurisprudência de nossos pretórios.

[...]

Note-se que a legislação codificada sempre teve atuação secundária no que pertine à responsabilidade do advogado. [69]

Dentre as formas de dano existentes, que podem ser provocados pela atuação do advogado, destaca-se uma teoria que exprime uma maneira muito peculiar de dano, a perda de uma chance, onde o cliente deixa de ver uma pretensão sua examinada pelo judiciário. A análise da perda de uma chance recebe destaque neste trabalho em razão de sua relevância no estudo acerca da responsabilidade civil do advogado.

Diante de tantas hipóteses em que a conduta do advogado, comissiva ou omissiva, tem o condão de fazer nascer responsabilidade civil, analisa-se, no presente estudo, algumas hipóteses mais corriqueiras, as quais são apreciadas pelo judiciário e trazidas pela doutrina e jurisprudência, ressaltando-se que o tema não se esgota nos casos expostos, pois, como já dito, a matéria começa a ser discutida com mais amplitude, sendo necessário, ainda, muito estudo, debate, julgados e até mesmo uma legislação mais específica ao tema para que se possa ter uma harmonia entre posicionamentos e decisões judiciais, podendo, enfim, se tornar, a responsabilidade civil do advogado, um tema menos esparso.

3.2 Natureza jurídica da responsabilidade civil do advogado e o dever de diligência

O advogado, ao exercer sua atividade, defendendo os direitos de seu cliente, o faz mediante a outorga de um mandato. "O mandato é o contrato pelo qual alguém (mandatário ou procurador) recebe de outrem (mandante) poderes para, em seu nome, praticar atos ou administrar interesses (CC, art. 653)". [70] A procuração é o instrumento do mandato, ou seja, é por meio dela que se exterioriza o mandato, ela é o documento que consubstancia os poderes conferidos ao mandatário, no caso, o advogado. Para esse labor, o mandante confere ao advogado a procuração ad judicia, isto é, para atuar em juízo em seu nome. O mandato é uma das formas de contrato previstas no Código Civil.

Assim, sendo o mandato um contrato, a responsabilidade imposta ao advogado é de natureza jurídica contratual, levando em conta o advogado profissional liberal, não se considerando outras formas em que o exercício da advocacia é possível de ser realizado, como, por exemplo, em casos de nomeação para atendimento da assistência judiciária. "Efetivamente a responsabilidade de qualquer profissional liberal – gênero de que os advogados são espécie – será, em regra, contratual". [71]

Sérgio Cavalieri Filho assim ensina:

Em relação a seu cliente, a responsabilidade do advogado é contratual, salvo quando atua como defensor público ou procurador de entidades públicas (Estado, Município, autarquias, advogado da União, etc.), casos em que, pelos danos que causar a terceiros, responde a pessoa jurídica de Direito Público em nome da qual atua, de acordo com as regras que disciplinam a responsabilidade do Estado. [72]

Aguiar Dias aponta a diferença existente entre a natureza da responsabilidade do advogado no Brasil e na França, pois lá o mandato judicial é confiado a um oficial público, reafirmando a natureza contratual dessa responsabilidade em nosso país.

Em nosso direito não é bem assim. O exercício da advocacia, se bem que a nosso ver participe do caráter de munus público, tem regulamentação diferente. O advogado não é oficial público e, assim, sua responsabilidade é puramente contratual, salvo o caso de assistência judiciária. [73]

Mas há exceções a essa regra da responsabilidade contratual, conforme ensina Rui Stoco, como nos casos do defensor dativo, o qual não tem ligação contratual com aquele que defende, ou quando pessoa necessitada é defendida pela Defensoria Pública, Procuradoria de Assistência Judiciária ou Procuradoria do Estado, não havendo, da mesma forma, relação contratual, ou então quando há atuação dos procuradores de entidades da administração direta ou indireta do Estado e advogados da União, pois a relação entre o Estado e o procurador é estatutária, e ainda quando membros do Ministério Público atuam como verdadeiros advogados em ações individuais ou coletivas. Nesses casos, a responsabilidade dos advogados ou de quem age como tal não é de natureza contratual. [74]

Aos profissionais liberais, quando prestam serviços, aplicam-se as noções de obrigação de meio e de resultado.

Obrigação de meio é aquela em que o devedor se obriga tão-somente a usar de prudência e diligência normais na prestação de certo serviço para atingir um resultado, sem, contudo, se vincular a obtê-lo.

[...]

Obrigação de resultado é aquela em que o credor tem o direito de exigir do devedor a produção de um resultado, sem o que se terá o inadimplemento da relação obrigacional. Tem em vista o resultado em si mesmo, de tal sorte que a obrigação só se considerará adimplida com a efetiva produção do resultado colimado. [75]

Em função disso, o advogado, ao exercer seu mister, não possui uma obrigação de resultado, mas sim de meio, de diligência, isto é, deve usar de todas as técnicas e métodos existentes e permitidos na defesa dos interesses de seu cliente, não estando vinculado ao resultado final da pretensão deduzida em juízo, pois seu papel é ser diligente, representando seu cliente em juízo, defendendo-o da melhor forma possível, cabendo ao magistrado o dever de dizer o direito. Por isso, o advogado não se vincula à produção de um resultado favorável ao cliente, pois não é ele quem julga, seu dever é agir com o máximo de diligência e eficiência na busca pelo direito (resultado desejado). Nesse sentido a lição de Rui Stoco:

[...] a aceitação de uma causa não gera obrigação de resultado, porém obrigação de meios.

Significa que o advogado se obriga a empregar todo o cuidado e diligência necessários e cuidar da causa com zelo e atenção, acompanhando o andamento da causa, peticionando quando necessário ou exigido e acompanhando e cumprindo os prazos processuais.

Significa, também, que a sua obrigação é de meios, ou seja, quando o profissional assume prestar um serviço ao qual dedicará atenção, cuidado e diligência exigidos pelas circunstâncias, de acordo com o seu título, com os recursos de que dispõe e com o desenvolvimento atual da ciência, sem se comprometer com a obtenção de um certo resultado. [76]

Carlos Roberto Gonçalves faz uma ressalva acerca do dever de diligência que incumbe ao advogado, pois, segundo o doutrinador, o advogado só se prende a um resultado "quando contratado para a elaboração de um contrato ou da minuta de uma escritura pública ou, ainda, para o exercício de uma atividade administrativa, típica de despachante burocrático". [77] No mesmo sentido Rui Stoco esclarece:

Quando esse profissional tem atuação extrajudicial, ou seja, fora do juízo, como jurisconsulto, parecerista, conselheiro ou contratado para tarefa certa, como a redação de um contrato, de um estatuto ou ato constitutivo; de providenciar o registro público desses documentos, então estará assumindo uma obrigação de resultado, pois o contrato objetivou essa finalidade. [78]

Arnaldo Rizzardo também trata das situações que comportam exceções à regra segundo a qual o advogado assume uma obrigação de meio, nos seguintes termos:

Já se depreende aí que não se trata de obrigação de resultado, exceto em situações singelas, ou em intervenções e postulações que não demandem controvérsias, discussões, divergências, recursos, preponderância de correntes doutrinárias ou teses, dissídios na jurisprudência. [...] Não há, em tais procedimentos, maiores dificuldades, e muito menos grandes discussões, bastando a correta formalização da petição.

Realmente, não assume o advogado a obrigação de vencer a causa. Se assim prometesse, já procederia com culpa, sujeitando-se a indenizar caso perder a ação, posto que ludibriou a parte. [79]

Assim, sendo a responsabilidade civil do advogado, em regra, contratual e tendo o mesmo obrigação de diligência (obrigação de meio), cabe a esse profissional manter-se sempre atualizado, acompanhando as mudanças na legislação, os posicionamentos doutrinários, as novas técnicas de defesa dos direitos, as orientações da jurisprudência, as quais acabam por proporcionar a dinâmica da legislação, visto que dá à letra fria da lei um aspecto prático e de atualização, evitando-se que normas antigas se tornem impróprias e incompatíveis com a atualidade. Agindo dessa forma, o dever de diligência estará sendo cumprido e uma possível responsabilidade evitada.

Os julgados não são normas cogentes na acepção pura desse vocábulo, mas, nem mesmo por isso, deixam de cumprir a missão que deles se espera, qual seja, a de unificação da ordem jurídica. Os juízes observam a jurisprudência e, com base nela, elaboram o direito vigente; para os advogados tornou-se questão de prudência observá-la.

[...]

O erro do advogado, nesse setor de metodologia de informação jurisprudencial, poderá ser conceituado como de direito e grave, sugerindo o dever de indenizar. Sem dúvida de que o trabalho do advogado futuro, já estressante, constitui um desafio diante da instabilidade dos julgados, de modo que a obrigação de se atualizar deixou de ser motivo de captação de clientela; virou seguro de responsabilidade civil. [80]

Por fim, tem-se que, para ser a responsabilidade conferida ao advogado, deve ser provada a sua culpa ou dolo ao exercer sua atividade, conforme a lição de Rizzardo:

Para incidir a responsabilidade impende que fique provada a prática com dolo ou a culpa. Quanto ao dolo, ou o propósito de lesar o cliente ou a parte representada, não se apresentam maiores dificuldades. Na culpa é que se encontra o amplo campo de situações que conduzem à responsabilização, as quais decorrem das infrações dos deveres impostos aos advogados, de modo especial, e que interessa, ao caso, a que está no inc. IX do art. 34 da Lei nº 8.906, consistente em "prejudicar, por culpa grave, interesse confiado ao seu patrocínio".

Embora a referência à culpa grave, não se pode olvidar o preceito do art. 32, que faz depender a responsabilidade unicamente da culpa. [81]

E, para encerrar a questão da necessidade de dolo ou culpa na atuação do advogado para que este possa ser responsabilizado, o supracitado doutrinador cita os ensinamentos de Fábio Siebeneichler de Andrade:

De modo que a circunstância de a culpa ser leve não exclui o dever de indenizar. É certo que deve estar presente um grau de razoabilidade, na medida em que, em geral, se exige do profissional um conhecimento médio. Essa circunstância, porém, se modifica quando a escolha do profissional tiver sido feita com base na notória especialização. Há que se ter, portanto, uma exigência mais rigorosa quando esse advogado não agir com eficiência que dele se espera e que lhe é habitual. [82]

3.3 Inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor e a não influência da inversão do ônus da prova contida em seu art. 6°, VIII

Conforme a definição encontrada no CDC do que vem a ser fornecedor e consumidor, parece que na relação entre advogado e cliente o primeiro apresenta-se como o fornecedor de serviços e o segundo como consumidor dos mesmos. Todavia, em função do caráter público que envolve o exercício da advocacia, dada a sua relevância para a administração da justiça, de sua independência e de ter uma legislação própria, de âmbito federal, que regula o exercício dessa profissão, parece não ser aplicável, na relação entre as partes supracitadas, o Código de Defesa do Consumidor. Além do que este Código parece ter sido instituído para proteger o consumidor diante das relações comerciais e, não sendo a advocacia uma atividade comercial, já que o próprio Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil estabelece que assim não seja, não se aplica esse diploma legal aos serviços prestados pelo advogado.

A responsabilidade do advogado é subjetiva, ou seja, fulcrada na idéia de culpa. "Tal responsabilidade será sempre por culpa e deverá estar sempre informada pelo elemento subjetivo, seja a relação contratual ou não". [83]

O CDC estabelece, como regra, a responsabilidade objetiva nas relações de consumo. E assim talvez se fez para proteger consumidores que, diariamente, consumiam produtos e serviços em setores de atividade profissional que não dispõem de regulamentação própria, sendo aquele Código portador de normas gerais, para profissões e casos não regulamentados especificamente. Mesmo ante essa responsabilidade objetiva, o art. 14, § 4º desse diploma prevê a responsabilidade subjetiva dos profissionais liberais.

Assim, só se poderá responsabilizar o advogado quando, por dolo e intenção manifesta de prejudicar ou locupletar-se, cause prejuízos ao seu cliente, ou obre com culpa manifesta, atuando de modo tão insatisfatório, atabalhoado, displicente e imperito que a relação causal entre esse agir e o resultado fique manifesta.

Significa ainda que, embora os advogados, assim como os demais profissionais liberais, sejam prestadores de serviços típicos, foram colocados de fora do campo de abrangência do Código de Defesa do Consumidor, por força da regra de exceção contida no referido § 4° do art. 14.

Ora, se o princípio adotado pelo CDC é o da responsabilidade objetiva, ao estabelecer a responsabilidade subjetiva dos profissionais liberais, afastou-os, como exceção, do seu âmbito de abrangência, reconhecendo que estes profissionais são regidos por estatuto próprio, como ocorre com os advogados, na consideração de que a lei que estabeleça disposições gerais (CDC) não revoga lei especial, ou seja, a lei específica que regulamenta determinadas profissões liberais (LICC, art. 2°, § 2°). [84]

Sobre esse aspecto, importante a observação feita por Carlos Roberto Gonçalves acerca da responsabilidade civil do advogado considerado isoladamente e da sociedade de advogados, que segundo ele não é abrangida pelo art. 14, § 4° do CDC, deixando claro que à essa se aplica o Código, ao contrário do que ocorre com o profissional advogado.

Manteve-se o princípio de que tal responsabilidade pessoal será apurada mediante a verificação de culpa (art. 14, § 4º).

Entretanto, é muito comum, hoje, tais profissionais agruparem-se em torno de empresas prestadoras de serviços, ou seja, sociedades de advogados. Como já se afirmou, a exceção do princípio da responsabilidade objetiva consagrada no Código de Defesa do Consumidor aplica-se apenas ao próprio profissional liberal, não se estendendo às pessoas jurídicas que integre ou para as quais preste serviço. [85]

Mesmo parecendo equivocada a doutrina que defende ser aplicável o CDC na relação entre advogado e cliente, expõe-se as razões que a conduz a esse posicionamento. Nesse sentido, o início desse pensamento se apresenta no fato de entre aquele profissional e seu constituinte existir uma relação de consumo, onde o primeiro é o fornecedor e esse último o consumidor. Segundo, para os que assim se posicionam, apenas há um privilégio para o advogado na sua relação com o cliente no diz que diz respeito à responsabilidade subjetiva lhe conferida, pois de resto esses profissionais se submetem ao regime da legislação do consumidor. Outra razão para se chegar a essa conclusão de que ao advogado se aplica o CDC é o poder de polícia das profissões, conforme defende Sérgio Novais Dias, ao citar José Cretella Júnior, defendendo não se submeter, o advogado, às sanções administrativas contidas no CDC, visto ser atribuído com exclusividade à OAB esse poder de polícia das profissões no que tange aos profissionais da advocacia.

[...] tal como ocorre com as outras liberdades, a liberdade de profissões sofre as restrições impostas pelo interesse público, que exige a prova prévia da idoneidade e capacidade daqueles que a exercem. O Estado usa, assim, de um verdadeiro poder de polícia, que se poderia enquadrar dentro de um título geral – polícia das profissões. [86]

E Novais Dias encerra dizendo que "os demais dispositivos do Código de Defesa do Consumidor, que não se conflitam com as normas do Estatuto da Advocacia, são aplicáveis aos advogados". [87]

Não se trata de negar a relação de consumo existente entre o advogado e seu cliente, ou aceitar, simplesmente, que há um privilégio ao profissional liberal, no caso o advogado, quando se estabelece pela legislação do consumidor a responsabilidade subjetiva à essa classe, ou ainda negar que deva haver um poder de polícia por parte do Estado para coibir abusos. A questão é que, com o advento da Constituição Federal de 1988, naturalmente o advogado teve, sabiamente, sua condição elevada a essencial à administração da justiça, não devendo ser tratado como os demais prestadores de serviço em razão da própria natureza dos serviços que presta, ou seja, serviços essenciais à justiça, que deve gozar de certos privilégios para que atue com precisão, não devendo sofrer pressões ao exercer sua atividade, como ter que se submeter ao regime criado para proteger o consumidor. Quanto à responsabilidade subjetiva lhe conferida, fica claro que o legislador quis excluir o profissional liberal da submissão ao CDC, pois essas profissões geralmente têm normas de conduta peculiares. Assim. As sanções disciplinares competem exclusivamente à OAB e as sanções por ilícitos que cometer o advogado, devem ser apuradas sob a égide das disposições sobre responsabilidade civil contidas no Código Civil e no Estatuto da OAB e não no Código de Defesa do Consumidor. E quanto ao poder de polícia das profissões, tem-se que o mesmo deve existir, mas ser operante nos casos em que não há legislação específica de caráter tão relevante quanto é o EAOAB, que disciplina o exercício da advocacia em específico.

Em vista desses argumentos, parece descabido dar relevância à inversão do ônus da prova trazida pelo CDC em seu art. 6°, inciso VIII, pois cabe ao magistrado saber o momento adequado de assim proceder ou não quando o assunto for responsabilidade civil do advogado, pois caberá a quem alega o erro desse profissional a produção da prova, salvo nos casos de inversão já previstos pelo CPC, sendo, por isso, não influente essa norma do Código de Defesa do Consumidor. Nesse sentido, importante a lição de Ênio Santarelli Zuliani:

Há quem sustente o cabimento da inversão do ônus da prova (expressamente previsto no art. 6º, VIII, da L. 8.078/90), porque o advogado não goza de privilégio diante de um resultado. O consumidor, sim, é que não merece ser prejudicado na investigação do possível erro profissional. Considero esse assunto, nessa área, irrelevante, dada a especialidade natural do juiz que será o encarregado de decidir o litígio.

[...]

O juiz, no entanto, por ser um técnico em assunto jurídico, para julgar uma ação em que se discute a responsabilidade civil dos advogados dispensa o serviço de auxiliares (peritos), para que possa compreender, analisar e julgar os imbróglios forenses que caracterizam esses processos. Um juiz prudente não se impressiona com o velho costume que culpa os advogados pelas injustiças do processo [...].

O sistema de inversão do ônus da prova não é, pois, o maior aliado do juiz encarregado de julgar a ação em que se pede ressarcimento de danos por erro do advogado. [88]

3.4 Erro de fato, erro de direito, erro escusável e erro inescusável

O advogado é um profissional que somente é assim considerado após ser aprovado no exame de Ordem, sendo, desta forma, um profissional com habilitação especial. Então, apresenta-se o questionamento de se saber se o advogado deve ou não responder pelos erros de fato e de direito que cometer. A doutrina apresenta dois posicionamentos. Um, defendendo que o advogado sempre responde pelos erros de fato e pelos de direito quando graves. Outro, se posicionando favorável à responsabilização do advogado apenas quando seu erro seja inescusável. É o que se passa a demonstrar.

Novais Dias entende que "o advogado responde sempre pelos erros de fato por ele cometidos", [89] exemplificando com o caso do advogado que na defesa de seu cliente peticiona pedindo número incorreto de horas extras mesmo diante de relatório escrito entregue pelo constituinte ao patrocinador da causa expondo em sentido diverso. E, quanto aos erros de direito, diz ser mais complexa a questão, nos seguintes termos:

Compete ao advogado manter-se adequadamente atualizado da lei, da doutrina e da jurisprudência na área do direito em que está militando. Não é preciso, pois, que seja uma enciclopédia jurídica ambulante, mas não pode escusar-se dos conhecimentos médios do advogado razoavelmente atualizado.

[...]

Contudo, quando o profissional é escolhido como um especialista naquele campo do direito, o rigor é maior. [90]

No mesmo sentido parece estar a doutrina de Aguiar Dias:

O advogado responde pelos erros de fato cometidos no desempenho de seu mandado. É nossa opinião que não se escusa, mostrando que o erro não é grave. Quanto aos erros de direito, é preciso distinguir: só o erro grave, como a desatenção à jurisprudência corrente, o desconhecimento de texto expresso da lei de aplicação freqüente ou cabível no caso, a interpretação abertamente absurda, podem autorizar a ação de indenização contra o advogado, porque traduzem evidente incúria, desatenção, desinteresse pelo estudo da causa ou do direito a aplicar ou, então, caracterizada ignorância, que se torna indesculpável, porque o profissional é obrigado a conhecer o seu ofício sem que seja obrigado a mostrar-se um valor excepcional na profissão. [91]

Rui Stoco discorda do posicionamento de Novais Dias, quando este jurista defende ser o advogado sempre responsável pelos erros de fato que cometer. Rui Stoco doutrina no sentido de não ser qualquer erro passível de gerar o dever de indenizar. Para ele, somente os erros inescusáveis tem esse condão e leva em consideração o critério do grau de culpa para se avaliar o quantum da reparação pelo dano material.

Assim, não é qualquer erro do advogado que gera a responsabilidade desse profissional, mas apenas os erros inescusáveis, grosseiros, inadmissíveis para um profissional que cursou a faculdade de Direito e foi aprovado em exame da OAB, o qual testa a sua proficiência e aptidão para o mister. O erro inescusável faz nascer o dever de indenizar para o advogado pelo prejuízo que causou ao seu constituinte, visto demonstrar incompetência ao atuar. O próprio EAOAB dispõe, em seu art. 34, que constitui infração disciplinar prejudicar, por culpa grave, interesse confiado ao patrocínio do profissional da advocacia. "Culpa grave se vislumbra na falta de conhecimento jurídico para o exercício do mister ou o total desconhecimento da legislação em vigor". [92] E nessa linha de pensamento, prossegue Rui Stoco:

[...] defender determinada tese jurídica, ainda que não seja a melhor ou invocar corrente doutrinária ou jurisprudencial superada ou minoritária, não pode conduzir à responsabilização do profissional, caso não tenha sucesso em uma ação judicial específica, embora outros profissionais tenham logrado ganho de causa, com a mesma tese, em outras ações. [93]

Carlos Roberto Gonçalves assim também entende, dizendo que "não será, entretanto, qualquer erro que irá dar causa à responsabilidade civil do profissional, proporcionando a respectiva ação de ressarcimento". [94] Invocando, nesse sentido, o posicionamento de Mário Guimarães de Souza, segundo o qual o erro, "só quando ele for inescusável, patente, demonstrativo apenas de ignorância profunda é que terá justificativa o pedido de perdas e danos". [95]

Assim também se posicionou L. P. Moitinho de Almeida:

Perder uma acção ou um incidente, não constitui, porém, erro de ofício, pois, como dissemos, as obrigações do advogado para com o cliente são de meios e não de resultado. E sendo o direito uma ciência especulativa, não pode exigir-se ao advogado que ele tenha necessidade de seguir o mesmo critério que o do juiz que elaborou a decisão e que, na maior parte dos casos, o advogado desconhece mesmo qual seja.

Para que haja erro de ofício é necessário que o advogado tenha agido com ignorância, inépcia ou negligência, numa palavra, com culpa. O erro de ofício que dá lugar à reparação civil tem de ser irrecusável [...]. [96]

Em suma, enquanto parte da doutrina acredita que o erro de fato sempre gera responsabilidade ao advogado e que o erro de direito assim o faz apenas quando for de natureza grave, outra parte da doutrina entende que os erros somente têm o condão de gerar responsabilidade ao advogado quando for inescusável, fruto de clara ignorância e despreparo, erros absurdos e que causem prejuízos ao cliente, o que parece ser o mais acertado, mesmo que essa corrente de pensamento não distinga claramente a ocorrência de responsabilidade quando o erro é de fato e de direito.

3.5 Desobediência às instruções do cliente

Há na doutrina quem entenda que a desobediência às instruções do cliente sempre pode acarretar a responsabilidade do advogado que assim se conduziu, pois esse, discordando daquele, pode renunciar ao mandato. Porém, parece não ser esta a melhor solução, devendo cada caso concreto ser analisado, levando-se em consideração quais os poderes conferidos ao advogado para sua atuação na defesa dos direitos e interesses do cliente, tendo grande importância, para tal finalidade, a procuração e os termos nela inseridos.

Como se sabe, o advogado é fundamental à administração da justiça justamente por ser um profissional habilitado, conhecedor do direito e, portanto, apto a defender os interesses do cliente em juízo e fora dele. Todavia, para se coibir abusos nessa representação, pode constar na procuração ad judicia uma limitação aos poderes conferidos ao patrocinador da causa ou, então, conferir-lhe poderes amplos e irrestritos, já que certos atos só podem ser praticados quando constarem expressamente no instrumento do mandato, como confessar, desistir, entre outros, como informa o art. 38 do CPC.

Desta forma, outorgada a procuração geral para o foro, pode o advogado praticar atos relacionados ao processo de acordo com seu conhecimento jurídico e dentro das suas concepções sobre o que acredita ser melhor para o cliente, que, leigo em matéria jurídica, assim consentiu ao outorgar poderes para o profissional atuar em seu nome.

Quanto aos atos que o art. 38 do CPC faz ressalva à atuação do advogado com a procuração geral para o foro, uma vez conferidos ao advogado tais poderes e constando os mesmos expressamente no instrumento do mandato, poderá, o advogado, praticar também esses atos sem precisar consultar o cliente, o qual já deixa claro sua anuência em incumbir tais tarefas ao advogado.

A nós parece que essa orientação do cliente deve ser formalizada em documento ou constar do instrumento do mandato, na consideração que a outorga de poderes legitima o outorgado a praticar todos os atos do processo. [97]

O que parece não ser admissível é que o advogado, mesmo tendo poderes amplos e irrestritos para atuar em nome do cliente, pratique atos contrários ao desejo e às instruções desse quando questionado sobre determinado assunto e a forma que pretende conduzir a questão e isso desagrade o outorgante, o qual acaba por determinar que o outorgado não proceda de tal forma, mesmo que tenha lhe conferido poderes para agir livremente. É que tais poderes irrestritos devem ser utilizados quando o cliente não toma conhecimento da prática de certo ato, mas tendo ele esse conhecimento e instruindo o advogado para agir de outra maneira, mesmo que dispondo ao contrário do que estabelecido na procuração, parece, ai sim, haver responsabilidade do patrocinador que desobedece as instruções do cliente, caso lhe proporcione prejuízo, pois, em tal situação, poderia o profissional do direito renunciar ao mandato pra evitar o conflito com o cliente, o que não implicaria na quebra do contrato, desde que de proceda em conformidade com o art. 45 do CPC.

Ainda sobre a questão acima suscitada, a doutrina traz o exemplo do advogado que realiza acordo sem poderes para fazê-lo ou extrapolando os poderes que lhe foram conferidos para esse ato, gera danos materiais ao cliente e é responsabilizado pela sua falta de diligência, devendo ressarcir os prejuízos. Mas ressalta o fato de o outorgante, diante das circunstâncias, alterar as instruções que conferira ao advogado no instrumento do mandato e o mesmo não as acata, respondendo pelos danos que advierem de sua conduta.

Mas se comprovado que o cliente, diante das circunstância, contrariando os termos do instrumento de mandato, orientou seu constituído a não fazer o acordo proposto ou a consultá-lo antes, então terá o advogado descumprido a vontade do cliente e desobedecido à orientação, respondendo pelo prejuízo.

[...]

Segundo parece, a permissão constante do instrumento de procuração para fazer o acordo já é a instrução a seguir. Apenas se o cliente, não obstante os termos do instrumento, tomar a iniciativa e orientar seu procurador para só fazer o acordo em determinadas condições ou mediante consulta prévia é que se terá a desobediência à ordem. [98]

Em síntese, "o advogado deve preservar sua independência técnica", [99] porém, "a qualidade de advogado não lhe dá o direito a dispor dos direitos alheios", [100] sem que autorizados expressamente para assim proceder.

3.6 Responsabilidade por conselhos e pareceres

Uma questão importante no estudo da responsabilidade civil do advogado é relativa à caracterização do dever de reparar os danos experimentados pelo cliente em função das orientações dadas por seu procurador, seja por conselhos ou mediante pareceres.

Apesar de autorizados doutrinadores ensinarem que o advogado não responde civilmente pelos seus pareceres, senão no caso de dolo, "pode responder o advogado pelo parecer desautorizado pela doutrina ou pela jurisprudência, induzindo o cliente a uma conduta desarrazoada, que lhe acarretou prejuízos". [101]

"Para Paulo Luiz Neto Lôbo, ‘na hipótese de consulta jurídica, o conselho insuficiente deve ser equiparado à ausência de conselho, sendo, também, imputável ao advogado a responsabilidade civil [...]’". [102]

Nesse sentido, importante e esclarecedora a lição de José de Aguiar Dias, que aborda tanto a responsabilidade pelos conselhos e pareceres infundados, quanto a decorrente da omissão de conselhos, a qual é equiparada, pela doutrina, ao conselho insuficiente.

A questão, destacada do dever de conselho, fundamental entre as obrigações impostas pela atividade profissional, qualquer que seja, está sujeita, ao que entendemos, às mesmas regras por que se apura a responsabilidade pelo desempenho do mandato. Um parecer ou conselho visivelmente desautorizado pela doutrina, pela lei ou pela jurisprudência acarreta, para o advogado que o dá, a obrigação de reparar o dano resultante de lhe haver o cliente seguido o raciocínio absurdo de cuja extravagância não poderia aquilatar.

[...]

Sendo mais raro, também não é impossível o caso de responder o advogado por omissão de conselho, o que pode suceder quando permite que o cliente enverede por um caminho errôneo, quando poderia aconselhá-lo a adotar fórmula garantidora de sucesso. [103]

Ressaltando o que já fora dito, o advogado presta um serviço de alta relevância pública e de valor inestimável à sociedade, visto ser ele o profissional gabaritado para defender os direitos e interesses das pessoas, uma vez que essas não conhecem o Direito a ponto de realizarem a autodefesa técnica e mesmo que conhecessem informalmente não estariam aptas a fazê-lo por não ter capacidade postulatória, conferida aos inscritos junto à OAB. Por isso, o cliente procura o advogado confiando no seu saber e, no mínimo, na sua prudência, tanto para os atos que ele venha a praticar quanto para os conselhos que possa dar. Assim, não se pode excluir da esfera da responsabilidade civil do advogado os pareceres e conselhos infundados, e até mesmo os conselhos insuficientes ou a omissão dos mesmos, que fizer em afronta ao sistema jurídico, mesmo que por culpa, e que venham a ocasionar danos ao outorgante do mandato, cabendo, sempre, a prova da conduta lesiva, do dano e do nexo causal.

É certo que, com essa crescente especialização do conhecimento, pessoas e empresas passam a tomar várias decisões baseadas em consultas a especialistas. No caso de advogados, a falta de informação adequada ou a má informação podem gerar danos incomensuráveis aos seus clientes, razão pela qual se faz necessário apreciar cada caso, de acordo com o padrão de conhecimento que se esperava do profissional que se habilitou a essa tarefa, para decidir por reconhecer ou não a responsabilidade. [104]

3.7 A não obrigatoriedade de sempre recorrer da decisão

Há, na atividade da advocacia e em sede de responsabilidade civil do advogado, questão relativa à obrigatoriedade ou não desse profissional em sempre recorrer das decisões prolatadas nos processo de seus clientes.

Parte da doutrina defende, como Carvalho Santos e Sérgio Cavalieri Filho, que não se deve exigir que o advogado recorra sempre, pois esse, como primeiro juiz da causa, deve analisar acerca da conveniência ou não do recurso, só se reconhecendo sua responsabilidade quando a sentença não recorrida tinha possibilidade de ser reformada, havendo, nesta situação, a perda de chance de seu cliente, cabendo a este provar tal fato. Quanto a teoria da perda de uma chance, ter-se-á, em momento oportuno, a sua análise neste trabalho.

No que respeita à conveniência ou não de recorrer, entendemos que, sendo o advogado o primeiro juiz da conveniência de se ajuizar ou não a ação, deve sê-lo, também, da conveniência de recorrer, mormente tratando-se de recurso especial ou extraordinário, sujeitos a requisitos rigorosos e específicos. O advogado, principalmente quando zeloso do seu bom nome, não pode ser obrigado a interpor um recurso manifestamente incabível. Não deve, entretanto, deixar de recorrer no caso de indiscutível necessidade, ou contrariando a vontade do cliente. Neste último caso, se tem convicção jurídica contrária, o caminho será a renúncia. [105]

Outra ala de pensamentos adota posição oposta, segundo a qual o advogado deve sempre recorrer, sob pena de se não o fizer ser responsabilizado.

Há também um posicionamento intermediário, o qual defende que o advogado deve, primeiramente, fazer um juízo de valor acerca da possibilidade de sucesso do recurso, colocando a questão sob o aspecto da natureza do recurso a ser interposto. Assim, o recurso ordinário seria um direito da parte, cabendo ao advogado, na defesa de seu constituinte, usar de todos os meios normais para alcançar o direito a ele confiado, devendo, nesse caso, ajuizar o recurso sempre. Já quanto aos recursos extraordinário e especial, por terem cabimento restrito e caráter extremamente técnico, desobrigariam o advogado a utilizá-los quando o patrocinador da causa entender não estar autorizado por lei ou ser inadmissível esses recursos para o caso de seu cliente.

Mas parece que o posicionamento mais adequado é o que defende que não se deve exigir que o advogado recorra sempre, esgotando todos os recursos postos à sua disposição. Para se saber quando deve recorrer e quando a não interposição do recurso tem o condão de gerar danos ao dono do direito discutido, deve-se fazer um juízo de valor sobre o caso. Todavia, este juízo de valor não é acerca da probabilidade de sucesso no recurso, mas antes um "juízo de valor objetivo, relativo à admissibilidade do recurso e à possibilidade de o mérito ser revisto e não quanto ao próprio resultado desse mérito, ou seja, quanto à solução da lide". [106]

No que tange aos recursos aos Tribunais e a certos recursos mais restritos, que exigem maiores pressupostos e condições para sua interposição, como, por exemplo, estar de acordo com a jurisprudência de Tribunais Superiores ou do STF, colhe-se a lição de Rui Stoco:

Ora, caberá ao advogado – posto que para tanto recebeu instrumento de mandato – verificar a conveniência de recorrer quando a questão controvertida e decidida nos autos estiver de acordo com a jurisprudência dominante do tribunal local ou a decisão proferida em consonância com Súmula do STF ou do STJ.

Em hipóteses tais não poderá responsabilizá-lo por não ter recorrido. [107]

Mas o mais razoável, sempre, é deixar o cliente ciente de todos os atos do processo e de todas as decisões a serem tomadas e, no caso específico de se interpor um recurso ou não, colher a opinião do cliente, após lhe explicar as vantagens e desvantagens de recorrer ou não, para que o mesmo esteja ciente e de acordo.

Mas cabe ressalvar que, se a orientação do cliente é incisiva e expressa, no sentido de que o advogado deve recorrer e este não o faz, incorrerá em responsabilidade, considerando que, havendo divergência entre outorgante e outorgado, este sempre poderá renunciar ao mandato, comunicando o fato àquele que o havia contratado para que possa atribuir poderes a outro profissional. [108]

Interessante, ainda, é a questão de interposição de recursos nos Juizados Especiais, onde não há custas processuais no caso de perda da demanda em primeira instância, só incidindo as mesmas em caso de interposição de recurso.

Nos juizados especiais, em que a sucumbência só incide na hipótese de o processo subir para a instância recursal, a não-interposição de recurso pelo advogado da parte da sentença que sucumbiu na primeira instância pode abranger o exame do custo-benefício do recurso. Ou seja, havendo pouquíssimas chances de êxito no recurso, era melhor para o cliente não recorrer, porque isso agravaria sua situação com a incidência de custas e, sobretudo, de honorários da outra parte de até 20%. [109]

3.8 Ajuizamento de lide temerária

O conceito de lide temerária é extremamente vago e a expressão não é esclarecedora. Diz-se, lide temerária, "da ação que alguém propõe de má-fé, sem legítimo interesse moral e econômico ou sem justa causa, causando danos à outra parte indevidamente chamada a juízo". [110] Assim, o ajuizamento de lide temerária caracteriza uma forma de abuso de direito, no caso, abuso de direito processual, que é definido como:

Exercício irregular ou anormal do direito de demandar, caracterizado pelo espírito de emulação, mero capricho, erro grosseiro, verificando-se, por igual, nos meios de defesa, [...]. Quem comete abuso de direito processual responde por perdas e danos, nos termos do art. 16 do Código de Processo Civil. [111]

Então, no conceito de lide temerária encontram-se presentes a idéia de abuso de direito processual e de litigância de má-fé, sendo esta, a má-fé, o "ânimo doloso de quem age ilicitamente, sabendo que viola os direitos de terceiros e transgride as disposições da lei". [112]

O art. 17 do CPC dispõe que se reputa litigante de má-fé aquele que proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo.

O art. 32 e seu parágrafo único do Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil prescrevem a responsabilidade do advogado pelos atos que praticar com dolo ou culpa em caso de lide temerária, a qual pode ser solidária à responsabilidade do cliente no caso de ambos estarem coligados para tal finalidade.

Da mesma forma, o CPC, no art. 14, estabelece que são deveres das partes e de todos aqueles que participarem do processo, incluindo aqui, obviamente, o advogado, cumprir com exatidão os provimentos mandamentais e não criar embaraços à efetivação dos provimentos judiciais, isto é, não agindo de forma temerária. As partes (litigantes) podem ser condenadas como litigantes de má-fé de ofício ou a requerimento do interessado e nos próprios autos. Já o advogado somente poderá ser responsabilizado em ação própria. O parágrafo único do artigo supracitado ressalva os advogados das sanções que podem ser impostas às partes, visto que aqueles profissionais se sujeitam exclusivamente aos estatutos da OAB.

Em suma, o advogado que ajuíza lide temerária pode ser responsabilizado por essa conduta, conforme se compreende da esclarecedora lição de Rui Stoco:

Portanto, o advogado também poderá ser responsabilizado por atuação temerária e de má-fé, mediante dolo ou culpa grave, mas apenas em ação própria e não de ofício ou nos próprios autos, pois a disposição do art. 14, V, do CPC não se aplica aos advogados e procuradores em geral. [113]

3.9 Violação do sigilo profissional

"O segredo profissional é imposição de ordem pública, e o advogado, como qualquer outro membro das profissões liberais, responde pela sua infração". [114]

Violar, sem justa causa, sigilo profissional é infração disciplinar que consta no art. 34, VII, do EAOAB, sendo, por isso, estabelecido o direito de o advogado recusar-se a depor como testemunha em processo no qual funcionou ou deva funcionar, ou sobre fato relacionado com a pessoa de quem seja ou foi advogado, mesmo quando autorizado ou solicitado pelo constituinte, bem como sobre fato que constitua sigilo profissional (art. 7º do mesmo Estatuto). Além disso, a violação de segredo profissional é crime, tipificado no art. 154 do CP (Código Penal).

"Cuida-se de hipótese em que a violação do sigilo, além de poder configurar infração penal, imporá ao advogado sanção de natureza administrativa por parte da OAB e o dever de compor danos morais". [115]

Assim, quando o advogado viola o sigilo profissional, o qual tem a obrigação de observar, e desse ato advém dano ao cliente, moral ou material, poderá ser responsabilizado civilmente pela sua conduta. Juntamente com a sanção civil, deverá sofrer reprimenda administrativa por parte da OAB e até mesmo ser criminalmente responsabilizado.

Mas essa regra do tipo penal pode ser mitigada, pois é elementar do crime que não haja justa causa para se romper o segredo profissional. Havendo justa causa, a conduta torna-se atípica e também não haverá necessidade de reparar danos, ou seja, não haverá responsabilidade civil.

Quando houver condenação criminal, restará indiscutível no cível a matéria, nascendo o dever de recompor os danos, se houver. Mas ainda que inexista condenação criminal, poderá restar o dever de reparar danos na esfera cível, desde que não tenha ocorrido justa causa para o sigilo profissional ser violado.

3.10 Imunidade judiciária e as ofensas irrogadas a outrem em juízo

A inviolabilidade do advogado por seus atos e manifestações no exercício de sua profissão, ou seja, sua imunidade profissional, vem prescrita no art. 133 da Constituição Federal e no art.7º, §2º da Lei 8.906/94 (EAOAB). O CP, em seu art. 142, I, dispõe ser a ofensa irrogada em juízo, na discussão da causa, pela parte ou por seu procurador, excludente do crime de injúria ou difamação. Assim, o advogado conta com imunidade ao exercer suas funções. Mas, ressalta-se, que sua inviolabilidade está condicionada aos limites da lei, não podendo se exceder em tais atos e manifestações. A jurisprudência vem responsabilizando civilmente o advogado que não atua dentro dos limites de sua inviolabilidade e profere ofensas a outrem em juízo, principalmente ofensas contra o juiz da causa. Além da responsabilidade civil que pode era atribuída ao causídico, o mesmo pode responder administrativamente (junto à OAB) e penalmente.

No processo, onde são discutidos fatos e direitos, poderá ocorrer que as partes e seus procuradores se excedam em suas manifestações e argumentações, acabando por ofender a parte contrária ou qualquer outra pessoa que esteja participando do processo, como o membro do Ministério Público, o magistrado, o outro litigante, os serventuários da justiça, enfim, agindo de forma a irrogar uma ofensa em juízo a outrem. Caso as ofensas sejam proferidas pelo advogado e as mesmas excedam o âmbito do permitido para a discussão da causa, pode o advogado ser responsabilizado civilmente por danos morais à parte que sofre a ofensa, pois "a imunidade não é um privilégio corporativista; é uma bandeira erguida para a defesa da soberania da função, sem o que o profissional não se encoraja na luta pela preservação da liberdade e dos demais direitos alheios". [116]

Desta forma, a imunidade profissional e o caráter de indispensável à administração da justiça que envolvem o exercício da advocacia perdem espaço quando o advogado excede os limites legais de sua função, ofendendo outrem em juízo, sendo passível de responsabilização e reparação dos danos morais que proporcionar. Nesse sentido, colhe-se a lição de Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, ao referirem-se ao advogado:

[...] tenha-se em mente que será ele indispensável enquanto agir escorreitamente segundo as balizas que o mandato estabeleceu. A inviolabilidade por seus atos e manifestações no exercício da profissão, para que se estabeleça a imunidade judiciária, pressupõe a prática de atos lícitos permitidos e nos exatos termos da outorga e do âmbito de discussão da causa, até porque se, por um lado, o advogado é inviolável por seus atos, quando no exercício de sua profissão, por outro, toda e qualquer pessoa é inviolável em sua honra, [...]. [117]

Ainda sobre esse aspecto, tem-se o ensinamento de Ênio Santarelli Zuliani:

Portanto, é por meio da linguagem lançada nas peças do processo que o advogado revela o seu dever-ser na organização jurídica que, por certo, não será desrespeitoso, ofensivo, ultrajante. O processo, não obstante um mecanismo (meio) de fazer o direito material, na verdade se transforma em corpo e alma da justiça no caso concreto, com sentido público, de modo que passa a ser inconveniente a falta de recato na linguagem a ser empregada nos atos formadores do processo justo (art. 5º, LV, da CF), ainda que o ressentimento que mova o impulso ou a reação violenta possa ser explicado, quer pela temeridade da lide, quer pelo abuso de direito de defesa da parte adversa e, inclusive, pela morosidade da justiça. Os expedientes próprios para debelar esses incidentes de percurso existem e, entre eles, não está situada a ofensa verbal aos demais protagonistas do processo. O desabafo com ofensas implica a responsabilidade do advogado por lesões de ordem moral aos destinatários de suas mensagens, porque a atuação descomedida, no uso de palavras e gestos, consubstancia ato personalíssimo ou de culpa profissional. [118]

De um lado a CF garante a inviolabilidade do advogado por seus atos e manifestações no exercício profissional, desde que dentro dos limites da lei, e de outro confere a todos a inviolabilidade da honra, da imagem, da intimidade e da vida privada, assegurando o direito à indenização por danos materiais ou morais decorrentes da violação desse preceito fundamental. Sobre esse aspecto, Sérgio Cavalieri Filho elucida o assunto:

E como a Constituição não pode estar em conflito consigo mesma, não obstante a diversidade de normas e princípios que contém, forçoso é concluir que sempre que direitos constitucionais são colocados em confronto, um condiciona o outro, atuando como limites estabelecidos pela própria Lei Maior para impedir excessos e arbítrios. Assim, se à imunidade do advogado contrapõe-se o direito à inviolabilidade da honra do juiz, segue-se como conseqüência lógica não constituir prerrogativa do advogado atingir a honra do magistrado, ainda que o faça no exercício do seu edificante mister. [119]

Ensina, ainda o referido autor, que "todo direito tem um limite, mesmo os direitos chamados de absolutos, qual seja, o direito alheio; e quando esse limite é ultrapassado, configura-se o abuso de direito, ato ilícito gerador de responsabilidade". [120]

Por fim, colhe a posição de Arnaldo Rizzardo, o qual defende que o próprio cliente pode ser responsabilizado pelas ofensas que o seu advogado irrogar em juízo, baseando seu pensamento na culpa in eligendo do constituinte na escolha do profissional. Ora, tal entendimento parece não ser compatível com a situação proposta, visto que o cliente contrata um advogado para resolver um problema seu e não para lhe criar outro. Se o advogado ofende a outrem em juízo, deve ele responder pelo seu ato e jamais o cliente, pois este não tem como adivinhar se aquele causídico vai proceder de tal forma ao escolhê-lo para atuar em seu nome. Mesmo assim, por ser um entendimento diferente, interessante trazê-lo neste trabalho.

Mesmo a parte que contratou o advogado arca com a responsabilidade.

Com efeito, o constituinte tem responsabilidade. Revelou falta de maior cautela na escolha do profissional que o representou.

A responsabilidade do contratante advém da chamada culpa in eligendo, que é aquela na qual o agente não procede com acerto na escolha de seu preposto, empregado, representante, ou não exerce um controle eficiente sobre os meios utilizados para a realização de uma determinada atividade, no caso a defesa de seus interesses num processo judicial.

Não bastasse a imprevidência do constituinte, encontra suporte a sua responsabilidade no art. 932, inc. III, do Código Civil (art. 1.521, inc. III, do CC precedente), pelo qual impera a responsabilidade objetiva do empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhe competir, ou em razão dele. Inquestionavelmente, o advogado considera-se um preposto do mandante, já que contratado para o desempenho na representação judicial.

Não fosse assim, pelos inúmeros prejuízos causado a terceiros por advogado não incidiria a responsabilidade do contratante, o que importaria em lacuna com a qual não pode compactuar o direito.

[...]

[...] efetivamente, pelos termos do preceito, se o mandante é obrigado a satisfazer todas as obrigações contraídas pelo mandatário, igualmente deve responder pelos danos que os atos deste último causarem. [121]

3.11 Responsabilidade pela execução de títulos de créditos emitidos para a retribuição dos serviços

Prestado o serviço, o advogado tem direito aos honorários convencionados, aos fixados por arbitramento e aos de sucumbência, conforme prescreve o art. 22 do EAOAB. Mesmo com esse direito garantido, o advogado continua sendo alvo da inadimplência dos clientes que, ao término da lide, deixam de cumprir com a sua obrigação junto ao causídico que lhe defendera.

Em tais situações, cabe ao advogado executar o contrato ou a sentença para cobrar aquilo que lhe é devido em termos de honorários. Assim, mesmo sendo reconhecido o direito aos honorários, quaisquer que sejam, o advogado possui meios adequados e legais para efetivar a cobrança daqueles, ficando proibida a emissão de títulos de crédito para garantir o pagamento das supracitadas verbas, pois a exigibilidade dos honorários possui seus limites. "O objetivo da proibição é manter o advogado afastado das disputas econômicas", [122] uma vez que essa não é a natureza de sua atividade, ou seja, a advocacia não é uma atividade voltada às disputas econômicas e nem comerciais. O art. 42 do Código de Ética e Disciplina veda a emissão de títulos de créditos para a cobrança de honorários, salvo a fatura de serviços prestados, por conveniência do cliente, vedada a tiragem de protesto.

Deste modo cabe ao advogado utilizar-se dos meios adequados para a cobrança de seus honorários, pois a cobrança dos mesmo por meio de títulos de crédito, uma vez que são expressamente vedados, pode proporcionar danos morais ao cliente, havendo, então, responsabilidade do advogado em repará-lo. Nesse sentido, a lição de Ênio Santarelli Zuliani:

Ao advogado cabe exercer o seu sagrado direito de cobrança na forma prevista em lei, com execução do contrato de trabalho, evitando-se as atividades que são apropriadas para o comércio em geral. Portanto, e na eventualidade de o advogado protestar um título de crédito para forçar o pagamento de honorários que estão sendo questionados pelo cliente, poderá esse seu proceder configurar não só um desrespeito das normas deontológicas, como um ilícito suscetível de fundamentar pedido de indenização por danos morais (abalo de crédito), tal como se sucede com inscrição indevida do sujeito na lista de devedores inadimplentes. [123]

3.12 Atuação na Justiça Criminal e a questão da prisão pelo não pagamento de dívida alimentícia pretérita

A atuação do advogado, no juízo criminal, exige maiores cautelas, visto que a sua culpa e conseqüente prejuízo ao cliente pode atingir um dos direitos mais importantes do ser humano, o direito à liberdade. Assim, havendo uma prisão indevida, por desídia do causídico, este poderá responder civilmente por danos morais. "É permitido afirmar, contudo, que não só ao Estado (Poder Público) recai o peso da prisão indevida; o advogado, a quem cabia requerer a perícia que faltou para livrar o réu da culpa, poderá suportar a responsabilidade civil pela negligente atuação". [124]

Apurada a ilegalidade da prisão, tanto o advogado quanto o Estado podem responder pelo erro. O primeiro pela falta de diligência, a qual deve ser provada, havendo nexo de causalidade entre a sua forma de atuar no caso e o dano moral produzido. O segundo pelo erro judiciário. Deve haver a reparação por aquilo que a vítima da prisão indevida deixou de ganhar em termos salariais e pelo comprometimento de sua carreira, além dos danos morais pelo constrangimento de ver-se preso e pela repercussão social que tal fato acarreta.

A prisão indevida do cliente poderá estar conectada com a falta de diligência do advogado e, uma vez estabelecido esse nexo de causalidade, responderá pelos prejuízos patrimoniais e morais, seguindo a liquidação do dano a mesma diretriz utilizada para compor o prejuízo que se atribui ao Estado (Poder Público) por erro judiciário, ou seja, restituindo o que a vítima perdeu em termos salariais no período de custódia e de dano moral, por ser inegável o constrangimento social que daí deflui. No caso, ainda, de se confirmar que a custódia indevida comprometeu a carreira da vítima do erro profissional (normalmente isso ocorre, porque, mesmo depois de alforriado, o encarcerado não consegue recuperar o antigo status empregatício, uma conseqüência do estigma da prisão, justa ou injusta), é devido um pensionamento que compense a diferença salarial prejudicada pela submissão a subempregos com renda depreciada. [125]

No que tange às prestações alimentícias, a CF autoriza a prisão civil pelo não pagamento das supracitadas prestações quando devidas e não pagas, sendo tal medida também autorizada pelo CPC e pela Lei 5.478/68.

Importante ressaltar que esse procedimento, permitido no ordenamento jurídico brasileiro, deve ser utilizado apenas para pleitear as prestações devidas e não pagas referentes aos três últimos meses imediatos ao pedido de alimentos deduzido em juízo, pois se faz necessária a imposição dessa ameaça à liberdade para a preservação da sobrevivência do alimentando, já que muitos devedores de alimentos só realizam o pagamento dos mesmos quando se vêem constrangidos de tal forma. As dívidas vencidas antecedentes ao trimestre mencionado são consideradas pretéritas, as quais devem ser cobradas sem a possibilidade da medida coercitiva da prisão civil.

Com base nesse entendimento, "advogado que se preze não pode ignorar a interpretação contemporânea que livra os devedores da prisão pelo não-pagamento de dívidas pretéritas (assim consideradas as que não se referirem às três últimas)". [126]

O advogado deve, por isso, manter-se atualizado com relação aos entendimentos dos Tribunais para não deixar que seu cliente tenha seu direito à liberdade constrangido quando não haveria necessidade, deixando que o Estado o reprima de tal forma. Cabe ao advogado procurar, sempre, a melhor interpretação para seu cliente, sem deturpar o sentido da lei, pois se assim não fizer, ninguém mais o fará, muito menos o Estado, cuja missão é fazer cumprir a lei, ao contrário do causídico, que deve se valer dela, em todos os aspectos legítimos, na defesa do constituinte.

Nesse sentido, colhe-se a valiosa lição de Ênio Zuliani Santarelli:

Resulta que, se o advogado contratado para atuar na defesa do devedor de alimentos, convocado para quitar dívidas acumuladas, sob pena de prisão civil (art. 733, do CPC), não usar do benefício da jurisprudência que desautoriza prisão civil por dívidas pretéritas, estará, com essa omissão, permitindo que o Estado-juiz comprometa a liberdade de seu cliente contra um direito garantido por uma jurisprudência consolidada. Volta-se a afirmar que a jurisprudência constitui "um bom guia" para os aplicadores do Direito, notadamente para os que "contam poucos anos de prática" e que não conquistaram, pela experiência, o tirocínio profissional.

Ora, limitando o advogado ao argumento inglório da justa recusa do pagamento, o juiz certamente, sem se convencer, baixará decisão decretando a prisão civil do alimentante (de 30 a 60 dias). Supondo que o advogado, mesmo com o cliente preso, continue a não usar da jurisprudência para impetrar HC, não resta dúvida de que incidiu em erro grosseiro. Poderá, por conseguinte, ser responsabilizado por danos decorrente dessa prisão civil, graças ao desempenho profissional abaixo da crítica.

Poder-se-ia argumentar que a prisão do devedor, em situações do gênero, não é ilegal ou inconstitucional, o que excluiria a responsabilidade do advogado que, mesmo contratado para obter salvo-conduto ao devedor, não consegue o intento. Concorda-se com essa objeção, desde que o advogado, na defesa, explorasse o ponto de vista favorável ao cliente, ou a inadequação da custódia por se cuidar de dívida pretérita. A prisão, nesse caso, não seria ilegal, por representar vontade do Estado-juiz. Porém, para a relação que se forma entre o advogado e o cliente, a omissão da versão liberatória funciona como culpa profissional, até porque não está o juiz obrigado a liberar o devedor da prisão se ele próprio não invoca a versão da jurisprudência que não se aplica de ofício. Excluir do devedor a chance de se livrar da prisão que poderia ser evitada significa, por via oblíqua, ofensa direita ao direito de permanecer em liberdade, sugerindo o dever de indenizar (arts. 620, do CPC; 1º, III, da CF e 954, parágrafo único, III, do CC de 2002). [127]

Conclui-se, em vista dos argumentos expostos, que se o advogado não se valer da interpretação favorável a seu cliente, no caso de prisão por dívida de prestação alimentícia pretérita, deixando que o mesmo acabe preso por desconhecimento da jurisprudência que veda esse tipo de constrangimento no caso de dívidas alimentícias pretéritas, resta ao causídico o dever de compor os danos sofridos pelo constituinte, sejam materiais ou morais.

3.13 Responsabilidade do advogado empregado e da sociedade de advogados

Tema complexo e controverso na doutrina é a questão da responsabilidade do advogado empregado e da sociedade de advogados. Quanto a esta última o debate doutrinário apresenta nuances maiores e mais complexas, uma vez que não está solidificado entendimento se a responsabilidade das sociedades de advogados é subjetiva ou objetiva.

Primeiramente, aborda-se a questão envolvendo o advogado contratado. Nesse caso, são duas as hipóteses.

Primeiro, trata-se do advogado contratado para prestar serviços e ajuizar ações em nome de seu empregador, tendo relação com esse decorrente de um contrato de trabalho, seguindo o regime da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Nesse caso, mostrando-se ineficiente e cometendo erros graves, poderá ser demitido por justa causa. Além da demissão, que é penalidade aplicada no âmbito do direito do trabalho, ocorrendo danos a seu empregador, em função de sua má atuação, poderá ser responsabilizado com base no direito comum, segundo as normas do direito civil.

Na segunda hipótese, tem-se o advogado contratado para dar orientação ou ingressar com ações em benefício e em nome dos associados de seu empregador, como no caso de sindicatos de classe. Aqui também caberá a demissão por justa causa quando a atuação do profissional for lamentável em decorrência de erros inescusáveis e, como fora contratado para defender interesses de associados ou cooperados de seu empregador, responderá civilmente pelos prejuízos que causar aos supracitados associados ou cooperados, cabendo a eles entrar com a ação judicial de reparação de danos em face da entidade (sindicato, cooperativa ou outra), do próprio advogado ou de ambos. Esse é o entendimento de Rui Stoco. [128]

Ainda acerca do tema acima proposto, Sérgio Novais Dias apresenta o seguinte entendimento sobre a responsabilidade da sociedade de advogados com relação ao dano causado por advogado empregado:

Em sendo o dano causado por advogado empregado de sociedade de advogados, não há dúvidas de que a sociedade responde (em face do disposto no artigo 1.521, III, do Código Civil), e, subsidiária e ilimitadamente, todos os sócios dela integrantes (por força do artigo 17 do Estatuto), cabendo ação regressiva da sociedade e/ou dos advogados-sócios contra o advogado-empregado causador do dano, nos moldes do artigo 462, §1º, da CLT. [129]

No que tange à responsabilidade das sociedades de advogados, tema complexo e não pacífico que passa a ser estudado, tem-se que diversas e profundas foram as modificações pelas quais passaram a sociedade e o mercado de trabalho, sendo as associações de profissionais uma alternativa rentável nesse novo cenário social e trabalhista, embora muitas vezes ilusória e criticada.

Na esteira do sucesso, como não poderia deixar de ocorrer, também surgem os percalços da estrada: as reclamações dos clientes, que são atendidos ora por um, ora por outro profissional, quando foram atraídos pelo nome daqueles que identificam a sociedade; a utilização desmedida de estagiários para o trato de assuntos para os quais nem sempre estão preparados; a dificuldade de gerir uma enorme e diversa gama de advogados com interesses nem sempre comuns, e, infelizmente, os danos acarretados aos clientes. [130]

José de Aguiar Dias defende, ainda, que como participantes de uma sociedade, os advogados que a compõem não conservam uma responsabilidade individual, ou seja, a responsabilidade das sociedades de advogados, assim como a dos hospitais e clínicas, passa a ser solidária e objetiva, visando a proteção do consumidor. [131]

Na mesma linha de pensamento se posiciona Ênio Santarelli Zuliani, ao citar Fernando Antônio de Vasconcelos:

O preceito do art. 14, §4º, da L. 8.078/90 (responsabilidade subjetiva do profissional liberal), aplica-se ao advogado que trabalha individualmente. Quando o serviço é prestado por sociedades de advogados, a responsabilidade deixa de ser subjetiva (dependente de culpa) e regula-se pela objetiva, ou seja, independente da prova de culpa. Evidente que não se outorga procuração a uma sociedade de advogados; contudo, mesmo se emitindo mandato para determinados sócios, a sociedade de advogados responderá de forma objetiva e, depois, poderá exercer o direito de regresso em face do profissional culpado. No caso de o dano ser provocado por advogado empregado de uma empresa, a sociedade empregadora responderá e, da mesma forma, poderá exercer o direito de regresso ao culpado. [132]

E prossegue Ênio Santarelli Zuliani dizendo que o art. 17 do Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil estabelece que o sócio de uma sociedade de advogados responde subsidiária e ilimitadamente, o que estaria de acordo com a regra vigente no direito brasileiro, que é a subsidiariedade da responsabilidade dos sócios pelas obrigações da sociedade, defendendo ser possível o estabelecimento de uma responsabilidade interna e paralela, entre um sócio e os demais.

Traz, por fim, na defesa desse ponto de vista, a lição de Ruy Azevedo Sodré, segundo o qual "quando a sociedade atua com o uso da razão social, ‘não são os sócios individualmente que praticam o ato incriminado, e, sim a totalidade deles, integrante da sociedade’". [133]

A indagação que se faz acerca de quem deve responder pelos danos causados ao cliente quando o caso envolve uma sociedade de advogados, encontra, na posição de Rui Stoco, a defesa de que a resposta está no art. 17 do EAOAB. O doutrinador assim ensina:

Perceba-se que a responsabilidade, em casos tais, é da sociedade de advogados, pois foi esta quem celebrou o contrato de prestação de serviços com o cliente, salvo se o advogado tiver subscrito o contrato em nome pessoal e do instrumento de procuração tenha constado apenas o seu nome e não os de todos os advogados integrantes do escritório. [134]

Seria, então, a responsabilidade, em tais casos, da sociedade de advogados, desde que em nome dela tenha sido firmado o contrato e que o nome de todos os seus integrantes constem na procuração. Caso seja feito por apenas um advogado, encarregado pela causa, este responde, subsidiariamente, em caso de dano. Da mesma forma, se mais de um advogado for o responsável pelo dano, mas não todos os sócios, ambos responderão pelo prejuízo, sendo todos devedores principais, podendo o cliente lesado exigir a reparação integral do prejuízo de qualquer um deles. E encerra o mesmo doutrinador:

No relacionamento obrigacional entre sociedade e advogado ou advogados que atuaram no mesmo processo, não se pode falar, portanto, em responsabilidade solidária.

[...]

Na responsabilidade subsidiária, há um responsável principal e um secundário. Somente após frustrada a possibilidade de obter o ressarcimento do responsável principal é que se poderá reclamar a satisfação da dívida do responsável subsidiário. [135]

Por fim, tem-se a posição de Sérgio Novais Dias, que inicia sua abordagem ao tema citando Paulo Luiz Neto Lôbo, o qual expõe seu entendimento acerca da natureza das sociedades de advogados:

[...] é uma sociedade profissional sui generis, que não se confunde com as demais sociedades civis. [...] o Estatuto manteve a natureza da sociedade de advogados como sociedade civil exclusivamente de pessoas e de finalidades profissionais. [...] rejeitou-se o modelo empresarial existente em vários países, para que não se desfigurasse a atividade de advocacia. [136]

Novais Dias ressalta que o cliente não contrata a sociedade, mas sim um advogado, mais de um, todos os advogados associados ou até mesmo um advogado empregado, firmando a procuração no nome de quem o defenderá, independentemente de quem ou quantos forem. Entende, o mesmo doutrinador, que o art. 17 do EAOAB não se apresenta claro quanto à responsabilidade ser subsidiária ou solidária, aduzindo que a responsabilidade solidária não se presume, mas antes deriva da lei ou da vontade das partes. Desta forma, podem os advogados de uma sociedade preverem a solidariedade entre si, sendo, então, resultado de acordo entre as partes. Para o mesmo, o contrato feito com o cliente pode ser por escrito, caso em que se sabe quem são os advogados envolvidos, e pode ser verbal, onde haverá apenas a procuração, podendo nela constar o nome de outros advogados da sociedade que não sejam os que tiveram contato com o cliente.

Em face desta nebulosidade que envolve o tema e da falta de exatidão do art. 17 do Estatuto da Advocacia, Novais Dias apresenta a seguinte solução: há sociedades onde todos os advogados trabalham juntos em todos os casos, mesmo que somente um deles tenha feito acordo com o cliente. Já outras sociedades existem em que os advogados se reúnem apenas para dividir as despesas e cada um trabalha nos seus casos, com seus clientes próprios. No primeiro caso, todos os advogados ficam responsáveis pela prática dos atos processuais e possíveis danos deverão ser reparados pela sociedade. No segundo, aparece o problema do mencionado art. 17, pois se apenas um advogado da sociedade provoca o dano, a circunstância não esclarece se apenas ele ou se toda a sociedade responde, concluindo que neste caso entende ser responsável apenas o advogado.

Há situações, como a não-interposição de recurso cabível, deixando escoar o prazo após a publicação no Diário do Poder Judiciário, em que a responsabilidade perante o cliente pode ser atribuída não só a um, mas a todos os advogado integrantes da sociedade, a quem foi outorgada a procuração, e em nome de quem foi realizada a publicação, pois competia a cada um deles, individualmente, zelar pela prática do ato, ou seja, pela interposição do recurso, não podendo o cliente saber e identificar se, dentro da divisão do trabalho no âmbito da sociedade, foi esse ou aquele advogado que ficou com a atribuição de praticar o ato e omitiu-se. Existem, porém, outras situações em que o ato causador do dano foi praticado por apenas um dos advogados, perfeitamente identificável pelo cliente, circunstância em que não está claro, pelo disposto no artigo 17 do Estatuto, a despeito da opinião de Paulo Luiz Neto Lôbo supracitada, se os demais sócios integrantes da sociedade respondem solidariamente com seu patrimônio pessoal. Pensamos que, nestes casos, a responsabilidade é apenas do advogado causador do prejuízo, a não ser que a solidariedade esteja prevista em contrato, exatamente porque ela não decorre da lei (Estatuto, artigo 17). [137]

No que tange à responsabilidade das sociedades de advogados ser objetiva ou subjetiva, o supracitado doutrinador defende esta última, nos seguintes termos:

É importante salientar que a responsabilidade da sociedade de advogados perante o cliente é também subjetiva e não objetiva. Não prevalece o argumento segundo o qual a sociedade, pessoa jurídica, encontra-se fora da exceção do §4º do artigo 14 do CDC, por não ser ela propriamente um profissional liberal. É que, como salientado precedentemente, a sociedade de advogados é exclusivamente de pessoas e finalidades profissionais, inclusive em se tratando de dano causado por advogado empregado da sociedade de advogados. [138]

E traz, ainda sobre a responsabilidade subjetiva da sociedade de advogados, esclarecedora lição de Antônio Lindbergh C. Montenegro:

A prestação de serviço pelo profissional liberal acha-se tão inteiramente ligada à sua responsabilidade pessoal (= pela culpa), que absurdo seria firmar princípios diversos para ele e para a pessoa jurídica que o tenha como empregado. Na ocasião em que for declarada a responsabilidade da empresa, forçosamente aparecerá o nome do profissional que atuou no caso concreto, como inábil para a atividade exercida. Daí a necessidade de demonstrar-se sua culpa, seja quando ele exerce o serviço individualmente, seja quando o faz como empregado ou preposto de determinada empresa. [139]

Em face do que foi exposto sobre este tema, o qual, como pode ser constatado, apresenta controvérsias na doutrina, parece ideal a conclusão de que, quando o dano for causado por advogado empregado contratado e regido pela CLT, poderá o mesmo ser demitido por justa causa além de poder ser responsabilizado de acordo com as normas da responsabilidade civil.

No que tange à sociedade de advogados, a solução pode ser a responsabilidade da sociedade quando todos os advogados trabalhem junto na causa, sem poder o cliente identificar quem está atuando no seu caso, podendo os sócios estabelecerem entre si a responsabilidade solidária para compor os danos. Caso um advogado específico tenha causado dano, sendo possível identificá-lo e tendo feito o contrato em seu nome pessoal e não em nome da sociedade, a responsabilidade é sua. Mas no caso de o contrato ter sido feito em nome da sociedade, mas apenas ele tenha proporcionado o dano ao constituinte, deve responder a sociedade e subsidiária e ilimitadamente, quanto ao seu patrimônio, o sócio responsável, no caso o advogado, restando aos demais sócios a possibilidade de cobrar deste último os prejuízos que advierem à sociedade por causa de sua atuação.

Finalmente, parece ser subjetiva a responsabilidade da sociedade de advogados por causa de sua peculiaridade, uma vez que é exclusivamente de pessoas e de finalidades profissionais e por sua atividade se confundir com a atividade do advogado, que é destacada das demais e recebe tratamento diferenciado.

3.14 Perda de uma chance

A palavra chance tem origem francesa e significa "ocasião favorável, oportunidade". Comumente vincula-se a teoria da perda de uma chance ao fato de o advogado perder prazo para a interposição de recursos, pairando no ar a dúvida acerca de qual seria o resultado da demanda se o recurso tivesse sido interposto, se o cliente obteria um resultado satisfatório em segunda instância. Porém, a perda de uma chance não ocorre apenas nesse caso, verificando-se em muitos outros, onde o patrocinador da causa falha, por omissão ou de forma que o efeito de sua conduta seja análogo ao de uma omissão, isto é, deixando o direito de seu cliente sem resposta judicial, acarretando uma perda de oportunidade ao constituinte, o qual deixa de ver apreciado um interesse seu em decorrência da falta de diligência e técnica daquele profissional. Assim, a perda de uma chance comporta diversas situações, diversos atos que resultam da atividade mal realizada pelo advogado, causando dano ao cliente por não ver sua pretensão apreciada pelo órgão julgador. Sobre o assunto, são colhidas as lições preliminares de Sérgio Novais Dias.

[...] nos casos de perda de uma chance o advogado é responsável pelos danos sofridos pelo cliente desde que exista uma relação de causalidade adequada entre o ato ou a omissão do advogado e o dano, ou seja, que em termos de probabilidade, num prognóstico feito a posteriori, os dano tenham decorrido, necessariamente, direta e imediatamente, da falha cometida pelo advogado. [140]

Passa-se a analisar, com maior profundidade, a teoria da perda de uma chance e os reflexos dela na atividade do advogado no que tange aos possíveis danos que esse profissional pode proporcionar a seu cliente quando sua conduta incida na mencionada teoria.

O art. 1.059 do CC estabelece como regra geral que as perdas e danos abrangem aquilo que efetivamente se perdeu e o que razoavelmente deixou de ganhar, isto é, danos emergentes e lucros cessantes, respectivamente. Esses, segundo o art. 1.060 do mesmo diploma legal, devem decorrer direta e imediatamente da inexecução da obrigação do devedor. Mas a perda de uma chance possui características peculiares, diferentes das demais hipóteses de perdas e danos. "É que, na perda de uma chance, no caso específico da atuação do advogado, nunca se saberá qual seria realmente a decisão do órgão jurisdicional que, por falha do advogado, deixou, para sempre, de examinar a pretensão de seu cliente". [141]

Há, na doutrina, quem defenda ser aplicável a perda de uma chance ao advogado em circunstâncias especialíssimas, fundamentando esse pensamento no disposto no já mencionado art. 1.059 do CC, segundo o qual as perdas e danos só abrangem o dano emergente e o lucro cessante, alegando que nunca se saberá ao certo se a pretensão não apreciada pelo judiciário seria acolhida se o órgão julgador tivesse dela tomado conhecimento e decidido a causa, ou seja, não se sabe se o cliente teria sua pretensão acolhida e julgamento favorável. Existiram alguns julgados nesse sentido, mas, contemporaneamente, as soluções adotadas vêm observando a teoria da perda de uma chance e com base nela fundamentando as decisões.

O certo é que o tema apresenta dificuldades, cuja solução adequada ao problema ainda encontra-se em estudo. A grande questão que se apresenta como entrave para se atribuir responsabilidade civil ao advogado nessas situações de perda de uma chance é relativa à incerteza do resultado da decisão judicial caso houvesse sido levado à apreciação do judiciário a questão cuja chance é tida como perdida, ou seja, a pergunta que se faz para saber se o advogado pode ou não ser responsabilizado pela perda de uma chance é a seguinte: com base na doutrina, nos entendimentos sumulados e principalmente na jurisprudência, se a questão tivesse sido apreciada pelo judiciário teria sido favorável ao cliente?

Sobre o assunto, Sérgio Novais Dias faz uma importante observação:

É certo que o advogado que agiu com culpa, provocando essa situação de não-apreciação da pretensão pelo Judiciário, deve ser responsabilizado pela sua omissão. Contudo, a apreciação do nexo de causalidade e da extensão do dano deve sempre ocorrer, para que o advogado não seja chamado a pagar a indenização de um dano que muito provavelmente não causou. Seria promover o enriquecimento sem causa do cliente, em detrimento do advogado. [142]

Em resposta à pergunta acima formulada, pode-se dizer que é impossível prever o resultado de uma demanda que não fora julgada, uma vez que o ato do julgamento envolve sempre juízo de valor e uma carga de livre apreciação que varia de magistrado a magistrado (o qual tem uma obrigação de resolver, decidir, julgar todas as questões levadas à sua apreciação – princípio da indeclinabilidade), afinal, cada um constrói seu juízo de valor baseado na sua percepção, na sua interpretação da conduta humana, na sua experiência social, sendo, portanto, claro que cada magistrado pode julgar a mesma causa de forma diferente, em razão de ser diferente a maneira como forma seu juízo de valor sobre o caso.

Também interfere na questão de se saber qual o resultado que se poderia obter, se o caso fosse apreciado, o fato de que a interpretação da lei não é uma só, comportando mais de uma, de acordo com o caso concreto. Nesse sentido, colhe-se o pensamento de Hans Kelsen, citado por Novais Dias:

A interpretação de uma lei não deve necessariamente conduzir a uma única solução como sendo a única correta, mas possivelmente a várias soluções que [...] têm igual valor, se bem que apenas uma delas se torne Direito positivo no ato do órgão aplicador do Direito – no ato do tribunal, especialmente. Dizer que uma sentença é fundada na lei não significa, na verdade, senão que ela está contida na moldura ou quadro que a lei representa – não significa que ela é a norma individual, mas apenas que é uma das normas individuais que podem ser produzidas dentro da moldura da norma geral. [143]

Todavia, não quer dizer que as decisões judiciais sejam absolutamente incertas. É possível se fazer um juízo de probabilidade do resultado de uma decisão que não ocorreu por não ter o advogado levado ao conhecimento do magistrado a questão ou de alguma forma influenciado para que isto não tenha ocorrido. Para que se faça tal juízo de probabilidade, é importante levar em consideração, sempre, decisões razoáveis, que possa ser digna de apreço, a fim de não se contrariar o disposto na Súmula 400 do STF, que não admite o recurso extraordinário quando a decisão tenha dado razoável interpretação à lei, ainda que não seja a melhor.

Nessa tarefa de se saber o resultado da demanda não conhecida pelo judiciário, importantíssimo é o papel da jurisprudência, pois é ela que demonstra a tendência de como vem julgando os magistrados, seja em primeiro grau, em instâncias superiores, nos tribunais superiores e no STF. Assim, se o pedido não formulado encontra abrigo em jurisprudência pertinente ao assunto, deve o advogado ser responsabilizado pelo dano provocado ao cliente pela perda da chance de ver seu pedido apreciado, quando, muito provavelmente, sairia vencedor da demanda. Todavia, se a jurisprudência não pende para o lado do direito do cliente que alega ter sofrido dano pela perda de uma chance de apreciação de seu caso, tal matéria pode ser usada na defesa do advogado em uma possível ação de reparação de danos com base na perda de uma chance, devendo demonstrar que mesmo com sua omissão o cliente não teria ganho de causa e que, por isso, não houve prejuízo.

Como se sabe, o STJ é o guardião das leis federais e o STF das normas constitucionais, cabendo a cada um desses órgãos dar o correto sentido das normas que estão aos seus cuidados. E, no tocante à interpretação dessas normas e ao provável sentido que o julgamento teria tomado, se fosse levado ao conhecimento do magistrado a questão, dispõe Novais Dias:

A realidade é que, em casos de interpretação legal em que o tribunal superior ou o Supremo Tribunal Federal sumularam o entendimento, a probabilidade é que o julgamento se faça no mesmo sentido da súmula. Mesmo porque, se assim não ocorresse no tribunal de segunda instância, a parte vencida recorreria e obteria na terceira instância a reforma do julgado para adequá-lo à súmula. Há casos, porém, em que se constata que o entendimento sumulado está superado pela própria jurisprudência, situação na qual o resultado mais provável do julgamento é aquele que está em sintonia com a jurisprudência superadora. [144]

Desta forma, havendo entendimento pacífico na jurisprudência ou em súmulas de tribunal superior ou do STF, o julgamento, se tivesse sido levado ao conhecimento do Poder Judiciário, seguiria o respectivo entendimento e, uma vez que fosse favorável ao cliente que alega ter sido prejudicado, resta caracterizada a perda de uma chance, sendo responsável o advogado, cabendo ao mesmo compor os danos. Mas se o entendimento utilizado como parâmetro demonstra que a pretensão do cliente não está protegida pelo Direito, o advogado não deverá ser responsabilizado, pois mesmo que tivesse tomado a providência cabível, seu pedido não seria provido por estar em desacordo com o que dispõe os tribunais e, assim, não haveria dano a ser reclamado.

Quanto "à valoração de matéria fática ou de prova, será provável o resultado que decorrer de uma avaliação razoável da questão, mesmo que não seja a única". [145]

"É, portanto, possível fazer um juízo do resultado provável do julgamento que não houve e, assim, atribuir a responsabilidade civil pela perda de uma chance, [...]". [146]

Nesse caso, "reconhecida a culpa, a grandeza reparatória tomará a dimensão do montante que razoavelmente se obteria na demanda, ou dos prejuízos que o perdedor vier a suportar pela má atuação do advogado". [147]

3.14.1 A teoria da causalidade adequada

Quando se fala em danos decorrentes de perda de uma chance, tem-se que os mesmos são comparados ao lucro cessante de uma situação de responsabilidade civil convencional. Isto porque no caso dos lucros cessantes não se sabe ao certo se eles realmente ocorreram, existindo a possibilidade de a vítima não ter deixado de ganhar algo em função do dano que sofreu. Em sede de perda de uma chance o mesmo se pode dizer, pois não se pode afirmar que o cliente realmente deixou de ganhar algo. Nesse sentido, Novais Dias expõe:

Ao tratar do lucro cessante, estamos acostumados a conviver com a ausência de certeza absoluta desse dano, pois nunca se saberá se o credor teria ou não aquele lucro esperado, que se indeniza.

[...]

Contudo, nessa situação de perda de uma chance, os danos materiais emergentes tem sua certeza equiparada à certeza dos lucros cessantes, ou seja, a certeza baseada na probabilidade, que leva em conta a evolução normal dos acontecimentos. [148]

Para solucionar esta questão forma criadas algumas teorias, como a Teoria da Equivalência ou a Teoria da Última Condição, ambas sem dar resposta satisfatório ao problema. Assim, a Teoria da Causalidade Adequada surge como a que melhor responde a essas situações, sendo a que predomina no direito português.

Para demonstrar no que consiste esta teoria, importante se faz colher as idéias e explicações de doutrinadores brasileiros e portugueses, citados por Sérgio Novais Dias em sua obra.

Para Orlando Gomes:

[...] entre o comportamento comissivo, ou omissivo, e o fato deve haver um nexo de causalidade. Adota-se, modernamente, o conceito de causalidade adequada, isto é, consideram-se as conseqüências objetivamente presumíveis da ação, segundo a experiência comum. [149]

Conforme João de Matos Antunes Varela, "um facto só deve considerar-se causa (adequada) daqueles danos (sofridos por outrem) que constituem uma conseqüência normal, típica, provável dele. [150]

E salutares são os ensinamentos do também autor português Fernando Pessoa Jorge, acerca dessa teoria, os quais se expõe:

[...] essa adequação traduz-se em termos de probabilidade, fundada nos conhecimentos médios: se, segundo os ensinamentos da experiência comum, é lícito dizer que, posto o antecedente x se dá provavelmente o conseqüente y, haverá relação causal entre eles. Deste modo, o dano considerar-se-á efeito do ato lesivo se, à luz das regras práticas da experiência e a partir das circunstâncias do caso, era provável que o primeiro decorresse do segundo, de harmonia com a evolução normal (e, portanto, previsível) dos acontecimentos.

[...]

A teoria da causalidade adequada – pelo menos na sua formulação mais generalizada – parte da situação real posterior ao facto e, normalmente, ao dano e afirma a conexão entre um e outro, desde que seja razoável admitir que o segundo decorreria do primeiro, pela evolução normal das coisas. Numa fórmula sintética, embora pouco elegante, poderíamos dizer que a obrigação de indenizar só existe em relação aos danos que, tendo resultado da lesão, provavelmente (ou seja, em termos de um juízo de probabilidade ex post) dela teriam resultado; ou, numa versão negativa: a obrigação de indenizar não existe em relação aos danos que, tendo resultado da lesão, todavia, em termos de probabilidade, dela não resultariam. [151]

Assim, pela Teoria da Causalidade Adequada, a qual será aplicada às situações de perda de uma chance, "faz-se sempre um prognóstico a posteriori entre ao ato e as prováveis conseqüências, no objetivo de fixar o nexo de causalidade". [152]

3.14.2 A perda de uma chance e a teoria da causalidade adequada

Dentre as diversas formas de ocorrer a perda de uma chance, a mais comuns são a perda de prazo para a prática de atos processuais e a não interposição de recursos, deixando o cliente sem ver sua pretensão examinada por órgão superior.

Constatada a existência do dano e a conduta incorreta do advogado, o que deve restar demonstrado para poder haver direito à indenização é o nexo de causalidade entre um e outro. O juiz, então, deverá valer-se de um juízo de probabilidade para julgar, apreciando o caso à luz da lei, da doutrina e da jurisprudência, para saber se o êxito do cliente seria provável caso o ato não praticado tivesse sido feito, levando a pretensão ao conhecimento do órgão competente para o julgamento, o qual não ocorreu, ou seja, deve tentar imaginar o que teria acontecido se a questão tivesse sido reexaminada pelo órgão superior, no caso, por exemplo, de não interposição de um recurso, se haveria ou não êxito do cliente, tendo sua situação melhorada. Se sua situação fosse melhorada, claro está o dano que o advogado causou, devendo ser responsabilizado e, conseqüentemente, compor os prejuízos. Mas se mesmo que o ato processual fosse praticado e o êxito, muito provavelmente, não ocorresse, não há nexo causal entre a conduta do causídico e o dano, não cabendo reparação de prejuízos pelo advogado.

Os danos que o cliente pode vir a sofrer, em sede de perda de uma chance, correspondem aquilo que ele deixou de ganhar em razão da falta de diligência do advogado.

Sobre o tema, Novais Dias traz a seguinte lição:

[...] nas situações em que, pela matéria discutida, não havia probabilidade de sucesso, não se pode cogitar de dano patrimonial causado pelo advogado, porque o prejuízo material sofrido pelo cliente não terá decorrido da falta de recurso, pois este, sem chances de êxito, nenhuma alteração para melhor ensejaria em favor do cliente. Neste caso, o dano que se pode considerar, embora nem sempre ocorra, é extrapatrimonial, ou dano moral, consistente na frustração decorrente de não ver sua pretensão reexaminada por um órgão jurisdicional superior. [153]

O que se passa a ver, agora, é quem deve demonstrar a existência do dano e do nexo causal.

3.14.2.1 Demonstração judicial da perda de uma chance e do dano

Nesta sede, a demonstração da ocorrência da perda de uma chance e do dano seguem o mesmo princípio da processualística padrão, ou seja, a quem alega um fato lhe incumbe o dever de prová-lo.

Desta forma, cabe à parte autora demonstrar a omissão do advogado na prática do ato que deveria ter realizado, a conseqüente perda de chance de ver sua pretensão apreciada pelo judiciário e o dano que isso acarretou-lhe.

Na hipótese de não interposição de recurso, compete ao cliente demonstrar que o advogado não recorreu em determinada matéria, o insucesso de sua pretensão e que o recurso era perfeitamente cabível. Se a perda de uma chance ocorreu, por exemplo, pela não produção de prova essencial ao acolhimento da pretensão, deve demonstrar, o interessado, que o pedido foi feito na petição inicial e que o advogado deixou a instrução correr sem ser requerida tal prova. O mesmo se diga quando a prova foi requerida e indeferida, deixando o advogado de recorrer desse indeferimento quando poderia tê-lo feito, cabendo ao cliente demonstrar que o advogado não recorreu neste caso.

Assim, aquele cliente que se diz prejudicado deve sempre demonstrar judicialmente que teve uma chance perdida e o dano que suportou. Porém, quando ficar evidente que era improvável a sua pretensão obter sucesso, a perda de uma chance não lhe acarreta nenhum dano.

3.14.2.2 Demonstração judicial do nexo causal

Nas situações de perda de uma chance, sendo demandado o advogado a reparar os danos sofridos pelo cliente, cabe ao causídico provar que se o ato (o qual não fora praticado ou fora praticado com imperfeição e que é tido como causa geradora do dano) tivesse sido realizado de forma correta, o dano sofrido pelo constituinte seria o mesmo, cabendo ao magistrado analisar, a posteriori, mediante um juízo de probabilidade (teoria da causalidade adequada), se essa alegação pode excluir o nexo causal.

Como já dito anteriormente, a regra é de que cabe ao autor provar os fatos constitutivos de seu direito e ao réu os fatos extintivos, modificativos e impeditivos do direito do autor. Assim o é nas ações de reparação por dano extracontratual. Todavia, quando há descumprimento de obrigação contratual, como no caso dos serviços advocatícios, o ônus recai sobre o devedor, o advogado. O cliente tem como fato constitutivo de seu direito o contrato e o dano sofrido. Assim, alegando que o advogado não cumpriu o contrato (mandato judicial), cabe a este último demonstrar algum fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do cliente. Desta forma, cabe ao advogado, em sua defesa, demonstrar que agiu de forma correta ou que o dano não decorreu de sua omissão, isto é, que mesmo com a sua falha, o cliente não teria sua pretensão acolhida, podendo demonstrar essa probabilidade de não acolhimento de tal pretensão com base na jurisprudência acerca do direito pleiteado pelo cliente, a qual deve se mostrar desfavorável a este para justificar que o dano não adveio da conduta omissiva do advogado, ficando livre do dever de indenizar por não haver nexo causal entre sua conduta e o dano sofrido pelo constituinte.

Neste sentido, colhem-se os ensinamentos de Sérgio Novais Dias:

Proposta, então, a ação de responsabilidade civil contra o advogado pela perda de uma chance, ele se defenderá alegando ou que não houve a perda de uma chance, porque não teria sido contratado par a ação, ou que seu mandato fora anteriormente revogado, ou que ele renunciara a tempo o mandato (na forma legal), ou, em caso de recurso, que não cabia a interposição de recurso naquele caso. Reconhecendo, porém, o advogado a prática do ato ou da omissão a ele imputável, que implicou a perda de uma chance, poderá alegar – e caberá a ele provar – a inexistência de nexo de causalidade entre o ato ou a omissão e o dano, circunstâncias que serão sempre avaliadas, caso a caso, em termos de probabilidade do que normalmente aconteceria.

[...]

Cabe, pois, ao devedor que inadimpliu a obrigação de provar que o dano sobreviria, mesmo se a obrigação fosse oportunamente desempenhada, ou seja, compete ao advogado provar que o cliente teria julgada contra si a ação ou o recurso cabível, se tivesse sido oportunamente ajuizado, isso numa perspectiva da causalidade adequada, ou seja, de probabilidade do resultado do julgamento que não ocorreu.

Nessa ação de responsabilidade civil, as partes discutirão qual teria sido o provável resultado daquela ação que deixou de ser ajuizada pelo advogado, ou daquele recurso que deixou de ser interposto. [154]

3.14.3 A posição doutrinária acerca da perda de uma chance no direito brasileiro

A respeito do posicionamento da doutrina no que tange a aceitação da teoria da perda de uma chance no ordenamento jurídico brasileiro, serão utilizadas as lições de Sérgio Savi, o qual abordou o tema e fez uma síntese das idéias e entendimentos de grandes doutrinadores do direito civil nacional.

Mesmo não sendo objeto de um estudo mais aprofundado pelos juristas que atuam no âmbito do direito civil, especialmente da responsabilidade civil, a teoria da responsabilidade civil por perda de uma chance vem sendo aceita no ordenamento jurídico brasileiro, tanto pelos autores clássicos quanto pelos contemporâneos.

Doutrinadores como Agostinho Alvim, Aguiar Dias e Carvalho Santos admitem a aplicação da teoria da responsabilidade civil pela perda de uma chance em nosso ordenamento. Porém, Sérgio Savi faz uma observação, argumentando que alguns desses doutrinadores que aceitam a aplicação de tal teoria acabam por tratá-la como se fosse uma espécie de lucro cessante e traz a seguinte lição, ao se referir a um caso de perda de uma chance por não interposição de recurso:

Ao inserir a perda de uma chance no conceito de lucro cessante e, desta forma, exigir a prova de que o recurso, acaso interposto, seria provido, Carvalho Santos acaba por inviabilizar qualquer pretensão de indenização da chance perdida por si só considerada.

Como visto ao longo deste livro, se fosse possível produzir esta prova, estaríamos diante de um típico caso de lucro cessante e, por este motivo, o advogado teria que ser condenado ao pagamento de tudo aquilo que o cliente razoavelmente teria direito se o recurso fosse provido.

Todavia, o que deve ser objeto de indenização é a perda da possibilidade de ver o recurso apreciado e julgado pelo Tribunal, possibilidade esta que restou definitivamente afastada em razão da negligência do advogado. [155]

Caio Mário da Silva Pereira e Miguel Maria Serpa Lopes também se posicionam favoráveis a essa teoria e sua aplicação do Direito brasileiro, devendo ser caracterizada como chance perdida aquela que tenha um grau de probabilidade suficiente, "ou seja, exigem [...] que a possibilidade perdida seja real e séria". [156] E na seqüência, Sérgio Savi colhe o pensamento de Judith Martins-Costa:

Embora a realização da chance nunca seja certa, a perda da chance pode ser certa. Por estes motivos não vemos óbice à aplicação criteriosa da Teoria. O que o art. 403 afasta é o dano meramente hipotético, mas se a vítima provar a adequação do nexo causal entre a ação culposa e ilícita do lesante e o dano sofrido (a perda da probabilidade séria e real), configurados estarão os pressupostos do dever de indenizar. [157]

Savi ainda menciona a aceitação de Silvio Venosa, o qual enquadra a perda de uma chance entre o lucro cessante e o dano emergente, classificando-a como um terceiro gênero de indenização, e a posição de Sérgio Novais Dias, que, segundo Sérgio Savi, trata a perda de uma chance como uma espécie de lucro cessante. E, por fim, apresenta os ensinamentos de Rafael Pettefi da Silva, que assim expõe:

Rafael Pettefi, após analisar a posição doutrinária francesa, afirma que a responsabilidade civil por perda de uma chance encontra-se atualmente, dividida da seguinte forma: ora é utilizada como uma categoria de dano específico, independente do dano final; ora é utilizada como recurso à causalidade parcial, hipótese em que se verifica a perda da vantagem esperada (dano final). Segundo esse autor, ambos os casos de utilização da noção de perda de uma chance podem ser utilizados tanto na responsabilidade médica como em outros casos, dependendo sempre do caso concreto. [158]

O que se conclui sobre a aceitação da doutrina acerca aplicação da perda de uma chance no Direito brasileiro é que, apesar de posicionamentos diferentes sobre a forma de se enquadrar a indenização das chances perdidas (se como dano material ou moral, dano emergente ou lucro cessante), desde que a chance perdida seja séria e real, adquire valor econômico e torna-se passível de ser indenizada.

3.14.4 A posição jurisprudencial acerca da perda de uma chance no direito brasileiro

Ao se analisar os julgados sobre a perda de uma chance, percebe-se que o seu número vem aumentando com o passar dos anos, o que deixa claro que a teoria vem sendo cada vez mais utilizada e vem encontrando respaldo na jurisprudência, visto que os julgadores vêm aceitando e aperfeiçoando o entendimento sobre essa espécie de indenização, mesmo que ainda hoje haja dificuldades em harmonizar os conceitos de perda de uma chance e a devida maneira de sua aplicação.

A pesquisa jurisprudencial realizada neste trabalho demonstra como o tema da responsabilidade civil por perda de uma chance vem se tornando cada vez mais presente no ordenamento jurídico brasileiro.

[...]

[...] Contudo, apesar de reconhecerem a possibilidade de reparação da chance perdida, desde que real e séria, encontram dificuldade em harmonizar o conceito.

Em alguns julgados, a perda da chance é considerada uma modalidade de dano moral; em outras oportunidades, é inserida no conceito de lucro cessante e poucas vezes é tratada como modalidade de dano emergente. [159]

3.14.4.1 A perda de uma chance como modalidade de dano moral

A jurisprudência, em muitos julgados, vem considerando casos em que a perda de uma chance constitui dano moral, ignorando o dano material decorrente da perda de uma chance. E assim tem-se a lição e o exemplo de Sérgio Savi:

Como em diversas outras hipóteses mais comuns e recorrentes no direito brasileiro, um fato do ofensor que ocasione a perda de uma chance para a vítima poderá ser considerado fato gerador de duas espécies de danos distintas.

Imagine-se, por exemplo, o caso de um "concursando" aprovado no provão e em todas as provas específicas, mas que se vê ilegitimamente excluído da prova oral pela comissão organizadora do concurso. A vítima, alegando que a atitude ilícita daquela comissão fez com que ela perdesse a chance de fazer a prova oral e, conseqüentemente, de ser aprovada no concurso do qual participava, poderá requer a condenação ao pagamento de indenização por danos materiais emergentes (perda da chance) e por danos morais (a frustração decorrente do ato ilícito).

Ou seja, não há dúvida de que, em determinados casos, a perda da chance, além de representar um dano material, poderá, também, ser considerada um "agregador" do dano moral. [160]

Há casos em que o magistrado, ao julgar a causa, pode se deparar com um caso onde a chance perdida não é séria nem real, não ensejando a reparação de danos materiais por meio da utilização dessa teoria, mas podendo, no caso, a mera expectativa perdida gerar o dano moral, passível de indenização.

Em suma, há casos em que a perda de uma chance pode representar um dano material e também poderá ser um "agregador" do dano moral. Em outros casos, decorrente de perda de uma chance, o dano material pode não ser passível de indenização, por falta de requisitos necessários, mas poderá ensejar a reparação por danos morais em razão da expectativa frustrada. "O que não se pode admitir é considerar o dano da perda de uma chance como sendo um dano exclusivamente moral, já que, presentes os requisitos [...], o mesmo poderá configurar um dano material, uma sub espécie de dano emergente". [161]

3.14.4.2 Mera possibilidade não é passível de indenização

A indenização por perda de uma chance, cujo conceito e aplicação ainda não se encontram pacíficos nem pela doutrina e nem pela jurisprudência, vem sendo, em alguns julgados, concedida em casos em que a chance perdida não se apresenta com a realidade e a seriedade exigidas para se configurar possível uma reparação de danos com base nessa teoria, isto é, a mera possibilidade, mera expectativa de direito perdido, embasa, por vezes, a indenização pela perda de uma chance, o que se mostra errado, uma vez que somente quando o grau de probabilidade de que a chance perdida poderia ter sido um direito certo para a vítima de tal dano, realmente passível de ser incorporado à sua esfera de direitos, é que se faz presente a possibilidade de se pleitear indenização pela perda de uma chance.

Portanto, não é qualquer chance perdida que pode embasar um pedido de indenização. Ela deve ser real e séria, havendo um determinado grau de probabilidade de obtenção do resultado almejado para que, ai sim, possa-se falar em perda de uma chance. Mera expectativa ou possibilidade não conduz à indenização por perda de uma chance.

Não bastassem os acórdãos que se limitam a enquadrar o dano da perda da chance como espécie de dano moral, há outra série de julgados que determinam a indenização da "chance perdida", sem que esta sequer exista ou possa ser considerada séria ou real.

[...]

[...]não é, portanto, qualquer chance perdida que pode ser levada em consideração pelo ordenamento jurídico para fins de indenização. Apenas naqueles casos em que a chance for considerada séria e real, ou seja, em que for possível fazer a prova de uma probabilidade de no mínimo 50% (cinqüenta por cento) de obtenção do resultado esperado (o êxito no recurso, por exemplo), é que se poderá falar em reparação da perda da chance como dano moral emergente. [162]

3.14.4.3 A quantificação do dano da perda da chance

Apesar de os julgados estarem reconhecendo a responsabilidade civil por perda de uma chance, tem-se deparado com uma questão tormentosa, qual seja, a quantificação do dano nestes casos.

Uma maneira de solucionar a questão da indenização em caso de falta de diligência dos advogados, que com sua atuação omissiva faz com que haja a perda da chance do cliente ver sua pretensão julgada, causando-lhe prejuízo, pode surgir com o advento das súmulas vinculantes, inseridas na CF a partir da emenda constitucional nº 45. Assim, se o cliente, autor de ação de indenização contra advogado pela chance perdida, demonstrar a identidade de situação fática entre o seu caso e os casos que levaram à edição de uma súmula vinculante, a qual invoca em seu benefício, restará claro que o órgão julgador deveria ter julgado de acordo com o disposto na súmula e que, portanto, realmente houve um dano, uma vez que, se idênticas forem as situações fáticas do caso em análise e dos casos considerados para a edição da súmula vinculante, outro não poderia ser o resultado senão aquele que alega o cliente, ou seja, a sua vitória na ação onde perdeu em razão da omissão do advogado na prática de algum ato processual, como, por exemplo, a não interposição de um recurso. Nestes casos de aplicação da súmula vinculante, estar-se-ia indenizando, portanto, o lucro cessante do cliente, o qual passa a ser claro, e não chance perdida.

Ainda no que tange à quantificação do dano na perda de uma chance, tem-se que, mesmo sendo difícil chegar a um valor para a indenização, há critérios que devem ser observados nessa tarefa, como demonstra Sérgio Savi:

Inicialmente, cumpre destacar que, [...], a indenização da perda da chance jamais poderá ser igual ao benefício que a vítima obteria se não tivesse perdido a chance e tivesse conseguido o resultado útil esperado. [...] Por não haver certeza da vitória no recurso, a indenização da chance perdida será sempre inferior ao valor do resultado útil esperado.

Se fosse possível afirma, com certeza, que o recurso acaso interposto seria provido, a hipótese seria de indenização dos lucros cessantes e não da perda da chance, [...].

Para a valoração da chance perdida, deve-se partir da premissa inicial de que a chance no momento de sua perda tem um certo valor que, mesmo sendo de difícil determinação, é incontestável. É, portanto, o valor econômico desta chance que deve ser indenizado, independentemente do resultado final que a vítima poderia ter conseguido se o evento não a tivesse privado daquela possibilidade.

[...]

Quanto à quantificação do dano, a mesma deverá ser feita de forma eqüitativa pelo juiz, que deverá partir do dano final e fazer incidir sobre este o percentual de probabilidade de obtenção da vantagem esperada. [163]

Em vista do que fora apresentado acerca da quantificação do dano da perda de uma chance, percebe-se a dificuldade em estabelecê-lo, o que não serve de argumento para aqueles que não aceitam a indenização das chances perdidas para refutá-las, pois mesmo diante de tal dificuldade, a existência de danos com essa natureza vem sendo cada vez mais aceita e aprimorada na doutrina e na jurisprudência.

3.15 Perda de prazo

A questão dos prazos processuais apresenta-se extremamente complexa, em face da diversidade de prazos existentes. Assim, estabelece o CPC que os atos processuais devem ser praticados nos prazos prescritos na lei e, em caso de omissão dessa, nos prazos fixados pelo juiz. Ainda, quando não houver nem um, nem outro, o ato deverá ser praticado no prazo de cinco dias. Há prazos fatais e peremptórios e os que assim não são, podendo ser dilatados. Em determinadas situações, poderá ser contado em dobro ou em quádruplo. Litisconsortes com procuradores diferentes terão prazo em dobro para certos atos. E ainda apresenta questão tormentosa no que tange ao termo a quo (data de início) e ao termo ad quem (data do término). Há prazos que são suspensos ou interrompidos. Enfim, diversos aspectos envolvem a questão dos prazos para a prática dos atos processuais, o que, via de regra, não exime o advogado de cumpri-los.

Perder prazo, para o advogado, constitui erro grave, visto que os prazos encontram-se expressos na legislação ou então são determinados expressamente pelo juiz, ou seja, é matéria legal, da qual o advogado deve ter conhecimento. Quaisquer dúvidas que venha a ter, como no que tange à sua contagem, deve-se valer da boa doutrina e da jurisprudência para não falhar, assim como deve se conduzir em todos os momentos durante sua vida profissional. "Constitui erro grave, a respeito do qual não é possível escusa, uma vez que o os prazos são de direito expresso e não se tolera que o advogado os ignore". [164]

O advogado que perde o prazo para a prática de um ato processual e desse seu erro advém algum prejuízo a seu cliente, responde pela perda de um direito que este último sofreu ao não ser praticado aquele ato, que pode ser, por exemplo, uma contestação, um recurso não interposto, uma reconvenção não feita. Enfim, advindo dano dessa não observância de prazo, surge a responsabilidade para o advogado pela perda do direito do cliente em ver realizado um ato processual, fato este que poderá acarretar prejuízo em sua situação dentro da lide ou até mesmo lhe acarretar a perda da demanda.

Entretanto, importante salientar que somente o erro grosseiro, que gere efetivo dano ao constituinte, é que tem o condão de responsabilizar o causídico, pois em certas circunstâncias a solução pode ser diversa da responsabilização do advogado.

Significa que, em matéria de prazo, apenas nos casos de erro crasso, inadmissível e visível icto oculi e, portanto, inescusável, que cause efetivo dano é que se poderá responsabilizar o causídico.

[...]

Contudo, segundo nos parece, há hipóteses e circunstâncias que poderão escusar o profissional pelo erro cometido, em situações anômalas nas quais o erro mostra-se escusável. [165]

Quando houver dúvidas sobre a forma de se contar os prazos, uma vez que nem sempre a legislação se apresenta clara sobre o assunto, o melhor é que, "na dúvida entre prazo maior ou menor, deve a medida judicial ser tomada dentro do menor, para não deixar nenhuma possibilidade de prejuízo ao cliente". [166]

3.16 Omissão de providências

O advogado também é responsável pelas providencias que deve tomar tempestivamente para resguardar os direitos de seu cliente, evitando o perecimento ou o sacrifício dos mesmos, sendo esta incumbência existente desde o período anterior ao contrato.

O advogado deve ser diligente e atento, não deixando perecer o direito do cliente por falta de medidas ou omissão de providências acauteladoras, como o protesto de títulos, a notificação judicial, a habilitação em falência, o atendimento de privilégios e a preferência de créditos. Deve, inclusive, ser responsabilizado quando dá causa à responsabilidade do cliente e provoca a imposição de sanção contra este, nas hipóteses dos arts. 16 a 18 do Código de Processo Civil. [167]

Quanto ao período anterior ao contrato, ou seja, antes de haver o desempenho do mandato, a responsabilidade do advogado é assim entendida por José de Aguiar Dias:

No período anterior ao desempenho do mandato, a responsabilidade do advogado se pode dar, ainda, pela omissão de providências preliminares, destinadas à ressalva dos direitos do cliente.

Aceita a causa, obriga-se o advogado a dedicar o maior zelo e atenção no desempenho do mandato, dando ao cliente informações constantes e completas sobre o andamento do pleito e tomando ou fazendo tomar as providências que se fizerem necessárias ao bom êxito da incumbência ou, pelo menos, a, na medida das possibilidades do desfecho favorável ao cliente, promover tudo o que estiver ao seu alcance, nesse sentido. [168]

Então, a falta dessas medidas essenciais à conservação dos direitos do cliente, mesmo antes do início do mandato, quando o advogado é procurado e aceita defendê-lo, mas ainda não há um contrato firmado, cabendo a ele tomar as medidas urgentes para não perecer o direito em questão, faz nascer o dever de reparar os danos proporcionados ao cliente pela inércia do profissional, o qual deve ser diligente e se valer dos devidos meios de proteção aos direitos do constituinte, não podendo ser omisso, visto que dessa omissão poderá advir um dano e conseqüente obrigação de indenizar.

3.17 Falta de propositura de ação judicial

Aquele que necessita dos serviços de um advogado para pleitear em juízo um direito seu entra em contato, em tal situação, com esse profissional. Faz uma entrevista com o advogado e, entrando em acordo com o mesmo, assina-lhe a procuração e lhe presta as informações, entregando os documentos necessários para a propositura da ação. Ocorre que o advogado, após o atendimento e recebimento da documentação, guarda esse material e esquece de propor a ação, deixando correr o prazo prescricional. Quando o cliente lhe solicita informações acerca do caso, o advogado percebe que se omitira e que ocorreu a prescrição do direito do cliente, informando a este o ocorrido. O cliente, então, ajuíza uma ação indenizatória em face do advogado relapso por perda de uma chance.

Nesta situação, caberá ao advogado, em sua defesa, demonstrar que a pretensão do cliente não seria acolhida se tivesse sido ajuizada a ação, cabendo fazê-lo mediante todos os meios que estiverem ao seu alcance, sendo salutar o uso da jurisprudência para demonstrar que os tribunais julgariam a pretensão de maneira desfavorável ao seu cliente e que, portanto, esse não obteve nenhum prejuízo por não ter sua pretensão apreciada. Neste caso, a perda de uma chance estaria sendo considerada como uma espécie de lucro cessante, mas mesmo sendo demonstrado pelo causídico que o pedido do cliente não seria acolhido, parece que esse faz jus a uma indenização por danos morais, em razão de sua frustração em não poder discutir seu direito em juízo, mesmo que saísse perdedor da demanda. A indenização, nesse caso, seria pelo fato de ter sido privado de usufruir de um direito subjetivo seu, o direito de ação.

Interessante é o fato de que o advogado pode demonstrar, quando acionado para reparar danos de seu cliente, que não lhe cabia tal direito e que, portanto, não sairia vencedor da demanda. Nesse caso, poderia muito bem o advogado já ter consciência dessa situação logo que tomou conhecimento dos fatos e dos documentos trazidos ao seu conhecimento. Então, se ajuizasse uma ação nessas condições, poderia restar caracterizada a propositura de lide temerária, com ou sem a ciência e participação do constituinte, ou ainda, ficar clara a intenção de ludibriar o cliente para receber honorários de uma ação fadada ao insucesso.

Após esse comentário, volta-se a questão da perda de uma chance pela não propositura da ação judicial e tem-se que, se o cliente que alega ter sofrido dano, provar a existência desse, da conduta omissiva do advogado e do nexo causal entre um e outro, caberá ao magistrado condenar o advogado a compor os danos decorrentes da conduta omissiva, que gerou a perda de uma chance para o cliente, devendo aplicar os critérios cabíveis para a quantificação do valor indenizatório.

"Ocorre aqui, como visto, uma espécie de paráfrase do julgamento anterior, que não ocorreu, onde o juiz da ação indenizatória terá de apreciar qual seria o provável resultado da ação não proposta". [169]

3.18 Pedido não formulado

Ao propor a ação, compete ao advogado formular todos os pedidos necessários para a obtenção de todas as vantagens a que tem direito o cliente. Assim, se o advogado se omite, em sua petição, em formular determinado pedido relativo a um direito do cliente que deve ser reclamado, ou deixa de fazê-lo em momento adequado e acaba por ocorrer a preclusão do direito por causa da omissão do causídico, não mais podendo ser postulado, há perda de uma chance do cliente e o advogado pode ser condenado a pagar indenização, caso se verifique que o autor tinha probabilidade muito boa de êxito se o pedido tivesse sido feito, ou seja, a chance perdida é real e séria.

É o caso do advogado que, contratado para ajuizar ação trabalhista, não formula pedido das parcelas rescisórias a que tem direito o cliente, as quais não poderão ser alvo do julgamento, por não terem sido incluídas no objeto da ação.

Da mesma forma que nos demais casos de responsabilidade civil do advogado pela perda de uma chance, se o cliente demonstrar que está com a razão, deverá receber a indenização pela perda de uma chance. Se o advogado, por sua vez, demonstrar que não haveria êxito mesmo que se o pedido fosse incluído no processo, livra-se de tal encargo.

A mesma situação se dá quando o advogado é do réu e se omite em ponto importante que deva constar na defesa, como o pagamento das parcelas rescisórias em ação trabalhista, pedindo para que sejam desconsideradas, proporcionando um prejuízo visível ao seu constituinte, pois, se o autor da ação trabalhista, no exemplo dado, sair vencedor da demanda, recebendo as verbas rescisórias, o empregador pode alegar e provar que, se tivesse feito tal argüição, não teria sofrido tal prejuízo.

3.19 Omissão na produção de prova necessária

Outra situação que pode ensejar a responsabilidade civil do advogado é quando este não produz uma prova necessária, decisiva no tocante ao convencimento do magistrado sobre o direito do cliente.

Pode ocorrer a ausência de prova pericial, que pode ter sido pedida, mas não foi promovida pelo advogado, o qual, pela situação fática que envolve o caso, deveria tê-lo feito, restando um dano ao cliente, que se vê privado de seu direito de ver a prova produzida e, com isto, ter maior possibilidade de sair vencedor da causa, na qual acabou saindo como vencido.

Cabe ao advogado, para não ser condenado à indenização pela perda de uma chance, demonstrar que mesmo sendo produzida a referida prova, o cliente não teria sua pretensão satisfeita porque o direito alegado não lhe pertencia, ou que por outro motivo qualquer não seria, a prova não produzida, hábil a lhe dar ganho de causa, afastando o nexo de causalidade da situação.

Ao cliente, por sua vez, cabe demonstrar a não produção da prova pelo advogado, a perda de sua chance de tentar, com a produção da prova, sair vencedor da ação, e o nexo causal entre a conduta do advogado e o respectivo dano alegado. Feito isso, deverá o magistrado atribuir responsabilidade civil ao causídico pela perda de chance de seu cliente.

Outro caso em que a falta de produção de prova pode acarretar dano ao constituinte por perda de chance é quando o advogado satisfaz-se em ouvir apenas uma das três testemunhas levadas a juízo pelo cliente, vindo a não ter acolhido o seu pedido pelo juiz por insuficiência de provas. Assim, o cliente, em uma ação de indenização por perda de uma chance, deverá demonstrar que se as outras duas testemunhas tivessem sido ouvidas o convencimento do juiz aconteceria e, conseqüentemente, sairia vitorioso da ação. Ao advogado, em sua defesa, caberá provar justamente o contrário, isto é, que as testemunhas não ouvidas am nada interferiam no juízo de valor formulado pelo julgador, livrando-se da responsabilidade civil pela perda de uma chance por não ter esgotado a oitiva de testemunhas que lhe foram disponibilizadas.

3.20 Extravio de autos

Pode ocorrer a hipótese de os autos serem extraviados, cabendo ao advogado, mesmo que não tenha sido ele o responsável por tal extravio, promover a restauração dos mesmos. Se não requerer, dentro um prazo razoável, a restauração dos autos extraviados, estará faltando com seu dever de diligência, podendo ser responsabilizado civilmente, caso advenha danos ao cliente por causa dessa sua omissão em requerer a restauração dos autos.

Em casos de extravio dos autos, o dano pode advir da demora que tal acontecimento acarretará na solução do feito. Pode ocorrer, também, que o processo seja extinto em razão do longo tempo em que ficou parado, sem a prática dos atos necessários ao desenvolvimento do processo.

Assim, sofrendo danos, o cliente, em razão do extravio dos autos, pode o advogado ser condenado a compô-los, mesmo que não tenha sido ele o responsável pelo acontecimento, bastando que deixe de requerer a restauração dos mesmos, pois esta é uma tarefa que lhe compete realizar. Mais óbvio será, então, a sua responsabilidade quando tenha sido ele próprio o causador do extravio e, na seqüência, não promove sua restauração, errando duas vezes.

Como nos demais casos de perda de uma chance, caberá ao cliente demonstrar a falta de diligência do advogado, a existência da perda de chance com o conseqüente dano e o nexo causal entre a conduta do causídico o resultado lesivo. Ao advogado compete demonstrar a inexistência de nexo causal, provar que requereu a restauração dos autos, mas que por motivos outros isso não aconteceu, ou, ainda, provar que não houve perda de chance, pois a ação não teria sucesso. E sobre este último aspecto que pode ser usado na defesa do causídico, Sérgio Novais Dias ensina:

O difícil aqui para o advogado é alegar que a ação era natimorta, ou seja, que a tese de direito em si mesma era, de plano, vencida na jurisprudência, pois, se assim realmente era quando da propositura da ação, mesmo que o juiz não reconheça o advogado como responsável pelos danos decorrentes da perda da chance, sem dúvida que o responsabilizará pelos danos causados pela aventura judicial que impôs ao cliente, ao propor uma ação que sabia ou devia saber sem chance de êxito. Neste caso, certamente o advogado será também condenado, se for levado ao Tribunal de Ética da OAB. [170]

Se o juiz da ação de indenização proposta pelo cliente concluir que o mesmo sofreu dano por perda de chance em razão de extravio de autos, já que tinha probabilidade muito grande de êxito no processo cujos autos se perderam, condenará o advogado a pagar a indenização pela chance perdida.

3.21 Não conhecimento de recurso por falta de preparo

Outra situação embaraçosa e de difícil explicação para o advogado é o não conhecimento de recurso por falta de preparo, pois estabelece o art. 511 do CPC que, ao interpor recurso, o recorrente deverá comprovar o preparo, sob pena de deserção, dispondo, em seu §2º, que a insuficiência no valor do preparo também implica em deserção, ou seja, não preparar o recurso ou fazê-lo com valores insuficientes implicam na mesma conseqüência processual.

Exceto no caso em que o cliente não disponibiliza numerário suficiente para o advogado realizar o preparo, já que este não tem a obrigação de custear as despesas processuais com seu próprio dinheiro, toda vez que o causídico deixar de preparar o recurso, configurada estará sua culpa, ensejando para o cliente a possibilidade de ajuizar ação indenizatória em face do advogado relapso por perda de chance, devendo, como sempre, provar que se o Tribunal tivesse tomado conhecimento do recurso, obteria julgamento favorável. Ao advogado cumpre demonstrar, por todos os meio legais, que assim não aconteceria.

3.22 A sistemática do agravo de instrumento, a interposição de recurso inadequado, o pedido de reconsideração e o protocolo integrado à luz da perda de uma chance

O agravo de instrumento, por ser dirigido diretamente ao Tribunal, exige que sejam cumpridos certos requisitos para que seja conhecido, os quais, se não se apresentarem quando de sua interposição, fará com que o recurso em tela não seja conhecido e poderá acarretar, pela falta de diligência do advogado na formação do instrumento, a perda de uma chance para o cliente e, assim, o dever de indenizar os danos proporcionados. Vale lembrar que, por ser recurso de sistemática excepcional e de julgamento célere, não é admitida a conversão em diligências nem prazo para emendar erros, ou seja, deve ser instruído de forma correta no ato de sua interposição, sob pena de não ser conhecido.

Neste recurso, as cópias de documentos devem ser rigorosamente revisadas quando de sua interposição, afim de não se permitir que nenhum documento seja esquecido. A legibilidade das cópias deve ser, também, alvo de atenção, pois a má impressão da cópia prejudica a leitura da data de protocolização, interferindo na identificação da tempestividade do agravo, que pode não ser conhecido se houver dúvida quanto à mesma. Cabe, ainda, à parte que agravou, juntar no processo a cópia do recurso, para que o juízo a quo tenha conhecimento do estado em que se encontra o processo. Não sendo tomada tal providência, o recurso também não será conhecido. Enfim, devem ser respeitados todos os requisitos desse recurso, que possui sistemática excepcional.

"Ora, perdendo o cliente a expectativa de ter um agravo conhecido [...] por erro do advogado, [...] abre-se caminho para o pedido de indenização por perda de uma chance". [171]

O advogado que interpõe recurso inadequado, sendo este previsto em lei, cometendo um erro tão grosseiro que nem se permite o aproveitamento daquele diante do princípio da fungibilidade, age com culpa, afinal, acontecendo tal situação, onde o recurso cabível é previsto na legislação, não pode o advogado alegar o desconhecimento da lei.

É o caso do advogado que interpõe agravo da decisão que julga sobre assistência judiciária, sendo que o correto, disposto na Lei nº 1.060/50, é a interposição de apelação para o caso, não podendo ser conhecido um recurso no caso em que outro está expressamente previsto na legislação. "Ora, o não-conhecimento poderá prejudicar a chance de a parte obter a gratuidade judiciária, sugerindo-se a responsabilidade do advogado". [172]

Outro acontecimento corriqueiro na prática forense é o pedido de reconsideração. Trata-se de uma manifestação do advogado diante de uma decisão interlocutória desfavorável aos interesses de seu cliente, pedindo reconsideração do despacho. Ocorre que, por não ser uma figura legal, isto é, por não ter previsão no CPC, é ato inexistente, não suspendendo e nem interrompendo o prazo para interposição do agravo. A doutrina e a jurisprudência se mostram implacáveis nesse caso, podendo ocorrer preclusão quando o advogado faz o pedido de reconsideração e deixa escoar o prazo para interpor o agravo, acreditando que o pedido de reconsideração suspende ou interrompe a fluência do prazo do recurso adequado. "Convém que o advogado não formule reconsideração para não incidir em preclusão, optando, em caso conveniente, por dirigir-se ao juiz sem prejuízo do agravo de instrumento cujo prazo não se interrompe ou suspende, para que o cliente, depois, não o culpe pelo insucesso da demanda," [173] por perda de uma chance.

Há, ainda, outra questão que pode ensejar ao cliente o pedido de indenização por perda de uma chance, relativa ao protocolo integrado, que, nos Tribunais estaduais, facilita a vida do advogado, evitando que o mesmo não se locomova a um juízo ou Tribunal para cumprir seus prazos. Assim, advogados do interior não precisam se locomover até a capital para entregar peças do processo de que lá participa. Todavia, esse processo não se aplica aos recursos dirigidos ao STJ, conforme dispõe a súmula 256 dessa Corte.

Desta forma,

Perder o prazo do recurso (não aqueles que são processados no Tribunal a quo) por não protocolizar em Brasília (encaminhar pelo protocolo integrado contra os dizeres de uma súmula) pode caracterizar erro inescusável e, conseqüentemente, permitir o questionamento de indenizabilidade por perda de uma chance ou da chance de exame do recurso de embargos no STJ. [174]

3.23 Ausência de contra-razões ao recurso

O cliente pode alegar que a ausência de contra-razões acarretou-lhe a perda da chance de evitar que fosse julgado contra si o recurso da outra parte. É claro que cabe ao juiz dizer o direito, mas compete ao advogado usar dos meios necessários ao seu convencimento. Por vezes, a ausência de contra-razões ao recurso pode não interferir em seu julgamento. Mas, em certas situações, pode ser decisiva.

Acontece que a matéria a ser devolvida ao Tribunal, quando interposto um recurso, já se encontra nos autos, estando à disposição do juiz relator para leitura. Além do que, conforme o disposto no art. 515, §§1º e 2º do CPC, são objeto de apreciação e julgamento pelo tribunal todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que a sentença não as tenha julgado por inteiro, e que a apelação devolverá ao tribunal o conhecimento dos demais fundamentos do pedido e da defesa, caso existam, mesmo quando o juiz de primeira instância acolher apenas um deles. Isto é, toda a matéria de primeira instância é levada à apreciação do órgão ad quem, já estando ali os fundamentos do direito alegado pelo recorrido. Não precisa, portanto, alegar novamente os argumentos e nem reiterar os pedidos, que já se encontram automaticamente feitos por ocasião do efeito devolutivo. "Precisa ele, ao contrário, suscitar nas razões, se for o caso, as questões novas que pretende ver apreciadas pelo órgão ad quem, juntando a prova de que deixara de fazê-lo, até então, por motivo de força maior". [175]

Desta forma, se o advogado receber do cliente os documentos novos que não foram apresentados até então por motivo de força maior ou porque a parte não tinha conhecimento de sua existência e não apresentá-los nas contra-razões, sendo que, se fossem utilizados, a probabilidade de sair vitorioso no recurso seria muito grande, claro está que gerou a perda de chance de seu cliente, devendo ser responsabilizado pelos danos que proporcionar.

Como já dito, toda a matéria discutida em primeira instância encontra-se à disposição do relator do recurso, mas não há garantia que ele irá ler todo o processo e, conseqüentemente, as alegações já feitas pelo advogado do recorrido. Por isso, as contra-razões são importantes, pois contradizem as razões do recurso, facilita a leitura e proporciona a conclusão do relator em sentido contrário ao que é pedido pelo recorrente, defendendo melhor os interesses do cliente. Nesse sentido, escreveu Novais Dias:

[...] não há nada que garanta à parte que o relator, na prática, lerá minuciosamente todas as folhas dos autos. Por esse motivo, as contra-razões são sempre úteis para combater diretamente os argumentos do recurso, oferecendo mais facilmente ao relator a opinião contrária ao recorrente, competindo ao advogado oferecê-las, na defesa dos direitos e interesses do seu cliente.   

Casos há em que a ausência de contra-razões pode, efetivamente, na prática, fazer falta, [...]. [176]

Vale lembrar que nestas situações de perda de chance, cabe, tanto ao cliente que se diz lesado, quanto ao advogado em sua defesa em uma ação de indenização pela perda de uma chance, provar o que lhe interessa.

O efeito devolutivo previsto nos §§ 1º e 2º do artigo 515 do CPC é, sem dúvida, quase sempre um forte argumento de defesa do advogado, para excluir o nexo causal entre a inexistência de contra-razões da outra parte e a perda de uma chance do seu cliente. [177]

3.24 Ausência de sustentação oral ao recurso

Em determinadas espécies de recursos, o advogado pode fazer sustentação oral na sessão de julgamento. Como incumbe a esse profissional se valer de todos os meios possíveis na defesa dos interesses de seu cliente, caso não faça a sustentação oral do recurso, pode-se vislumbrar a possibilidade de responsabilização do causídico pela perda de uma chance.

A questão é que, em regra, o voto dos juizes relatores e revisores já vêm prontos para a sessão, de acordo com aquilo que analisaram e absorveram da lide levada ao seu conhecimento. A importância da sustentação oral do recurso se apresenta quanto à possibilidade de convencimento de outros juizes que compõem a sessão de julgamento, os quais não tiveram vista dos autos. Assim, se a sessão é composta por três juizes, – sendo um relator, um revisor e um terceiro – pode este último, que não teve vista dos autos, formar seu juízo de valor com base na sustentação oral feita pelo advogado e, possivelmente, argumentar ao relator e revisor para repensarem o seu voto, podendo culminar no voto favorável ao cliente cujo advogado fez a sustentação oral. Em se tratando de colegiados, onde o número de juizes seja cinco, por exemplo, – um relator, um revisor e mais três – não tendo estes últimos vista dos autos, é sobre eles que o advogado fará incidir seu poder de persuasão para tentar sair vitorioso da causa por três votos a dois.

Isto ocorre porque nem sempre os desembargadores, pelo simples contato com os autos, conseguem absorver com clareza a situação fática discutida ou a questão de direito trazida ao seu conhecimento, sendo possível tal esclarecimento por meio da realização da sustentação oral do recurso.

"Contudo, sempre que a decisão do tribunal for coerente e juridicamente admissível, difícil será fixar um nexo causal entre o resultado desfavorável e a ausência do advogado na tribuna para a sustentação oral". [178] Mas se for possível demonstrar essa relação de causalidade em face da alta probabilidade de sucesso que teria o cliente se a sustentação oral fosse realizada, há a responsabilidade civil do advogado pela perda de uma chance.

Em sede de responsabilidade por perda de uma chance devido ao não comparecimento do advogado à sessão de julgamento, a situação que mais evidencia a existência dessa responsabilidade é quando o exame do Tribunal for relativo a valoração de fatos e de provas, quando, geralmente, a segunda instância também é a última, sendo a sustentação oral extremamente influente na decisão da causa, aumentando a probabilidade de êxito do cliente.

O que vai dizer se está ou não caracterizada a perda de chance no caso em análise, assim como nas demais hipóteses em que se cogita da aplicação dessa teoria, é o grau de probabilidade de êxito na pretensão do cliente se a sustentação oral fosse feita.

3.25 Não interposição de recursos de natureza extraordinária

Os recursos de natureza extraordinária (recurso especial ao Superior Tribunal de Justiça – STJ, recurso extraordinário ao Supremo Tribunal Federal – STF e o recurso de revista ao Tribunal Superior do Trabalho – TST) possuem estritas hipóteses de cabimento, não sendo qualquer motivo ou matéria que autoriza a sua interposição, sendo rigorosos os seus requisitos de admissibilidade.

Desta forma, como já fora tratado anteriormente, quando da análise da não obrigatoriedade de se recorrer, pode o advogado não interpor recurso dessa natureza por entender não ser cabível, ou ainda por falta de diligência.

Nesta última hipótese, cabe ao cliente demonstrar a mencionada falta de diligência, a chance perdida e o nexo causal entre um e outro para ser merecedor de indenização pela perda de uma chance. Ao advogado cabe fazer justamente o contrário para não ser responsabilizado.

Porém, se o recurso de natureza extraordinária não foi interposto por entender o advogado não ser cabível para o caso, o cliente, ao alegar ter sido lesado pela chance que perdera, deve demonstrar a viabilidade do recurso não interposto, sendo a hipótese enquadrada em um dos permissivos legais de admissibilidade. "Caso contrário, dano não houve em face da ausência de recurso, porque, não sendo ele cabível, o tribunal que por último proferiu a decisão era, à luz da lei processual, a última instância para aquela decisão". [179]

Se o permissivo que autoriza a interposição do recurso em tela é a violação da lei, cabe ao cliente demonstrar que atende a esse requisito provando que a decisão violou determinado dispositivo legal. O advogado, em sua defesa, poderá negar essa argumentação, alegando fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito alegado pelo constituinte.

Sendo o permissivo do recurso a violação à lei, deverá o cliente demonstrar o atendimento ao requisito, ou seja, que a decisão, em tese, violou determinada norma legal. Contudo, poderá o advogado, em sua defesa, negar o fato constitutivo, ou seja, que aquele fundamento era descabido, isto é, que não havia, em tese, a violação da norma, ou, como fato impeditivo, que aquele fundamento era por demais complexo, ou inusitado que ultrapassava o nível de argumentação e de conhecimentos esperados de um advogado médio (agravado o rigor do exame em se tratando de um especialista), de maneira que não tinha o advogado a obrigação de sustentar, neste caso, a violação da norma. Além disso, ainda como fato impeditivo, poderá demonstrar o advogado que, apesar de ser possível cogitar, em tese, violação da norma legal pela decisão, o que viabilizaria o seguimento do recurso e seu conhecimento, que o tribunal superior não daria acolhida à tese, em face da jurisprudência e da doutrina, ou seja, que o resultado provável do julgamento do recurso seria contrário ao cliente. [180]

Quando o permissivo autorizador do recurso for a divergência jurisprudencial, o cliente deverá demonstrar que a decisão proferida em seu desfavor foi de encontro com outra decisão, que atribuiu interpretação divergente da primeira. O advogado deverá defender-se demonstrando a inexistência de divergência ou a inacessibilidade à jurisprudência que diverge da decisão prolatada contra seu cliente.

Em se tratando de divergência jurisprudencial, caberá ao cliente alegar e demonstrar que a decisão deu a determinada norma interpretação divergente daquela que lhe conferiu outro tribunal, circunstância que, pelo permissivo daquele recurso, o viabilizaria. Pode o advogado defender-se negando a existência da divergência, ou alegar fato impeditivo, consistente na inocorrência de negligência ou de imperícia, demonstrando que aquele aresto veiculador da divergência não era acessível a um advogado razoavelmente informado, porque nunca foi publicado nos compêndios autorizados de jurisprudência disponíveis no mercado, exame esse cujo rigor é agravado tratando-se de renomado especialista. Poderá o advogado, também como fato impeditivo, demonstrar que, mesmo se caracterizada a divergência, o tribunal superior provavelmente optaria pela tese exposta na decisão não recorrida. [181]

3.26 Execução impossível

Frente ao inadimplemento de obrigação assumida pelo devedor, cabe ao credor promover ação para cobrar-lhe e, na seqüência, em caso de sentença favorável, ver a sua pretensão satisfeita através da fase de execução. Ou, em caso de a obrigação estar consubstanciada em título de crédito extrajudicial, promover a ação de execução diretamente.

A execução é voltada ao patrimônio do devedor, o qual será utilizado para satisfazer o crédito do credor. Todavia, a execução encontra suas dificuldades em ser realizada, muitas vezes por causa da dificuldade de se localizar os bens do devedor. Assim, se não são localizados os seus bens, se são impenhoráveis, se inexistem bens, ou se os existentes são insuficientes para saldar a dívida, torna-se impossível conseguir a execução.

O advogado não tem responsabilidade pelo fato de ser a execução impossível. Entretanto, há uma situação específica em que a atuação do causídico pode lhe conferir responsabilidade por se tornar impossível a execução. Esta situação ocorre quando na execução de sentença condenatória, constatar-se que o devedor alienou seu patrimônio para terceiros (provavelmente de boa-fé), no curso da lide, ficando sem bens em seu nome e, conseqüentemente, frustrando a possibilidade de êxito na execução, pois não haverá mais o que penhorar para satisfazer o crédito, uma vez que uma providência deixou de ser tomada pelo advogado.

Iniciada a execução, o devedor que não paga a dívida, nem faz nomeação válida, tem seus bens penhorados. Cabe ao advogado, nestas situações, promover a inscrição da penhora ou das citações de ações reais ou pessoais reipersecutórias relativas a imóveis no registro de imóveis. Fazendo isto, torna público o fato e, por conseguindo, afasta a presunção de boa-fé de um terceiro que venha a adquirir o bem do devedor.

Se um terceiro adquire o bem do devedor, deixa o credor sem a possibilidade de penhorar bens daquele, desde que o adquirente esteja de boa-fé. Mas se a penhora ou a citação de ação real ou pessoal reipersecutória relativa a imóveis for registrada, a presunção de boa-fé do terceiro adquirente é afastada, respondendo o referido bem pela execução, por se caracterizar fraude à execução, conforme estabelece o art. 592, V e 593, I e II, ambos do CPC.

Então, não há dúvida que a inscrição da penhora no registro de imóveis, quando esta recair sobre bens imóveis, é medida salutar para o êxito da execução e preservação do direito do credor. Se o advogado não toma tal providência, que está prevista em lei (CPC, art. 659, §§ 4º e 5º), responde pela perda de uma chance de seu cliente ver o bem leiloado para satisfazer o seu crédito, em razão de ter-se tornado impossível a execução, pois, "efetivar o registro da penhora passou a ser diligência obrigatória, porque de sua efetividade depende o êxito ou satisfação completa da execução". [182]

A situação muda quando se trata de registrar a citação ou a distribuição da ação de conhecimento ajuizada, para garantir uma futura execução. Aqui não existe a obrigação de tal providência. E sobre essa inexistência de obrigação de registro da citação ou de distribuição da ação de conhecimento, Ernesto Antunes de Carvalho, citado por Ênio Santarelli Zuliani, apresenta três motivos para a dispensa:

[...] três razões para dispensar o registro da citação ou distribuição da ação: não obrigatoriedade do ato, ao contrário do que ocorre com a penhora; alto custo financeiro do registro (onerando, ainda mais, o autor) e falta de especificidade do bem a ser penhorado no futuro. [183]

E Ênio Santarelli Zuliani acrescenta mais uma razão:

Acrescento mais uma a esse excelente estudo: o risco de ter o autor que providencia um registro dessa ordem e que, naturalmente, restringe a expectativa do réu, como proprietário, de dispor de seus bens, de responder, em caso de improcedência da ação, por prejuízos que essa restrição provocou, inclusive não patrimoniais. Todo esse debate mostra que a matéria é polêmica, sem unanimidade jurisprudencial, o que, em termos de obrigação de diligência, não vincula o advogado. [184]

Assim, não promovendo, o advogado, o registro da citação ou da distribuição da ação de conhecimento, mesmo que o réu da ação venha a alienar todo o seu patrimônio e ficar o autor da ação sem bens para serem penhorados, caso vença a demanda e haja uma futura penhora, não haverá responsabilidade do advogado pela perda de uma chance, pois esse profissional não violou seu dever de diligência, já que não há previsão legal para a prática de tal ato e em função dos demais motivos supracitados.

3.27 Ação rescisória não interposta

Por fim, analisa-se o último tópico deste trabalho sobre a responsabilidade civil do advogado, estudando a existência ou não da mesma, por perda de uma chance, quando o advogado não interpõe ação rescisória. Tem-se, então, duas situações.

Quando o advogado é contratado exclusivamente para propor a ação rescisória e, após a entrevista com o cliente e verificando ser cabível a medida, se não o propô-la, ter-se-á mesma situação de quando deixa propor uma ação judicial, situação esta já analisada anteriormente. Haverá, então responsabilidade do causídico por perda de uma chance.

O problema surge quando o advogado já atuou em todo o processo, cuja decisão transitou em julgado. A perquirição é acerca de existir ou não o dever de propor tal ação.

Para compreender e resolver tal problemática, importante a lição de J. C. Barbosa Moreira, citado por Novais Dias:

O direito brasileiro, à semelhança de outros ordenamentos, conhece dois tipos de remédios utilizáveis contra decisões judiciais: os recursos e as ações autônomas de impugnação. Em nosso sistema, o traço distintivo consiste em que, através do recurso, se impugna a decisão no próprio processo em que foi proferida, ao passo que o exercício de ação autônoma de impugnação dá sempre lugar à instauração de outro processo. A ação rescisória é exemplo clássico dessa segunda espécie. [185]

A ação rescisória apresenta peculiaridades. Deve haver, para a sua propositura, um depósito prévio no valor de 5% do valor da causa, que será revertido, a título de multa, à parte contrária em caso de inadmissibilidade ou improcedência, conforme prescreve o art. 488, II, do CPC. Cabe ao advogado, portanto, orientar seu cliente sobre esses riscos, pois além dessa quantia, poderá ser condenado ao apagamento de custas e honorários do advogado da parte contrária. Na Justiça do Trabalho, porém, não se exige o referido depósito.

Outra peculiaridade é que, da mesma forma que os recursos de natureza extraordinária, as hipóteses de cabimento dessa ação são restritas.

Assim, em face dessas peculiaridades, como a grande despesa que pode envolver essa impugnação, o advogado não pode ser diretamente responsabilizado pela perda de chance por não ter ajuizado a rescisória, mas sim porque não orientou seu cliente, ou seja, por omissão de conselho sobre seu cabimento e sobre as despesas, o que pode implicar a perda de uma chance. Nesse sentido, Novais Dias expõe:

Como a ação rescisória implica possibilidade de despesas de honorários de sucumbência e risco de pagamento de multa, não pode o advogado ser responsabilizado diretamente pela perda de uma chance por não ajuizá-la, mas sim por omissão de conselho que implicar a perda de uma chance. No processo do trabalho, contudo, em que não há depósito prévio nem, de ordinário, a condenação em honorários, abre-se espaço para a responsabilização do advogado diretamente pela perda de uma chance caso este não providencie a propositura da ação rescisória em situações como dos planos econômicos Bresser e Verão. É que, com a mudança da orientação jurisprudencial a respeito (de favorável para contrária aos empregados), inúmeras decisões transitaram em julgado antes que isso ocorresse, com julgamento favorável aos empregados, e as ações rescisórias, que foram depois ajuizadas com fundamento na violação literal da norma constitucional que trata do direito adquirido, têm sido acolhidas, uma vez que, tratando-se de interpretação da Constituição Federal, tem-se entendido que não se aplica a Súmula 343 do STF. Nesses casos, parece evidente que teria o advogado de uma empresa, condenada em diferenças salariais decorrentes desses planos econômicos, indiscutivelmente de propor a ação rescisória antes do prazo de dois anos após o trânsito em julgado da ação contrária aos interesses do cliente, desde que essa alteração jurisprudencial tenha se dado ainda dentro do prazo decadencial, pois antes dessa mudança de entendimento da jurisprudência não se poderia ter como provável o sucesso da ação rescisória. Não o fazendo, seria hipótese de responsabilização do advogado, porque provável o êxito da pretensão do cliente se fosse veiculada por esse meio autônomo de impugnação da sentença. [186]

Quando o advogado atuou no processo cuja sentença transitou em julgado, defende a doutrina que não seria um meio de defesa do mesmo, o qual não interpõe a rescisória, alegar que não foi contratado para esse processo, uma vez que se trata de ação autônoma, que instaura um outro processo, nos seguintes termos:

Compete, pois, ao advogado, como atribuição da condução técnica da causa, avaliar sempre o cabimento da ação rescisória contra a sentença transitada em julgado que contrariou os interesses de seu cliente e aconselhá-lo sobre a adoção da providência, com as necessárias advertências sobre os riscos financeiros do processo. Tratando-se de demanda trabalhista, deve o advogado cuidar da propositura da ação, quando cabível a rescisória e provável o resultado favorável ao seu cliente. [187]

Porém, a mesma doutrina entende que muitas das hipóteses enumeradas no art. 485 do CPC, por disporem sobre fatos e circunstâncias ocorridas fora do processo, que fogem ao conhecimento do advogado, mas que autorizam a propositura da rescisória, não ensejam o dever de esse profissional ajuizar a ação rescisória e, portanto, não pode ser responsabilizado pela perda de uma chance caso a ação não venha a ser proposta, salvo se tomou conhecimento dos fatos por meio de seu cliente e não o orientou sobre a possibilidade de promover tal ação.

Sendo proposta uma ação de indenização em face do advogado que não ajuizou a rescisória, alegando perda de uma chance em obter um novo julgamento que lhe poderia ser favorável, compete ao cliente (autor da ação de indenização) demonstrar o cabimento da ação rescisória e o não aconselhamento e ajuizamento da mesma, tendo o advogado conhecimento dos fatos autorizadores do pedido.

Ao advogado, em sua defesa, compete refutar o cabimento da ação, alegar inocorrência de culpa sua em razão de ser o argumento apresentado pelo autor como permissivo da rescisória complexo demais ou que fugia à capacidade exigível de um advogado razoavelmente atualizado na matéria, ou defender-se demonstrando que mesmo sendo proposta a ação rescisória o resultado do julgamento provavelmente seria desfavorável ao cliente, e, por fim, alegar que orientou seu cliente acerca da propositura da ação, mas por desejo desse, não foi ajuizada.


Considerações finais

Após o estudo acerca do tema proposto, ou seja, a responsabilidade civil do advogado, o que se pôde constatar foi a complexidade que o assunto comporta. Primeiramente por se tratar de responsabilidade civil, instituto do direito civil que gera divergências quanto a conceitos e entendimentos. Mas também por ser, a responsabilidade civil do advogado, alvo de estudos pormenorizados recentes. A doutrina e a jurisprudência ainda estão longe de serem unânimes em muitos pontos e a consolidação de alguns julgados parece começar a ocorrer.

Durante a análise das hipóteses propostas, foram trazidos aspectos controvertidos, com pensamentos dos doutrinadores sendo divergentes entre si. Podem ser exemplos disso a questão da não aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor à relação existente entre o advogado e o cliente, a qual, mesmo sendo uma relação de consumo, portanto devendo ser regida por esse diploma legal, não apresenta as mesmas características das relações que o supracitado código visa proteger após a sua criação e vigência.

Outro importante ponto do trabalho foi a apresentação do estudo feito acerca da perda de uma chance. Essa teoria, que vem sendo cada vez mais estudada e aplicada no direito brasileiro, passando a compor o ordenamento jurídico pátrio, é considerada por alguns doutrinadores como uma terceira espécie de dano, entre o dano emergente e do lucro cessante. Aliás, foi possível ver que alguns doutrinadores aproximam esta "nova modalidade" ao lucro cessante, enquanto que a doutrina que assim não entende critica o pensamento contrário. Na verdade, o que se tem é, como já dito, um entendimento ainda em formação acerca de certas teorias e temas da responsabilidade civil, dentre os quais se encontra a perda de uma chance. A questão da quantificação do valor indenizatório a ser pago à vítima do evento lesivo com base na perda de chance também apresenta divergências, assim como o aspecto de dano moral incutido em situações como essa.

Enfim, tirar conclusões sobre estes assuntos mais polêmicos e controvertidos da responsabilidade civil do advogado é tarefa árdua e em certo ponto até mesmo precipitada. A matéria continuará sendo lapidada pelos estudiosos e os entendimentos caminharão para um sentido cada vez mais próximos, devendo ser analisado cada caso concreto para se obter um posicionamento adequado, que esteja de acordo com o atual sistema jurídico.

É válido dizer novamente que o tema é por demais amplo e que os aspectos analisados são os mais comuns, salvo algumas hipóteses cuja possibilidade de ocorrer é mais remota, mas que foram objeto de reflexões dos estudiosos do Direito e que, em razão disso, mereceram abordagem por serem lições preciosas.

O trabalho apresentou, quando a situação analisada assim o exigiu em face às divergências doutrinárias, os entendimentos de ambas as partes e, quando foi possível, a situação que melhor se coaduna com o ordenamento jurídico brasileiro foi a defendida, mas sempre deixando claro que uma adoção de entendimento não significa a exaustão do mesmo, que pode encontrar abrigo em outro posicionamento.

Em vista do estudo feito e da matéria trazida no presente trabalho, parece que o objetivo do mesmo em colocar em evidência os principais erros cometidos pelos advogados e as conseqüências de suas ações foi atingido e que a pertinência do tema e sua importância foram enaltecidas. O que resta claro e vale lembrar é que no Direito nenhum assunto se esgota, visto que toda a verdade é sempre relativa, nunca absoluta.


Referências

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ZULIANI, Ênio Santarelli. Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil – n° 21 – Jan-Fev/2003 – Assunto Especial: Responsabilidade Civil do Advogado. Porto Alegre: Síntese, 2003.


Anexo - Jurisprudências

Apelação cível. Responsabilidade civil. Advogado que atua em reclamatória trabalhista. Insucesso na demanda não gera o dever de indenizar. Dano moral não configurado. Recurso improvido (TJRS – 2ª CC. – Ap. nº 70004631768. – Rel. Des. Ney Wiedemann Neto).

Responsabilidade civil. Advogado. Sentença desfavorável. Obrigação de meio, não de resultado. Ausência do causídico à audiência.

Para fixar-se a responsabilidade civil do advogado o juiz deve examinar a repercussão da omissão ou ato praticado e sua influência no resultado da demanda. Ainda, deve verificar as possibilidades de êxito do cliente. Confissão ficta aplicada em causa solvida em prova documental, exceto quanto à ocorrência de justa causa para a despedida. Todavia, é sabido que o depoimento pessoal, sem outros elementos, faz prova contra o depoente. Assim, conclui-se que a omissão do advogado não acarretou o decaimento. Não reconhecimento da responsabilidade civil. Recurso provido (TJRS – 3ªtrc-jec. – Ap. nº 71000513929. – Rel. Des. Maria José Schmitt Santana).

Responsabilidade civil. Advogado. Prestação de serviços deficiente. Danos morais e materiais. Exigência de prova de dolo ou culpa, esta grave e inescusável a justificar responsabilização.

A obrigação do profissional do direito é de meio e não de resultado, dependendo a responsabilidade civil da verificação de culpa (art. 159, do CC de 1916, e art. 14, § 4º, do CDC). Não havendo prova de que o profissional liberal haja obrado com culpa grave, ou errado grosseiramente, não há se falar em responsabilização. Não se tipifica desídia, negligência ou abandono da causa o não uso de todos os recursos ou prazos processuais, quando os pertinentes foram utilizados. Dir-se-á, inclusive, que a insistência, não raras vezes, provocando retardamento do feito, pode até tipificar litigância temerária, quando então sim poderia gerar responsabilização. Apelação desprovida (TJRS – 9ª CC. – Ap. nº 70008064180. – Rel. Des. Marilene Bonzanini Bernardi).

Erro inescusável do causídico

Responsabilidade civil. Advogado. Indenizatória ajuizada contra escritório de advocacia por cliente que perdeu a demanda. Pretensão ao ressarcimento do prejuízo sofrido com a sucumbência sob a alegação de que houve erro inescusável do causídico ao não argüir a prescrição da ação. Acolhimento. Indenizatória procedente. Sentença mantida. Voto vencido (1º TACSP – 2ª C. – Ap. – Rel. Jacobina Rabello – JTACSP – RT 123/45).

"Mandato – Indenização – Advogado – Ajuizamento pelo mandante – Desídia e culpa comprovada – Cabimento – O advogado que, no exercício de sua profissão, deixa de empregar a habilidade mínima que de sua formação se espera, incidindo em erro resultante da ignorância de preceitos elementares, agindo com culpa e causando prejuízo ao cliente, responde pela conseqüente indenização" (2º TACIVSP – Ap. c/ Ver. 651.095-00/1, 15-4-03, 4ª Câmara – Rel. Celso Pimentel).

Atuação ineficiente na defesa de uma causa em juízo

Indenização. Responsabilidade civil. Propositura contra advogado, que mal defendera os interesses dos autores em Juízo. Hipótese em que o mesmo se sujeita, eventualmente, à sanção disciplinar mas não civil, mormente quando devolveu o que recebera a título de honorários. Pedido improcedente (TJSP – 1ª C. – Ap. 113.443-1 – Rel. Luiz de Azevedo – j. 15.02.1990).

Advocacia. Ação movida pelos clientes visando à restituição de honorários, em face do prejuízo que o patrono lhes causou. Atividade limitada ao oferecimento de exceção de incompetência de Juízo e litispendência. Desídia do advogado que não oferece a certeza moral para se concluir: "se outro fosse o comportamento, não haveriam os autores perdido a demanda". Remuneração circunscrita apenas aos serviços prestados. Restituição devida, acrescentando-se a correção monetária. Recurso provido, em parte, para esse fim (TJSP – 2º C. – Ap. – Rel. João Del Nero – j. 01.07.1980 – RJTJSP 68/45).

Acordo sem o consentimento do cliente (desobediência às instruções do cliente)

Advogado. Transação. Renúncia de parte substancial do crédito do cliente sem o seu consentimento. Responsabilidade pelo dano. Indenização que deve corresponder à diferença entre o montante recebido e o eu teria direito o autor. – "A desobediência às instruções do constituinte, seja variando as que foram traçadas, seja excedendo os poderes ou utilizando os concedidos em sentido prejudicial ao cliente é fonte de responsabilidade do advogado" (TJSP – 14ª C. – Ap. – Rel. Ruiter Oliva – j. 13.06.1995 – JTJ-Lex 172/9).

Conselhos e pareceres

Constitucional. Administrativo. Tribunal de Contas. Tomada de contas. Advogado. Procurador. Parecer. C.F. Art. 70, parágrafo único. Art. 71, II, art. 133. Lei 8.906, de 1994, arts. 2º, §3º, art. 7º, art. 32, IX.

I – Advogado de empresa estatal que, chamado a opinar, oferece parecer sugerindo contratação direta, sem licitação, mediante interpretação da lei das licitações. Pretensão do Tribunal de Contas da União em responsabilizar o advogado solidariamente com o administrador que decidiu pela contratação direta: impossibilidade, dado que o parecer não é ato administrativo, sendo, quando muito, ato de administração consultiva, que visa a informar, elucidar, sugerir providências administrativas a serem estabelecidas nos atos de administração ativa. Celso Bandeira de Mello, "Curso de Direito Administrativo", Malheiros Ed., 13ª ed., p. 377.

II – O advogado somente será civilmente responsável pelos danos causados a seus clientes ou a terceiros, se decorrentes de erro grave, ou de ato ou omissão praticados com culpa, em sentido largo: Código Civil, art. 159; Lei 8.906/94, art. 32.

III – Mandado de Segurança deferido.

(STF – Mandado de Segurança 24.073-3 – DF – Rel. Min. Carlos Velloso)

Não obrigatoriedade em recorrer

Mandato. Responsabilidade civil do advogado. Opção por não recorrer de sentença desfavorável. Admissibilidade. – "Se o recurso se apresentava como temerário e protelatório, caracterizador de litigância de má-fé, tem o advogado o dever profissional de não recorrer, conforme inteligência do art. 17, VII do CPC, c/c art. 31, §1º, da Lei 8.906/94 (Estatuto do Advogado). Sentença de procedência reformada. Recurso referente à reconvenção não conhecido. Recurso da ação principal provido" (2º TACSP – 2ª C. – Ap. 567.552-00/7 – Rel. Felipe Ferreira – j. 10.04.2000).

"Mandato – Responsabilidade civil – Advogado (artigos 159 e 1.300, do Código Civil, artigo 32, da Lei nº 8.906/94) – Prova – Ausência – Descabimento. Não há culpa por negligência do advogado que não recorre da sentença desfavorável, se foi induzido por informações incorretas do cliente a promover ação temerária, cujo direito, prova irrefutável comprova inexistir. Inteligência do artigo 17, do Código e Processo Civil combinado com o artigo 31 e parágrafo único do artigo 32, da Lei 8.906/94. Sentença reformada" (2º TACSP – Ap. c/ Ver. 520.828, 22-6-98, 2ª Câmara – Rel. Felipe Ferreira).

Perda de prazo processual

Mandato. Reparação de danos. Perda de prazos processuais. Culpa grave. Indenização devida. – "Do exercício da advocacia exige-se, ao mínimo, o conhecimento de prazos processuais, a fim de que o profissional possa realizar a correta defesa dos interesses do constituinte, nos moldes admitidos pelas regras legais" (2º TACSP – 10ª C. – Ap. 521.964 – Rel. Marcos Martins – j. 24.03.1999 – RT 787/144).

Imunidade judiciária e ofensa irrogada a outrem em juízo

Dano moral. Advogada que se refere a perto em termos inadequados. Ação reparatória improcedente. Contexto da demanda. Imunidade judiciária. Responsabilidade disciplinar ocorrente. Responsabilidade civil inocorrente. Recurso provido. – "A pessoa que for muito sensível, incapaz de suportar certas insinuações ou mesmo ataques, não deve atuar em processos, porque neles as críticas candentes e as acusações são freqüentes. Não é todo sofrimento moral que pode ou deve ser reparado pecuniariamente. É preciso que a dor tenha expressão, que a reparação seja socialmente recomendável e que não conduza a distorções do nobre instituto. É o que aconteceria se se alargar o campo da reparação para um mero incidente processual" (TJSP – 4ª C. Dir. Privado – Ap. 41.580-4/0 – Rel. José Osório – j. 06.08.1998 – Bol. AASP 2.092/868).

Inviolabilidade e imunidade judiciária (arts. 133, da CF, 142, I do CP, e 70, §2º do Estatuto da OAB, Lei 8.906/94) – "O advogado que utiliza linguagem excessiva e desnecessária, fora de limites razoáveis da discussão da causa e da defesa de direitos, continua responsável penalmente. Alcance do §2º do art. 7º da Lei 8.096/94 frente a CF (arts. 5º, caput, e 133). Suspensão parcial do preceito pelo STf na ADIn 1.127-8. jurisprudência dominante no STF e STJ, a partir da Constituição de 1988. Seria odiosa qualquer interpretação da legislação vigente conducente à conclusão absurda de que o novo Estatuto da OAB teria instituído, em favor da nobre classe dos advogados, imunidade penal ampla a absoluta, nos crimes contra a honra e até no desacato, imunidade essa não conferida ao cidadão brasileiro, às partes litigantes, nem mesmo aos juizes e promotores. O nobre exercício da advocacia não se confunde com um ato de guerra em que todas as armas, por mais desleais que sejam, possam ser utilizadas. Recurso de habeas corpus a que se nega provimento" (STJ – 5ª T. – RHC 4.889 – Rel. Assis Toledo – j. 02.10.1995 – RT 734/583).

Responsabilidade civil do advogado – Ofensa moral assacada contra o juiz da causa –Conduta não amparada pela inviolabilidade profissional. Não há direito sem limites, mesmo no respeitante às garantias, inviolabilidades e imunidades constitucionais. Tanto é assim que a própria Constituição, se por um lado confere ao advogado inviolabilidade por seus atos e manifestações no exercício da profissão, por outro assegura a todos a inviolabilidade da honra, da imagem, da intimidade e da vida privada. Resulta daí não constituir prerrogativa do advogado atingir a honra do magistrado, ainda que o faça no exercício do seu edificante mister.

Ademais, sendo independente a responsabilidade criminal da civil, a imunidade penal prevista no art. 7º, §2º, da Lei 8.906/94, não tem nenhuma repercussão sobre o dever de indenizar do advogado pela prática de ato ilícito no exercício de sua atividade profissional (TJRJ – EInfrs 306/96 na Ap. cível 8.343/95 – 2ª Gr. Cs., rel. Des. Sérgio Cavalieri Filho).

Perda de uma chance

"Erro de técnica profissional – Perda de prazo para pagamento de preparo recursal – O procedimento é responsabilidade do advogado – Ocorrência de dano material – Dever do advogado indenizar – Decisão: conhecer – Rejeitar as preliminares – No mérito, negar provimento – Maioria" (TJDF – Ap. Cível 4750798, Acórdão 129913, 29-6-00, 4ª Turma Cível – Rel. Estevam Maia).

"Indenização – Dano moral – Não ajuizamento tempestivo de demanda trabalhista para a qual o mandatário havia sido contratado – Hipótese de perda de uma chance para o cliente – Desídia profissional – Caracterização – Admissibilidade. A conduta desidiosa do advogado que, por deixar de promover a ação judicial para a qual foi contratado, permite que prescreva o direito do cliente, caracteriza a figura da ‘perda de uma chance’, ensejando indenização de natureza moral" (2º TACSP – Ap. c/ Rev. 606.170-00/5, 31-10-01, 5ª Câmara – Rel. Luís de Carvalho).

"Responsabilidade civil do advogado – Embargos de declaração e apelações interpostas fora do prazo legal – Descumprimento do dever de diligência – Perda de prazos – Não conhecimentos dos recursos – Dano – Existência – Forma de liquidação – Ação procedente. O advogado tem o dever de manifestar recurso ordinário oportuno tempore, respondendo por sua interposição intempestiva. A perda de prazo, como ensina José de Aguiar Dias, ‘constitui erro grave, a respeito do qual não é possível escusa, uma vez que os prazos são de direito expresso e não se tolera que o advogado o ignore’ (Da responsabilidade civil, vol. 1, p. 348, Forense, 1987 – 8ª edição). O prejuízo da parte consiste na perda da possibilidade de ver apreciado o mérito da causa na instância superior. Não se configurando qualquer causa de exclusão de responsabilidade civil do advogado, impõe-se a procedência do pedido indenizatório, com fixação da indenização através de arbitramento e, liquidação de sentença, levando-se em conta que o dano corresponde a perda de uma chance. Decisão: unânime" (TJPR – Ap. Cível 833, 22-4-96, 5ª Câmara – Rel. Des. Carlos Hoffmann).

RESPONSABILIDADE CIVIL. ADVOGADO. PERDA DE UMA CHACNE. Age com negligência o mandatário que sabe do extravio dos autos do processo judicial e não comunica o fato à sua cliente nem trata de restaurá-los, devendo indenizar à mandante pela perda de uma chance (TJRS, 5ª Câmara Cível nº 591064837, Rel. Des. Ruy Rosado de Aguiar, julgada em 29/8/1991).


Notas

  1. DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil. 7 v. 20. ed. Sã Paulo: Saraiva, 2006, p.11.
  2. VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Responsabilidade Civil. 4 v. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2004, p. 22.
  3. DINIZ, op. cit., p.12.
  4. DINIZ, op. cit., p.13.
  5. DINIZ, op. cit., p.40.
  6. VENOSA, op. cit., p.14.
  7. DINIZ, op. cit., p.46.
  8. VENOSA, op. cit., p.62.
  9. DINIZ, op. cit., p.54.
  10. DINIZ, op. cit., p.55.
  11. DINIZ, op. cit., p.56.
  12. VENOSA, op. cit., p.33.
  13. DINIZ, op. cit., p.67.
  14. DINIZ, op. cit., p.71.
  15. VENOSA, op. cit., p. 35.
  16. DINIZ, op. cit., p. 92.
  17. DINIZ, op. cit., p. 93.
  18. VENOSA, op. cit., p.45.
  19. DINIZ, op. cit., p. 110-111.
  20. RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Responsabilidade Civil. 4 v. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 179.
  21. HENRI e MAZEAUD apud RODRIGUES, op. cit., p. 9.
  22. VENOSA, op. cit., p.25.
  23. RODRIGUES, op. cit., p. 10.
  24. VENOSA, op. cit., p.161.
  25. VENOSA, op. cit., p.167-168.
  26. VENOSA, op. cit., p.176.
  27. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, art. 2º.
  28. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, art. 3º.
  29. VENOSA, op. cit., p.199-200.
  30. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, art. 14.
  31. CARDELLA, Haroldo Paranhos. Ética Profissional da Advocacia. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 03.
  32. LÔBO, Paulo. Comentários ao Estatuto da Advocacia e da OAB. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 33.
  33. CARDELLA, op. cit., p. 04.
  34. LÔBO, op. cit., p. 34 – 35.
  35. LÔBO, op. cit., p. 54 - 55 - 56.
  36. LÔBO, op. cit., p. 18.
  37. LÔBO, op. cit., p. 20.
  38. CARDELLA, op. cit., p. 04.
  39. CARDELLA, op. cit., p. 05.
  40. LÔBO, op. cit., p. 53.
  41. LÔBO, op. cit., p. 61.
  42. LÔBO, op. cit., p. 67.
  43. LÔBO, op. cit., p. 72.
  44. CARDELLA, op. cit., p. 09.
  45. LÔBO, op. cit., p. 74.
  46. LÔBO, op. cit., p. 76.
  47. LÔBO, op. cit., p. 83.
  48. CARDELLA, op. cit., p. 37.
  49. LÔBO, op. cit., p. 182.
  50. LÔBO, op. cit., p. 183.
  51. CARDELLA, op. cit., p. 37.
  52. LÔBO, op. cit., p. 186.
  53. LÔBO, op. cit., p. 192.
  54. LÔBO, op. cit., p. 193.
  55. LÔBO, op. cit., p. 97.
  56. LÔBO, op. cit., p. 108.
  57. CARDELLA, op. cit., p. 19.
  58. CARDELLA, op. cit., p. 24 - 25.
  59. CARDELLA, op. cit., p. 31.
  60. CARDELLA, op. cit., p. 28.
  61. CARDELLA, op. cit., p. 30.
  62. CARDELLA, op. cit., p. 34.
  63. LÔBO, op. cit. p. 204.
  64. CARDELLA, op. cit., p. 39 – 40.
  65. CARDELLA, op. cit., p. 40.
  66. CARDELLA, op. cit., p. 49.
  67. CARDELLA, op. cit., p. 50.
  68. GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolf. Novo Curso de Direito Civil: Responsabilidade Civil. 3 v. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 224.
  69. STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 477-478.
  70. DINIZ, op. cit., p. 303.
  71. STOCO, op. cit., p. 479.
  72. CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 377.
  73. AGUIAR DIAS, José de. Da Responsabilidade Civil. 11. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 410.
  74. STOCO, op. cit., p. 479.
  75. DINIZ, op. cit., p. 294 – 295.
  76. STOCO, op. cit., p. 480.
  77. GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 393.
  78. STOCO, op. cit., p. 480.
  79. RIZZARDO, Arnaldo. Responsabilidade Civil. 1. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 347.
  80. ZULIANI, Ênio Santarelli. Responsabilidade Civil do Advogado. Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil – Assunto Especial, n. 21 – Jan-Fev/2003. Porto Alegre: Síntese, 2003, p. 131-132.
  81. RIZZARDO, op. cit., p. 348.
  82. ANDRADE apud RIZZARDO, op. cit., p. 348.
  83. STOCO, op. cit., p. 480 - 481.
  84. STOCO, op. cit., p. 481.
  85. GONÇALVES, op. cit., p. 396.
  86. CRETELLA JÚNIOR apud NOVAIS DIAS, Sérgio. Responsabilidade Civil do Advogado na Perda de uma Chance. 9. ed. São Paulo: LTr, 1999, p. 23 - 24.
  87. NOVAIS DIAS, op. cit., p. 25.
  88. ZULIANI, op. cit., p. 134 – 135.
  89. NOVAIS DIAS, op. cit., p. 34.
  90. NOVAIS DIAS, op. cit., p. 34.
  91. AGUIAR DIAS, op. cit., p. 424.
  92. STOCO, op. cit., p. 482.
  93. STOCO, op. cit., p. 482.
  94. GONÇALVES, op. cit., p. 395.
  95. SOUZA apud GONÇALVES, op. cit., p. 395.
  96. ALMEIDA, L. P. Moitinho de. Responsabilidade Civil dos Advogados. Lisboa: Coimbra Editora, 1985, p. 23.
  97. STOCO, op. cit., p. 483.
  98. STOCO, op. cit., p. 483 - 484.
  99. NOVAIS DIAS, op. cit., p. 38.
  100. AGUIAR DIAS, op. cit., p. 428.
  101. GONÇALVES, op. cit., p. 394.
  102. LÔBO apud NOVAIS DIAS, op. cit., p. 36.
  103. AGUIAR DIAS, op. cit., p. 416 – 417.
  104. NOVAIS DIAS, op. cit., p. 37.
  105. CAVALIERI FILHO, op. cit., p. 377.
  106. STOCO, op. cit., p. 484.
  107. STOCO, op. cit., p. 484.
  108. STOCO, op. cit., p. 485.
  109. NOVAIS DIAS, op. cit., p. 74.
  110. NÁUFEL, José. Novo Dicionário Jurídico Brasileiro. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 573.
  111. NÁUFEL, op. cit., p. 17.
  112. NÁUFEL, op. cit., p. 583.
  113. STOCO, op. cit., p. 486.
  114. AGUIAR DIAS, op. cit., p. 434.
  115. STOCO, op. cit., p. 487.
  116. ZULIANI, op. cit., p. 152.
  117. GAGLIANO e PAMPLONA FILHO, op. cit., p. 228.
  118. ZULIANI, op. cit., p. 153.
  119. CAVALIERI FILHO, op. cit., p. 378.
  120. CAVALIERI FILHO, op. cit., p. 378.
  121. RIZZARDO, op. cit., p. 351.
  122. ZULIANI, op. cit., p. 151.
  123. ZULIANI, op. cit., p. 151.
  124. ZULIANI, op. cit., p. 154.
  125. ZULIANI, op. cit., p. 154.
  126. ZULIANI, op. cit., p. 155.
  127. ZULIANI, op. cit., p. 156.
  128. STOCO, op. cit., p. 486.
  129. NOVAIS DIAS, op. cit., p. 41 – 42.
  130. AGUIAR DIAS, op. cit., p. 431.
  131. AGUIAR DIAS, op. cit., p. 431.
  132. VASONCELOS apud ZULIANI, op. cit., p. 147.
  133. SODRÉ apud ZULIANI, op. cit., p. 148.
  134. STOCO, op. cit., p. 487.
  135. STOCO, op. cit., p. 487.
  136. LÔBO apud NOVAIS DIAS, op. cit., p. 39.
  137. NOVAIS DIAS, op. cit., p. 41.
  138. NOVAIS DIAS, op. cit., p. 42.
  139. MONTENEGRO apud NOVAIS DIAS, op. cit., p. 42.
  140. NOVAIS DIAS, op. cit., p. 15.
  141. NOVAIS DIAS, op. cit., p. 43.
  142. NOVAIS DIAS, op. cit., p. 46.
  143. KELSEN apud NOVAIS DIAS, op. cit., p. 48.
  144. NOVAIS DIAS, op. cit., p. 49.
  145. NOVAIS DIAS, op. cit., p. 50.
  146. NOVAIS DIAS, op. cit., p. 50.
  147. RIZZARDO, op. cit., p. 352.
  148. NOVAIS DIAS, op. cit., p. 63.
  149. GOMES apud NOVAIS DIAS, op. cit., p. 64.
  150. VARELA apud NOVAIS DIAS, op. cit., p. 65.
  151. JORGE apud NOVAIS DIAS, op. cit., p. 64 – 65.
  152. NOVAIS DIAS, op. cit., p. 65.
  153. NOVAIS DIAS, op. cit., p. 67.
  154. NOVAIS DIAS, op. cit., p. 71.
  155. SAVI, Sérgio. Responsabilidade Civil por Perda de uma Chance. São Paulo: Atlas, 2006, p. 39 – 40.
  156. SAVI, op. cit., p. 41.
  157. MARTINS-COSTA apud SAVI, op. cit., p. 41.
  158. PETTEFI DA SILVA apud SAVI, op. cit., p. 43.
  159. SAVI, op. cit., p. 44.
  160. SAVI, op. cit., p. 53.
  161. SAVI, op. cit., p. 56..
  162. SAVI, op. cit., p. 56, 60 – 61.
  163. SAVI, op. cit., p. 63.
  164. AGUIAR DIAS, op. cit., p. 425.
  165. STOCO, op. cit., p. 485.
  166. GONÇALVES, op. cit., p. 394.
  167. GONÇALVES, op. cit., p. 394.
  168. AGUIAR DIAS, op. cit., p. 414.
  169. NOVAIS DIAS, op. cit., p. 76.
  170. NOVAIS DIAS, op. cit., p. 77.
  171. ZULIANI, op. cit., p. 140.
  172. ZULIANI, op. cit., p. 141.
  173. ZULIANI, op. cit., p. 141.
  174. ZULIANI, op. cit., p. 142.
  175. NOVAIS DIAS, op. cit., p. 79.
  176. NOVAIS DIAS, op. cit., p. 80.
  177. NOVAIS DIAS, op. cit., p. 80.
  178. NOVAIS DIAS, op. cit., p. 81 – 82.
  179. NOVAIS DIAS, op. cit., p. 77.
  180. NOVAIS DIAS, op. cit., p. 77 – 78.
  181. NOVAIS DIAS, op. cit., p. 78.
  182. ZULIANI, op. cit., p. 150.
  183. CARVALHO apud ZULIANI, op. cit., p. 150 – 151.
  184. ZULIANI, op. cit., p. 151.
  185. BARBOSA MOREIRA apud NOVAIS DIAS, op. cit., p. 82 – 83.
  186. NOVAIS DIAS, op. cit., p. 83 – 84.
  187. NOVAIS DIAS, op. cit., p. 85.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CAVAZZANI, Ricardo Duarte. Responsabilidade civil do advogado. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1953, 5 nov. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11927. Acesso em: 19 abr. 2024.