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Partes e terceiros no processo civil.

Cinco dimensões da qualidade de parte à luz dos princípios constitucionais do acesso à justiça e do contraditório

Partes e terceiros no processo civil. Cinco dimensões da qualidade de parte à luz dos princípios constitucionais do acesso à justiça e do contraditório

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É necessária a conceituação de partes e de terceiros com base na visão instrumentalista do processo e na teoria dos direitos e garantias constitucionais fundamentais.

Palavras-chave: Partes. Terceiros. Contraditório. Inafastabilidade das decisões judiciais. Dimensões da qualidade de parte. Efeitos dos provimentos jurisdicionais. Parte em sentido material. Parte na demanda. Parte em sentido processual. Parte para fins de auxílio técnico-jurídico das decisões judiciais. Partes para fins de impugnação das decisões judiciais. Intervenção iussu iudicis. Interesse institucional como espécie de interesse jurídico.

Sumário: 1. Introdução. 2. Da evolução do conceito de partes e de terceiros no processo civil: insuficiência dos critérios metodológicos até hoje adotados. 2.1. Fase sincretista ou privatista. 2.2. Fase autonomista ou conceitual. 2.3. Fase instrumentalista e a necessidade de sua revisitação à luz da teoria dos direitos e garantias constitucionais fundamentais. 3. A importância da principiologia constitucional (acesso à justiça e contraditório) para a ampliação do conceito de parte no processo civil. 4. Partes, terceiros interessados, terceiros estranhos ou desinteressados e cinco dimensões da qualidade de parte no processo civil. 4.1. Partes, terceiros interessados, terceiros estranhos (desinteressados). 4.2. Parte em sentido material. 4.3. Parte na demanda; 4.4. Parte em sentido processual; 4.5. Parte para fins de auxílio técnico-jurídico das decisões judiciais (nova dimensão processual da qualidade de parte). 4.6. Parte para fins de impugnação das decisões judiciais (nova dimensão processual da qualidade de parte); 4.7. Formas de aquisição da qualidade de parte no processo civil. 5. Para uma conceituação mais constitucionalizada da qualidade de parte no processo civil. Conclusões. Referências bibliográficas.


1. Introdução

Compreender e delimitar o sentido de parte em direito processual não é tarefa fácil; porém é assunto que deve ser enfrentado por todos que pretendam aprofundar seus estudos em relação a esse ramo do Direito. A concepção de parte é fundamental no processo para solução de inúmeros problemas teóricos e práticos 1.

Litisconsórcio, intervenção de terceiros, coisa julgada — especialmente no plano da sua identificação e dos seus limites subjetivos —, litispendência, perempção, continência, competência em razão da pessoa (ratione personae), pressupostos processuais ou requisitos subjetivos de admissibilidade processual, legitimidade ad causam (ativa e passiva) etc. são institutos processuais que, para serem bem compreendidos, dependem de uma boa noção da delimitação do sentido de parte em direito processual. Isso, por si só, já demonstra a relevância teórica e prática e a complexidade dos temas ora tratados neste pequeno texto 2.

A nossa abordagem será realizada de forma bem objetiva, com preocupação central para uma sistematização que se evidencie mais didática possível quanto aos assuntos analisados.

Entendemos que nos dias atuais, em que a complexidade das relações sociais se avoluma e se intensifica, um dos principais desafios do jurista é com a redução da complexidade sobre a compreensão dos temas por ele tratados, de forma a facilitar o acesso e a leitura rápida pelo seu leitor, o que não implica, necessariamente, a perda da coerência e da profundidade teórica da sua abordagem.

Inicialmente analisaremos a evolução da conceituação de partes e de terceiros no processo civil, demonstrando a insuficiência dos critérios adotados. Na seqüência, teceremos considerações sobre terceiros estranhos, terceiros interessados e partes, apontando cinco dimensões da qualidade de parte no processo civil: parte em sentido material; parte na demanda; parte em sentido processual; parte para fins de auxílio técnico-jurídico das decisões judiciais como uma nova dimensão processual da qualidade de parte e parte para fins de impugnação das decisões judiciais, também outra nova dimensão processual da qualidade de parte.

Apontaremos também as várias formas de aquisição da qualidade de parte no processo civil.

Mais adiante, iremos apresentar algumas diretrizes constitucionais para uma conceituação mais constitucionalizada da qualidade de parte no processo civil.

Ressalta-se que a análise dessas dimensões da qualidade de parte é feita com o apontamento da relevância teórica e prática de cada uma delas, interligando sempre que possível, em relação de adequação, direito material e direito processual, já que esse é a razão de ser daquele.

As diretrizes apresentadas pelo pós-positivismo jurídico e pelo neoconstitucionalismo foram fundamentais para o desenvolvimento e conclusões finais 3.

Não apresentamos critérios fechados quanto às dimensões da qualidade de parte no processo civil, nem apontamos critérios rígidos para a aferição de interesse que justifique a intervenção de terceiros 4. A complexidade das relações sociais e as peculiaridades de cada caso concreto impedem que sejam estabelecidas diretrizes rígidas, incompatíveis com a principiologia constitucional, especialmente com o princípio do contraditório (art. 5º, LV, da CF) e com o princípio do acesso à justiça (art. 5º, XXXV, da CF), dentro do qual é fundamentado o direito a uma tutela jurisdicional adequada. Partimos da concepção, portanto, de que Direito não é só sistema, é também problema e, com isso, cada situação concreta merece tratamento adequado às suas necessidades 5.


2. Da evolução do conceito de partes e de terceiros no processo civil: insuficiência dos critérios metodológicos até hoje adotados

2.1. Fase sincretista ou privatista

Até a conquista da autonomia científica e metodologia do direito processual, que somente veio a ocorrer em meados do Século XIX com a obra de Oskar von Bülow (1868) 6, não havia uma noção processual de parte que não estivesse atrelada, de alguma forma, à titularidade da relação jurídica material. Portanto, dentro da concepção sincretista e privatista que reinava nessa época, não existiam critérios metodológicos próprios para conceituar e delimitar as reais dimensões processuais da concepção de partes, litisconsórcio, intervenção de terceiros 7, bem como de muitos outros institutos do direito processual. O estudo do direito processual era desenvolvido com base em uma visão predominantemente prática, em que prevalecia a mera compreensão exegética dos textos legais existentes, sem qualquer critério metodológico ou científico 8.

No Brasil, os velhos processualistas da denominada corrente civilista conceituavam partes como sendo os sujeitos da relação jurídica material deduzida em juízo 9. Francisco de Paula Batista, jurista pernambucano, considerado como um dos grandes autores clássicos da época da fase meramente procedimentalista do direito processual no Brasil, ao analisar, em meados do Século XIX, o tema relativo às partes, afirmava que existiam pessoas que poderiam e outras que não poderiam estar em Juízo, de sorte que poderiam propor e contradizer ações todas as pessoas que não fossem proibidas 10.

Não havia então uma conceituação metodológica clara de parte e de terceiros para fins processuais. As hipóteses de admissão ou de proibição eram aferidas de dispositivos legais do direito material, o que impedia uma visão sistematizada do fenômeno processual.

No mesmo sentido era a concepção de João Monteiro ao sustentar que toda ação teria seu fundamento em uma relação de direito préexistente e sua negação, de sorte que não havia relação de direito sem um agente ativo, considerado como credor, e outro passivo, que seria o devedor 11. João Monteiro ainda apresentava concepção de intervenção de terceiros diretamente atrelada ao direito material, tanto que denominava os terceiros intervenientes de litigantes acidentais 12.

2.2. Fase autonomista ou conceitual

Com a obra de Bülow surge o direito processual como novo ramo do Direito. A partir dela tem início a fase autonomista ou conceitual do direito processual, também intitulada de processualismo científico, pois o direito processual passa a ser compreendido com objeto e método próprios; passa a ser compreendido e estudado, enfim, por uma visão científica do fenômeno processual. Grandes estudos surgem a partir da nova fase do direito processual: na Alemanha inicialmente e, logo em seguida, na Itália e em outros países europeus. Os italianos, todavia, foram os principais responsáveis pela transferência dessa nova linha de conhecimento para a América Latina 13.

Apesar de distinguir bem partes em sentido processual de partes em sentido material, a metodologia da introspecção (método meramente técnico-jurídico), que reinava nessa segunda fase de evolução do direito processual, não se conseguia apresentar conceituação de parte que incluísse todas as situações e dimensões da qualidade de parte abrangidas pelos princípios do acesso à justiça e do contraditório, especialmente o contraditório na sua dimensão de garantia constitucional de informação e de participação no processo para influenciar nas decisões judiciais.

A idéia de parte em sentido processual nessa fase autonomista abrangia comumente aquele que pedia e aquele em face de quem era formulado o pedido (demandante e demandado) 14. O avanço era representado pela nítida distinção feita entre partes na relação jurídica material e partes na relação jurídica processual, que nem sempre são as mesmas.

Parte nessa fase autonomista do direito processual passa a ser elemento do processo (Wach), recebendo a partir daí conceituação em sentido formal ou processual 15. Carnelutti fazia a distinção entre sujeitos da lide e os sujeitos do processo, estabelecendo em relação a essas duas dimensões, respectivamente, a diferença entre parte em sentido material e parte em sentido processual 16.

José Frederico Marques, um dos grandes processualistas da história do direito processual no Brasil, explicava que partes seriam os sujeitos parciais da relação processual, diferentemente dos órgãos judiciários, que seriam sujeitos imparciais dessa relação 17.

Enrico Tullio Liebman, em postura formal extremada, chegou a afirmar que a noção de parte em sentido substancial (sujeito da relação jurídica controvertida ou da lide) seria estranha à lei e ao sistema de direito processual, de sorte que se não houvesse a coincidência da chamada parte em sentido substancial com a parte em sentido processual, aquele seria apenas um terceiro 18.

Também se tinha nessa segunda fase uma noção conceitual mais clara das várias formas de intervenção de terceiros 19, bem como de outros institutos do direito processual que passaram a receber conceituação formal, limitada, porém, à concepção metodológica da introspecção que até então reinava.

Terceiros nessa fase eram aqueles sujeitos estranhos à relação jurídica material deduzida em juízo e estranhos à relação jurídica processual já formada. Esses terceiros poderiam intervir no processo em curso quando, mesmo que estranhos à relação jurídica material posta em juízo e à relação jurídica processual já instaurada, fossem parte de uma outra relação jurídica material intimamente ligada com aquela em juízo já deduzida 20.

Surge a noção formal e processual de intervenção de terceiros, que é o instituto por intermédio do qual é permitido o ingresso de alguém em processo pendente entre outras partes. Dizia José Frederico Marques, ao referir-se aos ensinamentos de Chiovenda, que o direito moderno havia aceitado institutos de origem germânica, que se fundamentariam na idéia de permitir o envolvimento de terceiros na esfera de eficácia da sentença 21.

Essa idéia de eficácia da sentença também era concebida de forma limitada e, por si só, não tinha o condão de dar resposta substancialmente adequada a todas as hipóteses de intervenção de terceiros.

A doutrina da época afirmava que alguns princípios eram extraídos do conceito processual de partes. Para Jaime Guasp seriam eles: a) o princípio da dualidade de partes — não existiria processo sem dois sujeitos em posições contrárias; b) o principio da igualdade de partes — autor e réu seriam equiparados na utilização das armas e meios de ataque e de defesa; e c) o princípio do contraditório — exigência de que fosse concedido o direito de manifestação à outra parte (in judiciis debet servari aequalitas; non debet actori licere quod reo non permittitur; audiatur et altera pars) 22. Todavia, a esses princípios era conferida conceituação formal limitada, sem as dimensões constitucionais apontadas pela doutrina atual.

A conceituação meramente formal e, portanto, processual de partes e de terceiros, com base somente no método técnico-jurídico (metodologia da introspecção), impedia que se tivesse uma compreensão desses institutos mais consentânea com os compromissos sociais do Direito, especialmente a pacificação social por intermédio da viabilização de tutelas jurisdicionais mais adequadas aos interesses envolvidos (interesses jurídicos diretos ou indiretos e interesses reflexos e legítimos), que se legitimassem pela abertura à participação de outras pessoas e entes sociais.

Essa concepção fechada da concepção sobre partes e terceiros era forte obstáculos ao ingresso em juízo, inclusive dos corpos intermediários (associações, sindicatos etc.), os quais, tendo surgido comprometidos com a defesa de interesses de dimensão social, situavam-se entre o indivíduo e o Estado 23.

2.3. Fase instrumentalista e a necessidade de sua revisitação à luz da teoria dos direitos e garantias constitucionais fundamentais

A visão fechada e introspectiva começou a desmoronar-se, pois ela já não respondia às necessidades e às exigências sociais e impedia uma visão pluridimensional de todo o fenômeno processual. Surge então uma nova linha de pensamento: a visão instrumentalista do direito processual; a fase da efetividade do processo; a fase do acesso à justiça; a fase do denominado direito processual de resultados. O direito processual passa a ser compreendido como meio de realização de justiça.

A nova fase instrumentalista teve início em meados do Século XX, especialmente a partir das décadas de 60 e 70 do referido Século, por meio de grandes estudos de Mauro Cappelletti 24 e de outros juristas italianos. Com essa nova fase, dá-se início à proposta de uma postura metodológica de otimização do sistema processual rumo à efetividade.

Há, nessa fase instrumentalista, uma reaproximação necessária entre o direito material e o direito processual (substância-processo) 25. Essa reaproximação com o direito material não nega a autonomia do direito processual, nem representa um retorno ao sincretismo ou privatismo de outrora.

A nova metódica empregada é aberta e pluralista 26, pois voltada também para considerar os valores externos ao sistema processual, tais como os culturais, econômicos, os éticos e outros valores sociais e políticos 27.

Apesar dos grandes avanços da nova fase metodológica, especialmente no plano da tutela dos interesses massificados, ainda não foram desvendados todos os horizontes relativos à qualidade de parte no processo civil.

A própria conceituação de partes e de terceiros no direito processual civil ainda está atrelada aos avanços conseguidos pela já superada fase autonomista ou conceitual do direito processual, em que a metódica era fechada e predominantemente formal.

A metódica pluralista e aberta estabelecida pela visão instrumentalista do direito processual não conseguiu apresentar conceituação de partes e de terceiros de acordo com a principiologia constitucional atual, que tem em seu núcleo a tutela dos direitos e garantias constitucionais fundamentais.

Cândido Rangel Dinamarco, um dos mais ardorosos defensores da visão instrumentalista do direito processual e, dentro dela, da metódica pluralista e aberta 28, afirma que partes são ‘os sujeitos do contraditório instituído perante o juiz’. Seriam, para o autor, os sujeitos interessados na relação jurídica processual 29.

E mais: enfatiza Dinamarco que esse conceito puramente processual de parte é o único que é capaz de explicar sistematicamente a contraposição parte-terceiro, sem que ocorram distorções que geralmente surgem das inconvenientes ligações com fenômenos do direito substancial ou com o próprio objeto do processo. Assim, após afirmar que a clássica definição de parte de Giuseppe Chiovenda — ‘parte é aquele que pede, aquele em cujo nome se pede e aquele em face do qual se pede a atuação da vontade concreta da lei’ — está por demais ligada à demanda proposta e ao objeto do processo, diz Dinamarco que referida definição peca pela ausência de associação ao princípio do contraditório.

Entretanto, Dinamarco não avança para desmembrar pelo prisma constitucional as diretrizes do princípio do contraditório e as várias dimensões da qualidade de parte que dessas diretrizes poderão ser extraídas. Na seqüência, contrariando uma das diretrizes metodológicas da própria visão instrumentalista do direito processual (reaproximação necessária entre direito material e direito processual), Dinamarco critica os conceitos impregnados de conteúdo jurídico-substancial, afirmando que os eles sempre conduzem a aproximar a figura da parte processual (parte no processo) à de parte legítima 30.

No mesmo sentido, é o entendimento de Ada Pellegrini Grinover e Araújo Cintra, os quais também adotam conceito puramente processual de parte. Para os renomados juristas, parte é aquele que vem deduzir uma pretensão à tutela jurisdicional, formulando o pedido (demandante) e aquele que se vê envolvido pelo pedido (demandado). Em relação à intervenção de terceiros, escrevem esses autores que existem situações que, apesar de já integrada a relação processual segundo o seu esquema subjetivo mínimo (juiz-autor-réu), a lei permite ou até reclama o ingresso de terceiro no processo, o que poderá ocorrer por força da substituição a uma das partes ou do acréscimo a elas. Nesses casos haveria a ampliação subjetiva da relação processual 31.

Ora, se não é importante, no plano processual, a conceituação jurídico-substancial de parte, como será aferida a extensão das diretrizes constitucionais do princípio do contraditório dentro do processo? Um conceito meramente formal de parte no processo impede a aferição concreta do exercício do contraditório e da sua própria extensão como garantia constitucional.

O mesmo raciocínio deve ser aplicado em relação à conceituação de terceiros. O conteúdo jurídico-substancial também é importante para saber se há terceiro interessado ou não e qual espécie de interesse justificaria sua intervenção. Saber quais são as reais dimensões dos interesses envolvidos no processo civil é fundamental. Até para fins de permitir a participação de terceiro no processo, torna-se imprescindível aferir o aspecto substancial da intervenção, pois em relação a tais aspectos é que poderão ser projetados possíveis efeitos do provimento final para saber se são terceiros interessados ou não. De qualquer forma, a aferição do interesse que justifica a intervenção é fundamental 32.

Por outro lado, o que se nota é que as várias obras já publicadas no País que estudam o sentido de partes e de terceiros no processo civil ainda não apresentaram uma visão constitucionalmente satisfatória dos conceitos e dimensões relativos a esses institutos e ainda muitas dúvidas existem 33. A concepção de tais institutos e a aferição das suas reais dimensões no processo civil somente serão adequadas quando os seus conceitos e dimensões forem extraídos dos princípios e garantias constitucionais a eles diretamente relacionados.

Mesmo o excelente e atualizado trabalho de Cássio Scarpinella Bueno, que muito avança ao deixar clara a importância do direito material para a aferição da qualidade de parte e de terceiro em relação ao processo, não contextualiza tais institutos à luz da principiologia constitucional 34.

A recente obra coletiva sobre o tema, coordenada por Fredie Didier Jr. e Teresa Arruda Alvim Wambier 35, apesar da riqueza teórica e a larga abrangência do seu conteúdo, não traz também estudo sobre terceiros e partes no processo civil no plano da principiologia constitucional.

Em relação à metódica necessária para a conceituação de partes no processo civil, observa-se que a visão instrumentalista do direito processual, traçada por uma metódica pluralista, está em crise. As incessantes reformas do CPC brasileiro confirmam essa assertiva. Mais de 40 (quarenta) leis já modificaram o CPC, provocando-lhe centenas de alterações. No plano dos movimentos em prol da efetividade do processo, liderados no Brasil pela concepção teórica em torno da visão instrumentalista do direito processual, são apontadas três grandes etapas de reformas: 1994/1996; 2001/2002; e 2005/2007, esta ainda em andamento.

Apesar dos inúmeros aspectos positivos gerados por essas reformas, pontos negativos existem, muitos deles relacionados à perda da unidade estrutural do CPC, à falta de observância da boa técnica processual, à geração de constantes polêmicas tanto na jurisprudência quanto na própria doutrina. Esses problemas têm produzido verdadeiras situações de insegurança jurídica e dificuldades de compreensão, interpretação e aplicação do sistema processual. Pode-se afirmar que o CPC tornou-se uma verdadeira colcha de retalhos.

Tudo isso impõe a necessidade de revisitação da própria visão instrumentalista do direito processual, que deve ter, no nosso sentir, como guia condutor, a teoria dos direitos e garantias constitucionais fundamentais. Torna-se imprescindível, como exigência do próprio Estado Democrático de Direito, que sejam fixadas as diretrizes metodológicas do direito processual à luz da teoria dos direitos e garantias constitucionais fundamentais. A partir da fixação dessas novas diretrizes metodológicas é que será eficiente e legítima a implementação de reformas constitucionais e infraconstitucionais. Com isso, não se quer negar ou abandonar definitivamente a metódica pluralista e aberta implantada pela visão instrumentalista do direito processual, mas revisitá-la e redirecioná-la sob duas premissas básicas: a) o direito processual é instituição constitucional; b) o seu estudo, a sua reforma legislativa, a sua interpretação e aplicação têm de ter como guia condutor a teoria dos direitos e garantias constitucionais fundamentais. Caso contrário, teremos que conviver com incessantes reformas das reformas do sistema processual que nunca satisfazem muito menos atendem às exigências do Estado Democrático de Direito e aos anseios sociais. Da mesma forma que a fase instrumentalista não negou a autonomia do direito processual, que foi conquistada pela fase anterior (autonomista ou conceitual), a nova fase a ser implantada do garantismo-constitucional processual fundamental não nega a metódica pluralista e aberta conquistada pela fase instrumentalista, mas pretende redirecioná-la e revisitá-la com base nas duas premissas acima 36. A partir de uma metódica constitucionalizada, dirigida pela teoria dos direitos e garantias constitucionais fundamentais, é que será possível estabelecer a delimitação conceitual adequada para partes e terceiros no direito processual civil.

No caso a teoria dos direito fundamentais, como guia condutora da nova postura metodológica a ser implantada, é justamente aquela decorrente dos direitos e garantias constitucionais fundamentais positivados expressa ou implicitamente na Lei Fundamental do País 37. Esses direitos e garantias constitucionais fundamentais compõem o núcleo de uma Constituição democrática e pluralista e possuem tanto dimensão subjetiva, que se liga às pessoas individuais ou coletivas titulares dos direitos, quanto objetiva, já que formam o parâmetro básico, com eficácia irradiante e vinculatória, para a interpretação e compreensão da própria ordem jurídica 38. Como principais diretrizes interpretativas relativas aos direitos e garantias constitucionais fundamentais podemos apontar: imprescritibilidade; aplicabilidade imediata 39; imunidade em relação ao poder reformador do constituinte derivado; imunidade em relação ao legislador infraconstitucional; são direitos pétreos 40; interpretação aberta e extensiva etc.


3. A importância da principiologia constitucional (acesso à justiça e contraditório) para a ampliação do conceito de parte no processo civil

Aspectos introdutórios. Há uma relação muito estreita entre a Constituição e o Direito Processual. É uma relação de reciprocidade, pois a Constituição tutela o Direito Processual com a fixação dos seus princípios basilares (devido processo legal, contraditório, ampla defesa, juiz natural etc.) e o Direito Processual é instrumento meio de proteção (sistema do controle da constitucionalidade — controle abstrato e controle difuso) e de efetivação material da Constituição (processos subjetivos).

O estudo e a compreensão do Direito Processual pelo prisma constitucional é fundamental, conforme já bem ressaltado por Nelson Nery Junior, segundo o qual o intérprete deve buscar a aplicação do direito ao caso concreto, sempre tendo como pressuposto o exame da Constituição Federal 41.

A principiologia constitucional dos direitos e garantias constitucionais fundamentais é importante para aferir, por exemplo, que tipo de interesse permite que alguém possa intervir no processo como terceiro, tornando-se parte em sentido processual e participando, assim, do contraditório. Para tanto, torna-se imprescindível a análise das dimensões constitucionais do acesso à justiça e do contraditório como princípios constitucionais fundamentais (art. 5º, XXXV e LV, respectivamente, da CF/88).

Assim, restaria saber, por exemplo, se o interesse legítimo autorizaria alguém a intervir como terceiro no processo, participando do contraditório. Poderá ocorrer que alguém não participe da relação jurídica material, mas que tenha interesse legítimo na demanda, mesmo que não venha a ser atingido juridicamente pela sentença final de forma direta ou indireta.

É o que ocorre, por exemplo, com a OAB quando, com base em interesse institucional, comparece para atuar em causa em que seja parte advogado (parágrafo único do art. 49 da Lei 8.906/94 42) ou com o Ministério Público que venha a intervir como assistente em demanda que seja parte como demandado órgão do Ministério Público 43.

Nesses casos, não se vislumbra a presença de interesse jurídico em sentido estrito, mas haverá interesse legítimo configurado como interesse institucional. Para saber se o interesse institucional é espécie de interesse jurídico que justifique a intervenção de terceiro, torna-se imprescindível a análise do direito de acesso à justiça à luz dos direitos e garantias constitucionais fundamentais (art. 5º, XXXV, da CF).

Como explicar então a atuação do amicus curiae (amigo do tribunal — da corte), que tem previsão expressa no ordenamento jurídico brasileiro (art. 7º, § 2º, da Lei 9.668/99 e art. 482, § 3º, do CPC, além de outras disposições legais)? O amicus curiae é figura de presença constante atualmente no controle abstrato da constitucionalidade, sendo que há uma forte tendência para possibilitar sua atuação também em outras demandas de interesse social.

Portanto, a solução para esses impasses e de muitos outros depende da compreensão constitucional do direito processual. Somente assim será possível que sejam alcançadas respostas mais uniformes e legítimas para o sistema processual, especialmente no que tange à sua interligação com o direito material e com a realidade social.

O princípio do acesso à justiça. Cappelletti e Garth já afirmaram de maneira expressa que o direito de acesso à justiça é o mais básico dos direitos humanos de um sistema igualitário que pretenda garantir e não apenas proclamar direitos. Seria também o ponto central da moderna processualística, de forma que seu estudo, na visão dos referidos juristas, exigira o alargamento e o aprofundamento dos objetivos e métodos da moderna ciência jurídica 44.

O princípio do acesso à justiça está consagrado no ordenamento jurídico brasileiro no art. 5º, XXXV, da CF/88, onde está estabelecido que: a lei não excluirá da apreciação do poder judiciário lesão ou ameaça a direito. Muitos autores denominam-o de princípio da inafastabilidade das decisões judiciais; outros de princípio da universalidade da jurisdição. O certo é que o art. 5º, XXXV, da CF/88, possui natureza jurídica pluridimensional, pois nele encontramos fundamentação jurídico-constitucional para inúmeros institutos do direito, tais como: direito de ação, direito de defesa, poder geral de cautela, legitimidade extraordinária (não há exigência no texto constitucional de que o comparecimento em juízo só se dê na defesa de interesse pessoal), tutela inibitória, tutela cautelar, antecipação dos efeitos da tutela, indeclinabilidade da jurisdição, direito a uma tutela jurisdicional adequada (individual ou coletiva; repressiva ou preventiva) etc.

Todas essas inúmeras dimensões do art. 5º, XXXV, da CF, estão inseridas dentro do direito de acesso à justiça, que não é direito somente da parte demandante ou da parte demandada, mas também do terceiro interessado juridicamente, do terceiro prejudicado e do portador de interesse legítimo, fático ou reflexo. Todos esses terceiros, além das partes demandante e demandada, têm o direito de comparecer em juízo para integrarem o contraditório com a finalidade de influenciarem na decisão do juiz no sentido de buscar uma decisão que seja a mais adequada e justa para o caso concreto 45. Ademais, quando a Constituição fala no art. 5º, XXXV, em lesão ou ameaça a direito, a concepção de direito aqui não poderá ser analisada em sentido restrito, mas de forma aberta e flexível, pois se trata de garantia constitucional fundamental. A limitação fica por conta da demonstração da utilidade da intervenção.

A essa conclusão chega-se porque o direito de acesso à justiça é garantia constitucional fundamental (art. 5º, XXXV, da CF/88), possui aplicabilidade imediata (§ 1º do art. 5º da CF/88), é cláusula pétrea (art. 60, § 4º, IV, da CF/88). E, por tudo isso, não lhe é compatível interpretação restritiva. A sua interpretação deverá ser sempre aberta e flexível, de forma a facilitar o ingresso em juízo e participação no contraditório, que são fatores de legitimação da própria prestação jurisdicional.

Ademais, é de se destacar que o art. 5º, XXXV, da CF/88, não se dirige somente ao legislador, mas também ao administrador, ao particular e ao próprio Poder Judiciário, dirigindo-se a todos indistintamente 46. A interpretação meramente literal não é compatível com a Constituição, especialmente no que tange aos direitos e garantias constitucionais fundamentais. Ela tem de ser aberta, flexível, para extrair da garantia ou do direito constitucional interpretado a melhor eficácia social.

Portanto, com base no art. 5º, XXXV, da CF/88, conclui-se que o interesse jurídico que justifica o comparecimento em juízo do terceiro deve ser flexibilizado, a fim de admitir, por exemplo, o interesse institucional como espécie de interesse jurídico justificador da intervenção no processo civil.

Os casos de intervenção de terceiros, tais como a assistência e o recurso de terceiro, devem ser interpretados de forma a flexibilizar o ingresso em juízo, analisando-se a situação concreta e todos os seus contornos com amparo no art. 5º, XXXV, da CF.

Com efeito, por força do referido dispositivo constitucional, o rol das hipóteses de intervenção de terceiros no processo civil previsto no CPC é meramente exemplificativo e a concepção de interesse jurídico que justifica a assistência deve ser concebida de forma aberta e flexível, de maneira a abranger o interesse institucional e outros interesses legítimos como espécies do gênero interesse jurídico. Até mesmo o interesse fático, conforme sua relevância concreta, poderia, em tese, dar ensejo à intervenção, caso fique evidente a sua utilidade.

Como é fundamental a relação de integração entre o direito processual e o direito material, este sempre deve ser considerado e analisado para identificar outras hipóteses de intervenção de terceiros que não aquelas arroladas no CPC. A forma e a própria técnica processual têm de ser flexibilizadas em prol da substância ventilada pelo direito material 47.

O princípio do contraditório. O contraditório é princípio constitucional fundamental. Está previsto expressamente no art. 5º, LV, da CF/88, que dispõe: "aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes".

Houve um grande avanço com a CF/88, pois a Carta Constitucional de 1969 somente assegurava o contraditório no processo penal (art. 153, § 16, da CF/1969).

No direito processual civil, o contraditório inicialmente esteve atrelado à parte demandada, como garantia do direito de defesa (audiatur et altera pars). Já dizia José Frederico Marques que a bilateralidade da ação e da pretensão gerava a bilateralidade do processo e nisso residiria o fundamento lógico do contraditório. Acrescentava também o saudoso processualista brasileiro, que para evitar que o direito de defesa sofresse restrições indevidas, o processo teria de ser estruturado sob a forma de contraditório. Concluía o citado autor que o traço básico e saliente do contraditório era o princípio constitucional decorrente do direito de defesa 48.

Posteriormente o contraditório evoluiu para passar a ser compreendido também como direito de ciência bilateral para reação, de forma a abranger tanto o demandante quanto o demandado.

Mais recentemente, especialmente pelos estudos de Elio Fazzalari, o princípio do contraditório passa a ser concebido como direito de participação no procedimento de preparação do provimento, em simétrica paridade, de todos aqueles que irão sofrer os efeitos da decisão 49. Passa a ser direito de participar na formação do provimento e fator de legitimação do ato decisório final. Fazzalari chega a dizer que o processo tem que ter no mínimo dois contraditores: um interessado e um contra-interessado 50. Nessa dimensão, o contraditório abrangeria, no mínimo, um demandante e um demandado, o que não excluiria a participação de terceiros interessados, que possivelmente possam vir a sofrer efeitos da decisão.

Nelson Nery Junior afirma que o princípio do contraditório, além de constituir-se em manifestação fundamental do princípio do estado de direito, tem íntima ligação com a igualdade de partes e com o direito de ação e, assim, ao ser garantido aos litigantes o contraditório e a ampla defesa, isso significa que tanto o direito de ação quanto o direito de defesa são manifestações do princípio do contraditório 51.

E mais: Nelson Nery ainda ensina que a garantia do contraditório é inerente às partes litigantes (demandante, demandado, opoente, chamado ao processo) e aos assistentes litisconsorcial e simples, bem como ao Ministério Público, mesmo que esteja atuando na função de fiscal da lei 52.

Nessa dimensão, o princípio do contraditório, na sua qualidade de garantia constitucional fundamental, passa a ser fator de inclusão para permitir e, em certos casos até exigir, a participação também de outros interessados no desfecho da demanda. E, nessa dimensão, o respeito ao contraditório é fator também de legitimação da própria atividade jurisdicional.

Por outro lado, o princípio em questão teria dupla dimensão. É direito à informação da existência da ação e de outros atos de processo (primeira dimensão) e é também a possibilidade de reação das partes contra atos que lhes sejam desfavoráveis 53.

Como garantia constitucional fundamental, o contraditório é cláusula pétrea (art. 60, § 4º, IV, da CF/88), não lhe é compatível interpretação restritiva e, não fosse isso, possui aplicabilidade imediata (§ 1º do art. 5º da CF/88). Assim, todos os que tenham interesse, mesmo que indireto ou reflexo, poderão participar do processo e, com isso, do contraditório, de forma a influenciar na decisão do juiz.

Mais recentemente o contraditório vem sendo analisado também com base em outra vertente: direito-dever. Assim, o contraditório, além da sua dimensão direito-garantia, imporia alguns deveres processuais, sendo eles a lealdade, a boa-fé objetiva etc.

É esse o entendimento de Antônio de Passo Cabral ao sustentar que as funções plurais do princípio do contraditório não se esgotariam na sua compreensão como direito de informação-reação, pois tal princípio, além de representar uma garantia de manifestação no processo, impõe deveres: a) às partes, no sentido de que elas devem contribuir eticamente para a solução do conflito; b) ao juiz, no sentido de que ele deve instalar efetivamente o debate judicial a respeito das várias questões discutidas no processo 54.

No mesmo sentido, Brunela Vieira De Vincenze, ao desenvolver estudo sobre a boa-fé no processo civil, ressalta que o contraditório é fator de legitimação do provimento final do processo, além de impor o exercício das posições subjetivas processuais de forma dialética, exigindo também o respeito aos deveres de cooperação e colaboração decorrentes de sua contemporânea acepção jurídico-política 55.

Explica ainda Brunela Vincenze que a garantia do contraditório, expressamente prevista no art. 5º, LV, da CF de 1988, serve de suporte e de limite para a aplicação da cláusula geral da boa-fé no processo civil e, assim, quando essa garantia for aplicada de acordo com a concepção prática pelo juiz, ela impõe às partes o dever de proceder com lealdade, em cooperação e colaboração para a realização dos escopos da jurisdição 56.

Assim, o contraditório, na sua condição de direito-dever de informação para reação, abrange todos os que participam do processo com relativa autonomia e têm condições de influir juridicamente na decisão. Todas essas pessoas, com exceção do juiz, são partes para fins processuais. E todos, partes e Juiz, têm dever de colaboração e de cooperação mútua na busca da decisão mais adequada e tempestiva para a situação ventilada concretamente. No plano infraconstitucional, essa orientação e, portanto, o dever de cooperação mútua, também está presente no CPC, conforme se extrai, entre outros, dos seguintes arts. 14, 125, 130, 339 etc..

Pela ampla abrangência do princípio do contraditório, pela dimensão publicística do direito processual e, em razão da relevância do contraditório para o direito processual, particularmente para o processo civil, que é o que mais nos interessa neste breve texto, entendemos que o juiz, considerando a relevância fática e jurídica das questões ventiladas, poderá, de ofício, provocar a intervenção de terceiros interessados no processo. É o que se denomina de intervenção iussu iudicis 57, que estava presente no CPC/39 (art. 91), está presente no art. 107 do CPC italiano, mas que não encontra amparo expresso no CPC/73, salvo para aqueles que entendem que não se trata de espécie de intervenção de terceiro, mas de formação de citação de litisconsórcio necessário por determinação do juiz com base no parágrafo único do art. 47 do CPC.

A fundamentação dessa espécie de intervenção de terceiros a ser provocada pelo juiz (iussu iudicis) encontraria a base constitucional de apoio nas próprias diretrizes do princípio constitucional do contraditório (art. 5º, LV, da CF) e na relevância dos reflexos da causa judicial para a sociedade e para terceiros, mesmo que não venham a ser atingidos diretamente pelo provimento final.

A intervenção iussu iudicis poderá ocorrer sempre que o juiz entender oportuna a intervenção, mas ele deverá apresentar as razões justificadoras da intervenção de terceiro.

Essa provocação de ofício pelo juiz de intervenção de terceiro no processo civil não fere o princípio da demanda; ao contrário, é fator que poderá legitimar socialmente o processo e a própria prestação jurisdicional. Nada impede, por exemplo, que o juiz entenda que em determinado processo discute-se, mesmo que somente incidenter tantum, interesse institucional da OAB ou do Ministério Público, provocando de ofício a intervenção dessas instituições, caso entenda como oportuna concretamente 58.

A inserção da boa-fé objetiva no processo civil com fundamento no princípio constitucional do contraditório (art. 5º, LV, da CF/88), bem como com base em dispositivos do CPC (art. 14, II, 339, 125 etc.), poderá gerar verdadeira mudança de paradigma no direito processual civil e nos seus institutos estruturais e fundamentais. Aplicando-se as orientações decorrentes da boa-fé objetiva, que consagra deveres anexos de conduta, impõe-se a tomada de medidas para garantir o equilíbrio dentro do processo e o resultado adequado da prestação jurisdicional. Com base nesses deveres anexos, poderá inclusive ser alterada a distribuição do ônus da prova, de forma a gerar limite à aplicabilidade da regra fechada de distribuição do ônus da prova prevista no art. 331 do CPC. Com efeito, todo aquele que tiver aptidão e domínio sobre a prova tem o dever ético de conduzi-la para o processo, atendendo-se, com isso, inclusive o dever previsto expressamente no art. 339 do CPC: "Ninguém se exime do dever de colaborar com o Poder Judiciário para o descobrimento da verdade".

Outra conseqüência que se extrai da leitura constitucional do processo civil à luz da garantia constitucional do contraditório é a revisitação dos institutos da substituição processual e da coisa julgada, de sorte a fixar o critério secundum eventum litis para a coisa julgada em relação ao titular do direito que foi substituído no processo. Ninguém, por imposição constitucional, poderá ser prejudicado por uma decisão sem ter tido qualquer oportunidade de ser ouvido. Nesses casos, somente deverá ocorrer coisa julgada para o titular do direito que não tenha participado do contraditório se a decisão lhe for favorável. É essa a orientação já prevista no art. 103 do CDC, em sede de coisa julgada coletiva.


4. Partes, terceiros interessados, terceiros estranhos ou desinteressados e cinco dimensões da qualidade de parte no processo civil:

Neste tópico iremos fazer a análise pontual das várias dimensões da qualidade de parte no processo civil. A abordagem terá como base as diretrizes decorrentes dos princípios constitucionais do acesso à justiça e contraditório, acima analisados. Antes, porém, faremos uma abordagem introdutória com a finalidade de diferenciação entre partes em sentido restrito, terceiros interessados, que também estão inseridos na qualidade de parte em sentido mais amplo e pluralista, e terceiros estranhos ou desinteressados, cujo conceito é obtido pelo método da exclusão ou da aferição residual.

Ressalta-se, todavia, que a indicação das cinco dimensões da qualidade de parte abaixo descritas não tem a pretensão de ser exaustiva, nem a poderia ser por força da incidência das garantias constitucionais fundamentais relacionadas aos institutos analisados, garantias constitucionais essas que impedem qualquer tipo de interpretação restritiva.

4.1. Partes, terceiros interessados, terceiros estranhos ou desinteressados

Não há entendimento pacífico sobre os critérios para a distinção entre partes e terceiros no processo civil. Por outro lado, pela falta de uma leitura mais constitucionalizada do processo civil, os critérios estabelecidos pela doutrina pátria para distinguir terceiros interessados e terceiros estranhos ou desinteressados não são satisfatórios. Essa problemática não se limita ao Brasil, já que em outros países também há sérias divergências sobre a distinção entre partes e terceiros no processo civil 59.

O Professor Arruda Alvim entende que o conceito de parte é puramente processual, resultando da simples afirmação da ação 60.Por outro lado, entende Vicente Greco Filho, o critério cronológico adotado por Ramiro Podetti, no sentido de que terceiro seria todo aquele que, por qualquer motivo, não figurou no processo desde o início, independentemente da qualidade do seu ingresso, não é suficiente para explicar o fenômeno e, não fosse isso, ele faz gerar confusão entre litisconsórcio ulterior, assistência, sucessão processual, institutos que não comportam a inserção dentro da mesma principiologia. Com efeito, o simples fator temporal gerado pela propositura da ação e pela citação inicial não é suficiente para conferir qualificação que distinga cientificamente parte de terceiros 61.

Assim, Greco Filho afirma que o conceito de terceiro deve ser aferido em função de seu ingresso no processo. A pessoa que do processo não participou por qualquer motivo seria sempre terceiro em relação à sentença proferida inter alios, independentemente de sua posição caso tivesse integrado a relação processual. Esse terceiro seria extraneus perante a sentença e poderia pleitear-lhe a invalidação se ela tivesse sido proferida sem sua presença como integrante da lide, isso quando fosse o caso de integração necessária da lide, como exemplo de um co-proprietário em ação com pedido de reivindicação de coisa comum. Mas se tivesse participado do processo, essa pessoa não seria terceiro, mas parte em sentido primário e direto (parte demandada). Destarte, conclui Vicente Greco Filho que é no momento em que ingressa no processo e justamente pela razão que justifica o seu ingresso é que devemos apreciar a qualidade do interveniente, voluntário ou coacto. Mas se ele não intervir será sempre extraneus e, portanto, terceiro 62.

Não concordamos com o critério exposto acima, que é meramente formal. E se o terceiro for atingido beneficamente pela sentença? Ele poderá utilizar-se dos efeitos da decisão, habilitando-se inclusive no processo para tais fins. Imaginemos uma ação com pedido declaratório de paternidade cumulada com ação com pedido condenatório de alimentos movidas pelo Ministério Público em favor de determinado menor. Como se pode afirmar que esse menor, que não compareceu no processo e irá se beneficiar da sentença, seja considerado como estranho ao processo? Ora, se o direito deduzido no processo a ele pertence, ele não pode ser considerado como estranho ao processo. Por outro lado, em lhe sendo desfavorável a sentença, nada impede que ele compareça e recorra como terceiro prejudicado, assumindo a qualidade de parte para fins recursais, passando daí a participar do contraditório.

Cândido Rangel Dinamarco, transcrevendo as cinco categorias de terceiros defendida pelo jurista Uruguaio Luis Torello Giodano 63, sustenta que tais classificações constituem a chave para a determinação dos casos em que o terceiro terá legitimidade para intervir e dos casos em que não a tenha, sendo elas importante também para a configuração das diversas espécies de intervenção de terceiros, tendo em vista que essas classificações mostram que: a) há terceiros destinatários integrais dos efeitos diretos da sentença, mesmo sem haverem intervindo no processo, como os titulares de obrigações solidárias; b) há os que são legitimados a intervir pelos reflexos jurídicos da sentença em sua esfera de direitos, tais como o fiador, os co-titulares de direito etc; c) há os que, por não suportarem efeito algum ou suportarem meros reflexos econômicos ou de fato (não jurídicos), não teriam nenhuma legitimidade para intervir 64.

Não concordamos também com o posicionamento acima, pois ele é restritivo às garantias constitucionais do acesso à justiça e do contraditório. Primeiro, porque direito também é fato e poderá ocorrer que fatos relevantes justifiquem a intervenção para que na fase instrutória a prova seja devidamente esclarecedora de fatos que tenham várias repercussões, inclusive sobre a honra de terceiros. Depois, porque existem interesses legítimos, como o institucional, que justificam a intervenção de terceiro no processo, como a intervenção do Ministério Público como assistente em ação de responsabilidade movida diretamente em face da pessoa física de determinado promotor de justiça, em que se discutem questões relativas ao exercício de prerrogativas do Ministério Público.

Robson Renault Godinho já enfrentou a questão relativa à intervenção do Ministério Público como assistente simples em demandas de responsabilidade civil movidas diretamente em face de membros da Instituição. O jovem jurista propõe, com muita clareza e precisão de idéias, uma releitura do instituto da assistência para admitir o interesse institucional como espécie do gênero interesse jurídico. Aduz ainda o autor que é evidente a presença de interesse institucional nas demandas de responsabilidade civil movidas diretamente em face de membros do Ministério Público quando as questões ventiladas nessas demandas envolverem prerrogativas institucionais, direitos e garantias de membros do Ministério Público. Conclui, por fim, Robson Godinho que admitir a intervenção do Ministério Público como assistente simples, em processo em face dos seus membros, com base em interesse institucional, é fazer com que o processo sirva às partes, mas também, acima de tudo, à própria sociedade, que é a beneficiada principal da atuação do Ministério Público como Instituição independente 65.

E, por fim, poderá o terceiro intervir porque é detentor de conhecimento técnico-jurídico sobre o assunto e, assim, ingressar para auxiliar técnica e juridicamente o juiz na decisão. É o caso da figura do amicus curiae (amigo do tribunal), figura hoje presente em vários dispositivos legais (art. 7º, § 2º, da Lei nº 9.668/99; art. 482, § 3º, do CPC etc.) e em ascensão no sistema jurídico brasileiro.

Por conseguinte, observa-se que, seguindo a clássica orientação de Chiovenda, Cassio Scarpinella Bueno afirma que parte é quem pede e contra quem se pede alguma espécie de tutela jurisdicional, sendo que terceiro seria todo aquele que não pede ou contra quem nada se pede em juízo 66. Scarpinella sustenta ainda que ‘ser terceiro’, para os fins de sua pesquisa, não se relaciona, em primeiro momento, com o participar do contraditório e ser sujeito de direitos, deveres, faculdades, ônus e obrigações na seara do processo. Assim, conclui o jovem processualista que entender parte todo aquele que participa, de algum modo, do contraditório é entender o fenômeno ‘parte’ como elemento exclusivo do processo, sendo que ‘parte’ relaciona-se também ao próprio direito de ação e ao direito material 67.

Não concordamos com o entendimento do Scarpinella. Primeiro porque poderá acontecer que alguém não compareça como sendo aquele que pediu ou como sendo aquele em face de quem foi formulado o pedido, mas ingresse em um dos pólos do processo, passando a ser demandante ou demandado. É o que ocorre com o denominado litisconsórcio facultativo unitário superveniente. Um dos co-proprietários ingressa no pólo ativo do processo instaurado por ação, com pedido reivindicatório, ajuizada por um dos condôminos. Nesse caso, ele não formulou pedido, mas ingressou como demandante incidente, passando a participar do contraditório.

Por outro lado, a assertiva de que o contraditório se restringiria à parte demandante e à parte demandada não tem razão de ser e contraria toda a magnitude do contraditório como princípio constitucional fundamental.

Ademais, para participar do contraditório, a parte tem que demonstrar a importância e a razão da sua participação e, para a aferição da presença de interesse que justifique a intervenção no processo em curso, o juiz vai analisar, em regra, a fundamentação no próprio direito material ou em outras questões fáticas e ou de interesse legítimo que justifique a intervenção. Portanto, analisar as dimensões da qualidade de parte pelo prisma do princípio constitucional do contraditório não é resumir o fenômeno parte somente à dimensão processual, mas é fazer com que o direito processual tenha legitimidade constitucional e atenda às reais necessidades do direito material.

Destarte, entendemos que, no plano processual, devem ser consideradas as partes em sentido mais restrito (demandante e demandada) e as partes intervenientes, que seriam os terceiros intervenientes. Os terceiros estranhos seriam aqueles que não possuem qualquer tipo de interesse que demonstre a razoabilidade da intervenção.

Portanto, terceiros desinteressados são aqueles que não têm qualquer tipo de interesse no processo e na própria prestação jurisdicional, seja jurídico em sentido estrito, seja interesse jurídico em sentido mais amplo, seja qualquer outro interesse legítimo que justifique a sua intervenção. Já terceiros interessados são aqueles que possuem interesse jurídico em sentido restrito ou interesse jurídico em sentido amplo no desfecho da demanda ou qualquer outro interesse legítimo que justifique a sua intervenção, sendo terceiros porque não são titulares da relação jurídica material deduzida em juízo e não estão autorizados legalmente para a defesa, em nome próprio, do direito alheio decorrente da relação jurídica material em juízo deduzida.

Thereza Alvim chega a sustentar que o representante do menor absolutamente incapaz, por atuar para integrar a capacidade, seria também parte no processo e, nesses casos, formaria com o incapaz, que também é parte, uma parte composta 68 .

Com base nos princípios do acesso à justiça e do contraditório, apontaremos abaixo, de forma bem objetiva, cinco dimensões da qualidade de parte no processo civil.

4.2. Parte em sentido material

Parte em sentido material são os titulares da relação jurídica material deduzida em juízo e, em comparecendo em juízo, serão os legitimados ordinários 69. Essa dimensão da qualidade de parte é importante para aferir as dimensões da sua participação no contraditório, bem como para saber quem será atingido pelos limites subjetivos da coisa julgada (art. 472 do CPC). Essa dimensão também é fundamental para se aferir litispendência, perempção, continência etc.

Em regra, as partes em sentido material é que serão parte da demanda, na qualidade de demandante ou de demandado, salvo nos casos de substituição processual, que depende de autorização legal (art. 6º do CPC).

Nesses casos de substituição processual, em comparecendo somente o substituto processual, entendemos, conforme já afirmado acima, que coisa julgada, por força de imposição constitucional decorrente do devido processo legal e contraditório (art. 5º, LIV e LV, da CF/88), deverá sempre operar segundo eventum litis. Em caso de decisão contrária aos interesses do substituído (titular do direito deduzido em juízo), esse não poderá, com respeito aos entendimentos em sentido contrário, ser atingido pela coisa julgada se não participou do contraditório.

4.3. Parte na demanda

Parte na demanda é todo aquele que figura no pólo ativo (demandante ou autor) ou passivo (demandando ou réu) da demanda posta em juízo, sendo que, em regra, partes na demanda serão os legitimados ordinários, mas o legitimado extraordinário também poderá figurar como parte na demanda quando houver autorização legal para que ele venha a defender, em nome próprio, direito alheio. O litisconsorte, ativo ou passivo, sempre será parte da demanda. O demandante se torna parte no processo, em regra, com a propositura da ação (art. 263 do CPC) e o demandado se tornará parte no processo, em regra, pela citação (art. 213 do CPC) ou pelo seu comparecimento espontâneo (art. 214 do CPC), salvo outras exceções legais.

4.4. Parte em sentido processual

Partes em sentido processual são todos aqueles que participam do contraditório. São todos aqueles que participam do procedimento de preparação do provimento, influenciando na decisão judicial.

É essa a conceituação mais ampla de parte no processo civil e, por isso, ela abrange o demandante e o demandado no processo, os terceiros intervenientes, o Ministério Público como órgão interveniente. Exclui o Juiz, que tem de ser parcial, bem como os auxiliares a ele subordinados.

4.5. Parte para fins de auxílio técnico-jurídico das decisões judiciais (nova dimensão processual da qualidade de parte)

Parte para fins de auxílio técnico-jurídico das decisões judiciais é uma nova dimensão processual da qualidade de parte no processo civil. Ela abrangeria a atuação do amicus curiae (amigo da corte ou do tribunal) 70.

O amicus curiae, que significa amigo da corte ou do tribunal, é instituto originário do direito anglo-americano. Sua introdução no direito brasileiro ocorreu com o advento da Lei nº 6.385.76 que, em seu ao art. 31, passou a impor a obrigatoriedade de intimação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) para sua intervenção nos processos em que se discutam questões de sua competência.

Recentemente, a Lei nº 9.868.99, que passou a disciplinar o processo e o procedimento da ação direta com pedido declaratório de inconstitucionalidade e da ação direta com pedido declaratório de constitucionalidade perante o STF, veio a admitir expressamente a intervenção do amicus curiae no sistema do controle concentrado de constitucionalidade, conforme está previsto no seu art. 7º, § 2º 71.

Existem outras disposições legais que também admitem a intervenção do amicus curiae, sendo elas: o art. 89 da Lei 8.884.94, que prevê a intervenção em determinadas causas do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE); o art. 482, § 3º, do CPC, que dispõe que o relator, levando em consideração a relevância da matéria e a representatividade dos postulantes, poderá admitir, em despacho irrecorrível, a intervenção de outros órgãos ou entidades no incidente de declaração de inconstitucionalidade em controle difuso ou incidental nos tribunais.

No sistema brasileiro, o amicus curiae poderá intervir por provocação do juiz ou por requerimento próprio, diferentemente do direito anglo-americano, que prevê também a hipótese da intervenção do amicus curiae por consenso das partes.

Não obstante exista entendimento no sentido de que a figura do amicus curiae é espécie do gênero intervenção de terceiros em sentido clássico, observa-se que há entendimento também em sentido contrário.

O principal argumento em sentido contrário é o de que no sistema da intervenção de terceiros, cuja disciplina básica está no CPC dos arts. 50/80, o terceiro ingressa na relação jurídica processual em curso, passando a ser parte assistente ou até mesmo parte demandante ou demandado, isso conforme a espécie de intervenção de terceiros. O terceiro, no caso das hipóteses clássicas de intervenção de terceiros, torna-se, com a sua intervenção, parte no processo, produzindo alguma forma de alteração subjetiva na relação jurídica processual. Já o amicus curiae não integra, com a sua intervenção, a relação jurídica processual, pois ele somente atua como um auxiliar técnico-jurídico do juiz, com função diversa, mas semelhante à função de um perito. São esses os ensinamentos de Fredie Didier Junior 72, que ainda aduz que a intervenção do amicus curiae consubstancia em um importante apoio técnico-jurídico ao juiz, contribuindo, assim, para o aprimoramento da própria qualidade das decisões judiciais. Ele ainda afirma que, na sua qualidade de assistente técnico-jurídico do juiz ou do tribunal, o amicus curie não teria, em regra, legitimidade para recorrer das decisões proferidas nas causas em que intervir 73.

A respeito do tema, em trabalho de ressaltada profundidade teórica sobre o tema, escreveu Cássio Scarpinella Bueno que o grande aspecto de distinção do amicus curiae daquelas espécies intervenção de terceiros previstas no CPC, seria, principalmente, mas não exclusivamente, a falta de um interesse jurídico, "(...) entendido como aquele que decorre de uma específica relação jurídica-base entre dois ou pouco mais de dois indivíduos, que tem tudo para ser afetada, direta ou indiretamente, atual ou potencialmente, pela decisão (ou decisões) a ser (em) proferidas (s) em processo em que contendem outras pessoas" 74 .

É de se consignar que os art. 7º e 18 da Lei 9.868.99 proíbem a intervenção de terceiros no processo objetivo do controle abstrato e concentrado de constitucionalidade pela ação direta declaratória de inconstitucionalidade e pela ação direta declaratória de constitucionalidade, não obstante a própria lei em questão admita a intervenção do amicus curiae (art. 7º, § 2º). Isso, por si só, já seria motivo para que se procure distinguir a intervenção do amicus curiae das espécies clássicas de intervenção de terceiros constantes do CPC brasileiro.

O STF atualmente vem flexibilizando, em suas decisões, a intervenção do amicus curiae, tanto que anteriormente não vinha admitindo a sustentação oral pelo amigo da corte, mas em decisão recente o mencionado tribunal alterou o seu posicionamento e passou a admitir a sua sustentação oral. O principal argumento foi o de que a atuação do amicus curiae não poderia limitar-se à mera apresentação de memoriais, pois a ampliação de sua atuação contribuiria para a garantia da maior efetividade e legitimidade das decisões do STF e ainda valorizaria a dimensão democrática dessa espécie de participação processual.

Além disso, também em decisão recente (ADPF 54 MC-DF, publicada no DJU do dia 02.08.04), o STF entendeu ser possível, outrossim, a intervenção do amicus curiae na argüição de descumprimento de preceito fundamental, aplicando, por analogia, o disposto no § 2º do art. 7º da Lei nº 9.868/99.

Destarte, há hoje uma forte tendência no sentido de ampliar a intervenção do amicus curiae, o que poderia abranger outras demandas de interesse público e social, como a ação civil pública, a ação popular etc. Essa tendência atende aos ditames de uma democracia pluralista, em que a interpretação jurídica deverá ser pluralista e aberta 75, o que também vai ao encontro do estatuído nos arts. 1º e 5º, XXXV, e § 2º, da CF.

A intervenção como auxiliar técnico-jurídico do juízo, portanto, de entidades, órgãos e pessoas com domínio de conhecimentos técnicos e jurídicos específicos, fortaleceria, em muito, a atuação do Poder Judiciário nas demandas coletivas, especialmente nas mais complexas, como as que envolvem o meio ambiente, a ordem urbanística, a saúde pública, a segurança pública etc. Assim, considerando que a ação civil pública também visa à tutela de interesses gerais da coletividade, mesmo que no plano concreto, nada impediria, no nosso entendimento, a aplicabilidade, também por analogia, do disposto no § 2º, do art. 7º da Lei 9.868/99, na ação civil pública e até mesmo em outras ações coletivas.

Resta saber se o amicus curiae seria parte ou não no processo civil. Entendemos que sim: ele assume a qualidade de parte porque participa do contraditório contribuindo e influenciando na formação do provimento. A sua intervenção é fator de ampliação da própria legitimidade das decisões judiciais. Por outro lado, observa-se que ele não é mero auxiliar técnico do juiz. É também auxiliar técnico-jurídico e, não fosse isso, não se subordina ao juiz. Daí a sua qualidade de parte. Por tais motivos entendemos que não há obstáculo que impeça que o amicus curiae recorra, em sendo o caso de recurso, da decisão judicial que não venha a acatar sua opinião no processo em que houve a sua intervenção.

4.6. Parte para fins de impugnação das decisões judiciais (nova dimensão processual da qualidade de parte)

Parte, para fins de impugnação das decisões judiciais, abrangeria todos aqueles que venham a ser atingidos por uma decisão judicial ou que estejam autorizados para defesa de determinados interesses e, por isso, poderão impugnar, por recurso ou por outro meio idôneo e adequado, decisões judiciais prejudiciais a esses interesses.

Portanto, essa dimensão da qualidade de parte abrange o demandante, o demandado, os terceiros intervenientes que sejam atingidos pela decisão que lhes é prejudicial, bem como outros terceiros que, mesmo não tendo participado do contraditório, venham a ser atingidos pela decisão ou estejam autorizados a defender certos interesses contrariados pela decisão judicial.

Assim, essa dimensão da qualidade de parte abrangeria também o recurso de terceiro prejudicado direta ou indiretamente ou mesmo o recurso de terceiro que esteja autorizado a defender direitos ou interesses prejudicados pela decisão.

No processo civil brasileiro, observa-se que essa dimensão da qualidade de parte ainda não foi muito bem debatida. Por isso, há posicionamento doutrinário e jurisprudencial entendendo que determinados terceiros, por não serem partes no processo e não terem interesses interligados com o desfecho da demanda, não poderiam recorrer da decisão, mesmo que ela lhes atinja prejudicialmente 76.

É precisamente o caso do perito, do leiloeiro, do depositário etc., os quais poderiam recorrer de decisões judiciais que lhes sejam prejudiciais. Entendemos que eles poderiam recorrer como terceiros (art. 5º, XXXV, da CF e interpretação flexível do art. 499 do CPC). Há entendimento, contudo, que sustenta que eles recorreriam, não como terceiros, mas com base em legitimidade recursal própria 77. Por outro lado, há posicionamento doutrinário e jurisprudencial no sentido de que eles não poderiam recorrer, já que seriam meros auxiliares do juízo, sendo que, o mais correto para essa orientação seria o ajuizamento pelos prejudicados, em sendo o caso, de ações autônomas, como no caso do perito judicial para buscar a revisão dos honorários periciais.

Também poderiam assumir essa qualidade de parte, para fins de impugnação da decisão judicial, todos aqueles que, não sendo parte na demanda ou no processo e, mesmo não tendo interesse nessa demanda, interligados, venham a sofrer a aplicabilidade de multa pelo juiz por força do disposto no art. 14, V, e parágrafo único, do CPC — multa essa aplicável a todos aqueles que participem do processo, salvo exceções legais, e que venham a praticar ato atentatório ao exercício da jurisdição.

O advogado, em razão de ser hoje o titular dos honorários advocatícios fixados judicialmente (Lei nº 8.906/94 art. 23 — Estatuto da OAB), tem interesse e legitimidade para recorrer da decisão judicial que, ao fixar honorários, contrariar seus interesses. É certo que o advogado não é parte, mas mero representante técnico da parte; porém, quando ele é atingido pela decisão judicial que fixou ou que deixou de fixar seus honorários, assume ele a qualidade de parte para fins recursais 78 .

A respeito dessa dimensão da qualidade de parte convém destacar aqui a Súmula 202 do STJ, que prevê: "a impetração de impetração de segurança por terceiro, contra ato judicial, não se condiciona à interposição de recurso".

4.7. Formas de aquisição da qualidade de parte no processo civil

Por vários meios poderá ser adquirida a qualidade de parte no processo civil, consideradas as dimensões acima tratadas. Assim, poderemos apontar as seguintes: a) pela propositura da ação (art. 263 CPC), o autor e o réu adquirem a qualidade de partes na demanda, passando o autor a ser também parte no processo; b) pela citação (art. 213 do CPC), o demandado passa a ser parte no processo; c) pelo comparecimento espontâneo, o demandado assume a qualidade de parte no processo (art. 214 do CPC); d) pela citação, o terceiro interessado adquire a qualidade de parte no processo (art. 213 do CPC); e) pela intervenção espontânea, o terceiro assume a qualidade de parte no processo; f) pela intervenção de terceiro provocada pelo juiz (intervenção iussu iuducis), o terceiro assume a qualidade de parte no processo no momento em que é intimado judicialmente para intervir; g) pela intimação pessoal do membro do Ministério Público, essa Instituição assume a qualidade de parte no processo para atuar como órgão interveniente (arts. 84 e 236, § 2º, ambos do CPC); h) pela sucessão processual voluntária (art. 42 do CPC) ou obrigatória (art. 43 do CPC), o sucessor assume a qualidade de parte no processo e na demanda, pólo ativo ou passivo, conforme o caso; i) pelo recurso ou por meio impugnativo incidental idôneo, o terceiro assume a qualidade de parte no processo para fins de impugnar decisão judicial 79.


5. Para uma conceituação mais constitucionalizada da qualidade de parte no processo civil

É inquestionável a necessidade de revisitação da conceituação de partes e de terceiros no processo civil com base na principiologia constitucional que tutela o processo, especialmente com fundamentação nos princípios constitucionais do acesso à justiça e do contraditório.

Com a mudança de paradigma no plano do Direito para um estudo fundado mais no plano constitucional e de base principiológica, valorativa e transformadora, o positivismo jurídico tem sido superado, aos poucos, por aquilo que genericamente é denominado por parte da doutrina de pós-positivismo 80.

A expressão pós-positivismo é equívoca e poderá guardar vários significados, tendo em vista a sua ampla abertura conceitual. Contudo, a doutrina que tem enfrentado o tema faz a análise do assunto a partir da guinada do direito constitucional e da inserção dos seus princípios como diretrizes fundamentais da ordem jurídica democrática 81. O pós-positivismo abrangeria todas as concepções de pensamento que procuram valorizar os princípios como mandamentos de otimização de uma ordem jurídica democrática, pluralista e aberta de valores. As concepções mais atuais em torno do neoconstitucionalismo estão inseridas dentro do gênero pós-positivismo 82.

Antonio Carlos Diniz e Antônio Cavalcanti esclarecem que o pós-positivismo jurídico constitui, em linhas gerais, um novo paradigma no plano da teoria jurídica, que objetiva contestar as insuficiências, aporias e limitações do juspositivismo formalista tradicional. Afirmam que o próprio termo pós-positivismo, que também é conhecido como não-positivismo ou não-positivismo principiológico, é detentor de um status provisório e genérico, na sua categoria terminológica, e a sua utilização não é pacífica, inclusive entre os autores que partilham de suas teses axiais. Esclarecem, ainda, que as suas bases filosóficas são ecléticas e compõem uma constelação de autores, os quais mantêm ponto de contato com concepções de um Gustav Radbruch tardio e passam pelas influências da teoria da justiça de John Raws, além de incorporarem elementos da filosofia hermenêutica e as bases da teoria do discurso de Habermas. No quadro da concepção pós-positivista, afirmam que seriam destacáveis cinco aspectos: 1º) o deslocamento da agenda, com ênfase à importância dos princípios gerais do Direito e à dimensão argumentativa na compreensão da funcionalidade do direito no âmbito das sociedades democráticas atuais, bem como o aprofundamento no papel que deve ser desempenhado pela hermenêutica jurídica; 2º) a importância dos casos difíceis; 3º) o abrandamento da dicotomia descrição/prescrição; 4º) a busca de um lugar teórico para além do jusnaturalismo e do positivismo jurídico; 5º) o papel dos princípios na resolução dos casos difíceis 83.

Diz a doutrina, ao estudar o tema, que o pós-positivismo não visa à desconstrução da ordem jurídica, mas à superação do conhecimento convencional com base nas idéias de justiça e de legitimidade, inserindo, para tanto, os princípios constitucionais, expressos ou implícitos, como a síntese dos valores consagrados na ordem jurídica 84. A nova concepção tem influenciado decisivamente na constituição de uma hermenêutica constitucional inovadora.

A própria concepção de sistema jurídico sofre transformações: de sistema jurídico fechado e auto-suficiente para sistema jurídico aberto, móvel e composto de valores 85. A interpretação constitucional passa a ser pluralista, dentro daquilo que Peter Häberle denomina de sociedade aberta dos intérpretes da Constituição 86.

O pós-positivismo coloca o constitucionalismo em substituição ao positivismo legalista, com profundas mudanças em alguns parâmetros, entre elas convém destacar: valores constitucionais no lugar da concepção meramente formal em torno da norma jurídica; ponderação no lugar de mera subsunção e fortalecimento do Judiciário e dos Tribunais Constitucionais quanto à interpretação e aplicação da Constituição, em substituição à autonomia inquebrantável do legislador ordinário 87.

A metodologia do pós-positivismo inseriu a hermenêutica como o capítulo mais relevante para o novo direito constitucional, iniciando-se a superação da metodologia clássica, que pregava a interpretação-subsunção, por uma nova interpretação constitucional criativa: a interpretação-concretização 88. Paulo Bonavides arrola as principais conquistas resultantes da nova hermenêutica do constitucionalismo da segunda metade do século XX: a) elaboração científica de um novo Direito Constitucional; b) criação de uma teoria material da Constituição diversa da sustentada pelo jusnaturalismo ou pelo positivismo formalista; c) superação da visão meramente jusprivatista e juscivilista para uma concepção em torno do "direito público"; d) uma nova interpretação, mais ampla, da Constituição e uma nova interpretação, mais restrita, dos direitos fundamentais, ambas autônomas e em recíproca sintonia; e) inserção do princípio da proporcionalidade no direito constitucional, com a ampliação da incidência do direito constitucional para todas as áreas do direito; f) conversão dos princípios gerais do direito em princípios constitucionais com eficácia normativa; g) elaboração de uma concepção de pluridimensionalidade dos direitos fundamentais, antes concebidos somente no plano da subjetividade; h) expansão normativa do direito constitucional para todas as áreas do Direito; i) consagração da tese mais importante, (...) de que a Constituição é direito, e não idéia ou mero capítulo da Ciência Política, como inculcava a tese falsa de Burdeau e de outros constitucionalistas francesas filiados à linha da reflexão constitucional que se vinculava à ideologia já ultrapassada do liberalismo clássico 89 .

O neoconstitucionalismo é a denominação atribuída a uma nova forma de estudar, interpretar e aplicar a Constituição de modo emancipado e desmistificado. A finalidade é superar as barreiras impostas ao Estado Constitucional Democrático de Direito pelo positivismo meramente legalista, gerador de bloqueios ilegítimos ao projeto constitucional de transformação, com justiça, da realidade social.

Conforme esclarecido por Robert Alexy, o legalismo, em oposição ao constitucionalismo democrático, impõe: 1) a norma em vez do valor; b) a subsunção em vez da ponderação; 3) a independência do direito ordinário em vez da onipresença da Constituição; 4) a autonomia do legislador ordinário, dentro do marco da Constituição, no lugar da onipresença judicial fundada na Constituição, colocando o legislador sobre o Tribunal Constitucional Federal 90.

O neoconstitucionalismo objetiva superar justamente essas barreiras interpretativas impostas pelo positivismo legalista. Lenio Luiz Streck entende que a superação de tais obstáculos poderá ser viabilizada em três frentes: a) por intermédio da teoria das fontes, haja vista que a lei já não é mais a única fonte — a Constituição passa a ser fonte auto-aplicativa; b) por uma substancial alteração na teoria da norma, imposta pela nova concepção dos princípios, cuja problemática também tem relação com a própria fonte dos direitos; c) por uma radical mudança no plano hermenêutico-interpretativo, para passar do paradigma da interpretação para compreensão para a compreensão para a interpretação 91.

Esclarece Luís Roberto Barroso que o neoconstitucionalismo pode ser estudado em três aspectos. Primeiro, pelo aspecto histórico, com a análise das transformações do direito constitucional após a 2ª Grande Guerra Mundial, especialmente por força da Lei Fundamental de Bonn (1949) e das Constituições da Itália (1947), de Portugal (1976) e da Espanha (1978). Também merece ser citada a Constituição Federal do Brasil de 1988. Segundo, pelo aspecto filosófico, o que deve ser realizado pelo estudo das vertentes teóricas que compõem o pós-positivismo jurídico. Terceiro, pelo aspecto teórico, o qual engloba o estudo da força normativa da Constituição, da expansão da jurisdição constitucional e do desenvolvimento de uma nova dogmática da interpretação constitucional 92.

O neoconstitucionalismo propõe, assim, a superação do paradigma do direito meramente reprodutor da realidade para um direito capaz de transformar a sociedade, nos termos do modelo constitucional previsto na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (arts. 1º, 3º, 5º, 6º etc.). Essa superação deve ser realizada a partir do Estado Democrático de Direito, de forma a proporcionar o surgimento e a implementação de ordenamentos jurídicos constitucionalizados 93.

Propõe-se também a concepção da Constituição como sistema aberto de valores, dinâmico em suas estruturas e transformador da realidade social.

O plano da efetivação concreta dos direitos constitucionais, individuais e coletivos é o ponto central para o neoconstitucionalismo. A implementação material desses direitos, especialmente no plano coletivo, que é potencializado, transformará a realidade social, diminuindo as desigualdades quanto ao acesso aos bens e valores inerentes à vida e à dignidade da pessoa humana. Para isso, é imprescindível a construção de novos modelos explicativos, superando as amarras construídas em um passado de repressão e de liberdade limitada, por valores não mais subsistentes no cenário da sociedade atual.

A própria interpretação do texto constitucional no plano do neoconstitucionalismo deve ser compreendida a partir da sua aplicação (efetivação). Como disse Lenio Luiz Streck, a Constituição será o resultado de sua interpretação, que tem o seu conhecimento no plano do ato aplicativo como produto da intersubjetividade dos juristas que emerge da complexidade das relações sociais 94.

No neoconstitucionalismo, a interpretação da Constituição é também aberta e pluralista e a idéia que gira em torno da construção de uma sociedade aberta dos intérpretes da Constituição, conforme tese proposta por Peter Häberle 95, corresponde às novas posturas constitucionalistas, mantendo perfeita sintonia com a principiologia do Estado Democrático de Direito implantada na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (arts. 1º, 2º, 3º, 4º, 5º etc.).

A partir dessa visão nova em torno da Constituição, denominada por muitos de neoconstitucionalismo, Eduardo Cambi fala em um neoprocessualismo, cuja construção teria como premissas fundamentais: a relação da Constituição com o processo e a necessária filtragem constitucional do direito infraconstitucional; o direito fundamental à ordem jurídica justa, o direito fundamental ao processo justo; a visão publicística do processo; o direito fundamental à tutela jurisdicional; a instrumentalidade do processo e a construção de técnicas processuais adequadas à realização dos direitos materiais; a conciliação da instrumentalidade do processo com o garantismo constitucional 96.

Tudo isso impõe uma mudança de paradigma em relação à concepção de partes e de terceiros no direito processual civil. A interpretação aberta e flexível sobre partes e terceiros facilitará o ingresso em juízo e fomentará a participação no contraditório de todos os interessados, o que é fator de legitimação da própria atividade jurisdicional no Estado Democrático de Direito.

Com base em uma leitura constitucional — que é a que se configura como a mais legítima forma de interpretação do direito em uma sociedade democrática —, amplia-se a qualidade de parte no processo civil, como ampliam-se também as hipóteses de intervenção de terceiros.

Contudo, essa contextualização da qualidade de parte no processo civil exige a releitura da relação entre o direito processual e o direito material, de sorte que este sempre possa ser meio útil e eficaz para viabilizar a aplicabilidade concreta daquele.

Para a conceituação constitucionalizada da qualidade de parte em processo civil, torna-se imprescindível considerar o princípio do acesso à justiça previsto no art. 5º, XXXV, da CF/88, em todas as suas dimensões, bem como considerar, ainda, todas as diretrizes do princípio constitucional do contraditório como direito-dever de participação e colaboração na preparação do provimento como fator de legitimação do processo e da prestação jurisdicional.

Em razão da magnitude constitucional dos princípios do acesso à justiça e do contraditório e, por não lhes ser compatível interpretação restritiva, não há fixar critérios rígidos para a aferição da qualidade de parte e de terceiro no processo civil.


Conclusões

1. A compreensão a respeito dos institutos partes e terceiros no processo civil é tema fundamental e de importância vasta para a prestação jurisdicional.

2. Coisa julgada e seus limites subjetivos, litispendência, perempção, continência, competência em razão da pessoa, elementos e condições da ação, pressupostos processuais subjetivos etc., para serem bem compreendidos, dependem do conhecimento da qualidade de parte e de terceiro no direito processual.

3. Na fase sincretista ou privatista do direito processual, não havia uma conceituação sistematizada de partes e de terceiros no processo civil, de sorte que a confusão até então existente entre direito material e direito processual impedia uma conceituação processual de parte e de terceiro e, por isso, os conceitos relativos a tais institutos estavam diretamente ligados à relação jurídica material.

4. Na fase autonomista ou conceitual do direito processual surge o conceito processual de parte e de terceiros, mas de forma fechada, com base no método meramente técnico-jurídico, o que se dava em razão do distanciamento do direito processual do direito material, provocado pelo método da introspecção implantado nessa fase e pela postura da doutrina que, em sua maioria, rejeitava a dimensão material de parte como critério para conceituar parte no plano do direito processual.

5. Na fase instrumentalista do direito processual, em que os critérios metodológicos são abertos e flexíveis, atualmente em crise, o conceito de parte e de terceiros sofreu e vem sofrendo mutações, mas ainda há forte influência dos resquícios deixados pela postura exclusivamente formal, fechada e técnica da fase autonomista.

6. Ainda não foi formulada adequadamente a conceituação de partes e de terceiros com base nos princípios constitucionais do acesso à justiça e do contraditório, havendo a necessidade de revisitação da visão instrumentalista do direito processual com base na teoria dos direitos e garantias constitucionais fundamentais, eixo sob o qual deve ser estudado, reformado e aplicado o direito processual em tempos atuais.

7. O princípio do acesso à justiça é garantia constitucional fundamental prevista no art. 5º, XXXV, da CF, cuja natureza jurídica é pluridimensional, o que abrangeria, entre vários outros institutos, o direito de ação, o direito de defesa e a intervenção de terceiros no processo civil.

8. Com base no art. 5º, XXXV, da CF, o rol das hipóteses de intervenção de terceiros no processo civil é meramente exemplificativo.

9. Também com base no art. 5º, XXXV, da CF, o interesse jurídico que justifica a assistência deve ser concebido de forma aberta e flexível, de forma a abranger o interesse institucional e outros interesses legítimos.

10. O direito material deve sempre ser considerado para aferição das dimensões da qualidade de parte no processo civil, bem como para a aferição dos limites e diretrizes da própria intervenção, o que não exclui outras hipóteses de intervenção com base em interesse legítimo.

11. O princípio do contraditório, previsto expressamente no art. 5º, LV, da CF/88, surgiu inicialmente no processo civil ligado ao direito de defesa; depois evoluiu para abranger o direito de informação e de participação tanto do demandado quanto do demandante. Na seqüência, evoluiu mais ainda para abranger o direito de participação na fase de preparação do provimento de todos aqueles que poderão vir a sofrer os efeitos da decisão. Mais recentemente, por força de novos estudos, está sendo construída também a idéia de contraditório como direito-dever de participação e de cooperação com a prestação jurisdicional. O Estado-Juiz é atingido, de forma a impor-lhe deveres de provocar e de garantir a manifestação de todos os interessados em relação a todas as questões ventiladas no processo, o que configuraria fator de legitimação do processo e da própria prestação jurisdicional.

12. Terceiros desinteressados são aqueles que não têm qualquer tipo de interesse na prestação jurisdicional ou no processo, seja jurídico em sentido estrito, seja interesse legítimo, fático ou jurídico.

13. Terceiros interessados são aqueles que possuem interesse jurídico em sentido restrito ou interesse jurídico em sentido amplo no desfecho da demanda, bem como aqueles que possuem interesses legítimos, fáticos ou jurídicos, sendo terceiros porque não são titulares da relação jurídica material deduzida em juízo e não estão autorizados legalmente para a defesa em juízo, em nome próprio, da relação jurídica material já deduzida judicialmente por outrem.

14. Por força dos princípios do acesso à justiça e do contraditório, como garantias constitucionais fundamentais, cinco dimensões da qualidade de parte no processo civil poderão ser aferidas, o que não exclui a possibilidade de outras existirem: a) partes em sentido material, que são os titulares da relação jurídica material deduzida em juízo e, em comparecendo em juízo, serão os legitimados ordinários e serão também os que sofrerão os limites subjetivos da coisa julgada; b) partes na demanda, que são os que figuram no pólo ativo (demandante ou autor) ou passivo (demandado ou réu) da demanda posta em juízo, sendo que em regra serão eles os legitimados ordinários, mas poderão ser também legitimados extraordinários, caso haja autorização legal para a defesa em nome próprio de direito alheio; c) partes em sentido processual são todos aqueles que participam do contraditório de forma que possam influir na decisão judicial, tratando-se da conceituação mais ampla de parte e, por isso, ela abrangeria o demandante e o demandado no processo, os terceiros intervenientes, o Ministério Público como órgão interveniente; d) parte para fins de auxílio técnico-jurídico das decisões judiciais (nova dimensão processual da qualidade de parte), que abrangeria a atuação do amicus curiae (amigo da corte ou do tribunal), figura hoje em ascensão no sistema processual brasileiro e que assume a qualidade de parte no processo civil porque tem independência em relação ao julgador e porque também poderá influenciar técnica e juridicamente a decisão judicial; e) parte para fins de impugnação das decisões judiciais, por recurso ou outro meio idôneo, o que abrangeria todos aqueles que venham a ser atingidos por uma decisão judicial ou que estejam autorizados para defesa de determinados interesses e, por isso, poderão impugnar por recurso, ou por outro meio idôneo e adequado, decisões prejudiciais a tais interesses.

15. Em decorrência da ampla abrangência do princípio constitucional do contraditório (art. 5º, LV, da CF) e por força da dimensão publicística do direito processual e tendo em vista, ainda, a relevância do contraditório para o direito processual, entendemos que o juiz, considerando a relevância fática e jurídica das questões ventiladas no processo em curso, poderá, de ofício, provocar, por decisão fundamentada, em se considerando oportuna, a intervenção de terceiros interessados no processo — trata-se aqui da denominada intervenção iussu iudicis.

16. Há a necessidade de revisitação da conceituação de partes e de terceiros no processo civil à luz da principiologia constitucional que tutela o processo, especialmente os princípios do acesso à justiça e do princípio do contraditório, o que impõe uma interpretação aberta daqueles institutos, de forma a facilitar o ingresso em juízo e a participação no processo pelo contraditório.

17. Com base na principiologia constitucional, decorrente especialmente dos princípios constitucionais do acesso à justiça e do contraditório, não é suficiente mais classificar parte como sendo aquele que pede e aquele em face de quem é formulado o pedido em juízo.

18. Impõe-se, assim, uma classificação mais pluralista e aberta da qualidade de parte no processo civil, o que não interfere nos efeitos diretos da decisão judicial e nos limites subjetivos da coisa julgada, pois as partes atingidas diretamente por esses efeitos são justamente aquelas que são as titulares da relação jurídica material, figurando geralmente como parte demandante ou parte demandada no processo, salvo nos casos de substituição processual, que depende de autorização legal (art. 6º do CPC).

19. Não há apresentar critérios fechados quanto às dimensões da qualidade de parte no processo civil, tampouco como apontar critérios rígidos para a aferição de interesse que justifique a intervenção de terceiros, pois a complexidade das relações sociais e as peculiaridades de cada caso concreto impedem que sejam estabelecidas diretrizes rígidas, incompatíveis com a principiologia constitucional, especialmente com o princípio do contraditório (art. 5º, LV, da CF) e com o princípio do acesso à justiça (art. 5º, XXXV, da CF).

20. A qualidade de parte no processo civil poderá ser adquirida: a) pela propositura da ação; b) pela citação do demandado; c) pelo comparecimento espontâneo do demandado; d) pela citação do terceiro interessado; e) pela intervenção espontânea; f) pela intervenção de terceiro provocada pelo juiz (intervenção de terceiros iussu iuducis); g) pela intimação pessoal do membro do Ministério Público; h) pela sucessão processual voluntária (art. 42 do CPC) ou obrigatória (art. 43 do CPC); i) pelo recurso ou por meio impugnativo incidental idôneo de terceiro.

21. A inserção da boa-fé objetiva no processo civil, que se fundamentaria especialmente no princípio constitucional do contraditório (art. 5º, LV, da CF/88), bem como em vários dispositivos do CPC (art. 14, II, 339, 125 etc.), poderá gerar verdadeira mudança de paradigma no direito processual civil e nos seus institutos estruturais e fundamentais, de forma a alterar até mesmo (isso especialmente em razão dos deveres anexos de conduta que essa principiologia impõe) a regra fechada sobre a distribuição do ônus da prova prevista no art. 333 do CPC.

22. Por força da leitura constitucional do processo civil à luz da garantia constitucional do contraditório, impõe-se também a revisitação dos institutos da substituição processual e da coisa julgada para fixar o critério secundum eventum litis para a coisa julgada em relação ao titular do direito que foi substituído no processo, de forma que, nesses casos, somente deverá ocorrer coisa julgada para o titular do direito que não tenha participado do contraditório se a decisão lhe venha a ser favorável, conforme orientação já prevista no art. 103 do CDC, em sede de coisa julgada coletiva.

23. A visão mais constitucionalizada da qualidade de parte no processo civil, amparada, teoricamente, no pós-positivismo jurídico e no neoconstitucionalismo, é atualmente premissa fundamental para a própria evolução do instituto, constituindo-se também em fator de legitimação da própria função jurisdicional no Estado Democrático de Direito.


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WATANABE, Kazuo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel (coords). Participação e processo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1988.


Notas

  1. Gabriel Resende Filho faz esse destaque da importância do termo parte, ocasião em que cita o posicionamento de Chiovenda no sentido de que não há no processo termo cuja definição seja tão importante quanto ao termo parte. Curso de direito processual civil, v. 1, p. 220.

  2. Nesse sentido, são os ensinamentos deixados por Giuseppe Chiovenda: "[...] La determinazione del concetto di parte no ha una mera importanza teorica, ma è necessaria per la soluzione di gravi problemi pratici: Che una persona sia ‘parte’ in uma lite o sia ‘terzo’, è importante ad. es. per la identificazione delle azioni (sopra § 12), come per accertare se essa sia soggetta o no alla cosa giudicata; se vi sia o no litispendenza, ecc.; così per stabilire se il rapporto con una data persona renda incapace in giudice (p. 573); chi possa intervenire come terzo in una lite; chi possa fare opposizione di terzo a una sentenza; chi possa deporre como teste nella lite; chi sia soggetto alla condanna nelle spese (art. 370 Cod. proc. civ.), e via dicendo [...]". Principii di diritto processuale civile, p. 578.

  3. Gregório Assagra de Almeida, Codificação do direito processual coletivo brasileiro, p. 35-40. A respeito, formulando crítica ao positivismo e demonstrando sua incompatibilidade com o neoconstitucionalismo, escreveu STRECK, Lenio Luiz, A hermenêutica filosófica e as possibilidades de superação do positivismo pelo (neo)constitucionalismo, in ROCHA, Leonel Severo e STRECK, Lenio Luiz (orgs.), Constituição, sistemas sociais e hermenêutica, p. 155.

  4. Para uma análise mais aprofundada sobre o interesse processual no processo civil e suas várias dimensões, cf. FREIRE, Rodrigo da Cunha Lima, Condições da ação: enfoque sobre o interesse de agir no processo civil brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.

  5. Sobre a tópica e o pensamento problemático são lições de Theoror Viehweg: "O ponto mais importante no exame da tópica constitui a afirmação de que se trata de uma ‘techne’ do pensamento que se orienta para o ‘problemas’. Aristóteles sublinhou isto em várias ocasiões: as primeiras palavras de sua tópica já o dizem (of. Supra § II, I, 2). De acordo com elas, a organização proposta, que ele empreende na tópica, é uma organização segundo zonas de problemas (cf. supra § II, I, 3). Pois ‘aquilo em torno do que os raciocínios giram são os problemas’ (Aristóteles, Top. 1, 4,2,2). Ademais, Aristóteles introduziu em seu próprio trabalho filosófico o estilo mental dos sofistas e dos retóricos, sobretudo quando teve que tratar de uma minuciosa discussão de problemas. As investigações sobre as aporias no livro terceiro Metafísica são um bom exemplo disso. Nasceu assim seu famoso método de trabalho aporético (1), que é exemplar para a filosofia moderna (24). O termo aporia designa a ‘falta de um caminho’, a situação problemática que não é possível eliminar, e que Boécio traduziu, talvez de modo frágil, pela palavra latina ‘dubitatio’ (2). A tópica pretende fornecer indicações de como comportar-se em tais situações, a fim de não se ficar preso, sem saída. É portanto uma técnica do ‘pensamento problemático’". Tópica e jurisprudência, p. 33.

  6. La teoría de las excepciones procesales y los presupuestos procesales. LICHTSCHEIN, Miguel Angel Rosas (tradução). Buenos Aires: Ediciones Juridicas Europa — America, 1964.

  7. A respeito da intervenção de terceiros e dentro da concepção civilista ou privatista do fenômeno processual, explicava João Monteiro: "Mas, além destas duas figuras necessárias à atividade judiciária da ‘ação’, outras acidentalmente aparecem, e tomam parte da formação da lide, ou porque tenham dado causa à obrigação do réu, ou porque tenham interêsse seu ligado ao deste, ou finalmente porque tal interêsse exclua o do autor ou do réu ou um e outro. Estes litigantes acidentais são: o chamado à autoria, o assistente e o opoente [...]". Teoria do processo civil, Tomo I, p. 210.

  8. Dinamarco esclarece que antes da consagrada obra de Bülow, publicada na Alemanha em 1868, as normas do processo eram criadas com base em ditames exclusivamente práticos e estudadas pelo critério meramente exegético, na esteira dos velhos praxistas e, assim, não havia: "[...] uma construção segura dos institutos processuais e muito menos uma coordenação harmoniosa entre eles, os quais eram geralmente tratados por romanistas e civilistas — o que bem indica como à consciência dos juristas de então não transparecera ainda a luz da distinção, hoje muito nítida, entre direito substancial e processo; não havia maturidade suficiente dos estudos, para compreender que não são do direito material institutos como o da coisa julgada, da hipoteca, da prova, da responsabilidade executiva, da ação [...]". Fundamentos do processo civil moderno, v. 1, p. 40.

  9. Moacy Amaral Santos retrata bem a influência desse período sincretista ou privatista do direito processual quanto à conceituação de partes: "De ordinário — já se disse —, as partes na relação processual são os sujeitos ativos e passivos da relação de direito substancial que se controverte. Não só em razão dessa comum coincidência, como ainda porque viam na ação o próprio direito material a reagir contra a sua ameaça ou violação, os velhos processualistas, que se formavam na chamada corrente civilista, conceituavam as partes como sujeitos da relação jurídica material deduzida em juízo. Por autor se entendia aquele que pedia o reconhecimento do seu direito, isto é, o credor (em sentido geral); como réu se havia aquele contra quem se pedia esse reconhecimento, isto é, o obrigado (Paula Batista, João Monteiro, Aureliano de Gusmão etc)". Primeiras linhas de direito processual civil, 1º v., p. 341.

  10. Francisco de Paula Batista ainda aduzia: "A palavra qualidade significa a pessoa caracterizada, segundo os direitos e as obrigações, que a autorizam ou a obrigam a comparecer em juízo; por exemplo, se comparece em virtude de direitos seus, ou de alguém, de quem é ‘procurador’, ‘tutor’, ‘curador’, etc. A proibição ‘absoluta’, sem remédio da representação, ou a ‘relativa’, sem o cumprimento das condições legais, ou a falta de ‘qualidade’ tornam a pessoa ilegítima". Teoria e prática do processo civil e comercial, pp. 54-6. A obra espelha bem a visão prática, fundamentada principalmente na mera exegese dos textos legais, que na época reinava.

  11. Teoria do processo civil, Tomo I, p. 209.

  12. "Mas, além destas duas figuras necessárias à atividade judiciária da ‘ação’, outras acidentalmente aparecem, e tomam parte da formação da lide, ou porque tenham dado causa à obrigação do réu, ou porque tenham interêsse seu ligado ao deste, ou finalmente porque tal interêresse exclua o do autor ou do réu ou um e outro. Estes litigantes acidentais são: o chamado à autoria, o assistente e o opoente [...]". Teoria do processo civil, Tomo I, p. 210.

  13. É o que bem esclarece Edson Prata ao retratar a evolução histórica do direito processual: "A Escola do Processualismo Científico nasceu na Alemanha com Bülow, Wach, Kohler, Stein, Hellwig; encaminhou-se para a Itália com Chiovenda, Carnelutti, Calamandrei, Redendi, D´Onofrio, Allorio, Liebman; alcançou a Espanha com Prieto-Castro, Jaime Guasp, Rafael de Pina; chegou a Portugal com o notável José Alberto dos Reis; ultrapassou o continente e encontrou muitos seguidores na Argentina, Uruguai e Brasil". História do processo civil e sua projeção no direito moderno, pp. 176-7. No mesmo sentido, cf. Devis Echandía, Teoria general del proceso, pp. 50-53.

  14. Cf. Chiovenda, Principii di diritto processuale civile, p. 581.

  15. Cf. Santos, Primeiras linhas de direito processual civil, 1º v., p. 342.

  16. Sobre o assunto já expressou Moacyr Amaral Santos: "Sem desconhecer os sujeitos da lide, parece-nos mais acertado, consideradas as partes como sujeitos da relação processual, encará-las apenas sob esse aspecto e conceituá-las tão-só no ‘sentido formal’. Trata-se de conceito meramente formal, que do processo deve ser extraído". Primeiras linhas de direito processual civil, 1º v., p. 342.

  17. "[...] A posição de parte se adquire pelo fato de figurar alguém, em seu próprio nome, em uma causa, como sendo aquêle pelo qual ou contra o qual se pede a decisão do juiz". Instituições de direito processual civil , pp. 163-4.

  18. Dizia Liebman "A noção de parte ‘em sentido substancial’, que seria o sujeito da ‘lide’ ou da relação controvertida (e que um setor da doutrina contrapõe à parte ‘em sentido processual’), é estranha à lei e ao sistema de direito processual. A chamada parte em sentido substancial, quando não coincide com a parte em sentido processual, é apenas ‘um terceiro’". Manual de direito processual civil, v. I, p. 90.

  19. "Terceiras pessoas podem, pois, em razão do interesse que tenham na causa ‘entre duas outras’, nela intervir. Não são essas terceiras pessoas sujeitas da relação jurídica deduzida em juízo pelas partes, mas de relação jurídica outra que àquela se prende, de modo que a decisão de uma influirá sobre a outra. Também não são terceiras pessoas ‘partes’ na relação processual originária, na qual intervêm por ‘provocação’ de uma delas, em certos casos, e, outros, ‘voluntariamente’. ‘Terceiros’, pois, são pessoas estranhas à relação de direito material deduzida em juízo e estranhas à relação processual já constituída, mas que, sujeitos de uma relação de direito material que àquela se liga intimamente, intervêm no processo sobre a mesma relação, a fim de defender interesse próprio". Amaral Santos, Primeiras linhas de direito processual civil, 2º v., p. 18.

  20. Cf. Amaral Santos, Primeiras linhas de direito processual civil, 2º v., p. 18

  21. "[...] Os terceiros que, embora não sendo partes ou sujeitos do processo, se encontram, sob certa forma, em relação com a lide a ser solucionada em juízo, sentirão os efeitos da sentença a ser proferida. Como observou LIEBMAN, o princípio de que ‘res judicata aliis non nocet’ não exaure ‘o tema da extensão subjetiva da sentença’: é necessário completá-lo, de certo modo, porque é inegável a ‘coexistência’, ao lado da ‘relação jurídica que foi objeto de decisão e sôbre a qual ‘incide a coisa julgada’, de inúmeras outras relações a ela ‘ligadas de modo variado’". Instituições de direito processual civil, v. II, pp. 244-5.

  22. Cf. José Frederico Marques, Instituições de direito processual civil, vol. II, p. 166.

  23. Cf. ALMEIDA, Gregório Assagra de. Direito processual coletivo brasileiro — um novo ramo do direito processual, pp. 44-5.

  24. Mauro Cappelletti, influenciado especialmente por Piero Calamandrei e também por Tullio Ascarelli, escreveu vários textos que começavam a dar início à nova metodologia aberta, o que se deu no final da década de 50 do Século XX e se intensificou nas décadas seguintes. O excelente livro de Mauro Cappelletti Proceso, ideologias, sociedad reúne grande arsenal dessa nova doutrina da efetividade do processo. Diz o autor na introdução do referido livro (p. XVII): "[...] Los institutos procesales comienzan así a ser contemplados bajo el perfil de su efectividad, de su accesibilidad, de su adecuadez a las instancias de una sociedad renovada y a los valores de una Constitución que está proyectada hacia la construcción de un orden social más justo y más moderno. Surgen de tal modo temas y problemas que la dogmática tradicional ha descuidado por demasiado tiempo con injustificada altanería, como la eficiencia de la ‘máquina de la justicia’, la duración y las costas del proceso, la accesibilidad de la justicia a todos (ricos y pobres, empresarios y trabajadores), la correspondencia del derecho procesal a valores de libertad individual y de justicia social, a las exigencias y tendencias evolutivas que se expresan en las nuevas y potentes ‘ideologias’ sociales, constitucionales, supranacionale y comunitarias del mundo contemporáneo".

  25. Em obra específica sobre o tema, afirma Bedaque: "A natureza instrumental do direito processual impõe sejam seus institutos concebidos em conformidade com as necessidades do direito substancial. Isto é, a eficácia do sistema processual será medida em função de sua utilidade para o ordenamento jurídico material e para a pacificação social. Não interessa, portanto, uma ciência processual conceitualmente perfeita, mas que não consiga atingir os resultados a que se propõe. Menos tecnicismo e mais justiça, é o que se pretende". Direito e processo: influência do direito material sobre o processo, p. 16.

  26. Dinamarco ressalta que enquanto se leve em conta parâmetros exclusivamente jurídicos, será razoável a esperança de se obter fórmulas universais e definitivas: "[...] O que torna absolutamente inviável essa tarefa é a grande premissa metodológica da processualística moderna, consistente no enfoque instrumentalista e teleológico do processo mesmo, considerado agora como um sistema aberto e ‘dependente’, legitimado pela aptidão [...] de prestar serviços à comunidade". A instrumentalidade do processo, p. 150.

  27. Pondera Dinamarco: "A negação da natureza e objetivo puramente técnicos do sistema processual é ao mesmo tempo afirmação de sua permeabilidade aos valores tutelados na ordem político-constitucional e jurídico-material (os quais buscam efetividade através dele) e reconhecimento de sua inserção no universo axiológico da sociedade a que se destina [...]". A instrumentalidade do processo, p. 22.

  28. Cf. A instrumentalidade do processo.

  29. "[...] São todos aqueles que, tendo proposto uma demanda em juízo (inclusive em processo pendente), tendo sido citados, sucedendo a parte primitiva ou ingressando em auxílio da parte, figuram como titulares das diversas situações jurídicas ativas ou passivas inseridas na dinâmica da relação jurídica processual (poderes, faculdades, ônus, deveres, sujeição)". Intervenção de terceiros, p. 16.

  30. Intervenção de terceiros, p. 17.

  31. "Partes — são pessoas que participam do contraditório perante o Estado-juiz. É aquele que, por si só ou através de representante, vem deduzir uma pretensão à tutela jurisdicional, formulando pedido (autor), bem como aquele que se vê envolvido pelo pedido feito (réu), de maneira que uma sua situação jurídica será objeto de apreciação judiciária. A qualidade de parte implica sujeição à autoridade do juiz e a titularidade de todas as situações jurídicas que caracterizam a relação jurídica processual [...]". Teoria geral do processo, pp. 269-270. Em relação à intervenção de terceiros acrescentam ainda Dinamarco, Ada Pellegrini e Araújo Cintra que: "[...] As modalidades de intervenção de terceiro reconhecidas no direito positivo são heterogêneas e dispares, pouco tendo em comum além da entrada de terceiro no processo pendente entre outras pessoas". Teoria geral do processo, p. 304.

  32. Cássio Scapinella Bueno também já manifestou sua preocupação com a análise da concepção "partes" e "terceiros" de forma interligada com o direito material, afirmando que o direito processual civil, apesar de ter identidade, função e finalidade e natureza próprias, volta-se para a aplicação correta do direito material: "O que ocorre é que a ‘necessária’ aproximação dos planos do direito material e do processo definitivamente conduz o estudioso a conclusões que, muitas vezes, destoam daquelas que se habituou a saber, justamente porque as soluções ‘clássicas’ foram lançadas em época que o processualista precisava justificar a ‘independência’ do seu objeto de estudo, distinguindo-o, separando-o, ‘opondo-o’ ao direito material. Falar de processo civil à luz do direito material àquela época era cometer sincretismo metodológico imperdoável. Hoje, o contexto é outro, genuinamente invertido". Partes e terceiros no processo civil brasileiro, pp. 1 e 5.

  33. Cf. Luiz Fux, Intervenção de terceiros (aspectos do instituto). São Paulo: Saraiva, 1990. Vicente Greco Filho, Da intervenção de terceiros. São Paulo: Saraiva, 1991. Athos Gusmão Carneiro, Intervenção de terceiros. São Paulo: Saraiva, 2003. Cândido Rangel Dinamarco, Litisconsórcio. São Paulo: Malheiros Editores, 1996. E também do Dinamarco, intervenção de terceiros. São Paulo: Malheiros Editores, 1997.

  34. Partes e terceiros no processo civil brasileiro, pp. 1-10.

  35. Aspectos polêmicos e atuais sobre os terceiros no processo civil e assuntos afins. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.

  36. Gregório Assagra de Almeida, Codificação do direito processual coletivo brasileiro, p. 127-41.

  37. Robert Alexy: "Una teoría de los derechos fundamentales de la Ley Fundamental es una teoría de determinados derechos positivamente válidos. Esto la distingue de las teorías de los derechos fundamentales que han tenido vigencia en el pasado (teorías histórico-jurídicas) como así también de las teorías sobre los derechos fundamentales en general (teorías teórico-jurídicas) y de teorías sobre derechos fundamentales que no son los de la Ley Fundamental, por ejemplo, teorías sobre los derechos fundamentales de otros Estados o teorías de los derechos fundamentales de los Estados federados que integran la República Federal de Alemania". Teoría de los derechos fundamentales, p. 28.

  38. Honrad Hesse: "La función diretriz de la Constitución consiste en asumir estos cánones y — sobre todo, en los derechos fundamentales — dotarlos de fuerza vinculante para todo el ordenamiento jurídico. Por su parte, esta Constitución contribuye, se como eslabón intermedio, se como lazo de unión, a garantir la existencia de un ordenamiento jurídico ‘moralmente recto’". Constitución y derecho constitucional. In BENDA, Ernst; MAIHOFER, Werner; VOGEL, Hans-Jochen, HESSE, Konrad (organizadores), Manual de derecho constitucional, p. 5. Em outra oportunidade, de forma mais precisa, acrescenta HESSE: "Estas circunstancias troquelan la singularidad, la estructura y la función de los derechos fundamentales: garantizan no sólo derechos subjetivos de los individuos, sino también principios objetivos básicos para el ordenamiento constitucional democrático y del Estado de Derecho, fundamentos del Estado constituido a través de dichos derechos de su ordenamiento jurídico. En su doble carácter muestran diferentes niveles de significación que respectivamente se condicionan, apoyan e complementan. Los derechos fundamentales actúan legitimando, creando y manteniendo consenso; garantizan la libertad individual y limitan el poder estatal, son importantes para los procesos democráticos y del Estado de Derecho, influyen en todo su alcance sobre el ordenamiento jurídico en su conjunto y satisfacen una parte decisiva de la función de integración, organización y dirección jurídica de la Constitución (...)". Significado de los derechos fundamentales. In BENDA, Ernst; MAIHOFER, Werner; VOGEL, Hans-Jochen, HESSE, Konrad (organizadores), Manual de derecho constitucional, p. 90.

  39. Ingo Wolfgang Sarlet: "No que diz com a eficácia dos direitos fundamentais propriamente dita, há que ressaltar o cunho eminentemente principiológico da norma contida no art. 5º, § 1º, da nossa Constituição, impondo aos órgãos estatais e aos particulares (ainda que não exatamente da mesma forma), que outorguem a máxima eficácia e efetividade aos direitos fundamentais, em favor dos quais (seja qual for a categoria a qual pertençam e consideradas as distinções traçadas) milita uma presunção de imediata aplicabilidade e plenitude eficacial. Também no plano da eficácia dos direitos fundamentais assume lugar de destaque o princípio da proporcionalidade e da harmonização dos valores em jogo, sugerindo-se que o limite seja, também aqui, reconduzido ao princípio fundamental do respeito e da proteção da dignidade da pessoa humana, fio condutor de toda a ordem constitucional, sem a qual ele própria acabaria por renunciar à sua humanidade, perdendo até mesmo razão de ser". A eficácia dos direitos fundamentais, p. 441-2.

  40. João dos Passos Martins Neto. Direitos fundamentais: conceito, função e tipos, p. 79-96.

  41. Princípios do processo civil na Constituição Federal, p. 25.

  42. Dispõe o art. 49 do Estatuto da OAB (Lei nº 8.906/90): "Os Presidentes dos Conselhos e das Subseções da OAB têm legitimidade para agir, judicial e extrajudicialmente, contra qualquer pessoa que infringir as disposições ou os fins desta lei. Parágrafo único. As autoridades mencionadas no ‘caput’ deste artigo têm, ainda, legitimidade para intervir, inclusive como assistentes, nos inquéritos e processos em que sejam indiciados, acusados ou ofendidos os inscritos na OAB".

  43. Admitindo o interesse institucional como espécie do gênero interesse jurídico, cf. o belíssimo trabalho de Robson Renault Godinho: O Ministério Público e assistência: o interesse institucional como expressão do interesse jurídico, in Aspectos polêmicos e atuais sobre os terceiros no processo civil e assuntos afins, pp. 831-55.

  44. Acesso à justiça, pp. 12-3.

  45. Esclarece Nelson Nery Junior: "Nisso reside a essência do princípio: o jurisdicionado tem direito de obter do Poder Judiciário a tutela jurisdicional adequada. A lei infraconstitucional que impedir a concessão da tutela adequada será ofensiva ao princípio constitucional do direito de ação". Princípios do processo civil na Constituição Federal, p. 133.

  46. É o que ensina Nelson Nery Junior: "Embora o ‘destinatário principal’ desta norma seja o legislador, o comando constitucional atinge a todos indistintamente, vale dizer, não pode o legislador e ninguém mais impedir que o jurisdicionado vá a juízo deduzir pretensão". Princípios do processo civil na Constituição Federal, p. 130.

  47. É o entendimento de Cássio Scarpinella Bueno: "A questão de "ser" parte, "querer ser" parte ou "poder ser" parte, destarte, não se resolve só para o direito processual; não se trata de um problema exclusivo de direito processual. Também não basta para o direito material. Não, pelo menos, quando se estuda processo, processo que tem como missão primeira aplicar e realizar concretamente o direito material". Partes e terceiros no processo civil brasileiro, p. 5.

  48. Instituições de direito processual civil, v. II, pp. 111-2.

  49. "Occorre, dunque, per individuarei il processo, Che risalgano ai destinatari degli effetti Del provvedimento, realizzando fra loro un contraddittorio paritetico". Istituzioni di diritto processuale, p. 85.

  50. "L’essenza stessa del contraddittorio esige che vi partecipino almeno due soggetti, un "interessato" e un "contrainteressato": sull’uno dei quali l’atto finale è destinato a svolgere effetti favorevoli e sull´altro effetti pregiudizievoli". Istituzioni di diritto processuale, p. 86.

  51. Princípios do processo civil na Constituição Federal, p. 170.

  52. "[...] Todos aqueles que tiverem alguma pretensão de direito material a ser deduzida no processo têm direito de invocar o princípio do contraditório em seu favor. Como as testemunhas e peritos não têm pretensão a ser discutida no processo, sendo apenas auxiliares da justiça, não lhes assiste o direito ao contraditório [...]". Princípios do processo civil na Constituição Federal, 171.

  53. Nelson Nery Junior, Princípios do processo civil na Constituição Federal, p. 171.

  54. Explica Antonio de Passo Cabral: "Além da obrigação das partes em contribuir eticamente para a resolução do conflito, o contraditório impõe ainda um dever ao juiz, no sentido de instalar verdadeiro debate judicial sobre as questões discutidas no processo. Desde há muito foi superada a visão de que o magistrado não deveria empreender esforços no campo probatório para não ferir sua imparcialidade, concepção dominante há algumas décadas e que ainda prevalece nos ordenamentos do ‘common law’, onde vigora o ‘adversarial system’ com uma maior passividade do julgador. Ao contrário, perceberam os processualistas a necessidade de postura ativa do juiz para a busca da verdade real, afastando a aplicação irrestrita do princípio dispositivo, e não apenas na atividade probatória". O contraditório como dever e a boa-fé processual objetiva, pp. 62-4.

  55. A boa-fé no processo civil, p. 44.

  56. Conclui, por fim, Brunela Vincenzi: "[...] a análise das teorias contemporâneas sobre a boa-fé, inclusive no direito privado brasileiro, revela um caminho novo que pode ser trilhado pelo processo civil brasileiro. A boa-fé objetiva é norma de conduta criadora de deveres anexos ou acessórios, como o de cooperação e colaboração entre as partes; é, ainda, regra que limita o exercício inadmissível de posições jurídicas no processo. As medidas contra a violação da regra da boa-fé objetiva podem até ser pecuniárias, mas têm por meta principal evitar a ocorrência de danos, tutelando antecipada e tempestivamente as condutas inadmissíveis no processo civil de resultados, em busca da realização dos escopos da jurisdição". A boa-fé no processo civil, pp. 172 e 177.

  57. Sobre o assunto, esclarece Vicente Greco Filho: "Em trabalho recente, Moacyr Lodo da Costa sustenta que o art. 91 do Código de Processo Civil regula um caso típico de intervenção de terceiros no processo, por iniciativa do juiz e não de integração de instância no caso do litisconsórcio necessário, conforme doutrina dominante. Explica o autor citado que é possível ver na expressão ‘quando necessário’, do art. 91, um equivalente do ‘quando ritiene opportuno’, do art. 107 do Código de Processo Civil italiano, porque ambos são provenientes do projeto preliminar Solmi (art.14), que dizia ‘quando lo ritenga necesario’". Da intervenção de terceiros, p. 21.

  58. Fredie Didier Jr. também tem admitido a intervenção iussu iudicis no sistema atual: "Pugnamos, porém, por uma intervenção extensiva deste poder, voltando um tanto ao regime do CPC-39. A intervenção de terceiro por ordem do juiz deve-se a dar não só nos casos de litisconsórcio necessário no pólo passivo, como também nas hipóteses de litisconsórcio unitário facultativo, para integrar aquele que poderia ter sido litisconsorte, mas não foi, eis que o terceiro, co-legitimado que ainda não compõe o processo, será inevitavelmente atingido pelo efeitos da coisa julgada da decisão judicial proferida no processo, em virtude da unitariedade da relação material. Aqui, caberia a intervenção ‘iussu iudicis’ como forma de minimizar os problemas do litisconsórcio facultativo unitário, cumprindo ao magistrado determinar a intimação (e não citação) do possível litisconsorte, para, querendo, integrar a relação processual. Também é possível imaginar a intervenção ‘iussu iudicis’ para comunicar ao cônjuge acerca da propositura de ação real imobiliária, pelo outro cônjuge, sem o seu consentimento (art. 10, CPC, c/c art. 1.647, II, CC-2002)". Direito processual civil, p. 264. Em sentido contrário é o entendimento de Dinamarco: "Tal instituto, como concebido na Península, inexiste no direito positivo brasileiro, que não dá ao juiz o poder discricionário de determinar a intervenção de terceiro como litisconsorte necessário: o que dispõe o nosso art. 47, par. único, é que, sendo já necessário o litisconsórcio segundo outros critérios (v. infra, nn.52-55), o juiz deverá determinar a integração daquele no processo. Prevalece entre nós, mais acentuadamente do que na Itália, a regra de ‘excepcionalidade do litisconsórcio necessário’, que a doutrina e jurisprudência corretamente proclamam". Litisconsórcio, p. 114.

  59. É o que diz Vicente Greco Filho: "A referência ao direito comparado e a algumas posições doutrinárias divergentes parece-nos suficiente para deixar demonstrada a inexistência de critério adequado e seguro na determinação das hipóteses de verdadeira intervenção de terceiros no processo. Assim, vimos que é comum referir como institutos agrupáveis sob o mesmo título tanto a assistência quanto casos típicos de litisconsórcio, ou, ainda, casos de cumulação de ações". Da intervenção de terceiros, p. 22.

  60. Conclui Arruda Alvim: "O que é relevante para determinar quais sejam as partes é o fato de alguém pedir algo, através do processo, contra outrem. Se se lhe reconhecer ‘legitimidade’ (ativa, no caso do autor, ou passiva, no caso do réu), de parte legítima se tratará; caso contrário, será ‘parte ilegítima’, o que significa que é ou foi parte; isto é, quem é tido por parte ilegítima não terá deixado de ser parte (...)". Manual de direito processual civil, v. 2, p. 25.

  61. "A simples circunstância temporal de estarem presentes, ou não, no momento da propositura da demanda ou no momento em que integram a lide, por meio da citação, aqueles cujo chamamento a juízo foi pedido desde logo pelo autor, é insuficiente para trazer luz ao nosso problema e levaria ao absurdo, por exemplo, de se considerar como de intervenção de terceiros a seguinte hipótese: o autor omite na inicial um dos co-proprietários de imóvel que reivindica, cujo nome aparece por indicação de um dos co-réus; o autor, reconhecendo a falha, promove também a citação do réu faltante, réu, que desde o início deveria estar presente no processo, deveria ser tido como terceiro interveniente. O mesmo se diga da intervenção ‘iussu iudicis’, no caso de litisconsórcio necessário". Da intervenção de terceiros, pp. 22-3.

  62. Da intervenção de terceiros, p. 23.

  63. Esclarece Dinamarco: "O uruguaio Luis Torello Giordano exibe ‘cinco categorias de terceiros’: a) os totalmente indiferentes, como acima; b) os ‘que tienem mero interes de hecho’; c) os ‘que son titulares de una relación jurídica conexa y dependentente de la que se discute em el proceso’; d) os ‘que, en mayor ou menor medida, son cotitulares del derecho deducido en el proceso; e) os ‘titulares de un derecho que los habilitaria a deducir uma pretensión totalmente incompatible com la que se discute em el proceso". Intervenção de terceiros, p. 20.

  64. Intervenção de terceiros, p. 20.

  65. O Ministério Público e assistência: o interesse institucional como expressão do interesse jurídico, in Aspectos polêmicos e atuais sobre os terceiros no processo civil e assuntos afins, pp. 831-55.

  66. Complementa Cássio S. Bueno: "[...] Partes são os não-terceiros; terceiros são todos os que não são partes. O conceito de parte, nestas condições, é obtido pela negação de quem seja terceiro e vice-versa". Partes e terceiros no processo civil brasileiro, pp. 2-3.

  67. Partes e terceiros no processo civil brasileiro, pp. 3-4.

  68. "Ambos conjunta e inexoravelmente, se constituem, no processo, em parte (autora e ré). Trata-se de parte composta. Enquanto um, a quem a lide não diz respeito, age, o outro é alcançado pelas conseqüências desse agir, pela decisão da lide e seus efeitos, além de ser atingido pela autoridade da coisa julgada material que sobre ela recair". O direito processual de estar em juízo, p. 17.

  69. Aduz Dinamarco: "[...] Partes na relação jurídica ‘material’ são os titulares de direitos e obrigações referentes a um bem da vida, como os sujeitos que celebram um contrato ou o que causou o dano e o que o sofreu, os cônjuges em face do vínculo matrimonial etc. Partes legítimas são as pessoas a quem a lei outorga qualidade para estar em juízo na defesa de direitos e interesses, seja propondo a demanda, seja para que em relação a elas a demanda seja proposta (legitimidade ativa ou passiva). Ordinariamente, têm essa qualidade apenas os sujeitos da relação material em litígio (os cônjuges para a ação de separação judicial, os contratantes para a de anulação do contrato etc.). O ideal é que figurem como partes no processo precisamente aquelas pessoas a quem a lei oferece condições para isso (partes legítimas, legitimidade ordinária ou extraordinária), mas, quando isso não acontece, ainda assim serão partes o sujeito que propôs a demanda e aquele em face do qual a demanda foi proposta e que veio a ser citado [...]". Instituições de direito processual civil, v. II, pp. 247-8.

  70. Nesse sentido, ALMEIDA, Gregório Assagra de; ALMEIDA, Flávia Vigatti Coelho de, O amicus curiae como parte no processo civil e no processo coletivo, in MPMG Jurídico, ano II, n. 6, julho/agosto/setembro de 2006, p. 41-2.

  71. Prevê a Lei 9.868/99, art. 7º, §, 2º: "O relator, considerando a relevância da matéria e a representatividade dos postulantes, poderá, por despacho irrecorrível, admitir, observado o prazo fixado no parágrafo anterior, a manifestação de outros órgãos ou entidades". Essa mesma lei também implantou a figura do amicus curiae em sede de controle difuso ou incidental da constitucionalidade pelos tribunais, conforme se extrai do § 3º do art. 482 do CPC, por ela inserido.

  72. Recurso de terceiro, pp. 157-65.

  73. Recurso de terceiro, pp. 185.

  74. Amicus curiae no processo civil brasileiro: um terceiro enigmático, p. 126.

  75. Propondo uma revisitação no plano da interpretação constitucional, defende o jurista alemão Peter Häberle, em obra já clássica: "Interpretação constitucional tem sido, até agora, conscientemente, coisa de uma sociedade fechada. Dela tomam partes apenas os intérpretes jurídicos ‘vinculados às corporações’ (zünftmässige Interpreten) e aqueles participantes formais do processo constitucional. A interpretação constitucional é, em realidade, mais um elemento da sociedade aberta. Todas as potências públicas, participantes materiais do processo social, estão nela envolvidas, sendo ela, a um só tempo, elemento resultante da sociedade aberta e um elemento formador ou constituinte dessa sociedade [...]. Os critérios de interpretação constitucional hão de ser tanto mais abertos quanto mais pluralista for a sociedade". Hermenêutica constitucional, p. 13.

  76. A respeito da matéria, entende Nelson Nery Junior: "Os auxiliares do juízo em geral, como o escrivão, diretor de secretaria, escrevente, contador, partidor, depositário judicial, perito judicial e os assistentes técnicos, não têm legitimidade para recorrer porque não são parte nem terceiro prejudicado. A lide discutida em juízo não lhes diz respeito. Se o pronunciamento judicial puder lhes causar algum prejuízo, poderão discutir a matéria em ação autônoma, não no processo em que funcionaram na qualidade de auxiliares. Tampouco a testemunha tem legitimidade recursal". Teoria geral dos recursos, p. 312.

  77. É o que escrevem José Miguel Garcia Medina, Luiz Rodrigues Wambier e Teresa Arruda Alvim Wambier: "O responsável recorrerá em função de legitimidade recursal assemelhada à do depositário judicial, do leiloeiro ou do perito nomeado pelo juízo. Para esses recorrentes, a legitimidade recursal não decorre da existência de uma relação jurídica ligada àquela sobre que controvertem as partes, até porque essa relação inexiste e pela decisão, portanto, não serão eles atingidos, nem mesmo reflexamente. Sua legitimidade recursal advém de pretensão própria, autônoma, que pretende resultado ímpar, desvinculado do resultado do julgamento da lide, em favor desta ou daquela parte. Conforme já se sustentou, ‘recorrerão não como terceiros (já que os terceiros não pleiteiam o reconhecimento de direito próprio), mas como partes naquele incidente, cuja decisão lhes dirá respeito’". Breves comentários à nova sistemática processual civil, p. 153.

  78. É também esse o entendimento de Nelson Nery Junior: "O mesmo se pode dizer do advogado, que é o representante judicial da parte nos autos. Como regra geral, o código não o legitima a recorrer em nome próprio. A exceção a essa regra encontra-se na questão dos honorários da sucumbência". Teoria geral dos recursos, p. 313.

  79. Em concepção mais restrita, aduz Cândido Rangel Dinamarco: "Adquire-se a qualidade de parte no momento em que a pessoa passa a ter a titularidade acima descrita (independentemente do exercício efetivo dos poderes e faculdades, ou seja, independentemente da prática de atos no processo), o que acontece mediante quatro momentos distintos: a) pela demanda (quem pratica o ato de iniciativa ganha, desde logo, a condição de demandante — autor, exeqüente); b) pela citação (com ela, o citado passa a ser réu, ou executado); c) pela intervenção espontânea (ingressando em processo pendente, o terceiro passa a ser parte da relação processual inicialmente constituída entre outras pessoas); d) pela sucessão (o sucessor, ou sucessores, passam a ocupar o lugar deixado pelo sucedido)". Litisconsórcio, p. 22.

  80. Gregório Assagra de Almeida. Codificação do direito processual coletivo brasileiro, p. 35-40.

  81. Direito material coletivo, p. 248.

  82. A respeito, formulando crítica ao positivismo e demonstrando sua incompatibilidade com o neoconstitucionalismo, escreveu Lenio Luiz Streck: "Daí a possibilidade de afirmar a existência de uma série de oposições/incompatibilidades entre o neoconstitucionalismo (ou, se assim se quiser, o constitucionalismo social e democrático que exsurge a partir do segundo pós-guerra) e o positivismo jurídico. Assim: a) o neoconstitucionalismo é incompatível com o positivismo ideológico, porque este sustenta que o direito positivo, pelo simples fato de ser positivo, é justo e deve ser obedecido, em virtude de um dever moral. Como contraponto, o neoconstitucionalismo seria uma ‘ideologia política’ menos complacente com o poder; b) o neoconstitucionalismo não se coaduna com o positivismo enquanto teoria, estando a incompatibilidade, neste caso, na posição soberana que possui a lei ordinária na concepção positivista. No Estado constitucional, pelo contrário, a função e a hierarquia da lei têm um papel subordinado à Constituição, que não é apenas formal, e, sim, material; c) também há uma incompatibilidade entre neoconstitucionalismo com o positivismo visto como metodologia, porque esta separou o direito e a moral, expulsando esta do horizonte jurídico (...)". A hermenêutica filosófica e as possibilidades de superação do positivismo pelo (neo)constitucionalismo, in ROCHA, Leonel Severo e STRECK, Lenio Luiz (orgs.), Constituição, sistemas sociais e hermenêutica, p. 155.

  83. Pós-positivismo, in BARRETTO, Vicente de Paulo (coord.), Dicionário de filosofia do direito, p. 650-4.

  84. Nesse sentido, Luís Roberto Barroso: "(...) o pós-positivismo não surge com o ímpeto da desconstrução, mas como uma superação do conhecimento convencional. Ele inicia sua trajetória guardando deferência relativa ao ordenamento positivo, mas nele reintroduzindo as idéias de justiça e legitimidade". Fundamentos teóricos e filosóficos do novo direito constitucional brasileiro: pós-modernidade, teoria crítica e pós-positivismo, in BARROSO, Luís Roberto (org.), A nova interpretação constitucional: ponderação, direitos fundamentais e relações privadas, p. 28.

  85. Luís Roberto Barroso, Fundamentos teóricos e filosóficos do novo direito constitucional brasileiro: pós-modernidade, teoria crítica e pós-positivismo, in BARROSO, Luís Roberto (org.), A nova interpretação constitucional: ponderação, direitos fundamentais e relações privadas, p. 34-5.

  86. Peter Häberle, Hermenêutica constitucional — a sociedade aberta dos intérpretes da Constituição: contribuição para a interpretação pluralista e ‘procedimental’ da Constituição, p. 12-3.

  87. Sobre o assunto, Robert Alexyt, El concepto y la validez del derecho, p. 159-61.

  88. Nesse sentido, Paulo Bonavides, Curso de direito constitucional, 18ª ed., p. 592.

  89. Curso de direito constitucional, 18ª ed., p. 583-4.

  90. Aduziu ainda Robert Alexy: "A la polémica entre constitucionalistas y legalistas subyacen profundas diferencias sobre la estructura del sistema jurídico. Por ello, una respuesta bien fundamentada a la cuestión acerca de quién tiene razón puede ser respondida sólo sobre la base de una teoría del sistema jurídico (...)". El concepto y la validez del derecho, p. 160-1. A polêmica entre constitucionalistas e legalistas subjazem profundas diferenças sobre a estrutura do sistema jurídico. Por isso, uma resposta bem fundamentada a essa questão acerca de quem tem razão pode ser respondida somente com fundamento em uma teoria do sistema jurídico (tradução livre pelo autor).

  91. Escreve Lenio Luiz Streck: "(...) Da incindibilidade entre vigência e validade e entre texto e norma, características do positivismo, um novo paradigma hermenêutico-interpretativo aparece sob os auspícios daquilo que se convencionou chamar de giro lingüístico-hermenêutico. Esse ‘linquistic turn’, denominado também de giro ‘lingüistico-ontológico’, proporcionou um novo olhar sobre a interpretação e as condições sob as quais ocorre o processo compreensivo. Não mais interpretamos para compreender e, sim, compreendemos para interpretar, rompendo-se, assim, as perspectivas epistemológicas que coloca (va)m o método como supremo momento da subjetividade e garantia da segurança (positivista) da interpretação". A hermenêutica filosófica e as possibilidades de superação do positivismo pelo (neo)constitucionalismo, in ROCHA, Leonel Severo e STRECK, Lenio Luiz (orgs.), Constituição, sistemas sociais e hermenêutica, p. 159.

  92. Conclui Luís Roberto Barroso: "O novo direito constitucional ou neoconstitucionalismo desenvolveu-se na Europa, ao longo da segunda metade do século XX, e, no Brasil, após a Constituição de 1988. O ambiente filosófico em que floresceu foi o do pós-positivismo, tendo como principais mudanças de paradigma, no plano teórico, o reconhecimento da força normativa à Constituição, a expansão da jurisdição constitucional e a elaboração das diferentes categorias da nova interpretação constitucional". Neoconstitucionalismo e constitucionalização do direito (O triunfo tardio do direito constitucional no Brasil), in Revista de Direito Constitucional e Internacional, v. 58, p. 131-41 e p. 173. No mesmo sentido, Eduardo Cambi, Neoconstitucionalismo neoprocessualismo, in FUX, Luiz, NERY JUNIOR, Nelson, WAMBIER, Teresa Arruda (coordenadores), Processo e Constituição: estudos em homenagem ao Professor José Carlos Barbosa Moreira, p. 664-72.

  93. Nesse sentido, escreve Lenio Luiz Streck: "(...) Em síntese, o fenômeno do neoconstitucionalismo proporciona o surgimento de ordenamentos jurídicos constitucionalizados, a partir de uma característica especial: a existência de uma Constituição ‘extremamente embebedoura’ (persuasiva), invasora, capaz de condicionar tanto a legislação como a jurisprudência e o estilo doutrinário, a ação dos agentes públicos e ainda influenciar diretamente nas relações sociais". A hermenêutica filosófica e as possibilidades de superação do positivismo pelo (neo)constitucionalismo, in ROCHA, Leonel Severo e STRECK, Lenio Luiz (orgs.), Constituição, sistemas sociais e hermenêutica, p. 160. Com abordagem sobre o neoconstitucionalismo, com inclusive inúmeros artigos e texto de capa nesse sentido, cf. (Neo)constitucionalismo: ontem, os códigos, hoje as constituições, in Revista do Instituto de hermenêutica Jurídica, v. 1, n. 2, 2004; também CARBONEL, Miguel (org.), Neoconstitucionalismo (s).

  94. Diz ainda Lenio Luiz Streck: "Ora, a construção das condições para a concretização da Constituição implica o entendimento da ‘Constituição como uma dimensão que banha todo o universo dos textos jurídicos, transformando-os em normas, isto porque a norma é sempre produto da atribuição de sentido do intérprete, o que ocorre sempre a partir de um ato aplicativo, que envolve toda a historicidade e a faticidade, enfim, a situação hermenêutica em que se encontra o jurista/intérprete. Por isto, Gadamer vai dizer que o entender contém sempre um fator de ‘applicatio’. Entender sem aplicação não é um entender". Ontem, os Códigos; hoje, as Constituições: o papel da hermenêutica na superação do positivismo pelo neoconstitucionalismo, in ROCHA, Fernando Luiz Ximenes e MORAES, Filomeno (coords.), Direito constitucional contemporâneo: estudos em homenagem ao professor Paulo Bonavides, p. 541.

  95. Escreveu Peter Häberle: "Interpretação constitucional tem sido, até agora, conscientemente, coisa de uma sociedade fechada. Dela tornam parte apenas os intérpretes jurídicos ‘vinculados às corporações’ (zünftmässige Interpreten) e aqueles participantes formais do processo constitucional. A interpretação constitucional é, em realidade, mais um elemento da sociedade aberta. Todas as potências públicas, participantes materiais do processo social, estão nela envolvidas, sendo ela, a um só tempo, elemento resultante da sociedade aberta e um elemento formador ou constituinte dessa sociedade (... weil Verfassungsinterpretation diese offene Gesellschaft immer von neunem mitkonstituiert und Von ihr Konstituiert wird). Os critérios de interpretação constitucional hão de ser tanto mais abertos quanto mais pluralista for a sociedade". Hermenêutica constitucional: a sociedade aberta dos intérpretes da Constituição: contribuição para a interpretação pluralista e ‘procedimental’ da Constituição, p. 13.

  96. Conclui Eduardo Cambi: "Portanto, o neoconstitucionalismo e o neoprocessualismo não são tendências que devem ficar apenas no plano teórico, exigindo do operador jurídico novas práticas para que, assim, seja possível resistir, sempre com apego na Constituição, a toda forma de retrocessos, o que servirá — e isto, por si só, não é pouco — para a concretização da ‘consciência constitucional’ e para a formação de uma silenciosa cultura democrática de proteção dos direitos e garantias fundamentais". FUX, Luiz, NERY JUNIOR, Nelson, WAMBIER, Teresa Arruda (coordenadores), processo e Constituição: estudos em homenagem ao Professor José Carlos Barbosa Moreira, p. 672-83.


Autor

  • Gregório Assagra de Almeida

    Gregório Assagra de Almeida

    Promotor de Justiça e Professor Universitário. Mestre e Doutor em Direito pela PUC-SP. Professor do Mestrado da Universidade de Itaúna. Diretor do Centro de Estudos e Aperfeiçoamento Funcional do Ministério Público do Estado de Minas Gerais. Jurista consultor do Ministério da Justiça na reforma do sistema de tutela coletiva.

    é autor dos livros: Direito Processual coletivo brasileiro: um novo rama do direito processual. Saraiva, 2003. Codificação do direito processual coletivo brasileiro, Del Rey, 2007. Manual das ações constitucionais. Del Rey, 2007. Direito material coletivo. Del Rey, 2008.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALMEIDA, Gregório Assagra de. Partes e terceiros no processo civil. Cinco dimensões da qualidade de parte à luz dos princípios constitucionais do acesso à justiça e do contraditório. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1959, 11 nov. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11952. Acesso em: 19 abr. 2024.