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Candidata recorre contra indeferimento de candidatura por "ficha suja"

Candidata recorre contra indeferimento de candidatura por "ficha suja"

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A candidata Malvina Maria da Silva teve seu registro indeferido pelo Tribunal Regional Eleitoral de Goiás, em virtude de condenzação por abuso de poder econômico, não transitada em julgado. Em recurso especial, a candidata sustenta a inconstitucionalidade da Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar nº 135/10).

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR PRESIDENTE DO TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO ESTADO DE GOIÁS.

Processo: RCAND nº 407493 (4074-93.2010.6.09.0000)

Protocolo: 279392010

Assunto: Ação de Impugnação de Registro de Candidatura – AIRC

Impugnante: Ministério Público Eleitoral

Impugnada: Malvina Maria da Silva

MALVINA MARIA DA SILVA, qualificada nos autos por meiode seus procuradores que esta subscrevem (M.J), com endereço profissional à rua 10, nº 109, Ed. Gold Center, sala 503, Setor Oeste Goiânia – GO, TEL 062 3214-3163, onde receberá as intimações de estilo vem à ínclita presença de Vossa Excelência, com o respeito e acatamento devidos, com fulcro no art. 121, § 4°, incisos I, II e III, da Constituição da República Federativa do Brasil; nos artigos 22, inciso I c/c 276, I, "a" e "b" do Código Eleitoral, interpor o presente RECURSO ESPECIAL, requerendo seja recebido processado nos presentes autos, remetendo-o ao Colendo Tribunal Superior Eleitoral, onde espera seja conhecido e provido, cassando-se o acórdão guerreado.

Termos em que,

Pede e espera deferimento.

Goiânia, 20 de setembro de 2010.

EDILBERTO DE CASTRO DIAS

OAB 13.748


Razões Recursais

Colendo Tribunal Superior Eleitoral,

Excelentíssimo (a) Relator (a)

É imprudente e, portanto, desaconselhável, passar abruptamente da clemência à crueldade. (Maquiavel)

Dos Fatos

O acórdão atacado não reconheceu a Inconstitucionalidade da Lei Complementar 135/10 por ofensa aos princípios da anualidade, do estado de inocência, do devido processo legal, do duplo grau de jurisdição e de cassação /dos direitos políticos e por fim indeferiu o registro de candidatura da recorrente com a seguinte ementa:

REGISTRO DE CANDIDATURA Nº. 4074-93.2010.6.09.0000

PROTOCOLO Nº 27.939/2010 – GOIÂNIA (GO)

Ementa: AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE REGISTRO DE CANDIDATURA. Inconstitucionalidade da Lei Complementar 135/10 por ofensa aos princípios da anualidade, do estado de inocência, do devido processo legal, do duplo grau de jurisdição e de cassação /dos direitos políticos. Inconstitucionalidade afastada. Inelegibilidade por condenação pela Justiça Eleitoral por abuso do poder econômico. Configurada. Procedência da Ação de Impugnação ao Registro de Candidatura. Registro indeferido.

A Lei Complementar 135/10 não ofendeu o principio da anualidade, pois não alterou o processo eleitoral por ser norma de direito material eleitoral.

Não há ofensa ao principio do estado de inocência, uma vez que a inelegibilidade não é sanção e porque o texto constitucional exigiu que a lei estabelecesse outras hipóteses de inelegibilidade considerando a vida pregressa dos candidatos.

A Lei Complementar 135/10 não ofende aos princípios do devido processo leal e do duplo grau de jurisdição, pois não prejudica o regular julgamento do processo, nem suprime instancias permite, em verdade, que os candidatos busquem medidas judiciais para surpreender o efeito da inelegibilidade (aditamento do recurso já interposto ou medida cautelar).

Tampouco estabeleceu hipótese de cassação ou perda dos direitos políticos, apenas criou hipóteses de inelegibilidade em obediência ao artigo 14, § 9º, da Constituição Federal.

Tendo sido a candidata condenação por órgão colegiado da Justiça Eleitoral em processo que apurou abuso de poder econômico, presente está a inelegibilidade prevista no artigo 1º, I, "d" da lei Complementar 64/90.

Ação de Impugnação julgada procedente com o indeferimento do registro de candidatura.

O presente recurso especial faz-se necessário tendo vista o inconformismo do recorrente com o acórdão do Tribunal Regional Eleitoral.


BREVE RESUMO

Escolhida que fora a impugnada em regular convenção partidária, foi apresentado, pela Coligação Goiás no Rumo Certo 2 (PP/PR), no dia 5 de julho corrente, seu pedido de registro de candidatura à Justiça Eleitoral.

No dia 12 de julho em curso, o Ministério Público Eleitoral protocolizou ação de impugnação ao registro de candidatura (protocolo nº 300272010), sob o fundamento de que teria sido condenada por abuso do poder econômico, tendo sido declarada sua inelegibilidade, pelo período de 3 (três) anos.

Aduziu também o Parquet que as hipóteses de inelegibilidade trazidas pela Lei Complementar nº 135/2010 tem aplicação imediata, não cabendo aplicação do princípio constitucional da anuidade, sendo aplicável ao pleito vindouro.

Ao final, pleiteou-se o indeferimento do registro da candidata impugnada.


PRELIMINARMENTE

A Lei Complementar – LC n. 135/2010 é Inconstitucional;

- A aplicação da LC n. 135/2010, para as eleições de 2010, é Inconstitucional

- DA NÃO APLICAÇÃO DA LEI COMPLEMENTAR N. 135, DE 04/06/2010, QUE ALTEROU A LEI COMPLEMENTAR N. 64, DE 18/05/1990

VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA ANUALIDADE

(CONSTITUIÇÃO FEDERAL – CF, ART. 16)

1.A presente Ação de Impugnação está marcada por vício insanável, pois, ao se sustentar em dispositivo da Lei Complementar n. 135, de 04/06/2010, que "altera a Lei Complementar nº 64, de 18 de maio de 1990, que estabelece, de acordo com o § 9º do art. 14 da Constituição Federal, casos de inelegibilidade, prazos de cessação e determina outras providências, para incluir hipóteses de inelegibilidade que visam a proteger a probidade administrativa e a moralidade no exercício do mandato", agride e viola o PRINCÍPIO DA ANUALIDADE, assim, expresso na Constituição Federal, art. 16, verbis:

Art. 16. A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 4, de 1993 – sem grifos no original) .

O i. Representante do MPE já desconfia bastante de que a LC n. 135/2010 é inaplicável, para estas eleições de 2010, por flagrante violação ao consagrado princípio da anualidade. Tanto é que o Impugnante dedicou demasiada argumentação para tentar justificar a sua ação violadora de garantia fundamental assegurada no texto constitucional brasileiro.

Certamente que esta Corte Regional, no exercício do seu poder de fazer o controle difuso ou aberto de constitucionalidade, declarará a inconstitucionalidade da aplicação da LC n. 135/2010, para estas eleições de 2010. Todavia, se necessário for, o Supremo Tribunal Federal, como guardião das garantias fundamentais constitucionais, corrigirá eventuais decisões que, por ventura, ignorem ou afrontem o mencionado princípio da anualidade.

Há que se afirmar, com veemência, que, nem mesmo em relação a atos decisórios – por colegiados –, já posteriores à entrada em vigor da novel LC n. 135/2010 (07/06/2010), não se admite como passíveis de serem invocados como causas de inelegibilidade para qualquer candidato ao pleito eleitoral de 2010. Isto, porque caracteriza violação ao princípio da anualidade.

Ademais, ainda que num forçado exercício de interpretação, entenda-se como válida a aplicação da LC n. 135/2010, para as eleições de 2010, jamais poderia a mesma ser flexionada para gerar efeitos retroativos a até 8 (oito) anos anteriores à sua publicação no Diário Oficial da União, ocorrida aos 07/06/2010.

Cabe, aqui, invocar e obter o controle difuso de constitucionalidade, desta Corte Regional Eleitoral, para espancar tamanho vício insanável no manejo da presente impugnatória.

VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DO ESTADO DE INOCÊNCIA

(CF, ART. 5º, LVII)

No seu mérito, a LC n. 135/2010 comete inominável violação ao princípio do estado de inocência.

Há que se ressaltar que o comando constitucional do art. 5º, LVII, assim, expressa: "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória". Aqui, o termo penal é adotado em sentido amplo, para equivaler a toda e qualquer sentença que imponha alguma penalidade, alguma restrição aos direitos de uma pessoa.

Acaso quisesse ser restritivo a uma determinada área do Direito, o termo adequado seria CRIMINAL e a expressão do texto constitucional deveria, assim, ser grafada: "... sentença CRIMINAL condenatória".

A restrição de direito, ainda mais do direito de CIDADANIA POLÍTICA de poder pleitear um cargo público, não pode ser promovida por norma infraconstitucional (e nem mesmo a Constituição!) que viole o princípio fundamental da inocência presumida ou do estado de inocência, pois, este deve prevalecer – para toda pessoa – até que sobrevenha sentença transitada em julgado.

Ressalte-se, aliás, que o direito de tomar parte no governo, ser candidato, ser eleito, ser representante e não apenas representado (democracia representativa), é um Direito Humano consignado no art. 21, da Declaração Universal dos Direitos Humanos:

"Artigo XXI

1. Toda pessoa tem o direito de tomar parte no governo de seu país, diretamente ou por intermédio de representantes livremente escolhidos.

2. Toda pessoa tem igual direito de acesso ao serviço público do seu país.   
3. A vontade do povo será a base  da autoridade do governo; esta vontade será expressa em eleições periódicas e legítimas, por sufrágio universal, por voto secreto ou processo equivalente que assegure a liberdade de voto" (Sem grifos no original).

Portanto, o princípio do estado de inocência precisa ser protegido, por ato expresso de controle que compete ao Judiciário, em face da real ameaça de violação que a LC n. 135/2010, inconstitucionalmente, inseriu no sistema jurídico brasileiro.

É a LC n. 135/2010 um instrumento legal que desarmoniza com o Sistema Jurídico brasileiro de índole garantista.

VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL

(CF, ART. 5º, LIV)

O devido processo legal é o princípio que reúne, engloba e exige a expressa observância de todos os demais princípios que devem presidir a condução de cada ato e de todo o conjunto da marcha procedimental processual nas searas legislativa, administrativa e judicial.

Ao se ferir qualquer um dos princípios asseguradores do processo legislativo, judicial ou administrativo, automaticamente, estará caracterizada a violação do princípio maior do devido processo legal/constitucional.

É óbvio, mas parece não ser para o Impugnante, que o devido processo legal não se esgota antes do trânsito em julgado da decisão/sentença que externaliza a convicção do julgador na aplicação da norma ao caso concreto.

E sem a consumação do devido processo legal, na sua inteireza e regularidade, não se pode sustentar a execução de penas ou penalidades, mormente, as que têm o poder de suprimir direitos fundamentais da pessoa.

É retórica frágil e inaceitável afirmar que "inelegibilidade não possui natureza jurídica de pena/sanção" (cf. Inicial de fls.), como quer o i. Representante do MPE. É evidente que se trata, sim, de pena/sanção aplicada por antecipação, com a inversão do princípio do estado de inocência, ao não se submeter ao princípio do trânsito em julgado (cf. LC n. 135/2010, art. 2º, que altera o art. 1º, alínea "e", da LC n. 64/1990).

Todavia, a LC n. 135/2010 produz inovação nociva e inconstitucional ao suprimir a garantia do trânsito em julgado para fazer surtir o efeito da cassação temporária (8 anos) de direitos políticos. Isto, reclama pronto controle de constitucionalidade dessa legislação produzida sem debates, sem aferição de seus propósitos e de seu alcance, apesar da retórica da participação popular na sua elaboração.

VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DO DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO

(CF, ART. 5º, LV, E P. EX. ART. 102, II)

O princípio do duplo grau de jurisdição, inobstante, não estar literalmente grafado no texto constitucional vem expresso o direito ao recurso, no art. 5º, LV, e, de modo implícito, em vários outros dispositivos da Carta Política brasileira. É princípio consagrado, destinado a produzir segurança jurídica e a paz individual e social diante de um julgamento.

Com previsões no texto constitucional, art. 5º, LV, e como a contida no art. 102, II, da CF, que assegura o direito da pessoa ao recurso e autoriza o Supremo Tribunal Federal a acolhê-los, afirma-se a existência de um julgamento pela instância inferior.

Da mesma forma, o Superior Tribunal de Justiça (CF, art. 105, II) e os Tribunais Regionais Federais (CF, art. 108, II) estão autorizados, constitucionalmente, a julgar em grau de recurso uma causa decidida, porém, sem que a sentença proferida, pela instância inferior, tenha produzido a sensação de satisfação que as partes buscam no Judiciário.

Com efeito, é flagrantemente inconstitucional, a idéia de que uma decisão colegiada, originária ou mesmo em grau de recurso, seja suficiente para cassar de direitos políticos (cf. LC n. 135/2010, art. 2º, que altera o art. 1º, alínea "e", da LC n. 64/1990, para além das causas de perda de direitos políticos criadas pela Constituição Federal, art. 15, I a V).

Destarte, aLC n. 135/2010 viola o art. 15 da CF e deve ser declarada inconstitucional, também, por isso.

a aplicação alínea "j", do inciso I, art. 1º, da LC nº 64/90, com a redação dada pela LC nº 135/2010, no caso em debate, como pretende o impugnante, violaria a Constituição da República e a Lei de Introdução ao Código Civil, por desconsiderar os princípios do devido processo legal, irretroatividade da lei, da coisa julgada material, do ato jurídico perfeito, princípio da não-surpresa, princípio da confiança, da segurança jurídica, da proporcionalidade, da razoabilidade e do princípio da anterioridade da lei penal prevista no art. 5º, inciso XXXIX, da CF

VIOLAÇÃO/CASSAÇÃO DE DIREITOS POLÍTICOS

– INFRINGÊNCIA AO ART. 15 DA CF

A LC n. 135/2010 inova, outra vez, de modo nocivo e inconstitucional ao produzir causa de cassação de direito político, criando mecanismos que podem gerar a "perda ou suspensão" do direito político de alguém poder se candidatar, não compatíveis com o rol taxativo do art. 15, da Constituição Federal:

Art. 15. É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de:

I - cancelamento da naturalização por sentença transitada em julgado;

II - incapacidade civil absoluta;

III - condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos;

IV - recusa de cumprir obrigação a todos imposta ou prestação alternativa, nos termos do art. 5º, VIII;

V - improbidade administrativa, nos termos do art. 37, § 4º (Sem grifos no original).

A afirmação de que a "perda ou suspensão" de direitos políticos – sem restrição de qualquer um deles – seguida da expressão de que "só se dará nos casos de", antes de se ficar o rol taxativo nos incisos I a V, do art. 15, da CF, é expressão inequívoca de que nenhuma (NEM UMA) outra causa, a não ser as expressas neste dispositivo, pode afetar direitos políticos de qualquer pessoa.

Elegibilidade integra o conceito de pleno gozo dos direitos políticos, em especial, o direito de ser votado.

Mais uma inconstitucionalidade da LC n. 135/2010, aqui, combatida que precisa ser declarada e controlada pelo Poder Judiciário.

EM CONCLUSÃO: Em razão de cada uma das preliminares suscitadas ou em decorrência de todas preliminares apontadas, deve ser declarada a inconstitucionalidade:

da Lei Complementar n. 135/2010, integralmente; e/ou

da aplicação da Lei Complementar n. 135/2010, para as eleições de 2010, por evidente afronta e violação ao princípio da anualidade (CF, art. 16).

O douto juiz Marco Antônio Caldas do Tribunal Regional Eleitoral do Estado de Goiás, também entendeu que a Lei Complementar nº 135, de 4 de junho de 2010, não pode ser aplicada nestas eleições, pois não tem a referida lei, força suficiente para suplantar a barreira de segurança jurídica erigida pelo constituinte em brilhante voto que colacionamos na íntegra:

Vedação à imediata aplicabilidade da LC 135/2010.

O argumento central em que se apóia o voto relator está radicado na Consulta TSE nº 1120-26 relatada pelo Min. Hamilton Carvalhido, precisamente na premissa ali afirmada de que "as inovações trazidas pela Lei Complementar nº 135/2010 têm natureza de norma eleitoral material e em nada se identificam com as do processo eleitoral". Isso porque o texto constitucional (art. 16) estabeleceu a clausula da anualidade para a lei "que alterar o processo eleitoral".

Porem, a excelência desse propósitos, a meu juízo, não tem força suficiente para suplantar a barreira de segurança jurídica erigida pelo constituinte. Alias, devo consignar que a segurança jurídica é esteio mesmo do Estado Democrático de Direito e, como tal, não pode ser vulnerada, exceto naquelas circunstancias em que a própria Constituição o permite.

Ainda sob esse aspecto, calha o seguinte excerto de lavra do juiz Magno Linhares, relator do Acórdão do TRE maranhense que, na assentada do dia 26/7/2010, declarou a irretroatividade da LC 135/2010:

"O fato da lei nova atendente, em geral, a um maior interesse social, a convivência democrática exige de todos os construtores da ordem constitucional, legisladores e magistrados, redobrada vigilância aos impulsos momentâneos de determinada maioria, ainda que os imbuídos do mais puro sentimento de justiça e das melhores intenções. Como bem enfatizou o arguto Maquiavel "é imprudente e, portanto, desaconselhável, passar abruptamente da clemência à crueldade."

Para fechar, e despido de soberba ou do menor intuito de coação intelectual aos meus pares, relembro à Corte um contexto semelhante a este que ora vivenciamos, ocorrido na primeira metade do ano 2009, quando o Ministério Publico Eleitoral se desdobrou no ajuizamento de inúmeras representações sobre excessos de doações supostamente havidas nas eleições do ano de 2006. À época, abri divergência, na esteira do TRE de São Paulo, segundo a qual o interesse de agir perdera-se no longo tempo decorrido entre os fatos e o ajuizamento da demanda, posição que restou vencida neste Colegiado, fato que permitiu algumas condenações, ate que o colendo TSE provocou uma guinada na questão, coincidindo exatamente com o rumo que eu propusera no mencionado dissenso, fazendo prevalecer o bom Direito, mesmo sob a forte pressão social e midiatica clamando, exclusivamente, por austeridade, para aliviar uma sensação geral de impunidade.

Devo ressaltar, ainda, que não me tomo aqui de insubordinação ao quanto ficou decidido na consulta TSE nº 1120-26, nem desconsidero os que, nesta Corte, adotaram ao adotarão posicionamento idêntico. Todavia, e levando em conta que o resultado da consulta não é vinculante – muito embora sirva e deva servir de orientação aos pronunciamentos dos Regionais -, não posso desconsiderar que o ápice do ordenamento jurídico é ocupado pela Constituição Federal, cujos comandos devem ser observados por todos os Poderes do Estado, em primeiro e destacado lugar.

Isto posto, sou pelo acolhimento da preliminar, no sentido de que a Lei Complementar nº 135/2010 não vigora para o processo eleitoral deste ano (2010), em acatamento ao art. 16 da Constituição Federal, e, de conseguinte, extinguir, sem resolução do mérito, a presente AIRC, nos termos subsidiários do art. 267, inciso VI, do CPC.

É o meu voto.

Goiânia, 4 de agosto de 2010.

Marco Antônio Caldas

Juiz Membro.

Vários Tribunais Regionais Eleitorais entenderam que a Lei Complementar nº 135, de 4 de junho de 2010, não pode ser aplicada nestas eleições, conforme noticias divulgadas na mídia.

Pelo menos quatro Tribunais Regionais Eleitorais (Maranhão, Pará, Rio Grande do Sul e Tocantins) deixaram de aplicar a Lei da Ficha Limpa no julgamento das candidaturas de políticos que pleiteiam cargos nesta eleição. Os tribunais eleitorais vêm considerando alguns trechos da lei inconstitucionais.

O Tribunal Regional Eleitoral (TRE-TO) decidiu que o ex-governador de Tocantins Marcelo Miranda (PMDB) vai continuar sua campanha ao Senado, apesar de ter sido contestado pelo Ministério Público Eleitoral (MPE) com base na Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar 135/10). Os integrantes do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-TO) entenderam que a nova regra não pode ser aplicada em casos ocorridos antes da sanção, em 4 de junho. Além do peemedebista, outros dois candidatos impugnados por situações parecidas tiveram os registros aceitos pela corte eleitoral.

No estado do Pará, manteve-se ontem, por 4 votos a 2, a candidatura ao Senado dos deputados Jader Barbalho (PMDB) e Paulo Rocha (PT), ao julgar pedido de impugnação feito pelo Ministério Público Eleitoral com base na Lei da Ficha Limpa;

Decisão Plenária

decisão em 04/08/2010

ACORDAM os Juízes Membros do Tribunal Regional Eleitoral do Pará, à unanimidade, acolher a preliminar de ilegitimidade de parte e deferir os registros dos suplentes Fernando Ribeiro e Francisco Ribeiro. No mérito, por maioria, julgar improcedente a impugnação e, via de conseqüência, deferir o registro de Jader Fontenelle Barbalho, declarando a inconstitucionalidade do art. 1º, I, k da Lei nº 64/1990, com redação alterada pela LC nº 135/2010, nos termos do voto do Relator. Vencido o Desembargador Ricardo Ferreira Nunes e os Juízes Paulo Gomes Jussara Júnior e Daniel Santos Rocha Sobral.

Decisão Plenária

decisão em 04/08/2010

ACORDAM os Juízes Membros do Tribunal Regional Eleitoral do Pará, por maioria, julgar improcedente a ação de impugnação e, em conseqüência, deferir os pedidos de registro de candidatura, declarando a inconstitucionalidade da aplicação retroativa do art. 1º, I, k da Lei nº 64/1990, com redação alterada pela LC nº 135/2010, nos termos do voto da Relatora. Vencidos o Desembargador Ricardo Ferreira Nunes e o Juiz Federal Daniel Santos Rocha Sobral. O Juiz Paulo Gomes Jussara Júnior diverge quanto ao fundamento da inconstitucionalidade retroativa da lei retro citada, entendendo ser inaplicável ao presente caso.

Os integrantes do Tribunal Regional Eleitoral do Maranhão, em 4 de junho, também entenderam que a nova regra não pode ser aplicada em casos ocorridos antes da sanção, em brilhante voto da lavra do juiz MAGNO LINHARES que transcrevemos na integra:

REGISTRO DE CANDIDATURA – Nº:

3398-21.2010.6.10.0000 – Classe 38

REQUERENTE: COLIGAÇÃO "O MARANHÃO NÃO PODE PARAR F1 (PRB/PP/PT/PTB/PMDB/PSC/PR/DEM/PV)".

CANDIDATO: JOSÉ SARNEY FILHO

CARGO: DEPUTADO FEDERAL

RELATÓRIO

Trata-se de requerimento de registro de candidatura, interposto pela COLIGAÇÃO "O MARANHÃO NÃO PODE PARAR F1 (PRB/PP/PT/PTB/PMDB/PSC/PR/DEM/PV)", por seu representante legal, devidamente autorizado, para o cargo de DEPUTADO FEDERAL de JOSÉ SARNEY FILHO, sob o número, 4321 para concorrer às eleições de 3 de outubro de 2010.

O Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários da Coligação "O MARANHÃO NÃO PODE PARAR F1" (PRB/PP/PT/PTB/PMDB/PSC/PR/DEM/PV), foi deferido na sessão de julgamento de 19/07/2010, podendo-se passar à análise do presente requerimento de registro.

A secretaria Judiciária publicou edital, nos termos do art. 34 da Resolução-TSE nº. 23.221/2010 em 07 de julho de 2010. (fl. 79)

O Ministério Público Eleitoral apresentou IMPUGNAÇÃO, alegando para tanto que o Tribunal Regional Eleitoral do Maranhão (TRE-MA) julgou procedente representação por conduta vedada movida contra o impugnado JOSÉ SARNEY FILHO, por ter violado o art. 73, inciso I, da Lei nº 9.504/97, aplicando-lhe apenas multa, em razão de ter veiculado propaganda eleitoral, via internet, no sítio oficial do município de Pinheiro-MA, nas eleições de 2006.

Diz, ainda, que a LC nº 135/2010, tornou inelegível o ora impugnado pelo prazo de 08 (oito) anos, a contar das eleições de 2006, tendo em vista o disposto no art. 1º, inciso I, alínea "J", que elenca como causa de inelegibilidade os que forem condenados por conduta vedada "que impliquem cassação do registro ou diploma".

Em sua contestação, fls.37/62, o ora impugnado argumenta, em síntese, que:

a)a aplicação alínea "J", do inciso I, art. 1º, da LC nº 64/90, com a redação dada pela LC nº 135/2010, no caso em debate, como pretende o impugnante, violaria a Constituição da República e Lei de Introdução ao Código Civil, por desconsiderar os princípios do devido processo legal, irretroatividade da lei, da coisa julgada material, do ato jurídico perfeito, princípio da não-surpresa, princípio da confiança, da segurança jurídica, da proporcionalidade, da razoabilidade e do princípio da anterioridade da lei penal prevista no art. 5º, inciso XXXIX, da CF); e,

b)a inelegibilidade prevista na citada alínea "J" somente incide quando implicar em efetiva cassação do registro ou diploma do candidato, o que não ocorreu, pois o julgamento da representação resultou apenas na cominação de multa.

Em réplica, o impugnante se manifestou preliminarmente pela constitucionalidade e aplicação imediata da LC nº 135 às eleições de 2010. No mérito, sustenta que a incidência da mencionada alínea "J" não exige aplicação efetiva da cassação do registro ou do diploma, e sim, apenas a previsão legal no dispositivo em que foi enquadrada a conduta do candidato (fls.84/92).

É o relatório.


VOTO

01. Do julgamento antecipado da lide. A LC nº 64/90 não proíbe ser a lide julgada antecipadamente. Tratando-se a questão de mérito unicamente de direito, como é o caso presente, ou, sendo de direito e de fato sem necessidade de se produzir prova em audiência, o julgador, em obséquio à celeridade processual, deve conhecer diretamente do pedido (aplicação subsidiária do CPC, art.330, I).

Na hipótese vertente, o impugnado argüiu em sua defesa questões preliminares e no mérito alegou fato impeditivo à pretensão deduzida na inicial, ensejando, por força do disposto nos artigos 326 e 327 do CPC, a concessão de réplica para o impugnante, conforme despacho de fl.81.

Portanto, recebo a última manifestação do Ministério Público Eleitoral como RÉPLICA, e, por se tratar de demanda cuja questão de mérito é unicamente de direito, indefiro nova manifestação das partes a título de alegações finais, passando a julgar o feito de maneira antecipada.

02. Da a inaplicabilidade LC nº 135/2010 ao caso concreto. Discutiu-se, por ocasião da edição da LC nº 64, de 18 de maio de 1990, ano de eleições, a eficácia imediata da referida lei frente ao disposto no art. 16 da Constituição Federal. Naquela época, o Egrégio TSE, através da Consulta nº 11.173-DF, rel. Min. Octávio Gallotti, respondeu que a lei sobre as inelegibilidades não configurava alteração do processo eleitoral, e, portanto, tinha eficácia imediata.

Fato semelhante se repete nos dias atuais em relação LC nº 135/2010, também em ano de eleições. Novamente, a Excelsa Corte Eleitoral decidiu, por maioria, pela aplicabilidade imediata da nova lei na Consulta nº 1.120-26/DF, rel. Min. Hamilton Carvalhido, apesar da ressalva de pensamento dos Ministros Arnaldo Versiani e Marcelo Ribeiro e do voto contrário do Ministro Marco Aurélio (Informativo TSE nº 19).

Na consulta nº 1147-9, rel. Min. Arnaldo Versiani, o TSE decidiu que "a nova lei de inelegibilidade se aplica aos processos em tramitação ou mesmo já encerrados antes da sua entrada em vigor", ressaltando, como premissa o entendimento de que inelegibilidade não é pena e que não há direito adquirido à elegibilidade.

Entretanto, a moderna doutrina do direito eleitoral vem apregoando que as inelegibilidades se classificam, quanto à origem, em inelegibilidades inatas e inelegibilidades sanção ou cominada. As primeiras ocorrem independentemente da prática de qualquer conduta por parte do cidadão ou de terceiros em seu benefício e a segunda decorre da prática de alguma conduta ilícita praticada pelo candidato. Nesse sentido são as lições de Adriano Soares da Costa (in: Instituições de Direito Eleitoral, 8ª ed., Rio de Janeiro, júris lúmen, 2009, pg 149); José Jairo Gomes (in: Direito Eleitoral. 4ª ed. Belo Horizonte, del rey, 2010, pg 144/145); e Edson Resende Castro (in: Teoria e Prática do Direito Eleitoral, 5ª ed. Belo Horizonte, del rey, 2010, pg 132/135).

A idéia de sanção ou penalidade tem como pressuposto a violação de determinações legais ou administrativas, e representam certa privação aos bens e interesses da pessoa. Conforme lição de Miguel Reale sanção "é toda conseqüência que se agrega, intencionalmente, a uma norma, visando ao seu cumprimento" (in: Filosofia Do Direito, 14ª ed. São Paulo, saraiva, 1991, pg 260)

Note-se que o TSE, em dezembro de 2009 julgou Consulta nº 1729, rel. Min. Felix Fischer, decidiu que nas hipóteses de abuso de poder: "O termo inicial para a aplicação da sanção de inelegibilidade, nos termos do inciso XIV do artigo 22 da Lei Complementar nº 64/90, é a data da eleição em que ocorreu o ilícito. Súmula nº 19 do TSE (AgR-REspe nº 25.476/RN, Rel. Min. Eros Grau, DJe de 24.4.2009)".

O uso da palavra "sanção" reforça a idéia de que aquela Corte Superior vinha entendendo que a inelegibilidade decorrente de ilícito eleitoral seria autêntica penalidade, afinal, é absolutamente incompreensível equívocos terminológicos em decisão de grande relevância como é o caso das consultas.

Vários outros julgados do TSE também se valiam do termo "sanção". Nesse sentido:

(...) A decretação de inelegibilidade constitui sanção prevista no art. 22, XIV, da LC nº 64/90, sendo perfeitamente cabível quando a causa de pedir reside na prática de abuso do poder político, não ficando caracterizado, in casu, o julgamento extra petita. (...) (RECURSO ESPECIAL ELEITORAL N° 35.980 (43773-77.2009.6.00.0000) -CLASSE 32 - IPATINGA - MINAS GERAIS.Relator: Ministro Marcelo Ribeiro, DJU 22/03/2010)

"(...) O art. 1°, I, c, da LC nO64/90 prevê a inelegibilidade daqueles que perdem seus cargos eletivos "por infringência a dispositivo da Constituição Estadual, da Lei Orgânica do Distrito Federal e da Lei Orgânica dos Municípios". Contudo, a pretensão de ver declarada tal inelegibilidade deve ser manejada por instrumento próprio. Tal sanção não se inclui entre aquelas previstas para o recurso contra expedição de diploma"

(EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO CONTRA EXPEDIÇÃO DE DIPLOMA N° 698 - CLASSE 218 - PALMAS - TOCANTINS.) (DJU 05/10/2009)

A própria LC nº. 135/2010, dando nova redação ao inciso XIV, art. 22 da LC nº. 64/90 mencionou o termo "sanção", dizendo que julgada procedente a representação por desvio ou abuso de poder ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, o julgador aplicará ao infrator "sanção de inelegibilidade para as eleições a se realizarem nos 08 anos subseqüentes à eleição que se verificou (...)".

Nesse contexto, com a máxima vênia do Ministério Público Eleitoral, filio-me ao entendimento daqueles que vislumbram a natureza das inelegibilidades decorrentes de infrações à preceitos legais como autêntica hipótese de penalidade, e não de simples conseqüência de uma condenação, afinal os efeitos punitivos decorrentes de uma infração podem ser contemplados por um ou mais textos legais, não se exigindo que estejam restritos no mesmo dispositivo ou na mesma lei.

Sendo assim, entendo ser aplicável à espécie as normas dos incisos XXXIX e XL do art. 5º da Constituição Federal que exige a anterioridade da lei punitiva aos fatos ilícitos ensejadores da penalidade e proíbe a retroatividade da lei punitiva, a não ser para beneficiar o réu.

São normas-princípios fundamentais para a segurança jurídica, considerada por Gustav Radbruch como uma "premissa de toda civilização" (apud, curso de direito civil, Paulo Nader, parte geral. Rio de Janeiro, forense, 2003, pg 149).

Na análise da ocorrência do fenômeno da retroatividade das leis, o importante é a data da ocorrência dos fatos considerados ilícitos, e não o enfrentamento de suas conseqüências. No caso presente os fatos ensejadores da condenação do impugnado ocorreram antes da vigência da LC nº.135/2010, sendo o bastante para se inferir que a tese sustentada pelo impugnante implica na efetiva retroatividade de lei mais severa.

Sem dúvida a LC nº. 135/2010 é um grande avanço e um moderno instrumento de valorização da ética na política brasileira. Todavia, não pode servir de ameaça permanente às garantias individuais e às demais regras basilares do Estado Democrático de Direito.

O fato da lei nova atendente, em geral, a um maior interesse social, a convivência democrática exige de todos os construtores da ordem constitucional, legisladores e magistrados, redobrada vigilância aos impulsos momentâneos de determinada maioria, ainda que imbuídos do mais puro sentimento de justiça e das melhores intenções. Como bem enfatizou o arguto Maquiavel "é imprudente, e, portanto desaconselhável, passar abruptamente da clemência à crueldade".

A inaplicabilidade da LC nº. 135 a fatos pretéritos não é reconhecimento de direito adquirido à elegibilidade. Evidentemente se o candidato reiterar sua conduta na vigência da nova lei, a sanção da inelegibilidade deverá ser aplicada com base nos novos critérios, e jamais com base nos critérios revogados.

Assim, embora a LC nº. 135 tenha aplicabilidade em tese, só pode disciplinar fatos futuros, ocorridos após a sua vigência.

Desse modo, acolho a preliminar suscitada pelo impugnado, para declarar a inaplicabilidade da alínea "j", inciso I, art. 1º da LC 64/90, incluído pela LC nº. 135/2010 na hipótese vertente, não incidindo esta causa de inelegibilidade.

Quanto aos demais requisitos legais para o registro de candidatura, verifico que o pedido foi instruído como os documentos exigidos pelo art. 26 da Resolução TSE nº 23.221/2010 (art. 11, da Lei nº 9.504/97), reunindo o candidato todas as condições de elegibilidade para o cargo, não havendo nenhuma causa de inelegibilidade.

Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTE a IMPUGNAÇÃO ofertada pelo Ministério Público Eleitoral, e DEFIRO o registro da candidatura de JOSÉ SARNEY FILHO, sob o número 4321 e com a opção de nome SARNEY FILHO,para o cargo de Deputado Federal.

É como voto.

São Luís, 26 de julho de 2010.

Juiz MAGNO LINHARES

Relator


2. DO MÉRITO

A Lei Complementar nº 135, de 4 de junho de 2010, publicada 2 (dois) dias depois, notadamente, trouxe extrema inovação às condições de elegibilidade, além de representar surpresa aos pretensos candidatos a cargos eletivos no pleito deste ano, já que sua vigência iniciou praticamente em simultaneidade com o início das convenções partidárias estabelecidas no art. 8º, caput, da Lei nº 9.504/97.

Todavia, conforme acertadamente discorreu o insigne Procurador Regional Eleitoral, há hipóteses de exceção de aplicação da lei inovadora, o que se daria "no caso de condenação por abuso de poder em AIJE, com fulcro no inciso XIV do art. 22 da LC nº 64/90, onde tenha sido fixada a inelegibilidade por 03 (três) anos na própria sentença/acórdão condenatório, haja vista que nesse caso a inelegibilidade é constituída na própria decisão judicial" (transcrição literal – p. 5).

Nesse aspecto, seria, pois, inaplicável ao caso concreto a alínea "d" do art. 1º, inc. I, da Lei Complementar nº 64/90, cuja redação foi trazida pela Lei Complementar nº 135/2010, pelos próprios fundamentos trazidos pelo impugnante. Assim, caberia a aplicação, sim, dos arts. 1º, inc. I, alínea "h" c/c art. 22, inc. XIV, ambos da Lei Complementar nº 64/90, todavia, com redação original, ou seja, anterior à Lei Complementar nº 135/2010.

Desse modo, indispensável o trânsito em julgado da decisão declaratória que aplicou a inelegibilidade à candidata impugnada.

No entanto, houve interposição de Agravo de Instrumento em Recurso Especial, protocolizado sob o nº 259692010, que ora tramita perante o colendo Tribunal Superior Eleitoral nos autos AI nº 182791.2010.600.0000 (número único), estando no aguardo de decisão daquela Máxima Corte Eleitoral. Assim, é claro, não houve trânsito em julgado da decisão declaratória dessa egrégia Corte, o que obsta o indeferimento, por esse motivo, da candidata impugnada.

Noutro ângulo, caso tais alegações, por si só, não gerem o convencimento dessa relatoria e do Plenário dessa Corte Eleitoral, no sentido do deferimento do pedido de registro da candidata, necessário se faz, então, lembrar que dispõe o art. 26-B, caput, da Lei Complementar nº 64/90 sobre a prioridade a ser dada para os processos daquela natureza e que, sendo a ele conferido efeito suspensivo – o que provavelmente deve ocorrer em razão dos fatos discorridos –, haverá priorização sobre todos os demais feitos, à exceção apenas dos mandados de segurança e hábeas corpus em trâmite, consoante preconiza o art. 26-C daquele mesmo diploma legal complementar.

Tais prioridades, não paira dúvida alguma, tem o condão de evitar prejuízos decorrentes da injustiça causada em razão da morosidade no trâmite processual ensejada pelo elevado número de feitos em andamento perante o Poder Judiciário, em especial, nesta época que antecede pleito eleitoral, a própria Justiça Eleitoral.

Ora, no caso sob exame na AIJE de protocolo nº 25616452008, esse egrégio Tribunal Regional Eleitoral, em apreciação ao RE Nº 5866, entendeu por tornar insubsistentes as sanções de inelegibilidade impostas a alguns recorrentes, os quais estavam permeados no mesmo fato que os demais, tendo sido mantida tal sanção apenas para alguns, dentre eles, a candidata impugnada, o que pode configurar injustiça, como se dá a entender que é. De qualquer modo, a decisão encontra-se em descompasso com o que dispõe o art. 22, inc. XIV, da Lei Complementar nº 64/90.

Ademais, há grande probabilidade de que seja suspensa, pela Corte Superior Eleitoral, a inelegibilidade da candidata impugnada, já que presentes a plausibilidade na pretensão recursal (LC 64/90, art. 26-C, caput).

Sendo assim, o correto seria o sobrestamento do pedido de registro de candidatura até que decisão interlocutória (declaração de efeito suspensivo ao agravo de instrumento interposto) ou final no AI nº 182791.2010.600.0000 seja proferida pelo Tribunal Superior Eleitoral.

Contudo, a Resolução TSE nº 23.221/2010, em seu art. 50, estabeleceu como prazo final para julgamento de todos os pedidos de registro de candidatura o dia 5 de agosto do ano em curso, ou seja, em curtíssimo tempo.

Destarte, é praticamente inacreditável que alguma decisão seja proferida pelo c. Tribunal Superior Eleitoral antes do término do prazo para julgamento da impugnação que ora se contraria e do próprio pedido de registro de candidatura.

Diante de tais assertivas, não é plausível que a candidata seja prejudicada por questões que estão fora de suas próprias vontades ou de sua execução pessoal, na dependência decisões alheias ao processo que cuida especificamente do futuro de sua candidatura.

Sobre o assunto, leciona Marino Pazzaglini Filho, em sua obra Eleições Gerais 2010 (São Paulo: Atlas, 2010, p. 33), que "a regra constitucional é a elegibilidade do cidadão", de modo que as incapacidades passivas eleitorais estão abarcadas nas exceções.

Convém, ainda, transcrever o que preconiza o art. 26-A da Lei Complementar nº 64/90, que dispõe:

Art. 26-A. Afastada pelo órgão competente a inelegibilidade prevista nesta lei, aplicar-se-á, quanto ao registro de candidatura, o disposto na lei que estabelece normas para as eleições.

Daí extrai-se que, sendo afastada, em qualquer instância, a inelegibilidade da candidata, terá ela seu registro de candidatura deferido, posto que preenchidos os demais requisitos legais necessários.

Para cessar de vez a discussão, convém transcrever decisão dessa egrégia Corte Eleitoral sobre a questão concernente ao trânsito em julgado de decisão, in verbis:

EMENTA RECURSO ELEITORAL. REGISTRO DE CANDIDATURA. IMPUGNAÇÃO. VIDA PREGRESSA (ART.14, §9º, DA CF). NOME DO CANDIDATO FIGURANDO EM PROCESSOS JUDICIAIS CRIMINAIS E DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CONDENAÇÕES NÃO TRANSITADAS EM JULGADO. A MATÉRIA FOI OBJETO DA ADPF N.144, JULGADA IMPROCEDENTE PELO COLENDO STF. EFICÁCIA ERGA OMNES E EFEITO VINCULANTE (ART. 10, §3º, DA LEI N. 9.882/99). RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

(TRE/GO, Ac. RE 4105, Rel. Juiz Marco Antônio Caldas, Publ. Seção de 18/08/2008).

Pelos aspectos narrados, encontra-se a candidata impugnada no pleno exercício de seus direitos políticos, não podendo ser privada dos direitos que lhe são garantidos pela legislação vigente, dentre eles o de ser votada, especialmente por tratar-se do direito regrado e não do excepcional.

Por conseguinte, cabível, por ser de direito, o deferimento do pedido de registro de candidatura.

PEDIDOS

Diante do acima exposto, REQUER a Vossa Excelência que:

A) Seja recebido o presente RECURSO ESPECIAL como tempestivo, para este DD. Ministro possa JULGAR PROCEDENTE todos os termos da presente julgando as preliminares, o controle e a conseqüente declaração de inconstitucionalidade da LC n. 135/2010, por todas as violações à Constituição Federal, apontadas acima;

B) No mérito seja reformada a sentença e, de conseqüência, DEFERIDO o registro da candidata MALVINA MARIA DA SILVA, posto estarem preenchidos os requisitos legais necessários e por ser de direito.

C) protesta pelas demais provas admitidas em direito.

Nestes Termos,

Pede Deferimento.

Goiânia-GO, 08 de agosto de 2008.

EDILBERTO DE CASTRO DIAS

OAB 13.748



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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DIAS, Edilberto de Castro. Candidata recorre contra indeferimento de candidatura por "ficha suja". Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2639, 22 set. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17453. Acesso em: 13 maio 2024.