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As limitações constitucionais ao poder de tributar e sua aplicabilidade às multas fiscais

As limitações constitucionais ao poder de tributar e sua aplicabilidade às multas fiscais

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Sumário: 1. Considerações gerais sobre a aplicação de multas fiscais escorchantes. 2. A aplicação às multas fiscais das limitações constitucionais ao poder de tributar. 3. Os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade e as multas fiscais. 4. As multas fiscais e o princípio do não-confisco em matéria tributária. 5. As multas fiscais e o princípio da capacidade contributiva. 6. As multas fiscais e o princípio da legalidade tributária. 7. As multas fiscais e a irretroatividade da lei tributária: a redução das multas no tempo. 8. As multas fiscais e o princípio da anterioridade tributária. 9. As multas fiscais e o Poder Judiciário. 10. Conclusões. Notas. Bibliografia.


1. Considerações gerais sobre a aplicação de multas fiscais escorchantes.

Para discutir a matéria de fundo, limitação constitucional ao poder de tributar e sua aplicação às multas fiscais, devemos antes anotar ponderações de Sacha Calmon Navarro Coelho e de Misabel Derzi(1) no tocante ao abuso na imposição das multas fiscais, nestes termos:

"Vivemos hoje quadra, que se espera duradoura, de baixa inflação, com tendência à estabilidade. Neste panorama, a existência em todas as legislações – federal, estaduais e municipais – de multas escorchantes, especialmente as ditas moratórias raia ao absurdo.

Nem se olvide que havendo ação fiscal (lançamento ex officio), ditas multas surdem em, no mínimo 100% do débito apurado, o que é verdadeiramente um despautério.

Sem falar noutras, de 200% e 300% do imposto devido, encontráveis aqui e acolá, nas dobras da legislação. As multas formais, punitivas, acessórias ou isoladas, que punem o descumprimento das obrigações acessórias, não deixam por menos."

Dessa forma, não existe dúvida que a problemática apontada pelos autores é real, havendo, também, a incidência de multas fiscais sem um controle quanto aos limites e parâmetros tanto no âmbito federal, quanto estadual e municipal.

Em geral, a visão de outros autores, com relação ao estabelecimento, elisão e graduação das multas fiscais, pode ser resumida pelas considerações de Mitsuo Narahashi(2), nestes termos:

"a. Sujeito passivo paga espontaneamente o tributo dentro do prazo: nenhum acréscimo.

b. Sujeito passivo paga espontaneamente o tributo, com atraso, antes de qualquer iniciativa do Fisco: acréscimo dos juros de mora;

b.1) O cumprimento espontâneo de obrigação acessória elide qualquer penalidade.

c. Sujeito passivo declara a obrigação tributária, mas paga o tributo, somente após a convocação do Fisco: acréscimo da multa de mora e dos juros de mora;

c.1) Se é chamado para suprir obrigação acessória que deveria ter cumprido, não é necessariamente dispensado de penalidades.

d. Sujeito passivo não declara o tributo, ou o declara com inexatidão ou falsidade: pagamento com multa de lançamento de ofício, além dos juros de mora sobre a totalidade ou a diferença apurada pela administração, podendo essa multa ser graduada, conforme a gravidade da infração." (grifamos)

A conclusão do autor supracitado merece discordância, já que a existência de declaração falsa ou de outra conduta tipificada penalmente não pode ser tratada e punida pelo Poder Executivo. Se existe crime, a questão transcende à seara tributária. Por isso, a nominada multa de lançamento de ofício não pode ser aplicada pelos agentes de fiscalização.

No Brasil, estabelecem-se percentuais de multas fiscais em percentuais maiores, quando se identifica a existência de crime fiscal. A medida, que tem como justificativa inibir e punir a sonegação fiscal, eleva o débito fiscal em muito e constitui erro porque permite que o Poder Executivo aplique pena de multa. Esse equívoco não é privilégio do sistema brasileiro, Fonrouge(3) já alinhava, comentando sobre as penalidades por atraso, que "Falta de pago – El pago puntual de los impuestos tiene grade importancia para la buena organización y marcha del Estado. Desgraciadamente en la legislación tributária argentina existe la mayor anrquía en la materia. (...). El monto exorbitante del recargo y su falta de limitación en el tiempo supera las penas aplicables por defraudación."

Sendo assim, o manicômio jurídico tributário, expressão de Becker(4), que adjetiva a confusão do sistema de tributação, se mantém e está sendo exacerbado pela inexistência de uma política de incidência de multas fiscais em percentuais coerentes e pela aplicação por agentes de fiscalização de penalidades tipificadas penalmente.

Dessa forma, a nosso juízo, é importante que seja debatido a limitação do poder de aplicação as multas fiscais.


2. A aplicação às multas fiscais das limitações constitucionais ao poder de tributar.

Inicialmente, não podemos deixar de anotar que, desde a Roma antiga há uma preocupação com o estabelecimento de penas pecuniárias excessivas, ensejando que as multas estabelecidas além dos limites de pagamento do devedor eram nulas e não podiam ser convertidas em outra espécie de pena(5). Dessa forma, todo o sistema de incidência de penalidades pecuniárias deve guardar o estabelecimento de multas em valores limitados à condição de pagamento do contribuinte, sem abusos e dentro de limites, sob pena de nulidade da aplicação da pena.

A existência de um limite na imposição das multas é instrumento de proteção que não pode ser ignorado. Rui Barbosa Nogueira(6) relata os absurdos que aconteciam na Rússia pela participação de fiscais na arrecadação das multas, os quais, visando a uma maior remuneração, extrapolavam no estabelecimento das penalidades, nestes termos:

"Para estimular estes esbirros o Ukase instituía tentadora recompensa: os fiscais passaram a ter participação no resultado das multas que impunham. Tal instigação oficial à delação gerou o mais odioso abuso de poder. Os fiscais se transformaram em inquisidores e interessados. Sob ameaça de terríveis acusações extorquiam resgates de sua vítimas. Mesmo os inocentes se apavoravam só com as ameaças de denúncias ou falsas acusações.

Porém, em justa revisão, o Oberfiskal Nesterov foi condenado por falsidades e malversações. Este velho de cabelos brancos, que tanto vinha apavorando os lares russos foi, inicialmente, submetido a suplícios lentos e gradativos. Depois, o carrasco, arrastando-o até o rompimento de seus braços e pernas, chegou ao cepo, sobre o qual lhe decepou a cabeça."

Por tudo isso é que, Pedro, o Grande, suprimiu a instituição do OBERFISCAL."

Nesse sentido, existe toda a base filosófica e histórica para levarmos a destaque a discussão de que, se as multas fiscais, mesmo sendo penalidades, e por conseguinte não tendo a natureza jurídica de tributos, observam princípios adstritos à tributação.

Na nossa visão, as multas fiscais devem observar os princípios e limitações ao poder estatal de imposição de tributos, sob pena da possibilidade de haver violação de direitos e garantias dos contribuintes pela via oblíqua da imposição de penalidades tributárias.

Os comentários sobre o tema de Ramon Costa, Nelly Blengio e Arenco Sayagues(7) são no seguinte sentido:

"La solución tiene su gran significación jurídica pues la aplicación de penas que afectan el ejercicio de derechos individuales consagrados por la constitución, debe estar rodeada de las máximas garantias, entre ellas, la actuación de um juez idóneo ajeno a las partes, como sostinía Couture, o super partes, como decia Carnellute. La aplicación de multas de caráter punitivo por la Administración acreedora del tributo, como lo hace el Código, rompe esse esquema; la admisión generealizada en el derecho contemporáneo de esta solución mas a una tradición derivada de regímenes autoritarios que a los fundamentos del Estado de Derecho".

Dessa forma, não há dúvida que a aplicação das penalidades fiscais não pode extrapolar direito e garantias do contribuinte.

A conclusão da aplicação às multas fiscais dos limites constitucionais ao poder de tributar passa pelo seguinte parâmetro inicial:

1. Uma regra que obriga um elemento principal deve ser válida para os elementos acessórios.

2. Deve haver a unidade de princípios que regulamentam toda a tributação, sob pena da possibilidade de não cumprimento das garantias do contribuinte através da inobservância dos princípios no estabelecimento das multas, com conseqüente fragilização das proteções em face a abusos do Fisco.

A nossa idéia não é nova, já que J. Rildo Medeiros Guedes(8) assim entendeu:

"Tanto os juros de mora como as multas, que representam um decréscimo patrimonial, têm caráter de reparação e de penalidade, como conceituadas, respectivamente, nas legislações civil e penal e, por conseguinte, constituem acessório do principal.

E, na qualidade de acessório, por uma questão de lógica e princípio – vide artigos 58 e 59 do Código Civil – acompanha o principal, constituindo-se, a partir daí, num todo indivisível, como acontece, por exemplo, com um imóvel edificado, onde o terreno é o principal e a construção o acessório."

Com efeito, na formação do estabelecimento do vínculo obrigacional tributário, que decorrerá da lei, deverá o legislador infraconstitucional observar os ditames previstos nas limitações ao poder de tributar. Ou seja, na edição de lei instituidora que balizará a formação da relação obrigacional devem ser observadas as limitações constitucionais sob pena de inexistência de vínculo jurídico obrigacional e conseqüente impossibilidade de cobrança do tributo.

Nesse viés, não se pode olvidar os princípios constitucionais tributários nas normas relativas à exigência de obrigação tributária principal.

Nessa linha de raciocínio, não podemos esquecer que o acessório segue o principal e que, se na edição das normas relativas à obrigação principal, é compulsória a observância de princípios constitucionais de limitação ao poder de tributar, da mesma forma e com razão, nas normas que dispõem sobre obrigações acessórias também devem observar as limitações ao poder de tributar.

Não haverá cobrança de multa se a obrigação principal deixar de existir por vício no vínculo obrigacional, qual seja, a lei. A lei que estabelece o vínculo principal deve ser elaborada dentro dos limites constitucionais, se assim não for, as multas fiscais, principalmente as moratórias, também não serão exigíveis, em vista da descaracterização da obrigação principal.

Merece consideração a manifestação de José Orlando Rocha de Carvalho(9):

"Acerca do reflexo do ônus financeiro representado pelo pagamento das multas ou penalizações, interfere da oneração a ele imposta e consistente no pagamento de qualquer tributo, afirmando ainda que tanto isso é verdade que a própria lei tributária não distingue entre a obrigação de pagar tributo (imposto, taxa...) daquela imposta para o pagamento de multa ou penalidade pecuniária, como ressaltado do exame do preceito legal correspondente"

Com isso, verificamos que na obrigação principal, que decorre o pagamento de tributo, o Fisco deve observar as limitações ao poder de tributar. Por que razão, então, não deveria cumprir as mesmas limitações quando da formação da obrigação principal decorrente de penalidade?

Por razão alguma, em face de que não se pode admitir um sistema híbrido de incidência e previsão principiológica, no sentido de que os princípios incidiriam somente sobre parte da obrigação tributária (obrigação principal) e sobre outra não (obrigação acessória).

A argumentação de que multa não é tributo, e por isso não pode na sua imposição observar os princípios tributários, não procede, uma vez que não se está tributando atividade ilícita, mas tão somente se verificando que na atividade de tributação os princípios de proteção ao contribuinte devem ser regrados de maneira una e indivisível, sob pena de inobservância por via oblíqua da própria Constituição.

A doutrina não é nova no sentido de que a multa fiscal, apesar de ter natureza jurídica diferente, deve observar os mesmos princípios que os tributos, uma vez que quanto à exigência como facilmente se pode demostrar pela observação de alguns dispositivos legais que tratam do assunto, especificamente os artigos 113, § 1o , 139 e 142 do Código Tributário Nacional(10).

Amador O. Fernandes(11) conclui assim:

"Portanto, conclui-se que: a) não havendo qualquer distinção em texto expresso de lei, o tratamento dispensado às multas fiscais deverá ser o mesmo que for atribuído aos tributos, pois ambos têm a mesma natureza e integram originariamente os créditos tributários, como expressamente declara o Código Tributário Nacional."

Por tudo isso, chegamos à conclusão de que, na edição de leis que estabelecem sanções relativas ao não pagamento de tributos no prazo e de outros deveres formais, o legislador está obrigado a observar os princípios das limitações ao poder de tributar, uma vez que a essência de formação do vínculo jurídico está adstrita àqueles princípios, independentemente de, na origem, o valor devido ser pela incidência de penalidade, tendo-se que ao final os valores serão convertidos em obrigação principal com todas as garantidas para o Fisco e para o contribuinte (limitações constitucionais ao poder de tributar).


3. Os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade e as multas fiscais.

O princípio da razoabilidade tem sua base de formação nos Estados Unidos, tendo sua acepção ligada à razoabilidade que a lei deve ter e sua relação com a moralidade e a continência do fundamento da edição da norma com a solidariedade, segurança jurídica, ordem e principalmente a justiça. Dessa forma, o fundamento de validade primeiro de uma norma jurídica deve ser o sentido de justiça(12).

Aplicação do princípio da razoabilidade em matéria de penalidades pecuniárias é aceito na doutrina, conforme ensina José Carlos Graça Wagner(13) :

"o ato ilícito pode ser punido até o limite de sua própria substância, de tal modo que não só de nada aproveite a quem o praticar como também perca tudo que envolveu na prática daquele ato. Nesse caso, os acréscimos de multa, juros e correção não podem ultrapassar o limite do que razoavelmente possa se presumir como resultado econômico obtido com as operações tributadas a que se refere a obrigação em atraso."

Dessa forma, o parâmetro mais usual do crivo dos limites das multas fiscais diz respeito à observância da razoabilidade e da proporcionalidade da exação.

No mesmo sentido se apresenta a doutrina de Rodolfo R. Spisso(14):

"Si ante la sola mora en el pago de las obligaciones tributarias la norma jurídica impusiera como sanción la pena de prisión, a no dudarlo, por vulnerarse la regla del equilíbrio conveniente entre el hecho antecedente y el consecuente, en atención a la igualdad proporción o equilíbrio axiológico-jurídico es una exigencia del principio de razoabilidad de las leyes, podría ser tachada de inconstitucional."

Podemos, então, verificar que a imposição de penalidades tributárias, inclusive as multas de mora, pode ser declarada inconstitucional em face do princípio da razoabilidade das leis.

O aludido princípio diz respeito, segundo o STF, aos balizamentos e parâmetros que o legislador, na sua atividade legislativa, deveria observar, estabelecendo ainda que os limites da lei devem regular a conduta de modo proporcional e adequado(15).

A doutrina constitucional moderna e o Supremo Tribunal Federal, nesse sentido, determinam que não se deve analisar as leis somente sob a ótica do princípio da reserva legal. O julgamento da questão deve ter como base o princípio da reserva legal proporcional, que tem como pressuposto não somente a legitimidade dos meios e dos fins a serem alcançados, mas também a necessidade de utilizar-se o meio menos gravoso ao indivíduo para alcançar o fim almejado(16).

Com isso, não pode haver distorção entre a medida estabelecida em lei e o fim por ela objetivado, determinando que o modo de combater e punir os ilícitos fiscais deve ser disposto com penalidades que guardem adequação dos meios e dos fins, sob pena de violação ao princípio da razoabilidade e a proporcionalidade.

Gilmar Mendes(17) resume a questão:

"Portanto, a doutrina constitucional mais moderna enfatiza que, em se tratando de imposição de restrições a determinados direitos, deve-se indagar não apenas sobre a admissibilidade constitucional da restrição eventualmente fixada (reserva legal), mas também sobre a compatibilidade das restrições estabelecidas com o princípio da proporcionalidade."

Na análise deste princípio aplicado a multas fiscais, vislumbramos que uma lei que estabeleça uma multa elevada para combater a sonegação fiscal deve ser graduada em percentual proporcional ao seu objetivo de punir e reprimir o ato ilícito.

A questão ainda é importante em vista de que a não observância do princípio da proporcionalidade na imposição das multas pode violar o direito à propriedade(18).

Devemos citar o RE nº 18.331(19):

"O poder de taxar não pode chegar à desmedida do poder de destruir, uma vez que somente pode ser exercido dentro dos limites que o tornem compatível com a liberdade do trabalho, comércio e da indústria e com o direito de propriedade"

Dessa forma, constatado que o princípio da razoabilidade das leis se aplica às normas que impõem penalidades fiscais, devemos discutir a questão do princípio do não-confisco em relação aos aludidos comandos normativos.


4. As multas fiscais e o princípio do não-confisco em matéria tributária.

O estabelecimento de multas fiscais não pode induzir à violação ao princípio do não-confisco. Para discussão inicial, levantamos a seguinte situação fática: A alíquota do IPTU é de 2% (dois por cento). Contudo, as multas fiscais pelo

atraso no pagamento são de 200% (duzentos por cento). Dessa forma, então, podemos analisar se pode a multa ter caráter confiscatório, mesmo que a imposição do tributo em si não tenha violado a aludida garantia constitucional.

Quanto a este princípio em matéria tributária, vale citar Vittorio Cassone(20):

"A vedação constitucional do confisco implica limitação à imposição de penalidade pecuniária. Já que as regras de tributação estão sujeitas ao princípio do "não-confisco", (...), o estabelecimento das penalidades não pode ser feito de modo desproporcional e abusivo sob pena de serem as mesmas consideradas confiscatórias, ou configurativas de confisco.

Todos os tributos podem ensejar efeito de confisco, desde que ultrapassados os limites da razoabilidade, sendo, pois, inconstitucionais".

O entendimento de Douglas Yamashita(21) é no sentido de que: "As penalidades também podem ser confiscatórias sempre que forem desproporcionais ao seu objetivo punitivo".

Dessa forma, verificamos que a não observância de uma proporcionalidade na previsão das multas fiscais pode levar à aplicação de multas confiscatórias, ensejando, se assim for, a possibilidade de declaração de inconstitucionalidade por violação expressa ao art. 150, IV, da CF/88.

No julgamento da ADIN ajuizada em face da exigência de multa em percentual de 300% (trezentos por cento), o STF(22) assim decidiu:

"Art. 003 º - Ao contribuinte, pessoa física ou jurídica , que não houver emitido a nota fiscal, recibo ou documento equivalente, na situação de que trata o artigo 002 º , ou não houver comprovado a sua emissão , será aplicada a multa pecuniária de trezentos por cento sobre o valor do bem objeto da operação ou do serviço prestado , não passível de redução , sem prejuízo da incidência do Imposto sobre a Renda e proventos de qualquer natureza e das contribuições sociais. (grifamos) Parágrafo Único - Na hipótese prevista neste artigo, não se aplica o disposto no artigo 004 º da Lei nº 8218 , de 29 de agosto de 1991 .O Tribunal , por votação majoritária, conheceu da ação direta quanto ao art. 003º e seu parágrafo único da Lei nº 8846 , de 21/01/94, vencido o Relator ( Ministro Celso de Mello, Presidente), que dela não conhecia. Prosseguindo no julgamento do pedido de medida cautelar, referente a essa norma legal , o Tribunal, por votação unânime, suspendeu, com eficácia ex nunc , até final julgamento da ação direta, a execução e a aplicabilidade do art. 003 º e seu parágrafo único da Lei nº 8846 , de 21/01/97 . Ausentes, justificadamente, os Ministros Sepúlveda Pertence e Maurício Corrêa. - Plenário, 17.06.98." (grifamos)

Com base nesse precedente não há dúvidas de que leis que estabelecem multas fiscais podem ser declaradas inconstitucionais por violarem o princípio do não-confisco.

Devemos ainda notar que o efeito confiscatório tem ínsita relação, quando tratado em matéria tributária, com o princípio da capacidade contributiva. Nesse viés, a capacidade econômica é a condição básica para a incidência de uma exação fiscal. Contudo, a incidência de multas fiscais confiscatórias pode afetar a capacidade contributiva, ensejando que a capacidade de contribuir para com as despesas estatais termina quando existe uma exigência fiscal confiscatória(23). Por isso, é importante estudarmos essa questão.


5. As multas fiscais e o princípio da capacidade contributiva.

Spisso(24) muito bem compila o princípio da capacidade contributiva nestes termos:

"vemos cómo el principio da capacidad contributiva no se subsume sino que complementa al de no confiscatoriedad, ya que el tributo podrá no absorber una parte substancial de las rentas, no obstante lo cual, si incide sobre los ingresos mínimos que aseguren al indivíduo su substistencia, corresponderá decalificarlo por inexistencia de capacidad económica."

Dessa forma, o princípio da capacidade contributiva impede que a tributação incida sobre os valores mínimos que o contribuinte tem para se manter.

A base fundamental do princípio da capacidade contributiva está bem explicitado por Luciano Amaro(25) no sentido de que "a capacidade contributiva inspira-se na ordem natural das coisas: onde não houver riqueza é inútil instituir imposto, do mesmo modo que em terra seca não adianta abrir poço à busca de água."

Com efeito, o princípio da capacidade tributária visa a que a tributação incida sobre a riqueza existente, evitando-se que as exações recaiam naqueles que não tem possibilidade de contribuir para as despesas do Estado. A justiça das leis tributárias depende da observância deste princípio. Tanto é assim que Roque Antônio Carraza(26) afirma que "há íntima ligação da capacidade contributiva com o princípio da igualdade e como mecanismo da Justiça Fiscal."

Sendo assim, o legislador deve, na edição de leis tributárias observar os limites da retirada da riqueza do contribuinte, sob pena de incorrer em tributação injusta.

Defendemos que o princípio da capacidade contributiva se aplica às leis que prevêem multas fiscais. Para chegarmos a esta conclusão estabelecemos a seguinte situação fática: um contribuinte que trabalhou durante 35 anos comprou um lote em local ermo, fez sua casa e, com o crescimento da cidade teve seu imóvel valorizado. Por outro turno, ele se aposentou e passou a receber um salário-mínimo a título de aposentadoria. Recebendo a guia do IPTU se depara com o valor de 5 salários-mínimos. Está neste caso configurada ofensa ao princípio da capacidade contributiva?

O município fez o lançamento correto, mas o contribuinte não tem recursos para pagar. Essa questão tem implicações sociais relevantes e, a princípio, entendemos que, se comprovada a situação de miserabilidade, o sujeito passivo poderá se valer da violação do princípio da capacidade contributiva para ver reduzido o imposto.

Com certeza, a posição que defendemos pode ser considerada protecionista e não se pode esquecer que resta a opção da venda do bem para pagamento do imposto devido. No entanto, a juízo da autoridade judicial pode ser alterado o valor lançado para se adequar a cobrança à capacidade do contribuinte. Por outro lado, jamais o administrador pode se valer disso para reduzir um tributo, pois sua atividade é vinculada à lei e impessoal, devendo, contudo, as penalidades pecuniárias serem graduadas dentro de limites que evitem a aludida violação, que, diga-se de passagem, é mais comum do que se pensa.


6. As multas fiscais e o princípio da legalidade tributária.

O princípio da legalidade tributária é o mais importante vetor relativo

à tributação. Suas origens remontam à Magna Carta de 1215, em que, por exigência dos Barões, passou-se a requerer a prévia aprovação dos tributos, consubstanciando o princípio no taxation without representation. Dessa forma, pelo menos em tese, somente pagamos os tributos que consentimos. Sendo assim, o princípio da legalidade tem como base o princípio do consentimento(27).

Hugo de Brito Machado(28) ensina que "a lei sendo a manifestação legítima da vontade do povo, por seus representantes nos parlamentos, entende-se que o ser instituído em lei significa ser o tributo consentido. O Povo consente que o Estado invada seu patrimônio para dele retirar os meios indispensáveis à satisfação das necessidades coletivas."

Devemos ainda observar que o princípio da legalidade tem como finalidade assegurar a segurança jurídica nas relações com o Estado, mediante o estabelecimento prévio das condutas a serem observadas de modo que tanto governantes como governados saibam previamente seus deveres e direitos(29).

A finalidade do princípio da legalidade é apresentado de forma definitiva por Hugo de Brito Machado(30) no sentido de que "o princípio da legalidade presta-se para garantir a segurança nas relações do particular (contribuinte) com o Estado (fisco), as quais devem ser inteiramente disciplinadas, em lei, que obriga tanto o sujeito como o sujeito ativo da relação obrigacional tributária."

Mais importante que a teoria de que os tributos são consentidos é a garantia de que todos os elementos da tributação vão estar na lei. Com isso, estudando o alcance do princípio da legalidade tributária, observamos que este princípio, segundo Rodolfo R. Spisso(31), alcança os seguintes elementos da relação tributária, nestes termos:

"Sólo la ley puede:

a) definir el hecho imponible;

b) indicar el contribuinte y, en su caso, el responsable del pago del tributo;

c) determinar la base imponible;

d) fijar la alícuota o el monto del tributo;

e) estabelecer extinciones y reducciones;

f) tipificar las infracciones y estabelecer las respectivas penalidades." (grifamos)

Reginaldo Ferreira Lima(32) salienta que "a lei deverá conter os contornos precisos dos elementos descritores do fato e a decorrente conduta, representada sempre pela relação obrigacional do poder tributário com o contribuinte."

Carraza(33) não deixa dúvidas afirmando que "todos os elementos essenciais devem ser erigidos pela lei, para que se considerem cumpridas as exigências do princípio da legalidade."

Pela análise da doutrina verificamos que as penalidades pecuniárias somente podem ser previstas em lei. Com isso, as multas fiscais moratórias ou por infração não podem ser veiculadas por instrumentos normativos diferentes das leis. Sendo assim, não se pode impor penalidade por decretos ou por outras normas tributárias complementares.

Nos valemos novamente das lições de Sacha Calmon:

"Os deveres tributários (ou, se prefere, as obrigações tributárias) são deveres ex lege e são de duas espécies: a) pagar tributo; b) cumprir deveres instrumentais (emitir notas fiscais, prestar declarações, não transportar mercadorias desacobertadas de documentação fiscal, etc.) A tipicidade do ilícito tributário é encontrada por contraste: a) não pagar o tributo e b) não cumprir os deveres instrumentais expressos. Mas as sanções – quase sempre sanções pecuniárias – devem ser previstas em lei. No Direito brasileiro só a lei – em sentido formal e material – pode estatuir sanções fiscais, segundo preceito de lei complementar à Constituição. Vigora pleno o brocardo latino do nullum tributum nula poena sine lege. A proliferação das sanções fiscais através de decretos é extravagante."

Dessa forma, vigora totalmente o princípio da legalidade em matéria de imposição de sanções fiscais, levando que se de um lado é discutível a possibilidade de instituição de tributos via medida provisória(34), de outro, a exigência de multas fiscais moratórias via medida provisória é impossível, uma vez que somente se pode aplicar pena através de lei em sentido formal e material e ainda pelo que determina o art. 97 do CTN: "somente a lei pode estabelecer: V – a cominação de penalidades para as ações ou omissões contrárias a seus dispositivos, ou para outras infrações definidas."

Cabe destacar, ainda, a existência de alguns impostos que não observam o princípio da legalidade tributária na fixação de alíquotas. São eles: imposto de importação, imposto de exportação, imposto sobre produtos industrializados e imposto sobre operações financeiras. Contudo, mesmo para esses impostos a fixação de multas deve se dar por lei, em vista de que a exceção ao princípio da legalidade se dá única e expressamente para as alíquotas e não para penalidades pecuniárias.

Assim, entendemos que a possibilidade de alterações de alíquotas através de decreto é exceção prevista constitucionalmente e como norma excepcional deve ser interpretada restritivamente, não se permitindo a extensão para ensejar a exigência de multas fiscais pela via de decretos.


7. As multas fiscais e a irretroatividade da lei tributária: a redução das multas no tempo.

As normas que impõem multas fiscais merecem uma análise detida no que diz respeito ao princípio da irretroatividade da lei tributária.

Devemos anotar as considerações de Spisso(35) acerca da importância da irretroatividade da lei para a manutenção do Estado de direito:

"los principios de legalidad – integrado con los de certeza y seguridad jurídica -, de razoabilidad de las leyes, de equidad y de inviolabilidad de la propriedad confluyen en el establecimiento de un valladar inexpugnable a los intentos de retroactividad fiscal. Elle permite que la plenitud del Estado de derecho (...). Sólo así se pude hablar de la real vigencia de un Estado de derecho, en que los derechos individuales y liberdades públicas se hallan efectivamente garantizados."

Com efeito, o art. 150, III, a, da Constituição da República Federativa, reza: "É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios cobrar tributos em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado."

Em vista da aludida norma constitucional, a lei tributária não retroage, aplicando-se aos fatos geradores ocorrido após a vigência do comando jurídico. Vale lembrar que Kelsen(36) ensina:

"vigência designamos a existência específica de uma norma e ainda que a vigência da norma pertence à ordem do dever-ser, e não à ordem do ser, deve também distinguir-se a vigência da norma da sua eficácia, isto é, do fato real de ela ser efetivamente aplicada e observada, da circunstância de uma conduta humana conforme à norma se verificar na ordem dos fatos."

Com isso, a lei tributária não pode ser aplicada retroativamente aos eventos ocorridos antes de sua publicação, residindo, neste aspecto, a questão da validade temporal da norma tributária.

Kelsen(37) explica que "relativamente ao domínio da validade temporal de uma norma positiva, devem distinguir-se o período de tempo posterior e o período de tempo anterior ao estabelecimento da norma. Em geral, as normas referem-se apenas a condutas futuras. No entanto, podem referir-se também a condutas passadas."

Nesse viés, as normas tributárias regulam condutas futuras, ou seja, aplicam-se a fatos geradores futuros, havendo, contudo, exceção à aludida regra geral, quando se tratar de norma relativa à imposição de penalidades. Vejamos as disposições do Código Tributário Nacional:

"Art. 105. A legislação tributária aplica-se imediatamente aos fatos geradores futuros e pendentes, assim entendidos aqueles cuja ocorrência tenha tido início mas não esteja completa nos termos do art. 116.

Art. 106. A lei aplica-se ao ato ou fato pretérito: I – em qualquer caso, quando seja expressamente interpretativa, excluída a aplicação de penalidade à infração dos dispositivos interpretados; II – tratando-se de ato não definitivamente julgado: a) quando deixe de defini-lo com infração; b) quando deixe de tratá-lo como contrário a qualquer exigência de ação ou omissão, desde que não tenha sido fraudulento e não implicado em fato de pagamento de tributos; c) quando lhe comine penalidade menos severa que a prevista na lei vigente ao tempo de sua prática." (grifamos)

Em linhas gerais, então, a lei tributária tem aplicação retroativa nos casos de penalidades. Com isso, as normas jurídicas, leis que impõem redução nos percentuais de multas fiscais, se aplicam retroativamente. Ou seja, se lei nova reduz o valor da multa de 100% para 50%, deve ser cobrado do contribuinte o menor percentual.

A questão seria fácil se tivesse a mesma sistemática do direito penal, pois se a pena pela prática de um delito é reduzida de 5 anos para 2 anos, aqueles que já tiverem cumprido a pena nos termos da lei nova terão sua liberdade assegurada.

De outro lado, o CTN apresenta a expressão: "tratando-se de ato não definitivamente julgado". Sendo assim, a aplicação retroativa da lei tributária somente é possível antes do julgamento e constituição definitiva do crédito tributário.

As discussões ainda pairam acerca de se o julgamento final seria no âmbito administrativo ou judicial. A posição majoritária, inclusive com o respaldo do Supremo Tribunal Federal, é no sentido de que o trânsito em julgado é no âmbito judicial. A melhor interpretação, na nossa avaliação, é no sentido de que a lei nova se aplica ao crédito tributário que não tiver sido extinto. Ou seja, enquanto houver crédito constituído, inscrito ou não em Dívida Ativa, a lei nova, se reduzir multas fiscais, se aplica ao crédito tributário, independente do trânsito ser administrativo ou judicial.

As leis tributárias relativas à aplicação de multas apresentam ainda uma característica de majoração proporcional no tempo, ou seja, os percentuais das multas fiscais moratórias aumentam gradativamente com o tempo.

Luciano Amaro(38) diz que: "as multas fiscais compensatórias(39) contraprestacionam de modo mais acerbado que os juros, o atraso no recebimento da prestação tributária; geralmente graduadas em função do tempo de atraso."

As leis tributárias que apresentam a aludida progressividade de multas fiscais no tempo são inconstitucionais, uma vez que a Constituição somente admite a proporcionalidade no tempo do caso do IPTU. O art. 156, § 1o, da Constituição Federal reza: "o imposto previsto no inciso I (IPTU) poderá ser progressivo, nos termos, de lei municipal de forma a assegurar o cumprimento da função social da propriedade".

O art. 182, § 4o, II, da CF/88 estabelece: "É facultado ao Poder Público Municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de: imposto sobre propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo."

Sendo assim, não há base para o aumento progressivo de multas em decorrência do tempo maior ou menor de inadimplemento, salientando-se que os juros de mora se prestam a indenizar e crescem no tempo, não sendo cabível que haja exacerbação da penalidade no tempo, uma vez que tal função já é cumprida pelos referenciados juros de mora.

Por tudo isso, concluímos que a multa moratória fiscal deve ser aplicada em valor único, conforme a maior ou menor possibilidade de sonegação do tributo, e jamais aumentar proporcionalmente no tempo por falta de base constitucional ou dupla penalização pelo não pagamento em dia e o acréscimo com punição pelo tempo de atraso, registrando-se que para esse fim existem os juros moratórios.


8. As multas fiscais e o princípio da anterioridade tributária.

O princípio da anterioridade tributária tem relação com a aplicabilidade da lei. Não basta, em matéria tributária, que exista lei vigente. Deve ser observado que a norma somente terá aplicação no primeiro dia do exercício seguinte à publicação da lei(40).

Sendo assim, por exemplo, uma lei que aumenta a alíquota do ICMS publicada em 30 de junho de 1999 somente terá aplicabilidade em 1º de janeiro de 2000. Para se exigir o aumento do tributo temos que observar concomitantemente o princípio da irretroatividade e anterioridade tributária, não bastando a lei estar vigente, estando a exigência do tributo condicionada ao cumprimento de quesito temporal.

Hugo de Brito Machado(41) explica que "o princípio da anterioridade da lei tributária não se confunde com o princípio da irretroatividade da lei, que é princípio geral de Direito e vigora, portanto, também no Direito Tributário, em cujo âmbito mereceu expressa acolhida (art. 150, inc. III, letra "b"). A anterioridade é a irretroatividade qualificada. Exige lei anterior ao exercício financeiro no qual o tributo é cobrado. Irretroatividade quer dizer que a lei há de ser anterior ao fato gerador por ela criado, ou majorado."

As leis tributárias que aumentam multas moratórias fiscais também observam o princípio da anterioridade, seguindo, pois, a mesma sistemática das normas que aumentam as obrigações principais.

Por isso, uma lei que aumente a multa moratória fiscal de 30% (trinta por cento) para 50 % (cinqüenta por cento) somente será exigível no primeiro dia do exercício seguinte à publicação da lei, levando-nos a concluir que o princípio da anterioridade tributária se aplica às leis que instituem e majoram multas fiscais.


9. O Poder Judiciário e a revisão dos limites de aplicação das multas fiscais.

A nosso juízo, deve ser editada lei complementar que regula a questão, nos termos do art. 146, II, da Constituição. Contudo, enquanto não discutida a aludida lei, a melhor solução para eventuais extrapolações na imposição de penalidades tributárias é a possibilidade que o devedor tem de se socorrer ao Poder Judiciário com o objetivo de reduzir e adequar as multas a percentuais razoáveis, dentro dos limites ao poder de tributar.

Heron Arzua e Dirceu Galdino(42) assim esclarecem a questão:

"De há muito se reconhece ao Poder Judiciário o direito de excluir ou mitigar a multa fiscal imposta pela autoridade administrativa (STF in RTJ 44/661; TACSP, in RT 372/276, 390/269 e 414/236). É facultado ao Poder Judiciário, atendendo à circunstância do caso concreto, reduzir multa excessiva aplicada pelo Fisco (STF, RE 82.150-SP, 2a T., in RTJ 78/610)."

Dessa forma, não há dúvidas que os percentuais de multas fiscais impostos podem ser revistos pelo Poder Judiciário, já que nenhuma lesão ou ameaça de lesão à direito escapará do controle judicial, que detém amplos poderes para adequar, no caso concreto, a limitação ao poder de impor multas aos princípios constitucionais ou, em controle abstrato, retirar do ordenamento norma que imponha multa fiscal inconstitucional(43).

Nesse sentido, esperamos que o Poder Judiciário interceda com vistas a fazer restabelecer a correta gradação das multas fiscais.


10. Conlcusão

Podemos alinhar algumas conclusões:

1. Ponderamos a necessidade de uma proposta legislativa com o fito de abrir a discussão sobre a importância da positivação dos limites de gradação das multas fiscais segundo critérios justos e que tenham como parâmetro o grau de sonegabilidade do tributo, possibilitando que as multas sejam maiores quantas forem as possibilidades de fraudes fiscais, evitando-se aplicação de multas abusivas, que impedem que o contribuinte, com reais dificuldades financeiras, tenha a possibilidade de adimplir suas dívidas.

2. As limitações constitucionais ao Poder de Tributar se aplicam às leis e procedimentos que impõem multas fiscais, devendo o legislador e o Fisco atentarem que as multas têm como limite formal os princípios constitucionais tributários.

3. As leis que estabelecem multas abusivas podem ser questionadas e declaradas inconstitucionais em face dos princípios da razoabilidade das leis, do não-confisco, da capacidade contributiva, da legalidade, da irretroatividade das lei e da anterioridade, e outros.

4. A aplicação de multas progressivas no tempo é inconstitucional, em face de que não se admite a exacerbação de penalidades no tempo, salientando-se que os juros são o instituto que variam, em razão do período de atraso, para recompor o patrimônio.

5. Por fim, esperamos que o trabalho tenha contribuído de alguma forma para que a matéria seja mais estudada. Dessa forma, muito mais que a concordância com o que foi estabelecido, esperamos as críticas, que representam a melhor forma de evolução das idéias, uma vez que o assunto é importante e merece uma maior atenção por parte dos doutrinadores e do legislador.


Notas

1. COÊLHO, Sacha Calmon Navarro; DERZI, Misabel Abreu Machado. "Da inexigibilidade das multas fiscais em regime de concordata", in Revista dos Procuradores da Fazenda Nacional, ano 1, nº 1, janeiro de 1997, pp. 63-112, p. 102.

2. NARAHASHI, Mitsuo. "Multa de mora em obrigação tributária", in Revista Dialética de Direito Tributário, nº 13, outubro de 1996, pp. 55-63, p. 63.

3. FONROUGE, Carlos M. Giuliani. Derecho financeiro. 2a ed., Buenos Aires, Ediciones Depalma, vol. II, pp. 714-715.

4. BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do direito tributário. 2a ed., São Paulo: Saraiva, 1972, p. 3.

5. KÖMEL, Pária Andrade. "A sanção penal", in Revista do curso de direito da universidade federal de Uberlândia, nº 1 /2, vol. 25, dezembro de 1996, pp. 193-252, p. 239.

6. NOGUEIRA, Barbosa Nogueira. "Barbarismo, poder e "direito" de tributar", in Direito Tributário Atual, ano 1987/1988, vol. 7/8, pp. 2061-2062, 2062.

7. COSTA, Ramon Valdes Costa; BLENGIO, Nelly Valdes de; ARECO, Sayagues Eduardo. Codigo tributario de la Republica Oriental del Uruguay concordado y anotado. Montevideo: Ediciones Jurídicas Amalio M. Fernandes, 1976, p. 335.

8. GUEDES, J. Rildo Medeiros. "Correção monetária do ICM dos municípios", in Revista de Administração Municipal, ano XXIIIX, nº 135, março/abril de 1976, pp. 54-64, p. 61.

9. CARVALHO, José Orlando Rocha. "Multa e o injustificável arbítrio do poder fiscal", in Revista de Estudos Tributários, ano I, nº 6, março/abril de 1999, pp. 30-45, p.32.

10. FERNANDES, Amador Outerelo. "O problema da correção monetária da multa", in Revista do Tribunais, ano 64, novembro de 1975, volume 481, pp. 32-43, p.36.

11. Idem, ibidem, p.37.

12. SPISSO, Rodolfo. Derecho constitucional tributario. Buenos Aires: Ediciones Delpalma, 1993, pp. 281-282.

13. WAGNER, José Carlos Graça. "Penalidades e acréscimos na legislação tributária", in Caderno de Pesquisas Tributárias, vol., 2a tiragem, 1990, pp. 325-336, p. 329.

14. SPISSO, Rodolfo. Derecho constitucional tributario. Buenos Aires: Ediciones Delpalma, 1993, p. 282.

15. LUNARDELLI, Pedro Guilherme Accorsi. "O depósito administrativo fiscal e a violação ao princípios da razoabilidade e proporcionalidade", in Revista Dialética de Direito Tributário, nº 58, março de 2000, pp. 75-81, p. 75.

16. MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade. São Paulo: Celso Bastos Editor, 1998, p. 39-40.

17. MENDES, Gilmar Ferreira. " O princípio da proporcionalidade na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal: novas leituras", in Repertório IOB de Jurisprudência, nº 14, caderno 2, 2a quinzena de julho de 2000, pp. 361-372, p. 371.

18. Idem, ibidem, p. 370.

19. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 18.331, Relator Orosimbo Nonato, publicado no DJU de 10/08/53.

20. CASSONE, Vittorio. "Confisco em matéria tributária", in Repertório IOB de Jurisprudência, nº 6, caderno 1, 2a quinzena de março de 2000, pp. 149-153, p. 153.

21. YAMASHITA, Douglas. Confisco como efeito tributário e sua proibição constitucional", in Repertório IOB de Jurisprudência, nº 6, caderno 1, 2a quinzena de março de 2000, pp. 258-268, p. 259.

22. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1075–1/DF, Relator Ministro Celso de Mello, data de Julgamento da Liminar no Plenário em 17.06.1998, acórdão pendente de julgamento.

23. YAMASHITA, Douglas. "Confisco como efeito tributário e sua proibição constitucional" in Repertório IOB de Jurisprudência, nº 6, caderno 1, 2a quinzena de março de 2000, nº 6, pp. 258-268, p. 264-265.

24. SPISSO, Rodolfo. Derecho constitucional tributario. Buenos Aires: Ediciones Delpalma, 1993, p. 242.

25. AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 3a ed., São Paulo: Saraiva, 1998, p. 134.

26. CARRAZA, Roque Antônio. Curso de direito constitucional tributário. 8a ed., São Paulo: Malheiros, 1996, p. 60.

27. SPISSO, Rodolfo. Derecho constitucional tributario. Buenos Aires: Ediciones Delpalma, 1993, p. 189.

28. MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 12a ed., São Paulo: Malheiros, 1997, p. 28.

29. SPISSO, Rodolfo. Derecho constitucional tributario. Buenos Aires: Ediciones Delpalma, 1993, p. 187.

30. MACHADO, Hugo de Brito, Curso de direito tributário. 12a ed., São Paulo: Malheiros, 1997, p. 28.

31. SPISSO, Rodolfo. Op. cit., p. 188.

32. LIMA, Reginaldo Ferreira. Direito cooperativo tributário. São Paulo: Max Limonad, 1997, p. 43.

33. CARRAZA, Roque Antônio. Curso de direito constitucional tributário. 8a ed., São Paulo: Malheiros, 1996, p. 270.

34. CARRAZA, Roque Antônio, op. cit., p. 176.

35. SPISSO, Rodolfo. Derecho constitucional tributario. Buenos Aires: Ediciones Delpalma, 1993, p. 227.

36. KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. 6a ed., São Paulo: Martins Fontes, 1999, p. 11.

37. Idem, ibidem, p. 14.

38. AMARO, Luciano. "Dedutibilidade de multas fiscais por infração", in Revista de Imposto de Renda, ano XXII, nº 133, agosto de 1978, pp. 8-12, p. 9.

39. Há comentário nosso, em sentido contrário ao autor, advogando que as multas fiscais não tem natureza compensatória e sim punitiva.

40. Art. 150, III, b, da Constituição Federal: é vedado cobrar tributos: "no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou."

41. MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 12a ed., São Paulo: Malheiros, 1997, p. 29.

42. ARZUA, Heron; GALDINO, DIRCEU. " As multas fiscais e o Poder Judiciário", in Revista Dialética de Direito Tributário, nº 20, maio de 1997, pp. 35-40, p. 35.

43. Ver ADIN 1075 – 1, origem: Distrito Federal, Relator Ministro Celso de Mello. partes requerentes: Confederação Nacional do Comercio – CNC requerido: Presidente da República Congresso Nacional. data de julgamento da liminar plenário, 17.06.1998. Liminar pendente de publicação.


Bibliografia.

1. livros.

AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 3a ed., São Paulo: Saraiva, 1998, p. 134.

BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do direito tributário. 2a ed., São Paulo: Saraiva, 1972.

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MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade. São Paulo: Celso Bastos Editor, 1998.

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2. artigos

AMARO, Luciano. "Dedutibilidade de multas fiscais por infração", in Revista de Imposto de Renda, ano XXII, nº 133, agosto de 1978, pp. 8-12, p. 9.

ARZUA, Heron; GALDINO, DIRCEU. " As multas fiscais e o Poder Judiciário", in Revista Dialética de Direito Tributário, nº 20, maio de 1997, pp. 35-40, p. 35.

CARVALHO, José Orlando Rocha. "Multa e o injustificável arbítrio do poder fiscal", in Revista de Estudos Tributários, ano I, nº 6, março/abril de 1999, pp. 30-45, p.32.

CASSONE, Vittorio. "Confisco em matéria tributária", in Repertório IOB de Jurisprudência, nº 6, caderno 1, 2a quinzena de março de 2000, pp. 149-153, p. 153.

COÊLHO, Sacha Calmon Navarro; DERZI, Misabel Abreu Machado. "Da inexigibilidade das multas fiscais em regime de concordata", in Revista dos Procuradores da Fazenda Nacional, ano 1, nº 1, janeiro de 1997, pp. 63-112, p. 102.

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KÖMEL, Pária Andrade. "A sanção penal", in Revista do curso de direito da universidade federal de Uberlândia, nº 1 /2, vol. 25, dezembro de 1996, pp. 193-252, p. 239.

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MENDES, Gilmar Ferreira. " O princípio da proporcionalidade na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal: novas leituras", in Repertório IOB de Jurisprudência, nº 14, caderno 2, 2a quinzena de julho de 2000, pp. 361-372, p. 371.

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NOGUEIRA, Barbosa Nogueira. "Barbarismo, poder e "direito" de tributar", in Direito Tributário Atual, ano 1987/1988, vol. 7/8, pp. 2061-2062, 2062.

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3. Jurisprudência

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 18.331, Relator Orosimbo Nonato, publicado no DJU de 10/08/53.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1075–1/DF, Relator Ministro Celso de Mello, data de Julgamento da Liminar no Plenário em 17.06.1998, acórdão pendente de julgamento.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FARÁG, Cláudio Renato do Canto. As limitações constitucionais ao poder de tributar e sua aplicabilidade às multas fiscais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 6, n. 51, 1 out. 2001. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2170. Acesso em: 20 abr. 2024.