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Racionalidade do processo de solução de colisões entre direitos fundamentais à luz da análise econômica do direito

Racionalidade do processo de solução de colisões entre direitos fundamentais à luz da análise econômica do direito

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A análise econômica do direito constitui-se num instrumental para a racionalização das decisões sobre colisões entre direitos fundamentais, oferecendo de dados empíricos, objetivos, aptos a estimular a adoção de práticas eficientes, que maximizem a utilidade maior buscada pelo direito – a justiça

RESUMO

Esta monografia tem como objetivo principal analisar e discutir o papel da análise econômica do direito no aperfeiçoamento da solução de colisões entre direitos fundamentais, partindo do referencial teórico da Teoria dos Direitos Fundamentais de Robert Alexy. Nesse sentido, defende que o correto manejo dos instrumentos postos à disposição do direito por aquela sorte de análise permite aferir mais precisamente as decisões nessa seara, o que fomenta a busca de maior racionalidade e eficiência nas decisões jurídicas. Para tanto, faz um exame da distinção entre regras e princípios, relevante em virtude da natureza principiológica básica dos direitos fundamentais. Destaca que princípios devem ser encarados como mandamentos de otimização, ou seja, normas que estabelecem que algo deve ser realizado na maior medida possível, condicionados a circunstâncias fáticas e aos efeitos dos demais princípios. Como decorrência, naturalmente entram em colisão, de modo que, para a definição do princípio preponderante em cada caso, devem ser adotadas as ideias de proporcionalidade e sopesamento num procedimento racional e fundamentado de argumentação jurídica, o que, constata-se, não é comumente observado pelo Supremo Tribunal Federal. Em seguida, busca-se compreender os contornos básicos da análise econômica do direito, situando seu surgimento num contexto histórico e filosófico, para ressaltar a importância dessa forma de interação entre a economia e o direito que gera benefícios para o desenvolvimento de ambas as ciências. No caso do direito, a utilização de um ferramental disponibilizado pela economia permite-o balizar-se pela eficiência, entendida como uma situação em que não há desperdícios, o que é essencial para a qualificação de tal situação como justa. Para melhor compreensão, são abordados alguns postulados econômicos básicos para, por fim, esclarecer o papel da análise econômica do direito no aperfeiçoamento da aplicação prática da máxima da eficiência como critério balizador da ponderação entre direitos fundamentais, com vistas a revalorizar a máxima da proporcionalidade e a conferir uma maior racionalidade ao discurso jurídico.

Palavras-chave: Direitos Fundamentais. Normas. Princípios. Regras. Colisão. Ponderação. Análise Econômica do Direito. Escolha racional. Utilidade. Equilíbrio. Custos de oportunidade. Externalidades. Proporcionalidade. Eficiência. Justiça.


SUMÁRIO: 1 INTRODUÇÃO. 2 DIREITOS FUNDAMENTAIS ENTRE REGRAS E PRINCÍPIOS. 2.1 PRINCÍPIOS E REGRAS NA CONCEPÇÃO DE ROBERT ALEXY. 2.2CRITÉRIOS PARA SOLUÇÃO DA COLISÃO ENTRE PRINCÍPIOS. 2.3 MÁXIMA DA PROPORCIONALIDADE. 2.4 SOPESAMENTO: ENTRE A TEORIA E A PRÁTICA. 3 A ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO. 3.1 CONTEXTUALIZAÇÃO. 3.2 FUNDAMENTOS da ECONOMIA. 3.3 DIMENSÕES. 3.4 POSTULADOS BÁSICOS. 3.4.1 Escolha Racional. 3.4.2 Utilidade. 3.4.3 Equilíbrio e Eficiência. 3.4.4 Custos de oportunidade. 3.4.5 Externalidades. 4 O PAPEL DA ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO NA PONDERAÇÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS. 4.1 MÁXIMA DA EFICIÊNCIA COMO CRITÉRIO DE PONDERAÇÃO ENTRE DIREITOS FUNDAMENTAIS. 4.2REVALORIZAÇÃO PRÁTICA DA MÁXIMA DA PROPORCIONALIDADE À LUZ DA ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO. 4.2.1 Adequação. 4.2.2 Necessidade. 4.2.3 Proporcionalidade em Sentido Estrito. 5 CONCLUSÕES. REFERÊNCIAS. 


1.INTRODUÇÃO

É inegável que, no atual estágio do Estado Democrático de Direito, direitos e garantias fundamentais passam a ocupar lugar cimeiro no ordenamento jurídico. Tais previsões inspiram a interpretação de todo o ordenamento jurídico, constituindo verdadeiras vigas-mestras da nossa sociedade.

Hodiernamente, é pacífico o entendimento no sentido da natureza principiológica dos direitos fundamentais. Tal concepção é tomada por um dado da realidade, controvertendo os pensadores do direito basicamente, apenas sobre aspectos daí decorrentes, como a correta identificação de quais direitos merecem o qualificativo de fundamentais, seus limites e sua efetivação.

Uma decorrência relevante de tal constatação é o reconhecimento de que, como princípios, tais direitos naturamente entram em colisão diante de conflitos de interesses, naturais numa vida em sociedade. Desta forma, princípios – e, portanto, direitos fundamentais – limitam-se mutuamente. Uma das dificuldades que surge dessa constatação consiste em aferir, em concreto, diante de cada conflito de interesses apresentado, qual ou quais direitos devem prevalecer, e em que medida, tendo em vista a tensão dialética entre a necessidade de garantir e efetivar ao máximo tais direitos e a inexorabilidade da restrição a um direito fundamental em virtude da maximização do direito fundamental contraposto.

Uma das teorias mais completas e festejadas acerca do tema é aquela cunhada por Robert Alexy, a partir de sua obra seminal Teoria dos Direitos Fundamentais. Nela, aborda-se, logo em seus capítulos iniciais, a questão da necessidade da identificação e adoção de uma solução racional para tais colisões entre princípios, de modo a atingir o máximo de efetividade de todo o sistema de direitos e garantias que possuam a nota da fundamentalidade. Nesse sentido, ele elabora sua tese acerca da necessidade de sopesamento entre princípios, o qual deve ser promovido à luz de uma argumentação jurídica cuidadosa, racionalmente fundamentada, a fim de evitar que decisões acerca de direitos fundamentais e suas colisões ocorram de forma arbitrária, no que ele nominou de decisionismo.

Lamentavelmente, a prática jurídica cotidiana revela que a jurisprudência pátria, notadamente a levada a efeito pelo Supremo Tribunal Federal, apesar de adotar com entusiasmo os critérios propostos por Alexy, olvidam essa última advertência do jurista alemão acerca da necessidade de fundamentação racional dos juízos de ponderação, com o que se prejudica um dos magnos propósitos de sua obra, que é justamente conferir mais segurança e previsibilidade das decisões judiciais que envolvam tais colisões.

Assim, considerando sua projeção e recepção entre os juristas pátrios, adotar-se-á, como ponto de partida, a teoria alexyana acerca das normas de direitos fundamentais, para investigar acerca de sua proposta de sopesamento entre princípios colidentes. Buscar-se-á identificar as insuficiências na utilização prática de suas ideias, para, em seguida, propor um novo método apto a conferir maior objetividade às ponderações realizadas nesse âmbito, utilizando-se, para tanto, do instrumental disponibilizado pela análise econômica do direito.É um ramo de investigação ainda pouco difundido no Brasil,que prega a necessidade de interação entre o direito e a economia. Visa trazer maior eficiência às decisões, o que permitirá maximizar – para já introduzir um termo do jargão econômico – as utilidades decorrentes da concretização dos direitos fundamentais, o que significa efetivá-lo na maior medida possível em face das limitações fáticas e jurídicas que lhe são inerentes.

Com este propósito, este trabalho constará de cinco capítulos, sendo esta introdução o primeiro. No segundo, será traçado um panorama das ideias de Alexy, em cotejo com as de Ronald Dworkin, acerca das normas jurídicas e sua especialização entre regras e princípios, para, constatando a inexorabilidade da colisão entre os últimos, analisar os critérios por ele propostos para uma solução racional. Abordará ainda o papel da proporcionalidade nessas sendas, para, em sequência, identificar a insuficiência prática da aplicação de suas idéias no judiciário nacional, tomando como paradigma decisões do Supremo Tribunal Federal.

No terceiro, serão fixados os contornos da análise econômica do direito, a partir de sua contextualização histórica e filosófica. Considerando que é essencial para o jurista familiarizar-se com alguns conceitos econômicos, a fim de se desfazerem preconceitos quanto a tal empresa, serão delineados os principais postulados da ciência econômica, a fim de permitir a compreensão dos benefícios que trará uma interação entre o direito e a economia.

No quarto capítulo, será tratado especificamente da aplicação da análise econômica do direito para o aperfeiçoamento dos critérios de ponderação entre direitos fundamentais, propondo-se ser este um caminho mediante o qual se logrará mais facilmente atingir a eficiência que, como se demonstrará, é essencial para o atingimento do valor maior do direito, a justiça.Por fim, virá a conclusão, sintetizando as principais ideias expostas ao longo do trabalho.


2DIREITOS FUNDAMENTAIS ENTRE REGRAS E PRINCÍPIOS

A Teoria dos Direitos Fundamentais, do jusfilósofo alemão Robert Alexy, publicada originalmente em 1985, ganhou notoriedade mundial como uma das obras mais influentes sobre o tema. Sua tese principal postula que as normas de direitos fundamentais possuem eminentemente caráter principiológico– do que decorre toda a sua explanação posterior –,o que vai culminar na necessidade de sopesamento quando direitos fundamentais, em concreto, entram em conflito[1].

Para Alexy, “não faltam indícios de que a distinção entre regras e princípios desempenham um papel fundamental no contexto dos direitos fundamentais”[2]. Mas reconhece que “o que falta é uma distinção precisa entre regras e princípios e uma utilização sistemática dessa distinção”[3], o que vai de encontro à clareza conceitual, ausência de contradição e coerência, pressupostos básicos de racionalidade de toda ciência[4]. Dessa forma,logo no início de sua obra (no capítulo II, para ser exato) ele se dedica a cunhar sua visão acerca do tema.

Ele deixa clara a relevância da distinção[5]:

Para a teoria dos direitos fundamentais, a mais importante delas [das diferenciações teorético-estruturais da norma de direito fundamental] é a distinção entre regras e princípios. Essa distinção é a base da teoria da fundamentação no âmbito dos direitos fundamentais e uma chave para a solução de problemas centrais da dogmática dos direitos fundamentais. [...] Nesse sentido, a distinção entre regras e princípios é uma das colunas-mestras do edifício da teoria dos direitos fundamentais.

Para bem compreender a ideação de Robert Alexy acerca da distinção entre regras e princípios no contexto dos direitos fundamentais, é relevante abordar alguns aspectos da teorização de Ronald Dworkin, tendo em vista que foi a partir de suas ideias que o debate contemporâneo acerca de regras e princípios ganhou relevo. Ademais, a doutrina do alemão acerca do tema compartilha boa parte da concepção do americano, sobre a qual construiu a parte mais abrangente de sua teoria dos direitos fundamentais.

Em que pese o tema da definição das espécies normativas já remonte a vários autores[6], foiDworkin que, contemporaneamente, visou definir fronteiras nítidas entre as duas espécies normativas, antes fugidias. Seu propósito, francamente declarado, era opor-se ao positivismo, tomando por parâmetro a obra de Hart, considerada “poderosa” não apenas por causa de sua clareza e elegância, mas também porque considerações sobre sua teoria devem ser ponto de partida de qualquer pensamento da filosofia jurídica[7]. Nesse sentido, aduziu[8]:

I want to make a general attack on positivism, and I shall use H.L.A. Hart’s version as a target, when a particular target is needed. My strategy will be organized around the fact that when lawyers reason or dispute about legal rights and obligations, particularly in those hard cases when our problems with these concepts seem most acute, they make use of standards that do not function as rules, but operate differently as principles, policies, and other sort of standards. Positivism, I shall argue, is a model of and for a system of rules, and its central notion of a single fundamental test for law forces us to miss the important roles of these standards that are not rules.

Dworkin identifica três teses básicas do positivismo[9], que podem ser assim resumidas: a) regras não são identificadas como tal por seu conteúdo, mas por seu pedigree, ou seja, pela maneira como são adotadas ou desenvolvidas, de modo a identificar as regras válidas e distingui-las das inválidas e das não-jurídicas; b) o direito é um catálogo exaustivo de regras, de modo que se um caso não for contemplado por nenhuma regra, cabe a uma autoridade, como um juiz, decidir discricionariamente, caso em que este vai além da lei para criar uma nova regra ou suplementar uma existente; c) obrigações jurídicas e direitos só existem em razão das regras[10].

Assim, segundo seu entendimento, o modelo de regras e princípios têm as seguintes características: a) sistemas jurídicos são compostos de regras e princípios (além de “políticas” e “outros padrões”); b) os juízes não têm margem de discricionariedade na decisão, salvo nos casos difíceis (hard cases); c) juízes não criam direitos com as decisões, apenas fixam direitos já existentes[11].

Para Dworkin, regras e princípios diferenciam-se no sentido de que as regras são aplicáveis à moda do tudo-ou-nada(all-or-nothing fashion), ou seja, preenchidos os pressupostos para sua aplicação, ou ela é válida, e se a aplica, ou é inválida, e não é o caso de mantê-la no ordenamento jurídico. Já os princípios não determinam absolutamente a decisão, mas contêm fundamentos a ser conjugados com os decorrentes de outros princípios. Isto significa dizer que princípios têm uma dimensão de peso: em caso de conflito, o princípio com peso relativo maior se sobrepõe ao outro, sem torná-lo inválido. São suas palavras[12]:

The difference between legal principles and legal rules is a logical distinction. Both sets of standards point to particular decisions about legal obligation in particular circumstances, but they differ in the character of the direction they give. Rules are applicable in an all-or-nothing fashion. If the facts a rule stipulates are given, then either the rule is valid, in which case the answer it supplies must be accepted, or it is not, in which case it contributes nothing to the decision.

[…]

Principles have a dimension that rules do not - the dimension of weight

or importance. When principles intersect […], one who must resolve the conflict has to take into account the relative weight of each.

Do exposto, observa-se que, para Dworkin, existe uma diferenciação baseada em uma estrutura lógica, entre regras e princípios. Embora Alexy parta da distinção cunhada pelo americano, com ele compartilhando parte das conclusões, dele se aparta quanto aos desdobramentos dessa teoria. Não se abordará aqui tais desdobramentos, pois os pontos apresentados são suficientes para o propósitos deste trabalho[13].

2.1 PRINCÍPIOS E REGRAS NA CONCEPÇÃO DE ROBERT ALEXY

Embora o conceito de normas jurídicas seja essencial para o Direito, sua conceituação não é fácil, nem isenta de controvérsias. Contudo, considerando que a presente exposição é lastreada na concepção alexyana, examinar-se-á basicamente o seu conceito de norma, identificado como semântico. Nesse sentido, Alexy parte da já tradicional distinção entre norma e enunciado normativo, considerado este como a expressão textual daquela[14]. Nesse sentido,“norma é, portanto, o significado de um enunciado normativo”[15].

Quando um enunciado normativo utiliza-se, em sua formulação, dos modais deônticos (permitido, proibido, obrigado), diz-se que se está diante de um enunciado deôntico, “o último estágio antes da apresentação da estrutura lógica das normas por meio de uma linguagem baseada em fórmulas”[16]. Assim, norma seria toda prescrição que pudesse ser expressa como enunciado deôntico.

Com essa concepção, a teoria de Alexy logra unificar, sob o conceito genérico de norma, as espécies regra e princípio, eis que ambos podem ser formulados como enunciados deônticos. Em suas palavras[17]:

Tanto regras quanto princípios são normas, porque ambos dizem o que deve ser. Ambos podem ser formulados por meio das expressões deônticas básicas do dever, da permissão e da proibição. Princípios são, tanto quanto as regras, razões para juízos concretos de dever-ser, ainda que de espécie muito diferente. A distinção entre regras e princípios é, portanto, uma distinção entre duas espécies de norma.

Contudo, tais espécies normativas guardam relevantes peculiaridades, pelo que “essa distinção é a base da teoria da fundamentação no âmbito dos direitos fundamentais e uma chave para a solução de problemas centrais da dogmática dos direitos fundamentais”[18].

Alexy rejeita as concepções anteriores sobre a distinção entelada[19], defendendo que princípios são mandados de otimização, ou seja, “são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível dentro das possibilidades jurídicas e fáticas existentes”[20]. Podem, pois, ser satisfeitos em graus variados, em virtude não só dos fatos (possibilidades fáticas), mas também dos princípios jurídicos e regras colidentes (possibilidades jurídicas).

Para conceituar regras, por sua vez, Alexy não discrepa do entendimento de Dworkin, acima referido. Para ele, “regras são normas que são sempre satisfeitas ou não são satisfeitas. Se uma regra vale, deve-se fazer exatamente aquilo que ela exige; nem mais, nem menos”[21].

2.2    CRITÉRIOS PARA SOLUÇÃO DA COLISÃO ENTRE PRINCÍPIOS

Atualmente, já é fartamente aceito que as normas definidoras de direitos fundamentais ostentam caráter marcadamente principiológico. Mesmo as regras de direitos fundamentais, em seu entender, ostentam um caráter duplo, se forem construídas de forma a contemplar, na sua própria estrutura, uma cláusula restritivacom a estrutura de princípios (relativa à primazia de princípios colidentes), caso em que estará sujeita a sopesamentos[22].

 Dessa constatação, decorrem inúmeras consequências relevantes, dentre as quais, a necessidade de ponderaçãoentre princípios quando, em um dado caso concreto, há um conflito entre eles. Contudo, apesar de aceita tal ideação, ainda reina controvérsia acerca da forma como tal ponderação pode ser racionalmente realizada.

A solução de um conflito entre regras implica que, ou se estabelece uma exceção a uma das regras, de modo a afastar a situação fática de sua incidência, ou se declara a invalidade de pelo menos uma das normas em conflito – o que trará como consequência sua expulsão do ordenamento jurídico. Isto porque, ao contrário dos princípios, o juízo sobre a validade de uma regra não é graduável, uma vez que não se admitem dois juízos concretos de dever-ser contraditórios entre si[23].

A forma pela qual esse conflito será dirimido não é relevante para a sua caracterização como regra. Assim, podem ser usados os critérios clássicos da cronologia, especialidade ou hierarquia, ou da importância das regras em conflito; o que é imprescindível é que seja decidida qual regra permanece, e qual deve ser declarada inválida.

A seu turno, a colisão entre princípios é solucionada de forma inteiramente diversa. Em situações tais, um dos princípios terá que ceder, diante das circunstâncias do caso concreto. Daí afirmar-se que “um dos princípios tem precedência em face do outro sob determinadas condições. Sob outras condições, a questão da precedência pode ser resolvida de forma oposta”[24]. A partir da identificação das condições sob as quais determinado princípio tem “mais peso” do que outro – os quais, a priori, estão no mesmo nível –pode-se extrair uma regra. Essa operação é regida pela lei de colisão.

As condições acima mencionadas constituirão os fatos sob os quais um dos princípios prevalecerá sobre o outro. Dessa forma, conclui-se que tais condições correspondem ao suporte fático de uma regra, a expressar a relação de precedência entre os princípios em conflito. Assim, utilizando-se da formulação lógica de Alexy, se sob as condições C­1 o princípio P1 tem mais peso que P2, sob as condições C2 é possível que P2 tenha a preferência[25].

Essa é a chamada lei de colisão, expressa, nas palavras de Alexy, como “as condições sob as quais um princípio tem precedência em face de outro constituem o suporte fático de uma regra que expressa a consequência jurídica do princípio que tem precedência”[26].

Tratando-se os princípios envolvidos de normas de direito fundamental, então as regras derivadas da lei de colisão são consideradas normas de direito fundamental atribuídas[27], pois possuem fundamentação diretamente referida a direitos fundamentais. Diante disso, “como resultado de todo sopesamento que seja correto do ponto de vista dos direitos fundamentais pode ser formulada uma norma de direito fundamental atribuída, que tem estrutura de uma regra e à qual o caso pode ser subsumido”[28].

Compreendido que a relação de preferência entre princípios, ao contrário das regras, somente pode ser aferida diante das condições de preferência, à luz do caso concreto posto à apreciação, cumpre examinar agora o procedimento pelo qual se analisam tais condições e os princípios envolvidos. A esse momento, tem lugar a análise da máxima da proporcionalidade, que tem por escopo racionalizar tal processo de sopesamento.

2.3 MÁXIMA DA PROPORCIONALIDADE

A proporcionalidade[29], que tem íntima conexão com a teoria dos princípios, pois decorre da própria natureza dessa espécie normativa, é constituída a partir de três máximas parciais e possui uma estrutura de aplicação racionalmente definida, segundo uma ordem pré-determinada: a análise da adequação precede a da necessidade, que, por sua vez, precede a da proporcionalidade em sentido estrito. É justamente nessa subsidiariedade que reside a razão de ser da divisão em máximas parciais[30].

Na lição de Humberto Ávila, a adequação “exige uma relação empírica entre o meio e o fim: o meio deve levar à realização do fim”[31]. Virgílio Afonso da Silva, por sua vez, complementa essa ideia, acrescentando queadequado “não é somente o meio com cuja utilização um objetivo é alcançado, mas também o meio com cuja utilização a realização de um objetivo é fomentada, promovida, ainda que o objetivo não seja completamente realizado”[32]. Assim, “uma medida somente pode ser considerada inadequada se sua utilização não contribuir em nada para fomentar a realização do objetivo pretendido”[33].

A necessidade pode ser conceituada como a impossibilidade de promoção do objetivo pretendido, com a mesma intensidade, por meio de outro ato que limite, em menor medida, o direito fundamental atingido[34].

Por fim, a proporcionalidade em sentido estrito impõe “um sopesamento entre a intensidade da restrição ao direito fundamental atingido e a importância da realização do direito fundamental que com ele colide e que fundamenta a adoção da medida restritiva”[35]. Em outras palavras, “o exame da proporcionalidade em sentido estrito exige a comparação entre a importância da realização do fim e a intensidade da restrição aos direitos fundamentais”[36]. Para que uma medida seja considerada desproporcional em sentido estrito, “basta que os motivos que fundamentam a adoção da medida não tenham peso suficiente para justificar a restrição ao direito fundamental atingido”[37].

Alexy constata, com razão, que os exames da adequação e da necessidade referem-se aos pressupostos fáticos de aplicação da norma[38], ou seja,“decorrem da natureza dos princípios como mandamentos de otimização em face das possibilidades fáticas”[39]. Isto porque, como visto, tais análises sempre exigirão apreciação das circunstâncias de fato, a fim de aferir as consequências e custos da decisão e das potenciais alternativas.

Já o exame da proporcionalidade em sentido estrito decorre da relativização em face das possibilidades jurídicas, é saber, envolve uma análise da norma (princípio) que fundamenta a decisão em face das normas (princípios) colidentes, num exame tipicamente deontológico.

Virgílio Afonso da Silva diagnostica bem essa relação[40]:

Qual é a relação entre a otimização diante das possibilidades fáticas e a regra da proporcionalidade? As possibilidades fáticas dizem respeito às medidas concretas que podem ser utilizadas para o fomento e a proteção de direitos fundamentais. Se para o fomento do princípio P1, há duas medidas estatais, M1 e M2 que são igualmente adequadas para esse fim, mas M1 restringe um outro direito fundamental P2, é de se admitir que a otimização desse princípio P2 exija que seja empregada a medida M2. Essa conseqüência da otimização de P2 em relação às possibilidades fáticas presentes nada mais é do que a já analisada sub-regra da necessidade.

Já o exame da terceira sub-regra – a proporcionalidade em sentido estrito – nada mais é do que um mandamento de ponderação ou sopesamento [...]. Quando dois ou mais direitos fundamentais colidem, a realização de cada um deles depende do grau de realização dos demais e o sopesamento entre eles busca atingir um grau ótimo de realização para todos. A otimização de um direito fundamental, nesse caso, vai depender das possibilidades jurídicas presentes, isto é, do resultado do sopesamento entre os princípios colidentes, que nada mais é do que a sub-regra da proporcionalidade em sentido estrito.

Ao se qualificar os princípios como normas que pressupõem ponderação, diante do caso concreto, para se aferir qual possui mais peso, a máxima da proporcionalidade surge como mecanismo natural para tal aferição, decorrendo da própria estrutura dos direitos fundamentais. “A análise da proporcionalidade é justamente a maneira de se aplicar esse dever de otimização ao caso concreto. E por isso que se diz que a regra da proporcionalidade e o dever de otimização guardam uma relação de mútua implicação”[41].

Interessante notar, por oportuno, que a racionalidade do processo de sopesamento, na visão de Alexy, está condicionada à fundamentação da decisão. Comessa ideia, ele busca refutar as críticas dos que imputam à sua teoria a pecha de modelo aberto e irracional.

Expressamente, ele reconhece que “se o sopesamento se resumisse à formulação de um tal enunciado de preferências e, com isso, à determinação da regra relacionada ao caso – que decorre desse enunciado –, o sopesamento, de fato, não representaria um procedimento racional”[42]. Para ele, tal seria um modelo decisionista, que não se pode confundir com o modelo fundamentado que ele propõe.

O modelo fundamentado, ainda em suas palavras[43],

distingue entre o processo psíquico que conduz à definição do enunciado de preferência e sua fundamentação. Essa diferenciação permite ligar o postulado da racionalidade do sopesamentoà fundamentação do enunciado de preferência e afirmar: um sopesamento é racional quando o enunciado de preferência, ao qual ele conduz, pode ser fundamentado de forma racional.

Ou seja, Alexy desloca o problema da racionalidade do sopesamento para a fundamentação racional dos enunciados das regras de direito fundamental atribuídas que estabelecem a preferência condicionada entre princípios colidentes. Tal fundamentação deve basear-se no que ele chama de lei do sopesamento, assim enunciada: “quanto maior for o grau de não-afetação ou de afetação de um princípio, tanto maior terá que ser a importância da satisfação do outro”[44].

Assim, conclui ele que[45]:

Ainda que o sopesamento em si não estabeleça um parâmetro com o auxílio do qual os casos possam ser decididos de forma definitiva, o modelo de sopesamento como um todo oferece um critério, ao associar a lei de colisão à teoria da argumentação jurídica racional. A lei de colisão diz o que deve ser fundamentado de forma racional. Nesse sentido, não se pode dizer que ela nada diz e que é, portanto, uma fórmula vazia. A recorrente objeção do irracionalismo já foi refutada (grifos no original).

Veja-se como Alexy insiste em afirmar que a racionalidade de sua proposta repousa na coerente fundamentação da regra que estabelece a preferência condicionada de um princípio em face do princípio colidente. Interpretando, pois, a contrario sensu, suas palavras, é forçoso reconhecer que em sua obra encontram-se elementos para tachar de irracionais decisões, que, a pretexto de aplicar a técnica do sopesamento, não logram fundamentar-se coerentemente, à luz de sólida argumentação jurídica, em face dos condicionantes fáticos e jurídicos do caso posto à decisão.

2.4 SOPESAMENTO: ENTRE A TEORIA E A PRÁTICA

Lamentavelmente, sói acontecer no Brasil a prolação de decisões que olvidam essa passagem da teoria alexyana, em algo que se pode identificar como uma adoção mutilada da sua teoria dos direitos fundamentais. Já é arraigada a consciência nos tribunais pátrios das grandes linhas da teoria de Alexy, ou seja, que direitos fundamentais têm natureza principiológica; que a ocorrência de colisão entre eles é frequente; e que a ponderação é uma técnica viável para a solução de tais conflitos. Contudo, a concomitante adoção da exigência de fundamentação racional em termos de argumentação jurídica ainda não encontrou ressonância devida.

Nesse sentido, Virgílio Afonso da Silva traçou um interessante diagnóstico do uso da máxima (para ele, regra) da proporcionalidade pelo Supremo Tribunal Federal (STF). São suas palavras[46]:

O recurso à regra da proporcionalidade na jurisprudência do STF pouco ou nada acrescenta à discussão e apenas solidifica a idéia de que o chamado princípio da razoabilidade e a regra da proporcionalidade seriam sinônimos. A invocação da proporcionalidade é, não raramente, um mero recurso a um tópos, com caráter meramente retórico, e não sistemático. Em inúmeras decisões, sempre que se queira afastar alguma conduta considerada abusiva, recorre·se à fórmula "à luz do principio da proporcionalidade ou da razoabilidade, o ato deve ser considerado inconstitucional” (grifos no original).

 O mesmo autor traz uma série de exemplos para demonstrar a sua afirmação, no sentido de que o “princípio da proporcionalidade”, apesar de ser considerado “de fundamental importância para o deslinde constitucional da colisão de direitos fundamentais”, limita-se a ser meramente citado pelo STF, sem lançar mão de nenhum procedimento estruturado de controle nos casos a ele submetidos[47]– tal como defendido por Alexy – e, dessa forma, não prestigia os postulados da racionalidade.

O raciocínio do pretório excelso “costuma ser muito mais simplista e mecânico. Resumidamente: a constituição consagra a regra da proporcionalidade; o ato questionado não respeita essa exigência; o ato questionado é inconstitucional”[48].

Para demonstrar sua constatação, o citado professor enumera algumas decisões nas quais esse silogismo é aplicado. Alguns serão aqui vistos.

COMPETÊNCIA - JUIZADOS ESPECIAIS - COMPLEXIDADE DA CAUSA. [...] CONSÓRCIO - DESISTÊNCIA - DEVOLUÇÃO DE VALORES - CORREÇÃO MONETÁRIA. Mostra-se consentâneo com o arcabouço normativo constitucional, ante os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, decisão no sentido de, ao término do grupo, do fechamento respectivo, o consorciado desistente substituído vir a receber as cotas satisfeitas devidamente corrigidas. Descabe evocar cláusula do contrato de adesão firmado consoante a qual a devolução far-se-á pelo valor nominal. Precedente: Verbete nº 35 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça: "Incide correção monetária sobre as prestações pagas, quando de sua restituição em virtude de retirada ou exclusão do participante de plano de consórcio" (grifos acrescidos).

(RE 175161, Relator(a):  Min. MARCO AURÉLIO, Segunda Turma, julgado em 15/12/1998, DJ 14-05-1999 PP-00019 EMENT VOL-01950-03 PP-00464).

No curto voto, de apenas duas laudas, encontra-se referência ao termo proporcionalidade apenas duas vezes, sempre acompanhado do termo razoabilidade. Não há, no voto, nenhuma referência aos caminhos percorridos para dizer que a norma contratual que proíbe a incidência de correção monetária na restituição das parcelas pagas por consorciado inadimplente ao final do grupo era desproporcional.

A mesma situação ocorreu no acórdão assim ementado:

ELEIÇÕES - CANDIDATOS - NÚMERO - DEFINIÇÃO. Ao primeiro exame, não surge a relevância de pedido no sentido de suspender-se preceito de lei que vincula o número de candidatos por partido às vagas destinadas à representação do povo do Estado na Câmara dos Deputados. Harmonia do preceito do § 2º do artigo 10 da Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997, regedora das eleições de 1998, com os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade ínsitos na Carta da República (grifos acrescidos).

(ADI 1813 MC, Relator(a):  Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 23/04/1998, DJ 05-06-1998 PP-00002 EMENT VOL-01913-01 PP-00063).

Também num voto de duas laudas, dessa feita o termo proporcionalidade foi utilizado, conjuntamente com razoabilidade, apenas uma vez, sem qualquer menção aos critérios de proporcionalidade, numa argumentação racional. Outros acórdãos são ainda citados pelo professor Virgílio Afonso da Silva, a exemplo dos acórdãos HC 76.060-4 e ADI 1407-2[49].

Assim, esvazia-se a ideia de sopesamento, criada justamente para reforçar a carga argumentativa da decisão.Faz-se resumir, destarte, tal questão a uma invocação genérica do princípio da proporcionalidade, com o que se recai no modelo decisionista, criticado até mesmo por Alexy, como analisado supra.

Nessa esteira, é de se destacar a necessidade da adoção de parâmetros mais objetivos, intersubjetivamente controláveis, para fundamentar o sopesamento realizado nos tribunais, sobretudo em se considerando que o órgão de cúpula do judiciário brasileiro, como demonstrado, não tem sido sensível à necessidade de fundamentação racional nesse âmbito.

Diante desse fluxo, pretende-se sugerir uma nova classe de argumentos, de grande prestígio no direito americano, mas ainda pouco versada no Brasil, que têm por pretensão tornar mais exata a análise das condicionantes fáticas e jurídicas a que Alexy se reporta com frequência. Tal abertura é dada pelo próprio autor, quando assevera que:

[...] a fundamentação de enunciados de preferências é uma fundamentação de regras relativamente concretas, que devem ser atribuídas às disposições de direitos fundamentais. Para a sua fundamentação podem ser utilizados todos os argumentos possíveis na argumentação constitucional. Mas a possibilidade de uso de argumentos semânticos fica excluída nos casos em que com a própria constatação da colisão já se decide, a partir do teor literal da Constituição, acerca da aplicação das disposições constitucionais em questão. Já os demais cânones da interpretação e argumentos dogmáticos, precedentes, argumentos práticos e empíricos em geral, além de formas específicas de argumentação jurídica, podem sempre ser utilizados (grifos acrescidos).

Dessa forma, considerando que a teoria de Alexy tem abertura para a introdução de elementos de argumentação, defender-se-á a utilização da metodologia da análise econômica do direito, prenhe do instrumental auferido das ciências econômicas, com os quais se busca conferir maior segurança e precisão na investigação das soluções de conflitos entre direitos fundamentais.


3 A ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO

Aanálise econômica do direito propõe-se a construir um estudo interdisciplinar, a partir da aplicação da teoria econômica à análise e evolução da realidade legal.No entanto, cumpre destacar que um estudo interdisciplinar envolvendo direito e economia não é algo exclusivo dessa abordagem. No campo do direito econômico, já há muito se praticava essa relação, justamente em face de seu objeto: a ordenação da atividade econômica. Contudo, a perspectiva é diversa, como bem observou Letácio Jansen[50]:

[...] poderíamos dizer, portanto, que, assim como o Direito Econômico trata da intervenção do Estado no domínio econômico (versando, de um modo geral, sobre normas organização), a Análise Econômica do Direito, voltada, prioritariamente, para o exame das normas de conduta, dedicar-se-ia ao estudo da “intervenção” da Economia no Estado.

[...]

No fundo, porém, estamos, nos dois casos, diante do problema da relação do Direito com a Economia [...].

A análise econômica do direito, portanto, não se confunde com o direito econômico. Sua proposta é mais ampla, de modo que pode ser conceituada como “o movimento filosófico que visa analisar, com base no racionalismo econômico, o comportamento humano decorrente de uma norma jurídica (seja ela geral e abstrata, seja individual e concreta)”[51]. Sua finalidade é “descobrir e esclarecer os efeitos econômicos dos contratos, decisões judiciais e leis, sob a perspectiva da eficiência econômica, de maior utilidade geral”[52].

Na mesma esteira, afirma Ivo Gico Júnior[53]:

A Análise Econômica do Direito nada mais é que a aplicação do instrumental analítico e empírico da economia, em especial da microeconomia e da economia do bem-estar social, para se tentar compreender, explicar e prever as implicações fáticas do ordenamento jurídico, bem como da lógica (racionalidade) do próprio ordenamento jurídico. Em outras palavras, a AED é a utilização da abordagem econômica para tentar compreender o direito no mundo e o mundo no direito.

Essa reformulação econômica do direito significa colocar, no centro dos estudos jurídicos, os problemas relativos à suaeficiência e do custo dos instrumentos jurídicos na busca de seus fins ou das consequências econômicas das intervenções jurídicas[54]. A aplicação da metodologia econômica, pois, não está mais restrita a apenas um ramo específico do direito, mas se alastra por todas as suas áreas, inclusive, como interessa particularmente ao presente trabalho, como auxiliar na solução de colisões entre normas de direitos fundamentais.

2.5 CONTEXTUALIZAÇÃO

O namoro entre o direito e a economia remonta a longa data. Pelo menos desde 1764, ano da publicação de “Dos delitos e das Penas”, identificava-se uma relação entre sanções jurídicas e sistema de incentivos (no caso, desincentivo ao cometimento de crimes). Nesse clássico, Cesare Beccaria já intuía que o homem, como ser racional, agia conforme seus próprios interesses[55], que as penas determinavam suas escolhas[56],e formulava perguntas que hoje constituem típico objeto de uma análise econômica[57].

Nessa mesma linha, Jeremy Bentham, em “An Introduction to the The Principles of Moral and Legislation”, de 1789, estatuiu que a finalidade de toda lei é, ou deveria ser, aumentar a felicidade total da comunidade[58]. Como toda sanção tende a diminui-la, ela só se justifica dos casos em que possa evitar um mal maior[59]. Trata-se de consequência de seu utilitarismo: o homem sempre buscaria maximizar a sua felicidade. Logo, a sanção, ao aumentar a dor das consequências da prática de um crime, desestimularia o indivíduo a praticá-lo.

Mas foi com Adam Smith que o casamento entre as disciplinas foi mais forte. Sua conhecida “A Riqueza das Nações”(1776), marco da teoria econômica, era, em verdade, apenas uma parte de uma teoria mais geral, que inclui o direito, refletida nas suas “Lectures on Jurisprudence”, que não chegaram a ser concluídas[60].

Podem ainda ser encontradas referências sobre injunções da economia sobre o direito em outras obras influentes do pensamento ocidental, dentre as quais se destaca a de Marx (O Capital,de 1861) e de Weber (Economia e Sociedade, de 1913).

Contudo, entre as décadas de 1920 e 1960, verificou-se um isolamento entre o direito e a economia. Dentre as razões identificadas para esse divórcio, encontram-se a associação, pelos economistas, do estudo do direito ao trabalho dos institucionalistas, então visto como legalístico e carente de rigor. Ademais, foi relevante o papel da transformação da economia em ciência empírica, por força da influência do positivismo, associado ao uso da matemática nos seus modelos teóricos, assim considerado inadequado para abordagem do direito e das instituições[61].

Esse divórcio entre direito e economia tem produzido consequências práticas desfavoráveis, sobretudo no direito, a ponto de ter sido diagnosticada um“profundo e esquizofrênico abismo entre o Direito, os direitos e a realidade”[62]. De igual sorte, tal modo de proceder tira o direito da “linha de frente” na influência sobre escolhas de novas políticas, de medidas para enfrentar crises, e do planejamento estratégico do Estado[63].

A partir de 1960, contudo, tem lugar um movimento que visa reconciliar o direito e a economia para o estudo de efetivas soluções eficientes para a sociedade. De um lado, procura dotar a economia de maiores condições de influir na realidade, de outro, trazer de volta o direito de seu nível excessivo de abstração para dotá-lo de relevância prática, algo que se vinha, paulatinamente, perdendo.

O reencontro entre o direito e a economia surge a partir da década de 1960, tendo sido o marco dessa reconciliação a publicação do artigo “The Problem of Social Cost”, de autoria do economista Ronald Coase, no prestigioso “Journal of Law and Economics”, periódico editado pela Universidade de Chicago[64].Cinco meses depois, foi publicado o artigo “Some Thoughts on Risk Distribution and the Law of Torts”,no “The Yale Law Journal”,de autoriade Guido Calabresi[65], tido como “o primeiro esforço sistemático feito por um jurista para analisar a lei dos torts do ponto de vista econômico”[66].

O movimento é consolidado com a publicação, em 1973, da obra “Economic Analysis of Law”, de autoria de Richard Posner, considerado o primeiro tratado da área, que reuniu as principais teses da tendência predominante polarizada na Escola de Chicago[67]. Sua relevância consistiu na sistematização geral e aplicação das ferramentas da disciplina a um vasto número de ramos do direito, indo além daqueles já normalmente associados à economia. Sua proposta foi explicar a natureza das doutrinas legais a partir do conceito de eficiência econômica, ainda que as mesmas carecessem de fundamentação econômica explícita[68].

O surgimento da análise econômica do direito dá-se num período de reação ao positivismo jurídico, ideal de direito inspirado nos paradigmas da modernidade. Num contexto que remonta ao iluminismo, a ciência, apoiada na razão, veio para substituir os anteriores referenciais teológicos cristãos, o que culminou por entronar a ciência como campo mais “valioso” do conhecimento humano.O direito não ficou alheio a essas tendências, e passou a reivindicar o statuscientífico. Um divisor de águas nesse movimento foi Hans Kelsen, que escancara seu projeto cientificista logo no prefácio à primeira edição de sua Teoria Pura do Direito[69].

Contudo, o evolver histórico encarregou-se de demonstrar as fragilidades desse paradigma. A concepção positivista de aproximação entre direito e norma, a crença de que haveria uma solução racional para cada caso, com efeito, nada mais do que ocultava uma realidade caótica, assistemática, que insistia em se revoltar contra os códigos.

Nessaesteira, surgiram várias respostas ao positivismo jurídico, dentro os quais é relevante citar, para efeitos deste trabalho, o Realismo Jurídico norte-americano, que clamava pela interdisciplinaridade com as demais ciências, para aproximar o direito da realidade social, e pelo abandono do formalismo estéril. A análise econômica do direito é fruto direto dessa ideação[70], ao lado da Critical Legal Studies, embasados na perspectiva política, e as teorias rights-based, lastreadas na filosofia moral e política[71].

Já nos países de tradição europeia-continental, a maior reação aos postulados do positivismo é identificada como o neo-constitucionalismo, que visa denunciar a insuficiência do raciocínio lógico formal e lidar com questões valorativas. Seu foco é a reaproximação do direito com a moral, por meio da constitucionalização principiológica do direito, no que se aparta do antigo jusnaturalismo, pois os valores são buscados no próprio ordenamento, e não e uma ordem superior[72].

Assim, o neo-constitucionalismo defende a necessidade de espaço para escolhas além da regra legal, mas carece de acordo quanto à metodologia a ser aplicada na tomada de decisões, com vistas a conferir-lhe um mínimo de racionalidade[73]. Não há, ademais, foco nas consequências reais das leis e decisões, muitas vezes expressamente relegadas a outros campos do saber[74].

Nesse sentido, a análise econômica do direito começa a ser discutida no Brasil como uma metodologia intersubjetivamente controlável, apta a contribuir significativamente para a compreensão de fenômenos sociais e que auxilie na tomada racional de decisões jurídicas[75]. A esse respeito, manifesta-se Ivo Gico Júnior[76]:

Em resumo, é exatamente nesse aspecto que a Análise Econômica do Direito oferece sua maior contribuição do ponto de vista epistemológico jurídico. Se a avaliação da adequação de determinada norma está intimamente ligada às suas reais conseqüências sobre a sociedade (conseqüencialismo), a juseconomia se apresenta como uma interessante alternativa para esse tipo de investigação. Primeiro, porque oferece um arcabouço teórico abrangente, claramente superior à intuição e ao senso comum, capaz de iluminar questões em todas as searas jurídicas, inclusive em áreas normalmente não associadas como suscetíveis a este tipo de análise. Segundo, porque é um método de análise robusto o suficiente para o levantamento e teste de hipóteses sobre o impacto de uma determinada norma (estrutura de incentivos) sobre o comportamento humano, o que lhe atribui um caráter empírico ausente no paradigma jurídico atual. E terceiro, porque é flexível o suficiente para adaptar-se a situações fáticas específicas (adaptabilidade) e incorporar contribuições de outras searas (inter e transdisciplinariedade), o que contribui para uma compreensão mais holística do mundo e para o desenvolvimento de soluções mais eficazes para problemas sociais em um mundo complexo e não-ergódigo.

2.6   FUNDAMENTOSda ECONOMIA

Embora o senso comum tenda a associar o estudo da economia a dinheiro e questões como desemprego, inflação e taxa de juros, deve-se deixar claro que a economia vai muito além do estudo dessas variáveis. Segundo Vasconcellos e Garcia[77],

Economia é a ciência social que estuda como o indivíduo e a sociedade decidem (escolhem) empregar recursos produtivos escassos na produção de bens e serviços, de modo a distribuí-los entre as várias pessoas e grupos da sociedade, a fim de satisfazer as necessidades humanas.

É um postulado básico da economia que, em qualquer sociedade, os recursos ou fatores de produção são escassos, enquanto as necessidades humanas são ilimitadas e se renovam constantemente. Isso obriga a sociedade a escolher entre alternativas de produção e de distribuição dos resultados da atividade produtiva aos vários grupos da sociedade[78].

Como visto, a economia tem por pretensão, antes de tudo, orientar a escolha humana em um cenário de escassez. Assim toda forma de comportamento humano que requeira a tomada de uma decisão é abrangida no objeto da moderna ciência econômica[79].

Nesse sentido, é a lição de Lionel Robbins[80]:

Here, then, is the unity of subject of Economic Science, the forms assumed by human behaviour in disposing of scarce means [...].Economics is the science which studies human behaviour as a relationship between ends and scarce means which have alternative uses.

A partir desse conceito, observa-se que o objeto da economia é bem mais amplo do que o senso comum permite crer. Tal extensão se deve ao fato de que a economia é caracterizada, antes de tudo, por ser um método de investigação, e não por ter um objeto específico, de modo que pode conciliar-se, assim, com o objeto próprio de outras ciências – bastando que aí exista a necessidade de tomada de uma decisão[81].

2.7  DIMENSÕES

À luz do exposto no item anterior, percebe-se que a economia pode fornecer os meios para a correta avaliação das consequências dos direitos, buscando responder indagações do tipo: as normas editadas trazem as consequências que dela se esperavam? Quais normas devem ser editadas para atingir determinada finalidade?

A essas duas questões correspondem duas dimensões distintas – mas inter-relacionadas – da análise econômica do direito, respectivamente, a positiva (o que é) e a normativa (o que deve ser). Enquanto a primeira se ocupa da análise do mundo dos fatos, através de um critério de verdade, a segunda responde a um critério de valor.

A análise econômica positiva do direito é voltada para a descrição de fatos passados e, através de projeções, antever como o ser humano se comportará diante de determinados fenômenos. À luz de conceitos microeconômicos, tal visão responde a indagações quanto aos efeitos de determinado enquadramento jurídico. Já a sua dimensão normativa analisa fatos sociais, regras morais e princípios éticos diante das instituições constantes da sociedade e das normas existentes, procurando formas de modificações destinadas à ampliação da eficiência, na busca do enquadramento jurídico mais adequado[82].

Interessante observar que a análise normativa, ao ser permeável a considerações valorativas, constitui uma ponte com o mundo do direito e sua ânsia por justiça. Nesse sentido, a análise econômica normativa do direito “procura investigar até que ponto a maximização da riqueza se relaciona com o ideal de justiça, constituindo uma fundação ética para o Direito. Neste contexto, tenta-se verificar até onde o Direito, enquanto ciência normativa, deve integrar relações de custo e benefício”[83].

Esclareça-se que, sob seu viés normativo, tal análise não servirá para isoladamente indicar quais consequências ou finalidades devem ser buscadas, as quais devem estar previamente estipuladas. A análise normativa depende de um objetivo para lhe servir de guia, para que possa aconselhar sobre o melhor meio de alcançar certa política pública[84].

Ademais, é de se observar que a análise normativa pressupõe uma análise positiva: não se pode sugerir a preferência por uma das opções sem antes se ter consciência da realidade como ela é. Essa é uma das mais fundamentais distinções entre o raciocínio juseconômico e o jurídico tradicional, que, por sua própria natureza, tem sua preocupação voltada apenas para questões deontológicas.

Carece o direito de um instrumental teórico que lhe permita compreender e prever o comportamento. Portanto, é fundamental explorar algumas categorias econômicas, que trarão mais luzes para a abordagem ora em tela.

2.8  POSTULADOS BÁSICOS

A análise econômica do direito repousa sobre alguns postulados básicos, tomados a partir da economia, de fundamental importância para seu correto manejo. Desta forma, arrolam-se, a seguir, os principais, a fim de traçar um panorama acerca da matéria com vistas a viabilizar a compreensão do instrumento posto à disposição do operador do direito.

2.8.1 Escolha Racional

O postulado primeiro da economia constitui-se sobre a racionalidade dos indivíduos, que efetuam suas escolhas sempre com vistas a maximizar o seu próprio interesse, ponderando os custos e os benefícios de cada alternativa. E, para tanto, reagem a incentivos[85].

A variação na estrutura de incentivos pode levar o indivíduo a alterar sua conduta, modificando o resultado de suas escolhas. Tal constatação é fundamental para a análise econômica do direito, pois, nesse contexto, todo o direito passa a ser visto como uma grande estrutura de incentivos. Se assim não fosse, o direito não teria grande utilidade, pois normas não teriam nenhuma influência sobre a vida das pessoas[86].

As escolhas humanas são sempre baseadas em suas preferências. A economia – e, portanto, a análise econômica do direito – não se ocupa em fazer juízos de valor acerca de tais preferências, nem procura saber suas razões. A existência de preferências é tomada como simples dado da realidade[87].

Em economia, racionalidade significa a capacidade para fazer escolhas consistentes, baseadas em preferências completas, transitivas e estáveis. Por completude, compreende-se a capacidade de elencar suas preferências dentre todas as alternativas disponíveis; por transitividade, a capacidade de ordenar logicamente as opções (se prefere A a B, e B a C, logo prefere A a C); por estabilidade, a presunção no sentido de que se as pessoas mudam de preferências, tal fato deve-se à mudança de algum fator externo, e não da própria preferência[88].

Tecnicamente, fala-se em preferência sob o signo da utilidade[89]: O indivíduo prefere a opção que lhe trará maior utilidade, pelo que se conclui que os indivíduos são maximizadores racionais de utilidade, ou seja, os indivíduos agem sempre buscando aumentar a sua própria satisfação, seus próprios interesses. É a concepção do homo economicus[90].

2.8.2        Utilidade

Utilidade, em sentido econômico, pode ser conceituado como “a qualidade que os bens econômicos possuem de satisfazer as necessidades humanas”[91]. Assim, indica a satisfação que uma pessoa tira de determinado bem. Como tal unidade é de difícil quantificação, já que varia subjetivamente, é possível, à luz do conceito do homo ecconomicus, ordenar as suas preferências.

É válido lembrar que utilidade não se restringe a dinheiro, mas a qualquer benefício que o indivíduo pretende obter. Nesse sentido, a clássica lição de Cooter e Ulen[92]:

Economists usually assume that each economic actor maximizes something: consumers maximize utility (i.e., happiness or satisfaction); firms maximize profits, politicians maximize votes, bureaucracies maximize revenues, charities maximize social welfare, and so forth. Economists often say that models assuming maximizing behavior work because most people are rational, and rationality requires maximization. Different people want different things, such as wealth, power, fame, love, happiness, and so on. The alternatives faced by an economic decision-maker give her different amounts of what she wants.

Uma derivação importante do conceito de utilidade é sua subdivisão em utilidade total e utilidade marginal. Utilidade total representa o somatório da satisfação obtida por todasas unidades consumidas, de modo que, quanto mais se consumir de determinado produto, maior a satisfação total. Por outro lado, a utilidade marginal se refere à satisfação adicional (na margem) obtida pelo consumo de mais uma unidade do bem. Enquanto a utilidade marginal tende a crescer com o consumo de novas unidades do bem, a utilidade marginal tende a decrescer, pois o consumidor vai perdendo a capacidade de percepção da utilidade proporcionada por mais uma quantidade do bem[93].

2.8.3        Equilíbrio e Eficiência

A respeito das escolhas, diz-se que, quando as mesmas são realizadas em um contexto social onde é possível a livre interação entre os indivíduos, que podem relacionar-se para realizar trocas por meio de barganhas, está-se no âmbito do mercado. É oportuno salientar que o contexto de mercado não pressupõe necessariamente troca de valores pecuniários. Em economia, “a referência a mercado significa pura e simplesmente o contexto social no qual os agentes poderão tomar suas decisões livremente, barganhando com os demais para obter o que desejam por meio da cooperação”[94].

Havendo possibilidade para livres trocas – ou seja, no mercado – a interação entre agentes maximizadores de utilidades os conduzirá à realização de trocas até que os custos para tanto se igualem aos benefícios auferidos, ponto a partir do qual não haverá mais interesse na sua realização. Esse é o chamado ponto de equilíbrio.

Equilíbrio, pois, pode ser definido como “o padrão de interação entre indivíduos que é alcançado quando todos os agentes estão maximizando sua utilidade simultaneamente, e de forma que nenhuma alteração no quadro possa implicar em incremento nessas utilidades”[95]. Esse padrão tende a permanecer, a menos que seja perturbado por forças externas[96].

O conceito de equilíbrio permite antever o resultado provável de uma alteração na estrutura de incentivos dos agentes. Por exemplo, ao alterar-se determinada norma jurídica – e, portanto, ao modificar-se a estrutura de incentivos – o ponto de equilíbrio será deslocado, o que levará os agentes à realização de novas interações até que o novo equilíbrio seja atingido.

Esse equilíbrio ao qual tende um livre mercado corresponde ao conceito de eficiência de Pareto, “que significa simplesmente que não existe nenhuma outra alocação de recursos tal que eu consiga melhorar a situação de alguém sem piorar a de situação outrem. Equilíbrios constituem, portanto, ótimos de Pareto”[97].

Deve-se notar também que uma situação perfeita de livre mercado é de rara verificação empírica. Aí o lugar das chamadas falhas de mercado, que incluem situações de concorrência imperfeita (monopólios, oligopólios, dentre outros), bens públicos (economicamente, são aqueles cuja utilização por uns não exclui sua utilização por outros)e externalidades (custos ou benefícios gerados para terceiros, que não participam da relação econômica).

Nesse sentido, a eficiência de Pareto deve ser encarada como uma tendência, a fim de conferir um valor preditivo à economia. Ao direito, pois, cabe acrescer à noção de eficiência de Pareto os critérios de justiça e equidade que lhe são próprios, considerando os efeitos das falhas de mercado, para que possa bem realizar seu papel social.

Importante observar que nem sempre uma situação Pareto-eficiente será justa segundo algum critério normativo. Contudo, uma situação que não guarda consonância com a eficiência de Pareto certamente será injusta, pois alguém poderia ter a sua situação melhorada sem que isso implicasse na piora da situação de outrem[98]. Em outras palavras, não há que se falar em justiça numa situação em que existe desperdício de recursos.

Assim, a eficiência é um critério essencial, mas não o único, a ser levado em conta na apreciação da justiça. É importante, para que se alcancem quaisquer fins considerados justos, que os meios sejam eficientes[99].

Tais afirmações são coerentes com a incapacidade da análise econômica do direito de dizer o que é justo ou injusto, certo ou errado, tendo em vista que tais categorias pertencem ao mundo dos valores, enquanto sua preocupação maior é com o mundo dos fatos. Contudo, tal método advoga que, não importa a política pública que venha a ser deliberada, sua execução deve-se dar de forma eficiente[100].

Nesse sentido, clara é a lição de Ivo Gico Júnior[101]:

Como dito, se os recursos são escassos e as necessidades potencialmente ilimitadas, todo desperdício implica necessidades humanas não atendidas, logo, toda definição de justiça deveria ter como condição necessária, ainda que não suficiente, a eliminação de desperdícios (i.e. eficiência). Não sabemos o que é justo, mas sabemos que a ineficiência é sempre injusta, por isso, não consigo vislumbrar qualquer conflito entre eficiência e justiça, muito pelo contrário, uma é condição de existência da outra.

A análise econômica do direito pode contribuir para a identificação do que é injusto (no caso, ineficiente), bem como para balizar os parâmetros de ponderação entre as alternativas disponíveis, a partir da identificação das reais consequências da adoção de cada uma das opções. Não se pode tomar responsavelmente uma decisão sem consciência de seus reais custos e benefícios a serem alcançados[102].

2.8.4        Custos de oportunidade

Toda escolha pressupõe um custo, identificado por custo de oportunidade, correspondentes à utilidade da segunda opção, que foi preterida em face da efetivamente adotada. Tendo em vista a limitação de recursos, toda escolha importa em renúncia às alternativas[103], razão pela qual sempre há necessidade de se comparar entre objetivos para se tomar uma decisão.

Segundo a definição de Vasconcellos e Garcia[104], “custos de oportunidade são custos implícitos, que não envolvem desembolso monetário. [...]. Esses valores são estimados a partir do que poderia ser ganho no melhor uso alternativo”.Assim, ao realizar uma escolha, os agentes ponderam os benefícios e os custos, inclusive os de oportunidade, de cada alternativa, a fim de tomar a decisão de maximize os seus interesses.

Intimamente relacionado aos custos de oportunidade, está o conceito de trade-off. Segundo Cordeiro[105],

Trade off é um conceito utilizado em economia, sem traduçãoadequada em português, que exprime a idéia de que, para seobter algo que se deseja, é necessário sacrificar ou abrir mão dealguma coisa que se tem. As empresas devem buscar o equilíbriodo trade-off.

Assim, considerando que trade-off representa uma situação em que há a necessidade de uma escolha, e que, num cenário de escassez, toda escolha implica custos de oportunidade, não há como dissociar os conceitos.

2.8.5        Externalidades

Uma das consequências do postulado da escolha racional implica, como visto, na ponderação entre os custos e os benefícios da adoção de determinada escolha. A este ponto, deve-se frisar que o conceito de custos envolve não apenas aspectos financeiros, mas também os efeitos da decisão gerados sobre terceiros, não relacionados direitamente à decisão tomada. Tais efeitos podem ser benéficos ou prejudiciais, e, como irradiam para fora do âmbito da decisão, são chamados de externalidades, respectivamente, positivas ou negativas.

Tecnicamente, em economia, consideram-se externalidades como falhas de mercado, que “ocorrem quando o consumo e/ou a produção de um determinado bem afetam os consumidores e/ou produtores, em outros mercados, e esses impactos não são considerados no preço de mercado do bem em questão”[106].

Assim, em qualquer decisão, havendo externalidades, deve-se avaliar o impacto que elas acarretarão a terceiros. Isso é sobretudo importante no âmbito jurídico, pois as decisões tomadas pelos agentes públicos, notadamente pelos juízes, em face de seu poder de coerção diferenciado,podem afetar, significativamente, toda a sociedade, e não apenas as partes envolvidas em um litígio em particular. Potencialmente, pois, toda decisão judicial tem, economicamente, efeitos erga omnes.


4  O PAPEL DA ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO NA PONDERAÇÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS

Considerando que a economia apresenta-se atualmente como a ciência social com maior base empírica, em virtude de seu refinado arsenal teórico, fortemente matematizado, sua interação com o direito possui relevante contribuição ao dar mais concreção e fundamentação aos raciocínios jurídicos, tantas vezes acusados de carentes de racionalidade.

Uma das dificuldades de comunicação entre juristas e economistas reside justamente na concreção do raciocínio destes e na abstração do daqueles. Embora ambos lidem com constantes ponderações, economistas o fazem através de equações e gráficos com unidades mensuráveis, objetivas, enquanto os juristas estão mais acostumados a trabalhar com valores abstratos, imateriais, o que demonstra sua incapacidade de transpor tal raciocínio para um gráfico[107].

Entretanto, ambas as disciplinas lidam com objeto análogo, que é, em maior ou menor grau, as escolhas humanas. A economia trabalha com escolhas em um cenário de escassez; o direito, ao prescrever condutas, delimita o raio dessas escolhas, ao mesmo tempo em que e a própria produção normativa é fruto de escolhas realizadas pelos legitimados para editá-las. Logo, não se pode mais ignorar a necessidade de integração entre os modos de proceder de ambas as disciplinas, considerando a aptidão da análise econômica para descrever o fenômeno jurídico e prescrever como ele pode ser mais eficiente[108].

Tal constatação é sobremaneira importante quando a escolha jurídica refere-se aos chamados hard cases. A análise econômica, nesses casos, pode oferecer parâmetros para decisões mais eficientes e, portanto, mais justas. Nesse diapasão, as análises dostrade offs, custos de oportunidade e demais categorias econômicas devem necessariamente ser levadas em conta pelos juristas, sobretudo nos casos em que se faça necessária uma ponderação entre princípios constitucionais.

Não se advoga, advirta-se desde já, a tese de que as consequências econômicas sejam o único parâmetro de justiça na solução de um caso. Defende-se, isto sim, que as considerações tipicamente jurídicas levem em conta também as consequências da solução a ser adotada, pois, como demonstrado supra[109], ainda que nem toda solução justa seja eficiente, toda solução ineficiente certamente é injusta, considerando que não se pode conceber como justiça a busca de finalidades através do desperdício de recursos insuficientes para atender todas as necessidades humanas.

4.1  MÁXIMA DA EFICIÊNCIA COMO CRITÉRIO DE PONDERAÇÃO ENTRE DIREITOS FUNDAMENTAIS

À luz das considerações até aqui expostas, já se pode afirmar que uma decisão jurídica, diante de um caso concreto em que interesses fundados em direitos fundamentais sejam conflitantes, constitui-se em uma escolha, e, para que tal solução seja eficiente, devem ser ponderados os interesses, com a consciência de que essa decisão necessariamente se constituirá num trade off: o reconhecimento do direito de um implicará na exclusão do direito de outro. Ademais, tal escolha gerará externalidades, positivas ou negativas, as quais também devem ser consideradas, pois causarão impactos não apenas às partes envolvidas, mas também a toda a sociedade[110].

Afirmou-se que nem toda solução eficiente pode ser considerada justa, mas que toda solução ineficiente certamente será injusta, tendo em vista que, num cenário de escassez de recursos, limitada principalmente, no caso do Estado, à sua capacidade arrecadatória, e necessidades ilimitadas – no âmbito dos direitos fundamentais, a necessidade de efetivação dos múltiplos direitos e garantias assegurados na Constituição – a adoção de providências que não maximizem a utilização dos recursos públicos implica em desperdício desses recursos que, utilizados eficientemente, permitiriam a efetivação ainda maior dos direitos fundamentais.

Essa é a razão pela qual, à luz da teoria de Alexy, não se pode, ao contrário que consta no caput do art. 37 da Constituição Federal de 1988, sustentar que eficiência seja um princípio. Ora, em face do que se acabou de referir, não é de se admitir, jamais, como válida uma decisão em desrespeito à eficiência. O critério de análise, aí, é à moda do tudo-ou-nada: ou a decisão maximiza a utilização dos recursos públicos, e é válida, ou não maximiza, e é inválida. Não se pode falar, assim, de graus de eficiência, não cabe sopesá-la com outros princípios.

Dessa forma, à luz da análise econômica do direito, demonstra-se que a natureza da eficiência aproxima-se da natureza da proporcionalidade, tendo em vista que ambas disciplinam um procedimento racional para o sopesamento de princípios diante de um caso concreto. Portanto, preferir-se-á a ela se referir como máxima da eficiência[111].

A máxima da eficiência, expressamente agasalhada pelo art. 37 da Constituição Federal, portanto, deve servir de parâmetro adicional à da proporcionalidade, dando-lhe mais concretude e permitindo um maior controle intersubjetivo das decisões tomadas em seu nome. A efetivação prática dessa máxima é imperiosa num país com tantos desafios como o Brasil, de modo a, mais velozmente, se lograr a efetivação dos direitos e garantias fundamentais nela previstos, sem recair em posições utópicas[112] que desconsideram os custos – inclusive os de oportunidade – da efetivação de tais direitos[113].

4.2  REVALORIZAÇÃO PRÁTICA DA MÁXIMA DA PROPORCIONALIDADE À LUZ DA ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO

Como visto[114], apesar de a proporcionalidade já gozar de prestígio na doutrina e jurisprudência pátrias, o Supremo Tribunal Federal ainda não acolheu em seus discursos, em sua inteireza, a necessidade de fundamentação racional dos juízos de ponderação, seguindo o caminho determinado pela aplicação de tal máxima. Tal proceder solapa a respeitabilidade desse ponto da teoria, fazendo parecer, injustamente, que Alexy defende um procedimento irracional.

Desta forma, demonstrar-se-á que a utilização do instrumental da análise econômica do direito pode contribuir para uma revalorização prática da ponderação através da proporcionalidade, enriquecida pela noção de eficiência trazida da economia.

Assim, partindo-se dos ensinamentos de Alexy, observamos que suas duas leis da solução de colisão entre princípios – a lei da colisãoe a lei do sopesamento – são sobremaneira enriquecidas quando a elas acrescentamos considerações a partir do instrumental fornecido pela análise econômica do direito.

Constatado que a colisão entre princípios somente pode ser solucionada diante do caso concreto, imperioso se faz, para a correta operação da solução da colisão, analisar as circunstâncias, as quais abrangem limitações fáticas e jurídicas aos princípios em análise. Nesse contexto, tem lugar a lei de colisão[115].

Da necessidade de identificação dessas circunstâncias e de suas consequências para identificação do princípio de maior peso, decorre a aplicação da máxima da proporcionalidade, em seus três subcritérios: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito, os quais serão adiante analisados.

4.2.1        Adequação

Como bem observado por Ávila, o exame da adequação não é tão simples quanto sua definição inicial faz parecer. Ao se estatuir que adequado é o meio apto a promover a realização do fim, fica em aberto a questão de saber o  que significa, efetivamente, promover um fim. Assim, ele identifica três aspectos para a devida resposta: quantitativos (intensidade), qualitativos (qualidade) e probabilístico (certeza)[116]. Nesse sentido[117]:

Em termos quantitativos, um meio pode promover menos, igualmente ou mais o fim do que outro meio. Em termo qualitativos, um meio pode promover pior, igualmente ou melhor o fim do que o outro meio. E, em termos probabilísticos, um meio pode promover com menos, igual ou mais certeza o fim do que o outro meio. Isso significa que a comparação entre os meios que o legislador ou administrador terá que escolher nem sempre se  mantém em um mesmo nível [...].

Assim, Ávila defende que, diante de uma escolha entre: a) um meio que promove melhor, mas de forma incerta, o fim, e b) outro meio que o promove menos, mas com mais certeza, não há como identificar a solução mais adequada, sendo exigível daquele que tomará a decisão “devem escolher um meio que promova minimamente o fim, mesmo que esse não seja o mais intenso, o melhor nem o mais seguro”[118].

Apesar da clareza e da correção da constatação, entende-se que, partindo-se da análise econômica do direito, Ávila se equivoca ao defender que, na ausência de um critério apriorístico para identificar qual dos aspectos da adequação deve prevalecer na análise, deve-se ter como válida qualquer decisão que “minimamente” promova o fim. Como consequência, caberia ao judiciário declarar inválida a medida apenas “nos caos em que a incompatibilidade entre o meio e o fim for claramente manifesto”[119].

Tal solução consagraria, em diversas situações, soluções manifestamente ineficientes e, como tal, injustas por levarem ao desperdício.

A análise econômica do direito possui instrumentos que permitem analisar os custos de cada uma das opções – aqui não restritas a questões financeiras – a fim de se tomar uma decisão racional. Tem tal análise condições de reduzir a avaliação dos três aspectos a um denominador comum: o conceito de utilidade[120].

Assim, analisando as curvas de utilidade marginal, é possível saber o que mais interesse à sociedade: uma providência, no particular, em maior quantidade, em maior qualidade, ou em maior certeza? Por exemplo, numa política para à finalidade de efetivar o direito à educação, o que mais interessa à sociedade: mais vagas em escolas, ou melhor qualidade para as escolas que já existem? Tratar-se-ia aí de um típico dilema no âmbito da adequação, entre qualidade e quantidade.

O conceito de utilidade marginal é útil para essa solução: tomem-se duas situações exemplo: (a) caso o acesso à escola, naquele dado nível de ensino já esteja universalizado, ou próximo disso, a utilidade marginal de mais vagas será bem mais reduzida do que a utilidade marginal do incremento da qualidade; (b) caso os serviços de educação sejam próximos à excelência, mas em um número reduzido de vagas, a utilidade marginal da melhoria da qualidade será bem mais reduzida do que a da ampliação das vagas.

Dessa forma, ao deliberar sobre o investimento, por exemplo, em (i) construção de uma nova escola ou (ii) aperfeiçoamento e qualificação docente, segundo a lição de Ávila, ambas as providências seriam adequadas para promover o direito à educação e, portanto, válidas. Contudo, nos casos limites acima ilustrados, constata-se que a adoção da providência (i) no caso (a), bem como da providência (ii) no caso (b) seria manifestamente ineficiente, pois, com aqueles recursos, se lograria mais utilidade para a sociedade tomar a decisão oposta – e, como tal, inadequada para promover a finalidade da efetivação ao direito à educação.

Os exemplos acima citados foram casos extremos. Mas, na realidade prática, nem sempre a decisão é tão clara assim. Dessa forma, a economia, em especial a econometria[121], fornece os instrumentos necessários para a medição estatística de tais utilidades, de modo que, ao revés do que quer Ávila, deve-se indicar a solução mais adequada no caso de conflito entre aspectos diferentes da máxima parcial da adequação. Descaberia, assim, o recurso a uma “incompatibilidade manifesta entre meios e fins”, conceito de difícil definição e controle, que cederia lugar a uma avaliação objetiva de utilidades.

4.2.2        Necessidade

Da mesma forma, o conceito de necessidade como impossibilidade de promoção do objetivo pretendido, com a mesma intensidade, por meio de outro ato que limite em menor medida o direito fundamental atingido padece de insuficiência.

Ávila defende que o exame da necessidade deve-se dar em dois passos: em primeiro lugar, o exame da igualdade da adequação dos meios; e, em segundo lugar, o exame do meio menos restritivo[122]. Contudo, à luz do exposto na seção anterior deste trabalho, entende-se aqui que o exame da “igualdade da adequação de meios” é típico da máxima parcial da adequação: através da avaliação das utilidades das opções, será adequada a medida que mais promova o fim atendido. Caso se conclua que mais de uma medida promova igualmente, de forma igualmente máxima, o fim atendido, ambas terão passado pelo crivo da adequação, cabendo, quanto à necessidade, apenas a análise do meio menos gravoso, o seja, em termos econômicos, que gere menos externalidades negativas sobre terceiros.

Tais externalidades também podem ser quantificadas econometricamente, a fim de se saber qual o impacto que elas terão para fora dos lindes da colisão sob exame. Dessa forma, havendo duas soluções igualmente adequadas, deve-se buscar conhecer o impacto na efetivação de direitos de outros indivíduos, para, com isso, ter-se uma base empírica sólida apta a fundamentar o juízo de necessidade.

Desenvolvendo o mesmo exemplo adotado supra, suponha-se que, em dado município, quantifique-se economicamente que tanto a solução (i) quanto a solução (ii) seriam igualmente adequadas, em face do equilíbrio ali hipoteticamente existente entre quantidade de vagas e qualidade do ensino. Nessa situação, sob o prisma da adequação, ambas as medidas seriam eficientes. Cumpriria, passando ao âmbito da necessidade, verificar qual das duas medidas, então, afetaria menos eventuais direitos fundamentais colidentes.

Simplificando a questão, pode-se afirmar que seria necessário então analisar, no caso da solução (i), o prejuízo causado aos estudantes que já estão matriculados, que não terão uma maior qualidade de ensino; no caso da solução (ii), o prejuízo aos alunos que não conseguem uma matrícula. Calculadas assim as externalidades negativas, será possível dizer, com razoável grau de precisão, qual a medida é desproporcional por não ser necessária, assim identificada aquela na qual o prejuízo será maior à sociedade.

Destaque-se que, quanto à adequação e à necessidade, tratam-se de análises acerca de pressupostos fáticos, razão pela qual se mostra ainda mais relevante a adoção de análises empíricas, que vão à concreção dos efeitos sobre a realidade, para fundamentar os juízos assim formulados.

4.2.3        Proporcionalidade em Sentido Estrito

Por fim, o subcritério da proporcionalidade em sentido estrito deve ser alvo de uma análise diferenciada. Nota-se que, enquanto as máximas parciais da adequação e da necessidade envolvem, necessariamente, a análise da decisão adotada em face das demais opções disponíveis, a proporcionalidade em sentido estrito debruça-se apenas sobre a alternativa escolhida, para avaliar a relação de custos dos meios e benefícios dos fins a serem atingidos.

Nesse sentido, Humberto Ávila entende que se trata de um exame complexo, uma vez que[123]:

“[...] o julgamento daquilo que será considerado como vantagem e daquilo que será considerado como desvantagem depende de uma avaliação fortemente subjetiva. Normalmente um meio é adotado para atingir uma finalidade pública, relacionada ao interesse coletivo [...], e sua adoção causa, como efeito colateral, restrição a direitos fundamentais do cidadão”.

A análise da proporcionalidade em sentido estrito guarda estreita relação com a lei do sopesamento, que pugna que a medida permitida de não-satisfação ou de afetação de um princípio depende do grau de importância da satisfação do outro[124]. Como Alexy advertiu, ao revés da adequação e da necessidade, que dizer respeito aos pressupostos fáticos, a proporcionalidade em sentido estrito refere-se aos pressupostos jurídicos, ou seja, a própria definição do alcance do princípio sob ponderação e dos demais com eles colidentes.

Interessante notar que Alexy utiliza-se de um conceito econômico para ilustrar seu entendimento acerca da fundamentação relacionada ao sopesamento: as curvas de indiferença[125].Tais curvas são entendidas como os pontos que representam combinações de diferentes quantidades de bens, cujas combinações representam, para o consumidor, a mesma utilidade.

Tais curvas são uma representação significativa da lei do sopesamento: se a finalidade a ser atingida com a decisão vai fomentar um direito fundamental, o meio adotado para tanto vai prejudicar um outro direito fundamental. Destarte, quanto maior a restrição causada pelo meio adotado, maior deve ser a satisfação trazida pelo fim atingido.

Assim, continuando o exemplo formulado, caso se delibere que o menor prejuízo é causado pela alternativa (i), deve-se analisar, em si, os meios para que tal decisão seja adotada. Por exemplo, para construir uma escola em determinada área da cidade, onde se identificou haver tal necessidade, para ampliar o número de vagas, será necessário desapropriar o único imóvel, naquela localidade, que reúne características suficientes para a instalação de uma unidade de ensino. Mas, no caso, em tal imóvel funciona uma fábrica que, com tal desapropriação, teria de ser fechada, ou instalada em outro lugar. Haveria um conflito, aí, entre o direito à educação e o direito ao trabalho dos empregados que seriam afetados pelo encerramento das atividades da fábrica. Nesse sentido, se a efetivação do direito à educação afeta em grande medida o direito fundamental ao trabalho, ambos devem ser sopesados, à luz do caso concreto, para saber-se o que tem maior peso, assim entendido o que maximize a utilidade social decorrente da sua efetivação.

Mas a utilização que Alexy faz em sua obra das curvas de indiferença, para efeitos do que defende a análise econômica do direito, é muito tímida, pois se limita a fazer o papel de uma ilustração. Tais gráficos, na verdade, permitem identificar quanto, em utilidade decorrente do direito fundamental ao trabalho, a sociedade estaria disposta a abrir mão para auferir, em utilidade decorrente do direito à educação.

A análise, nesse prisma, não é comparativa entre diversos meios disponíveis, como dito, mas acerca do que deve ser a relação entre direitos fundamentais colidentes. Nesse diapasão, Alexy refere-se a “curvas de indiferença de segundo nível”[126] para representar o que deve ser a importância que se deve conferir a cada direito fundamental, a qual é construída num metanível em relação às curvas de indiferença individuais. Daí falar-se que tais curvas representam os pontos em que os sopesamentos conferem idêntica utilidade à sociedade. Cada ponto seria a representação de específicas condições de relação de precedência entre os princípios sopesados.

Ante o exposto, não se pode negar que a análise econômica do direito, com seus precisos métodos de avaliação das escolhas e suas consequências, constitui-se num instrumental apto a contribuir para a racionalização das decisões relativas à solução de colisões entre direitos fundamentais, mediante o oferecimento de dados empíricos, objetivos, aptos a estimular a adoção de práticas eficientes, que maximizem a utilidade maior buscada pelo direito – a justiça.


5  CONCLUSÕES

O presente estudo demonstra que a análise econômica do direito é capaz de fornecer, através de seu instrumental haurido das ciências econômicas, critérios de maior segurança para a interpretação e aplicação do direito. Em especial, que a ponderação entre direitos fundamentais colidentes pode-se beneficiar significativamente sob essa nova abordagem, por conferir mais racionalidade às decisões.

Partindo-se do contexto da Teoria dos Direitos Fundamentais, elaborada por Robert Alexy, em cotejo com as ideias de Ronald Dworkin, fundamenta-se que a distinção entre regras e princípios é essencial para a compreensão dos direitos fundamentais. Sãoestes espécies do gênero norma jurídica, assim qualificada como toda prescrição que pode ser expressa como enunciado deôntico.

Para Alexy, enquanto regras são insuscetíveis de gradação, de modo que seu critérios segue a moda do tudo-ou-nada, princípios são normas caracterizadas por se constituírem em mandados de otimização, a ordenar que algo seja realizado na maior medida possível, restando tal possibilidade condicionada a limitações fáticas e jurídicas, compreendidos, nessas últimas, os efeitos dos demais princípios. Nesse contexto, a ponderação surge como meio idôneo a solucionar as frequentes colisões entre princípios.

A ponderação entre princípios, pois, visa identificar, diante do caso concreto, qual deles terá que ceder. São as condições específicas de cada caso que determinarão a prevalência de um princípio; se outras são as condições, a solução inversa pode ter lugar. Desse modo, a lei da colisão pugna que as circunstâncias constituem o suporte fático de uma norma de direitos fundamental derivada, obtida como resultado da ponderação.

A máxima da proporcionalidade tem papel relevante nessa operação, pois relaciona critérios de avaliação das circunstâncias fáticas e jurídicas condicionantes do peso de um dado direito fundamental em face de outros. Tal máxima é constituída de três máximas parciais, duas relativas às fáticas (adequação e necessidade), e outra relativa às jurídicas (necessidade em sentido estrito).

Adequação pode ser entendida como a aptidão do meio para levar à realização do fim; a necessidade, como a impossibilidade de promoção desse fim por um meio alternativo e menos gravoso; e a proporcionalidade em sentido estrito, o sopesamento entre a intensidade da restrição de um direito em face da importância da realização do direito colidente.

Embora em teoria seja fartamente aceita a ideia da ponderação e da proporcionalidade, a análise de precedentes jurisprudenciais do Supremo Tribunal Federal revela que o recurso ao “princípio” da proporcionalidade frequentemente é utilizado como um topos, sem que seja acompanhado da necessária fundamentação que confere a desejada racionalidade ao discurso jurídico.

Para contribuir com a solução desse descompasso entre a teoria de Alexy e a sua efetivação judicial no Brasil, propõe-se a adoção da análise econômica do direito, a qual, reaproximando o direito da economia, é capaz de fornecer, mediante o emprego do instrumental havido da metodologia das ciências econômicas, balizas mais precisas para aferir as operações de ponderação e sopesamento entre direitos fundamentais.

Embora as relações entre direito e economia remontem à Beccaria, durante boa parte do século XX esse campos do saber viveram dissociados, em evidentes prejuízos para as suas capacidades de compreender e interferir na realidade. A partir da década de 70, contudo, esse movimento – estimulado como uma reação ao positivismo jurídico – tratou de demonstrar que a utilização de métodos econômicos para compreender os efeitos das normas jurídicas fazia aportar, para o jurista, mecanismos capazes de interagir com a realidade, concebendo o direito como uma estrutura de incentivos, que afeta as escolhas dos indivíduos. E, como tal, houve uma revalorização das duas ciências: do direito, por ser capaz de combater seu insuportável grau de dissociação com a realidade, e a economia, por obter instrumentos para estimular comportamentos no sentido da eficiência no uso de recursos escassos.

A análise econômica do direito possui duas dimensões: uma positiva, voltada para a compreensão da realidade, mediante a avaliação das consequências das escolhas realizadas em um cenário de escassez, e a normativa, que visa analisar, a partir do contexto social, moral e ético, as normas jurídicas e propor as modificações necessárias à ampliação da eficiência do atingimento das finalidades determinadas por esse contexto.

São postulados econômicos básicos para a compreensão da análise econômica do direito a escolha racional, entendida como a capacidade humana de buscar a maximização de seus interesses, mediante a ordenação de suas preferências; utilidade, como a medida da satisfação dos interesses humanos, necessária para reduzir a um denominador comum preferências de difícil comparação; equilíbrio, como o padrão de interação em que todos os agentes estão, simultaneamente, maximizando sua utilidade, o que corresponde ao conceito de eficiência de Pareto, lembrando-se que, ao se considerar a eficiência uma situação em que o emprego de meios é realizado de uma forma ótima, onde não há desperdícios, é forçoso considerá-lo como um requisito, ainda que não exclusivo, da justiça; custos de oportunidade, como os custos referentes à utilidade da opção preterida em uma escolha, que compõem os custos para se tomar uma decisão; e externalidade, considerados os efeitos colaterais das escolhas, ou seja, os efeitos, positivos ou negativos, gerados sobre terceiros.

Tendo tais conceitos em mente, cria-se a consciência de que toda decisão – inclusive as jurídicas – tem um custo, de modo que a eficiência (erigida a “princípio” constitucional, inclusive), torna-se pressuposto para a justiça. Isto porque, embora nem toda decisão eficiente seja justa, toda decisão ineficiente é necessariamente injusta, já que não se pode considerar como justa uma situação na qual os meios poderiam, se empregados de forma diversa, melhor atender aos objetivos constitucionais.

Forçoso é, portanto, compreender a eficiência, expressa no art. 37 da Constituição Federal de 1988, não possui natureza de princípio, pois não é passível de ponderação, ou seja: não se pode tolerar nenhuma decisão ineficiente, pois ela é critério de avaliação da própria decisão. Trata-se, pois, de uma máxima, ou, como quer Humberto Ávila, um postulado normativo aplicativo.

Com tal ideação, propõe-se uma revalorização da máxima da proporcionalidade, buscando que seu emprego resulte de um processo racionalmente conduzido, de forma fundamentada, a partir de parâmetros mais objetivos de avaliação e controle. Tal empresa é bem sucedida com o emprego da análise econômica do direito, considerando-se a necessidade de análise da proporcionalidade à luz da eficiência.

Assim, para a correta compreensão a máxima parcial da adequação, não basta compreendê-la como um meio que minimamente promova um fim determinado. É possível, mediante o manejo do conceito de utilidade marginal, com o emprego de métodos da econometria, saber qual é a solução que mais atende à finalidade (ao princípio) que se deseja promover. Qualquer outra solução seria ineficiente e, portanto, não deveria ser acatada.

Quanto à necessidade, pugna-se pela sua releitura em deferência à consideração das externalidades geradas pelas decisões, notadamente pelas judiciais, pois inexoravelmente gerarão efeitos sobre terceiros. Tais externalidades devem ser quantificadas, para se adotar a decisão que menos externalidades negativas traga à sociedade, outro parâmetro inerente ao exame da eficiência.

Por fim, sobre a proporcionalidade em sentido estrito, o sopesamento entre o princípio que se visa atender e o que com ele colide também deve ser analisado economicamente, no sentido de apurar, em que ponto das curvas de indiferença, deve-se situar a decisão ótima. Ponderam-se princípios, com a consciência de que quanto maior for o gravame ao princípio colidente, tanto maior deve ser a importância do fim atingido; mas o quanto grave ou o quanto importante, isto pode ser aferido por instrumentos econômicos, a fim de melhor balizar tal sopesamento.

Enfim, conclui-se que a análise econômica do direito, com métodos precisos e validados cientificamente de apuração de dados empíricos, podem, se bem empregados, ser significativamente úteis para avaliar decisões relativas à solução de colisões entre direitos fundamentais, de modo a conferir-lhes maior racionalidade e aparelhá-las das condições necessárias a que a busca da eficiência não seja mero floreio retórico, mas uma verdadeira arma na luta pela efetivação mais célere possível dos direitos fundamentais prometidos pela Constituição.


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Notas

[1]É certo que tal teoria abrange, com profundidade, diversas outras questões. Contudo, dados os limites da proposta deste trabalho, a abordagem circunscrever-se-á à sua concepção acerca das normas de direitos fundamentais, com a consequente necessidade da distinção entre princípios e regras, e os critérios de solução em caso de conflito entre eles.

[2] ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. 2º ed. Traduzido por Virgílio Afonso da Silva. Malheiros: São Paulo, 2011. p. 86.

[3] ALEXY, loc. cit.

[4] Ibid., p. 38.

[5] Ibid., p. 85.

[6] Por exemplo, Esser, Larenz e Canaris. Para um panorama de seus pensamentos, v. ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 12ª ed. amp. Malheiros: São Paulo, 2011. p.35-36.

[7] DWORKIN, Ronald. Taking Rights Seriously. Havard University Press: Cambridge, 1978. p. 16.

[8] Idib., p. 22.

[9]Mas ele ressalva que isto é apenas um “esqueleto” do positivismo, pois a distribuição da “carne” é feita de diferentes maneiras por diferentes autores (Ibid., p. 17).

[10] DWORKIN, loc. cit.

[11]Ibid, passim.

[12] Ibid., p. 24; 26.

[13] Por exemplo, no que se refere à posição de Dworkin a respeito da existência de uma única resposta correta para cada caso, tema que resvala para a teoria da argumentação jurídica e extrapola o corte aqui adotado.

[14]A demonstração desse fato é que uma mesma norma pode ser expressa por diferentes enunciados normativos, ou ainda sem qualquer enunciado, a exemplo de semáforos ou placas de trânsito.

[15] ALEXY, op. cit., p. 54.

[16] Ibid., p. 57.

[17] Ibid., p. 87.

[18] Ibid., p. 85.

[19] Por exemplo, a referente ao grau de generalidade, alto para princípios, baixo para regras, como defendido por Raz, Christie Hughes e Simonius (Ibid., p. 87).

[20] Ibid., p. 90.

[21] Ibid., p. 91.

[22] Ibid., p. 141.

[23] Ibid., p. 92.

[24] Ibid., p. 93.

[25] Ibid., p. 98-99.

[26] Ibid., 2011. p. 99.

[27] Para maior detalhamento das normas de direito fundamental atribuídas, cf. ibid., p. 69-76.

[28] Ibid., p. 102.

[29] A proporcionalidade é comumente referida como “princípio da proporcionalidade”. A equivocidade dessa qualificação decorre do quanto até aqui já exposto: não se trata de um mandamento de otimização, a ser efetivado na maior medida possível, nem pode ser sopesado contra algo. Para Alexy, se tal máxima não for satisfeita, terá lugar uma invalidade, o que a situa no âmbito das regras (Ibid., p. 112), no que é seguido por Virgílio Afonso da Silva (SILVA, Luís Virgílio Afonso. O proporcional e o Razoável. Revista dos Tribunais, São Paulo, ano 91, vol. 798, abr. 2002, p. 25). Lembra-se aqui a concepção divergente de Humberto Ávila, para quem a proporcionalidade é uma metanorma, ou seja, uma norma sobre a aplicação de outras normas, pelo que é errôneo qualificá-la no mesmo nível das normas sobre as quais será aplicada. Por isso, prefere qualificá-la como postulado normativo aplicativo (v. ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 12ª ed. amp. Malheiros: São Paulo, 2011 p. 133 et seq). Mas para os efeitos desse trabalho, não há impacto qualificar a proporcionalidade como regra, princípio ou postulado, mas compreender seu significado e contribuir para uma aplicação mais eficiente dessa espécie.

[30] SILVA, Luís Virgílio Afonso. O proporcional e o Razoável. Revista dos Tribunais, São Paulo, ano 91, vol. 798, abr. 2002, p. 34.

[31]ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 12ª ed. amp. Malheiros: São Paulo, 2011. p. 177.

[32] Ibid., p. 36.

[33] Ibid., p. 37.

[34] Ibid., p. 38.

[35] Ibid., p. 40.

[36]ÁVILA, op. cit., p. 185.

[37] SILVA, op. cit., p. 41.

[38] ALEXY, op. cit., p. 117.

[39] Ibid., p. 118.

[40] SILVA, op. cit., p. 44.

[41] Ibid., p. 44.

[42] ALEXY, op. cit., p. 164.

[43] Ibid.,p. 165.

[44] Ibid., p. 167.

[45] Ibid., p. 173-174.

[46] SILVA, op. cit., p. 31.

[47]Ibid., p. 31.

[48]Ibid., p. 31.

[49] Ademais, há ali referências à RTJ 152, 455; Lex STF 237,304; e Lex STF 237, 304 [309].

[50] JANSEN, Letácio. Introdução à Economia Jurídica. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003. p. 15.

[51]MAIA, Douglas Leonardo Costa. Paradigmas da Análise Econômica do Direito, para o Estudo da Intervenção Estatal, por Direção, sobre a Ordem Econômica Brasileira. 2007. 115 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de Direito, Universidade de Marília, Marília, 2007. Disponível em: <http://www.unimar.br/pos/trabalhos/arquivos/5c6b7cbc26a8db62b7538648b2af310a.pdf>. Acesso em: 01 jul. 2011. p. 32.

[52]LAUDA, Bruno Bolson. A Análise Econômica do Direito: Uma Dimensão da Crematística no Direito. Revista Eletrônica do Curso de Direito da UFSM, Santa Maria, v. 4, n. 1, mar. 2009. Disponível em: <http://www.ufsm.br/revistadireito/eds/v4n1/a3.pdf>. Acesso em: 05 jul. 2011. p. 6.

[53]GICO JÚNIOR, Ivo. Metodologia e Epistemologia da Análise Econômica do Direito. Economic Analysis of Law Review, Brasília, v. 1, p. 7-32, jan.-jun. 2010. Disponível em: <http://portalrevistas.ucb.br/index.php/EALR/article/view/1460/1110>. Acesso em 02 jul. 2011. p. 17.

[54]PACHECO, Pedro Mercado. El Análisis Económico del Derecho: Una Reconstrucción Teórica. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1994. p. 34-35.

[55] “Ninguém faz o sacrifício de uma parte de suas liberdades apenas visando ao bem público. [...] Cada homem somente por interesses pessoais está ligado às diversas combinações políticas deste globo [...]”(BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. Traduzido por Torrieri Guimarães. São Paulo: Martin Claret, 2000. p. 18.)

[56] “A fim de que o castigo surta o efeito que se deve esperar dele, basta que o mal causado vá além do bem que o culpado retirou do crime. Devem ser contados ainda como parte do castigo os terrores que antecedem a execução e a perda das vantagens que o delito deveria produzir”. (Ibid., p. 50).

[57]“[Tormentos e torturas] levarão ao fim proposto pelas leis? Quais são os meios mais apropriados para prevenir delitos? As mesmas penas serão igualmente úteis em todas as épocas? Qual a influência que exercem sobre os costumes?” (BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. Traduzido porTorrieri Guimarães. São Paulo: Martin Claret, 2000. p. 17).

[58] “By the principle of utility is meant that principle which approves or disapproves of every action whatsoever.

according to the tendency it appears to have to augment or diminish the happiness of the party whose interest is in question” (Ibid., p. 14).

[59] BENTHAM, Jeremy. An Introduction to the The Principles of Moral and Legislation. Kitchener: Batoche Books, 2000. p. 134.

[60]VELJANOVSKY, Cento. A Economia do Direito e da Lei: Uma Introdução. Traduzido por Francisco J. Beralli. Rio de Janeiro: Instituto Liberal, 1994. p. 25.

[61] Ibid., p. 26-27.

[62]GALDINO, Flávio. Introdução à Teoria dos Custos dos Direitos. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 345.

[63]SUNDFELD, Carlos Ari. Introdução às Agências Reguladoras. In: ______. (coord.) Direito Administrativo Econômico. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 17.

[64] Nesse artigo, analisam-se os efeitos externos produzidos pelas atividades econômicas (externalidades). Em resumo, ele defende que, no que se refere às atividades geradoras de danos, que a questão não se deve limitar à forma pela qual se deve responsabilizar o causador do dano, pois a relação é recíproca: Evitar que A cause dano a B equivale a causar dano a A. Dessa forma, a solução deve visar evitar o dano mais sério (COASE, R. H. The Problem of Social. Cost. The Journal of Law & Economics, Chicago, v. III, p. 1-44, out. 1960. p. 2).

[65] Sua pretensão foi examinar, à luz da teoria econômica, o alcance que podem ter os distintos significados implícitos na noção de distribuição de riscos, de modo a avaliar quais as normas mais eficazes para lograr o objetivo fixado como ótimo (CALABRESI, Guido. Some Thoughts on Risk Distributions and the Law of Torts. The Yale Law Journal, New Haven, v. 70, n. 4, p.499-553, mar. 1961. p. 499-500).

[66]VELJANOVSKY, op. cit., p. 30.

[67] ALVAREZ, Alejandro Bugallo. Análise Econômica do Direito: contribuições e desmistificações. Direito, Estado e Sociedade, v. 9, n. 29, p. 49-68, jul.-dez. 2006. p. 52.

[68]VELJANOVSKY, op. cit., p. 34.

[69] “Logo desde o começo foi meu intento elevar a Jurisprudência, que – aberta ou veladamente – se esgotava quase por completo em raciocínios de política jurídica, à altura de uma genuína ciência, de uma ciência do espírito. Importava explicar, não as suas tendências endereçadas à formação do Direito, mas as suas tendências exclusivamente dirigidas ao conhecimento do Direito, e aproximar tanto quanto possível os seus resultados do ideal de toda a ciência: objetividade e exatidão" (KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. Tradução por João Baptista Machado. 6ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998. p. VII).

[70]GICO JÚNIOR, op. cit., p. 12.

[71] ALVAREZ, op. cit., p. 50. No mesmo contexto e época, é válido salientar, situa-se a produção de Dworkin, como visto na seção 2, supra.

[72]GICO JÚNIOR, op. cit., p. 12-13.

[73] Não serão abordadas aqui, as diversas teorias acerca da busca dessa metodologia, como a tópica jurídica de Viehweg, o discurso ideal de Habermas, ou o juiz Hércules de Dworkin.

[74] Como, por exemplo, defende Dirley da Cunha Júnior: “Evidentemente que não são, nem podem ser alçados a obstáculos à efetivação judicial desse direito ao salário mínimo, os eventuais reflexos que a fixação de seu valor podem gerar na economia e nas finanças públicas [...] Questões como aumento dos custos de produção, aumento da inflação, desemprego, etc., são problemas políticos que desafiam soluções políticas”. (CUNHA JÚNIOR, Dirley. Controle Judicial das Omissões do Poder Público. 2ª ed. rev. atual. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 306).

[75]GICO JÚNIOR, op. cit., p. 15.

[76]Ibid., p. 15.

[77] VASCONCELLOS, Marco Antônio S.; GARCIA, Manuel E. Fundamentos de Economia. 2ª ed. Saraiva: São Paulo, 2006. p. 2.

[78] VASCONCELLOS, loc. cit.

[79] GICO JÚNIOR, op. cit., p. 16.

[80] ROBBINS, Lionel. An Essay on the Nature and Significance of Economic Science. MacMillan: London, 1945. p. 15-16.

[81] A exemplo da ciência política, sociologia, antropologia, psicologia e, logicamente, do direito.

[82] OLIVEIRA JÚNIOR, Raimundo Frutuoso de. Aplicações da Análise Econômica do Direito.Anais do XIX Congresso Nacional do CONPEDI. Fortaleza: CONPEDI, 2010, pp. 363-378. p.367.

[83] OLIVEIRA JÚNIOR, loc. cit.

[84]GICO JÚNIOR, op. cit., p. 20.

[85]CARVALHO, Cristiano. A Análise Econômica do Direito Tributário. São Paulo; Porto Alegre: CMTED, 2008. Disponível em: <http://www.cmted.com.br/restrito/upload/artigos/27.pdf>. Acesso em 30 jun. 2011. p. 4.

[86]GICO JÚNIOR, op. cit., p. 21-22.

[87]Ibid., p. 25.

[88]GICO JÚNIOR, loc. cit..

[89] V. item 3.4.2, infra.

[90]Em que pese a extrema utilidade desse tipo de dogma, é sabido, por outro lado, que em diversas situações, os indivíduos não se portam da forma esperada segundo os modelos, notadamente em situações de risco e incerteza. Alguns pesquisadores, como Daniel Kahneman e Amos Tversky já demonstraram a relevância desses desvios comportamentais. Contudo, tais desvios não parecem comprometer a análise econômica, pois mesmos os desvios diagnosticados seguem padrões, o que leva à necessidade de aperfeiçoamento dos modelos, não de seu descarte (GICO JÚNIOR. op. cit., p. 26).

[91]VASCONCELLOS; GARCIA, op. cit., p. 36.

[92] COOTER, Robert; ULEN, Thomas. Law and Economics. 3rd. ed. [s.l.]: Addison Wesley Longman, 2000. p. 10-11.

[93] Um exemplo singelo permite demonstrar o conceito de utilidade marginal: quando se está com muita sede, a utilidade auferida de um copo de água é intensa. Com o segundo copo – quando a sede já não é mais a mesma – a utilidade marginal se reduz. A utilidade de um terceiro copo já será bem mais reduzida, pois a necessidade que ele visava atender – a sede – já se estava esvaindo. Daí porque um consumidor se dispõe a pagar muito mais pelo primeiro copo de água do que pelo terceiro.

[94]GICO JÚNIOR, op. cit., p. 22.

[95] LAUDA, op. cit., p. 12.

[96] COOTER; ULEN, op. cit., p. 11.

[97]GICO JÚNIOR, loc. cit.

[98]GICO JÚNIOR, loc. cit..

[99]CARVALHO, op. cit., p. 7.

[100]GICO JÚNIOR, op. cit., p. 27.

[101]GICO JÚNIOR, loc. cit.

[102]GICO JÚNIOR, loc. cit.

[103]CARVALHO, op. cit., p. 5.

[104]VASCONCELLOS; GARCIA. Op. cit., p. 70.

[105]CORDEIRO, José Vicente Bandeira de Mello. A Logística como Ferramenta para a Melhoria do Desempenho em Pequenas Empresas. FAE Business, Curitiba, nº 8, p. 32-34, maio 2004.Disponível em: <http://www.fae.edu/publicacoes/pdf/revista_da_fae/fae_v8_n1/rev_fae_v8_n1_08_vicente.pdf>. Acesso em: 10 jul. 2011.

[106] SOUSA, Maria da Conceição Sampaio de. Bens Públicos e Externalidades. IEMonit: Brasília, 2011. Disponível em: <http://vsites.unb.br/face/eco/inteco/textosnet/1parte/externalidades.pdf>. Acesso em: 09 jul. 2011. p. 1.

[107]SUNDFELD, loc. cit.

[108]CARVALHO, Cristiano; MATTOS, Ely José de. Análise Econômica do Direito Triburário e Colisão de Princípios Jurídicos: Um Caso Concreto. Berkeley: Berkeley Program in Law and Economics, 2008. Disponível em: <http://www.escholarship.org/uc/item/5sb875z8.pdf>. Acesso em 30 jun. 2011. p. 6.

[109] V. seção 3.4.3, supra.

[110] CARVALHO; MATTOS, op. cit., p. 10-11.

[111] Que, segundo a concepção alexyana, teria a natureza de regra, ou, para Humberto Ávila, constituiria mais um postulado normativo aplicativo, por se tratar de uma metanorma. Neste ponto, remete-se o leitor ao exposto na nota n. 29, supra.

[112] Reporta-se, aqui, a um dos modelos teóricos acerca da concepção de direitos fundamentais no país, caracterizado pela ausência de limitas às prestações públicas, tidas por ideológicas (GALDINO, op. cit., p. 186).

[113] Embora este trabalho limite-se a analisar a solução de colisão entre princípios, registra-se a ideação desenvolvida neste item tem especial significação na temática da efetivação dos direitos fundamentais sociais, na qual também se revela imprescindível a análise do sopesamento – mais ainda sob a luz da eficiência. A esse respeito, cf. o Capítulo 9 da Teoria dos Direitos Fundamentais de Alexy (ALEXY, op. cit., p. 433-519).

[114] V. seção 2.4, supra.

[115] V. seção 2.2, supra.

[116]ÁVILA, op. cit., p. 177.

[117]Ibid., p. 178.

[118]ÁVILA, loc. cit.

[119]Ibid., p. 182.

[120] V. seção 3.4.2, supra.

[121] A econometria é o “método para desenvolver modelos de previsões econômicas baseado na unificação de teoria e estatística econômicas, técnicas matemáticas e tecnologia computacional” (AULETE, Caldas. iDicionário Aulete. Rio de Janeiro: Lexicon Digital, 2008. Disponível em: <http://aulete.uol.com.br/site.php?mdl=aulete_digital&op=loadVerbete&pesquisa=1&palavra=econometria>. Acesso em 10 jul. 2011).

[122]ÁVILA, loc. cit.

[123]ÁVILA, op. cit., p. 185.

[124] ALEXY, op. cit., p. 167.

[125]Ibid.,p. 168-170.

[126]Ibid.,p. 169.


Autor

  • Lucas Hayne Dantas Barreto

    Procurador Federal. Professor de Direito Administrativo na Faculdade Ruy Barbosa. Mestrando em Direito Público pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Especialista em Direito do Estado. Membro do Instituto de Direito Administrativo da Bahia.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BARRETO, Lucas Hayne Dantas. Racionalidade do processo de solução de colisões entre direitos fundamentais à luz da análise econômica do direito. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3245, 20 maio 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21780. Acesso em: 19 abr. 2024.