Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/23514
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

O sistema constitucional dos países lusófonos.

Um breve passeio no modelo jurídico-político de Angola, do Brasil, de Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste, à luz das concepções de Ferdinand Lassalle, Konrad Hesse e Karl Loewenstein

O sistema constitucional dos países lusófonos. Um breve passeio no modelo jurídico-político de Angola, do Brasil, de Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste, à luz das concepções de Ferdinand Lassalle, Konrad Hesse e Karl Loewenstein

Publicado em . Elaborado em .

Analisam-se os sistemas constitucionais dos países lusófonos (Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, São Tomé e Príncipe, Portugal e Timor-Leste), a partir das categorias lançadas por Ferdinand Lassalle, Konrad Hesse e Karl Loewenstein, verificando mais a realidade jurídico-política do que o texto constitucional.

Resumo: O presente ensaio visa analisar os sistemas constitucionais dos países lusófonos (Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, São Tomé e Príncipe, Portugal e Timor-Leste), a partir das categorias lançadas por Ferdinand Lassalle, Konrad Hesse e Karl Loewenstein, verificando mais a realidade jurídico-política do que o texto constitucional.

Palavras-chave: Direito Constitucional Comparado - Lusofonia – Sistema Constitucional – Angola – Brasil – Cabo Verde – Guiné-Bissau – Moçambique – São Tomé E Príncipe – Portugal – Timor-Leste – Ferdinand Lassalle – Konrad Hesse – Karl Loewenstein.

Sumário: I. Introdução; II. Pressupostos de compreensão a partir de Lassalle, Hesse e Loewenstein; III. A Comunidade Lusófona; IV. Portugal; V. Brasil; VI. Angola; VII. Cabo Verde; VIII. Guiné-Bissau; IX. Moçambique; X. São Tomé e Príncipe; XI. Timor-Leste; XII. Considerações finais; XIII. Referências; XIV. Sítios virtuais.  


I. INTRODUÇÃO

O presente texto visita os sistemas constitucionais dos países lusófonos, que vem a ser Portugal e aqueles que têm na experiência colonial portuguesa um elemento comum.

Como é cediço, fazem parte da comunidade lusófona os seguintes Estados soberanos e independentes: Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e o Timor-Leste.

O tema descansa a sua justificativa nas indiscutíveis relações de proximidade e de semelhança entre as histórias e as realidades, bem como entre os sonhos e aspirações, das pessoas e das instituições desses aludidos Estados pertencentes à comunidade lusófona.

A finalidade deste breve ensaio é a de demonstrar as principais semelhanças e dessemelhanças entre os referidos sistemas constitucionais, de sorte a propiciar e evidenciar as boas experiências normativas de cada um desses membros da comunidade lusófona e revelar as eventuais experiências negativas, para que tenhamos a humildade de copiar os acertos e procuremos evitar ou corrigir os erros cometidos.

Para alcançar esse desiderato, visitaremos os aspectos mais importantes dos respectivos textos constitucionais, conscientes, no entanto, de que a comparação de sistemas jurídicos vai muito além da singela comparação de enunciados textuais, visto que de há muito nos ensinou Miguel Reale (Teoria Tridimensional do Direito) que para uma adequada compreensão do fenômeno jurídico (e o fenômeno constitucional é de caráter jurídico) se faz indispensável o conhecimento das circunstâncias fáticas, dos valores sociais e coletivamente compartilhados e dos textos normativos, no presente caso dos textos constitucionais.

Nessa linha, temos que comparação de Direito não se resume a comparação de Textos, mas, sobretudo e principalmente, a comparações de Experiências e de Realidades, levando-se em consideração todos os demais aspectos relevantes (cultura, história, geografia, economia, religião, ciências etc.) para uma adequada compreensão do Sistema Constitucional de cada um dos citados membros da comunidade lusófona.

Cuide-se que o que merece ser realçado em qualquer análise do sistema jurídico-constitucional consiste em verificar se as normas (regras, princípios e postulados) são instrumentos eficazes de ordenação e de organização da vida em sociedade.

Ou seja, o sistema constitucional em si, visto isoladamente, não tem qualquer importância. O sistema constitucional deve estar conectado com a realidade social e a Constituição, para ser levada a sério, deve ser norma jurídica com força suficiente para conformar os padrões comportamentais das pessoas e das instituições, especialmente dos governos e dos governantes.

Nesse prisma, indaga-se: o que efetivamente nos interessa saber acerca dos sistemas constitucionais dos países lusófonos? As Constituições são simples “folhas de papel”? Ou as Constituições têm força normativa? As Constituições não passam de textos semânticos justificadores dos abusos governamentais? Ou as Constituições se revelam como norma jurídica obedecida e cumprida pelos governantes e governados? Ou as Constituições ainda desempenham um caráter pedagógico porquanto não obtiveram a plena adesão dos governantes e dos governados?

Previamente às indagações acerca da eficácia normativa dos textos constitucionais, no que tem relevância, importa saber o grau de legitimidade e de legitimação das mencionadas Constituições. Quais tiveram origem democrática e legítima e quais são autoritárias e ilegítimas?


II. OS PRESSUPOSTOS DE COMPREENSÃO A PARTIR DE LASSALLE, HESSE E LOEWENSTEIN

Nessa perspectiva, como pressupostos de compreensão utilizaremos as categorias conceituais lançadas por Ferdinand Lassalle (A essência da Constituição/Über die Verfassung), por Konrad Hesse (A força normativa da Constituição/Die normative Kraft der Verfassung), e por Karl Loewenstein (A Teoria da Constituição/Verfassunglehre).

Nada obstante o surgimento de novas teorias e doutrinas explicativas e justificadoras das atuais realidades constitucionais, especialmente de países histórica e tradicionalmente situados na periferia da modernidade ocidentalizada, como sucede com os lusófonos, creio que os referidos autores permanecem capazes de viabilizar esse desiderato: uma adequada compreensão do fenômeno constitucional, afinal de contas, os clássicos são sempre atuais.

Com efeito, no longínquo ano de 1862, no reino germânico da Prússia, Ferdinand Lassalle proferiu palestra posteriormente publicada e que no Brasil ganhou dois títulos: o primeiro Que é uma Constituição?; o segundo título é A Essência da Constituição. Este último é o título mais usual de sua clássica obra em solo brasileiro.

Pois bem, Lassalle (2001, p. 5) principia sua exposição com as seguintes indagações:

Que é uma Constituição? Qual a verdadeira essência de uma Constituição? Em todos os lugares e a qualquer hora, à tarde, pela manhã e à noite, estamos ouvindo falar da Constituição e de problemas constitucionais. Na imprensa, nos clubes, nos cafés e nos restaurantes, é este o assunto obrigatório de todas as conversas.

E, apesar disso, ou por isso mesmo, formulamos em termos precisos esta pergunta: Qual será a verdadeira essência, o verdadeiro conceito de uma Constituição? Estou certo de que, entre essas milhares de pessoas que dela falam, existem muito poucos que possam dar-nos uma resposta satisfatória. 

Ante esse quadro problemático, Lassalle continua lançando mão de indagações que recordam o método da maiêutica socrática, e nesse jogo de perguntas e respostas, diz que a resposta de um jurista seria a de que “A Constituição é a lei fundamental proclamada pela nação, na qual baseia-se a organização do Direito público do país” (LASSALLE, 2001, p. 6).

De posse desse conceito jurídico da Constituição como “Lei Fundamental”, Lassalle (2001, p. 7) pergunta: “Qual a diferença entre uma Constituição e uma lei?”

Lassalle (2001, p. 7)  reconhece a essência legislativa da Constituição, no sentido de que ela – a Constituição – é também uma Lei; mas nada obstante seja uma Lei, ela – a Constituição – é mais do que uma simples Lei, porquanto, segundo Lassalle, alterações legislativas não provocam as mesmas reações que provocam alterações constitucionais, visto que “quando mexem na Constituição, protestamos e gritamos: ‘Deixem a Constituição!’. Qual é a origem dessa diferença?”, indaga Lassalle (2001, p. 8).

Para Lassalle (2001, p. 8): “Todos esses fatos demonstram que, no espírito unânime dos povos, uma Constituição deve ser qualquer coisa de mais sagrado, de mais firme e de mais imóvel que uma lei comum”

Por isso que, continua Lassalle (2001, p. 8), a “Constituição não é uma lei como as outras, é uma lei fundamental da nação”. Mas o que diferencia a lei fundamental das demais leis não-fundamentais? Permanece indagando Lassalle.

Para responder a essa pergunta Lassalle (2001, p. 9) fornece três pistas:

1º Que a lei fundamental seja uma lei “básica”, mais do que as outras comuns, como indica seu próprio nome “fundamental”;

2º Que constitua – pois de outra forma não poderíamos chamá-la de fundamental – o verdadeiro fundamento das outras leis, isto é, a lei fundamental, se realmente pretende ser merecedora desse nome, deverá informar e engendrar as outras leis comuns originárias da mesma. A lei fundamental, para sê-lo, deverá, pois, atuar e irradiar-se através das leis comuns do país;

3º Mas as coisas que têm um fundamento não o são por um capricho; existem por que necessariamente devem existir. O fundamento a que respondem não permite serem de outro modo. Somente as coisas que carecem de fundamento, que não as casuais e as fortuitas, podem ser como são ou mesmo de qualquer forma; as que possuem um fundamento, não. Elas se regem pela necessidade. (...) A idéia de fundamento traz, implicitamente, a noção de uma necessidade ativa, de uma força eficaz e determinante que atua sobre tudo que nela se baseia, fazendo-a assim e não de outro modo.

Certo que para Lassalle (2001, p. 10) em sendo a Constituição a Lei Fundamental de uma nação, ela enquanto Lei Fundamental se apresenta como uma “força ativa que faz, por uma exigência da necessidade, que todas as outras leis e instituições jurídicas vigentes no país sejam o que realmente são. Promulgada, a partir desse instante, não se pode decretar, naquele país, embora possam querer, outras leis contrárias à fundamental”

Nos aproximamos do elemento central das proposições de Lassalle (2001, p. 10) e vez mais ele formula uma pergunta capital para descortinar a verdadeira essência da Constituição:

Muito bem, pergunto eu, será que existe em algum país – e fazendo esta pergunta os horizontes clareiam – alguma força ativa que possa influir de tal forma em todas as leis do mesmo, que as obrigue a ser necessariamente, até certo ponto, o que são e como são, sem poderem ser de outro modo?

A essa indagação, Lassalle (2001, p. 10) oferece a seguinte resposta:

Esta incógnita que estamos investigando apóia-se, simplesmente, nos fatores reais do poder que regem uma determinada sociedade.

Os fatores reais do poder que atuam no seio de cada sociedade são essa força ativa e eficaz que informa todas as leis e instituições jurídicas vigentes, determinando que não possam ser, em substância, a não ser tal como elas são.

Eis o coração da tese de Lassalle: a Constituição resulta dos fatores reais de poder de uma determinada sociedade.

Lassalle (2001, p. 11) joga com um exemplo que sabe absurdo: “suponhamos que um país, por causa de um sinistro, ficasse sem nenhuma das leis que o governavam e que por força das circunstâncias, fosse necessário decretar novas leis”

Ante esse quadro de absoluta anomia jurídica, Lassalle (2001, p. 11) indaga: “Neste caso, o legislador, completamente livre, poderia fazer leis de capricho ou de acordo com o seu próprio modo de pensar?”

Lassalle começa a responder a essa pergunta lastreado no insuperável princípio da realidade.

Com efeito, os contrários à monarquia, onde houvesse uma, ficariam açulados a negar ao monarca as suas prerrogativas políticas e poriam abaixo essa forma de governo. A reação do monarca, seria a seguinte, segundo Lassalle (2001, p. 12):

O monarca responderia assim: Podem estar destruídas as leis, porém a realidade é que o exército subsiste e me obedece, acatando minhas ordens; a realidade é que os comandantes dos arsenais e quartéis põem na rua os canhões e as baionetas quando eu o ordenar. Assim, apoiado neste poder real, efetivo, das baionetas e dos canhões, não tolero que venham me impor posições e prerrogativas em desacordo comigo.

Como podeis ver, um rei a quem obedecem o exército e os canhões é uma parte da Constituição.

Peço licença para abrir um parêntese nesse aspecto da força das armas no cenário jurídico-constitucional de um país, especialmente no tocante à defesa das instituições do Estado.

É por todos conhecido o clássico debate travado entre Hans Kelsen e Carl Schmitt acerca de quem deve ser o “Guardião da Constituição” (Der Hüter der Verfassung).

Segundo a visão liberal e democrática de Hans Kelsen (2003) o órgão jurídico-político adequado e competente para guardar, defender e proteger a Constituição deve ser um “Tribunal”, composto de magistrados cuja missão principal seria, mediante uma justiça ou jurisdição constitucional, velar pela supremacia normativa da Constituição.

Todavia, segundo a visão anti-liberal e autoritária de Carl Schmitt (2007), em vez do “Tribunal Constitucional”, o verdadeiro “guardião” da Constituição seria o Chefe de Estado, porquanto seja ele o detentor da faculdade de decretar o “estado de emergência ou de exceção constitucional”, logo a quem obedecem as forças armadas ou de segurança de um país. Ou seja, aquele que detiver o comando das armas se revela como o verdadeiro “guardião da Constituição”.

Se observarmos o texto constitucional brasileiro somos tentados a imaginar que as teses liberais e democráticas de Kelsen se apresentam vencedoras, haja vista o disposto no caput do artigo 102 que enuncia que “compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição”.

Sucede que os textos não devem ser lidos “em tiras ou isoladamente”, mas em sua totalidade, como adverte o magistério de Eros Roberto Grau (2006, p. 44).

Por esse ângulo, no texto constitucional brasileiro há específico Título – o V - versando acerca da “Defesa do Estado e das Instituições Democráticas”, com a atribuição concedida ao Presidente da República, ouvidos os Conselhos de Defesa Nacional e o Conselho da República, de decretar o “Estado de Defesa” e de solicitar ao Congresso Nacional a decretação do “Estado de Sítio”, que implicaria a suspensão dos direitos e liberdades constitucionais (arts. 136 a 141, CF).

Tenha-se que nos termos da Constituição brasileira o Presidente da República é o comandante supremo das Forças Armadas nacionais (art. 142). Nesse passo, à luz de Carl Schmitt, o “guardião” da Constituição brasileira seria o Presidente da República, a quem o “aparato de segurança” deve obedecer.

Todavia, analisando o tema com mais vagar, veremos que ambas as concepções são aparentemente contraditórias, visto que em situação de normalidade institucional o “guardião da Constituição” é o Supremo Tribunal Federal. Mas em situação de anormalidade institucional a missão de proteger a Constituição compete ao Presidente da República.

E, em situações extremas, diante de conflito insolúvel entre os poderes constitucionais (Presidente da República versus Supremo Tribunal Federal ou versus Congresso Nacional), compete às Forças Armadas o dever de velar pela preservação ou restabelecimento da ordem institucional (art. 142, CF).

É de ver, portanto, a importância das Forças Armadas como fator real de poder nos sistemas constitucionais, sejam os democráticos sejam os autoritários.

Nos demais países lusófonos a situação é praticamente a mesma, competindo à “Corte Constitucional” velar pela Constituição nos períodos de normalidade institucional e ao Chefe-de-Estado ou às Forças Armadas velar pela Constituição nos períodos de anormalidade institucional.

Fecho o longo parêntese e volto a Ferdinand Lassalle.

Nessa batida, Lassalle (2001, p. 12) recorda que além do rei e do exército (forças armadas) uma “aristocracia” ou “nobreza” influente e bem-vista pelo rei é também uma parte da Constituição, pois essa parcela da sociedade, ainda que ínfima, não abriria mão de suas benesses ou prerrogativas.

Quem mais, segundo Lassalle, se apresenta como “fator real de poder” e parte da Constituição? Lassalle (2001, pp. 13-15)  fala da “grande burguesia” e dos “banqueiros”, ou seja, do poder econômico como partes da Constituição, porquanto o próprio Estado e a sociedade dependeriam financeiramente dessas duas aludidas classes sociais.

Lassalle (2001, p. 16) também menciona a alta burocracia estatal como “fator real de poder” e aduz o seguinte exemplo:

Suponhamos que o governo intentasse promulgar uma lei penal semelhante à que prevaleceu durante algum tempo na China, punindo na pessoa dos pais os roubos cometidos pelos filhos. Essa lei não poderia viger, pois contra ela se levantaria o protesto, com toda a energia possível, da cultura coletiva e da consciência social do país. Todos os funcionários, burocratas e conselheiros do Estado ergueriam as mãos para o céu e até os sisudos senadores teriam que discordar de tamanho absurdo. É que, dentro de certos limites, também a consciência coletiva e a cultura geral da nação são partículas, e não pequenas, da Constituição.

Lassalle não fala das religiões ou das igrejas, mas não restam dúvidas de que acaso o legislador resolvesse interferir na religiosidade ou na economia interna das igrejas, certamente sofreria ante a força social e as influências que as crenças religiosas exercem sobre as pessoas. Nesse passo, digo que as igrejas também são partes da Constituição, e o seu poder não deve ser desprezado.

Por fim, Lassalle (2001, p. 16) analisa se a “pequena burguesia” e a “classe operária” podem ser vistas como parcelas da Constituição:

Imaginemos agora que o governo, querendo proteger e satisfazer os privilégios da nobreza, dos banqueiros, dos grandes industriais e dos grandes capitalistas, tentasse privar das suas liberdades políticas a pequena burguesia e a classe operária. Poderia fazê-lo?

Infelizmente, sim; poderia, mesmo que fosse transitoriamente. Os fatos nos demonstram que poderia.

Mas, e se o governo pretendesse tirar à pequena burguesia e ao operariado não somente as suas liberdades políticas, mas a sua liberdade pessoal, isto é, pretendesse transformar o trabalhador em escravo ou servo, retornando à situação em que se viveu durante os tempos da Idade Média?  Subsistiria essa pretensão?

Não, embora estivessem aliados ao rei a nobreza e toda a grande burguesia.

Seria tempo perdido.

O povo protestaria, gritando: Antes morrer do que sermos escravos! A multidão sairia à rua sem necessidade de que os seus patrões fechassem as fábricas, a pequena burguesia juntar-se-ia solidariamente com o povo e a resistência desse bloco seria invencível, pois nos casos extremos e desesperados, também o povo, nós todos, somos uma parte integrante da Constituição.

Com efeito, nos períodos dramáticos e revolucionários, parcela substantiva do povo se torna irracional e explode a violência.

Eis a tese central de Lassalle (2001, p. 17): “Esta é, em síntese, em essência, a Constituição de um país: a soma dos fatores reais de poder que regem uma nação”

Nesse passo, Lassalle (2001, p. 17) revela que a Constituição jurídica não passa de uma simples “folha de papel”:

Mas que relação existe com o que vulgarmente chamamos Constituição? Com a Constituição jurídica? Não é difícil compreender a relação que ambos os conceitos guardam entre si. Juntam-se esses fatores reais do poder, os escrevemos em uma folha de papel e eles adquirem expressão escrita. A partir desse momento, incorporados a um papel, não são simples fatores reais do poder, mas sim verdadeiro direito – instituições jurídicas. Quem atentar contra eles atenta contra a lei e por conseguinte é punido.

Ninguém desconhece o processo que se segue para transformar esses escritos em fatores reais do poder, transformando-os dessa maneira em fatores jurídicos.

Lassalle (2001, p. 21) demonstra que a organização do poder institucionalizado é a justificativa de sua permanência e de seu controle sobre o poder popular desorganizado, porquanto sejam as forças armadas alicerçadas na hierarquia, na disciplina e na obediência.

Entretanto, segundo Lassalle (2001, p. 22), o poder da nação apesar de infinitamente maior não é tão organizado quanto o poder das forças armadas e a nação carece do principal instrumento do aparato de segurança do poder institucionalizado: de armas. A nação fabrica ou paga as armas que a mantém domesticada ou neutralizada.

Para Lassalle (2001, p. 23) essas seriam as razões explicativas da supremacia do poder organizado das instituições sobre o poder desorganizado da nação. No entanto, a população pode um dia se revoltar, cansada de ver os interesses gerais da nação mal conduzidos e derrotar aqueles que em vez de usar o poder para servir ao povo, servem-se do poder contra o próprio povo, pois o poder da nação é invencível, acentua Lassalle (2001, p. 34).

Nesse compasso, Lassalle (2001, p. 23) explicita as diferenças entre a Constituição real e a Constituição jurídica:

Tenho demonstrado a relação que guardam entre si as duas constituições de um país: essa constituição real e efetiva, integralizada pelos fatores reais de poder que regem a sociedade, e essa outra constituição escrita, à qual, para distingui-la da primeira, vamos denominar folha de papel.

Lassalle (2001, p. 25) recorda que todas as sociedades sempre tiveram um modo de ser e de funcionar, sempre tiveram uma constituição no sentido real, mas a modernidade trouxe uma novidade para o cenário social: a constituição escrita na folha de papel, cuja principal missão é o estabelecimento documental de todas as instituições e princípios do governo vigente.

Lassalle (2001, p. 33), em tópico sobre a “arte” e a “sabedoria” constitucionais, inicia demonstrando que a erupção revolucionária não abala o direito privado, mas o direito público constitucional desmorona. Indaga Lassalle: “Quando podemos dizer que uma constituição escrita é boa e duradoura?” Lassalle oferece a seguinte solução:

A resposta é clara e parte logicamente de quanto temos exposto: Quando esta constituição escrita corresponder à constituição real e tiver suas raízes nos fatores do poder que regem o país.

Onde a constituição escrita não corresponder à real, irrompe inevitavelmente um conflito que é impossível evitar e no qual, mais dia menos dia, a constituição escrita, a folha de papel, sucumbirá necessariamente, perante a constituição real, a das verdadeiras forças vitais do país.

Conclui Lassalle (2001, p. 40):

Os problemas constitucionais não são problemas de direito, mas do poder; a verdadeira Constituição de um país somente tem por base os fatores reais e efetivos do poder que naquele país vigem e as constituições não têm valor nem são duráveis a não ser que exprimam fielmente os fatores reais do poder que imperam na realidade social: eis aí os critérios fundamentais que devemos sempre lembrar.

[...]

Se alguma vez os meus ouvintes ou leitores tiverem que dar seu voto para oferecer ao país uma Constituição, estou certo de que saberão como devem ser feitas estas coisas e que não limitarão a sua intervenção redigindo e assinando uma folha de papel, deixando incólumes as forças reais que mandam no país.

Essa é a premissa estampada por Ferdinand Lassalle: os problemas constitucionais não questões jurídicas, não se resolvem de acordo com as normas do direito, mas se cuidam de questões políticas, resolvidas com base nas conveniências, nos interesses e na força.

Peço, vez mais, licença para recordar uma página da história constitucional brasileira que se afivela ao pensamento de Lassalle.

Trata-se do Mandado de Segurança n. 3.557, julgado em 7.11.1956, no qual o Supremo Tribunal Federal apreciou impetração do Presidente João Café Filho em face da Mesa do Congresso Nacional que se recusava a retransmitir-lhe o cargo de Presidente da República, tendo em vista a pressão exercida pelas Forças Armadas, especialmente pelo General Henrique Teixeira Lott, Ministro da Guerra.

Nesse julgamento, o Tribunal reconhece a sua incapacidade de impor a força jurídica da Constituição em face da força política das Armas. Valiosa a reveladora passagem do voto do Ministro Nelson Hungria:

Qual o impedimento mais evidente, e insuperável pelos meios legais, do titular da Presidência da República, que o obstáculo oposto por uma vitoriosa insurreição armada?

Afastado ‘o manto diáfano da fantasia sobre a nudez rude da verdade’, a resolução do Congresso não foi senão a constatação da impossibilidade material em que se acha o senhor Café Filho, de reassumir a Presidência da República, em face da imposição dos tanks e baionetas do Exército, que estão acima das leis, da Constituição e, portanto, do Supremo Tribunal Federal. Podem ser admitidos os bons propósitos dessa imposição, mas como a santidade dos fins não expunge a ilicitude dos meios, não há jeito, por mais especioso, de considerá-la uma situação que possa ser apreciada e resolvida de jure por esta Corte.

É uma situação de fato criada e mantida pela força das armas, contra a qual seria, obviamente, inexeqüível qualquer decisão do Supremo Tribunal. A insurreição é um crime político, mas, quando vitoriosa, passa a ser um título de glória, e os insurretos estarão a cavaleiro do regime legal que infringiram; sua vontade é que conta, e nada mais.

[...]

Contra uma insurreição pelas armas, coroada de êxito, somente valerá uma contra-insurreição com maior força. E esta, positivamente, não pode ser feita pelo Supremo Tribunal, posto que este não iria cometer a ingenuidade de, numa inócua declaração de princípios, expedir mandado para cessar a insurreição.

Aí está o nó górdio que o Poder Judiciário não pode cortar, pois não dispõe da espada de Alexandre. O ilustre impetrante, ao que me parece, bateu em porta errada. Um insigne professor de Direito Constitucional, doublé de exaltado político partidário, afirmou, em entrevista não contestada, que o julgamento deste mandado de segurança ensejaria ocasião para se verificar se os Ministros desta Corte ‘eram leões de verdade ou leões de pé de trono’.

Jamais nos inculcamos leões. Jamais vestimos, nem podíamos vestir, a pele do rei dos animais. A nossa espada é um mero símbolo. É uma simples pintura decorativa no teto ou na parede das salas de Justiça. Não pode ser oposta a uma rebelião armada. Conceder mandado de segurança contra esta seria o mesmo que pretender afugentar leões autênticos sacudindo-lhes o pano preto de nossas togas.

Senhor Presidente, o atual estado de sítio é perfeitamente constitucional, e o impedimento do impetrante para assumir a Presidência da República, antes de ser declaração do Congresso, é imposição das forças insurrecionais do Exército, contra a qual não há remédio na farmacologia jurídica. ­

É induvidoso que diante da força real do poder das armas a força simbólica do direito nada pode fazer.

Nada obstante esse dado incontrastável da realidade política, em 1959 Konrad Hesse proferiu palestra na qual procurou apresentar uma alternativa à tese ácida de Ferdinand Lassalle. No Brasil a citada palestra foi publicada sob o título de “A Força Normativa da Constituição” (1991).

Em sua exposição, Hesse principia recordando a aludida palestra de Ferdinand Lassalle e as teses defendidas por esse citado pensador constitucional, mormente a ideia de que a Constituição jurídica não passa de uma “folha de papel” inútil se divorciada dos fatores reais de poder, de sorte a revelar uma contradição entre o Direito Constitucional e a própria essência da Constituição.

Incomodado com essa perspectiva, Hesse (1991, p. 11)  aduz:

Essa negação do direito constitucional importa na negação do seu valor enquanto ciência jurídica. Como toda ciência jurídica, o Direito Constitucional é ciência normativa; Diferenciando-se, assim, da Sociologia e da Ciência Política enquanto ciências da realidade. Se as normas constitucionais nada mais expressam do que relações fáticas altamente mutáveis, não há como deixar de reconhecer que a ciência da Constituição jurídica constitui uma ciência jurídica na ausência do direito, não lhe restando outra função senão a de constatar e comentar os fatos criados pela Realpolitik. Assim, o Direito Constitucional não estaria a serviço de uma ordem estatal justa, cumprindo-lhe tão-somente a miserável função – indigna de qualquer ciência – de justificar as relações de poder dominantes.

Tenha-se que Hesse falou para um povo escarmentado pelos horrores impostos pelo nazifascismo e praticamente se reconstruindo, material e moralmente, após a derrota na Segunda Guerra Mundial.

Seguindo o método de Lassalle, Hesse (1991, p. 11) faz várias indagações provocativas:

A questão que se apresenta diz respeito à força normativa da Constituição. Existiria, ao lado do poder determinante das relações fáticas, expressas pelas forças políticas e sociais, também uma força determinante do Direito Constitucional? Qual o fundamento e o alcance dessa força do Direito Constitucional? Não seria essa força uma ficção necessária para o constitucionalista, que tenta criar a suposição de que o direito domina a vida do Estado, quando na realidade, outras forças mostram-se determinantes?

Na construção de suas respostas, Hesse procura demonstrar que a análise do tema pressupõe o reconhecimento das relações entre o texto normativo e o contexto social, no seu condicionamento recíproco, afastando o prisma isolado do positivismo formalista ou do positivismo sociológico, levando a uma superação da radical separação entre a realidade e norma, entre ser (Sein) e dever-ser (Sollen).

Com efeito, aduz Konrad Hesse (1991, p. 14):

A norma constitucional não tem existência autônoma em face da realidade. A sua essência reside na sua vigência, ou seja, a situação por ela regulada pretende ser concretizada na realidade. Essa pretensão de eficácia (Geltungsanspruch) não pode ser separada das condições históricas de sua realização, que estão, de diferentes formas, numa relação de interdependência, criando regras próprias que não podem ser desconsideradas. Devem ser contempladas aqui as condições naturais, técnicas, econômicas, e sociais. A pretensão de eficácia da norma jurídica somente será realizada se levar em conta essas condições. Há de ser, igualmente, contemplado o substrato espiritual que se consubstancia num determinado povo, isto é, as concepções sociais concretas e o baldrame axiológico que influenciam decisivamente a conformação, o entendimento e a autoridade das proposições normativas.

Para Konrad Hesse, a Constituição não é mero reflexo da realidade social, mas um elemento capaz de imprimir ordem e conformar essa realidade social e política, visto que há mútuo condicionamento entre a “Constituição real” e a “Constituição jurídica”, em uma relação de coordenação, e não de dependência recíproca, porquanto a pretensão de eficácia da Constituição a coloca como uma força normativa social.

Konrad Hesse (1991, p. 18) critica o formalismo estéril divorciado da realidade, porquanto regulador de inúteis abstrações hipotéticas, e diz: “se as leis culturais, sociais, políticas e econômicas são ignoradas pela Constituição, carece ela do imprescindível germe de sua força vital. A disciplina normativa contrária a essas leis não logra concretizar-se”

Hesse se louva no pensamento de Wilhelm Humboldt e aduz que a norma constitucional somente constrói o futuro se considerar o presente, e se estiver determinada pelo “princípio da necessidade”. Diz Hesse (1991, p. 18):

Em outras palavras, a força vital e a eficácia da Constituição assentam-se na sua vinculação às forças espontâneas e às tendências dominantes do seu tempo, o que possibilita o seu desenvolvimento e a sua ordenação objetiva. A Constituição converte-se, assim, na ordem geral objetiva do complexo de relações da vida.

Avizinhamo-nos do coração da tese de Hesse que consiste em identificar plenamente o texto constitucional com o contexto social, pois isso seria acolher a premissa de Lassalle. Diz Hesse (1991, p. 19):

Embora a Constituição não possa, por si só, realizar nada, ela pode impor tarefas. A Constituição transforma-se em força ativa se essas tarefas forem efetivamente realizadas, se existir disposição de orientar a própria conduta segundo a ordem nela estabelecida, se, a despeito de todos os questionamentos e reservas provenientes dos juízos de conveniência, se puder identificar a vontade de concretizar essa ordem. Concluindo, pode-se afirmar que a Constituição converter-se-á em força ativa se fizerem-se presentes, na consciência geral  - particularmente, na consciência dos principais responsáveis pela ordem constitucional -, não só a vontade do poder (Wille zur Macht), mas também a vontade de Constituição (Wille zur Verfassung).

Eis a tese de Hesse: a vontade de Constituição pode prevalecer sobre a vontade do poder, desde que haja uma consciência constitucional ou cívica por parte dos principais interessados e responsáveis pela concretização da Constituição.

Essa vontade constitucional provém de três vertentes diversas, segundo Hesse (1991, p. 19):

Baseia-se na compreensão da necessidade e do valor de uma ordem normativa inquebrantável, que proteja o Estado contra o arbítrio desmedido e disforme. Reside, igualmente, na compreensão de que essa ordem constituída é mais do que uma ordem legitimada pelos fatos (e que, por isso, necessita de estar em constante processo de legitimação). Assenta-se também na consciência de que, ao contrário do que se dá com uma lei do pensamento, essa ordem não logra ser eficaz sem o concurso da vontade humana. Essa ordem adquire e mantém sua vigência através de atos de vontade.

Fincadas essas estacas conceituais, Hesse aponta os caminhos que devem ser percorridos para que uma Constituição tenha efetiva e eficaz força normativa, revelando os limites do texto constitucional e os pressupostos das normas constitucionais.

Segundo Hesse, o conteúdo da Constituição deve considerar os elementos sociais, culturais, políticos, históricos, econômicos e deve considerar o estado espiritual de seu tempo, em busca de uma ordem jurídica justa e adequada, de modo a assegurar o apoio e a defesa da consciência geral. A Constituição deve ser estimada pelo povo.

A Constituição deve ser aberta e principiológica, não sendo adequado constitucionalizar interesses momentâneos ou particulares ou situações muito específicas, de sorte a provocar a necessidade de permanentes revisões constitucionais, com a sua inevitável desvalorização normativa, enuncia Hesse.

Outrossim, a Constituição deve contemplar uma visão plural dos complexos interesses existentes em uma sociedade, não devendo se assentar em uma estrutura unilateral, pois a dinâmica de um mundo em permanente transformação exige a preservação e a incorporação da estrutura contrária, mediante meticulosa ponderação, afirma Hesse.

Saindo da órbita do conteúdo e avançando no delicado tema da práxis constitucional, Hesse convida a todos a sacrificar seus interesses particulares e egoísticos em favor da preservação da Constituição, pois isso fortalece o respeito à Constituição e garante um bem da vida indispensável à essência do Estado democrático. Em vez da vontade do “interesse”, prevaleça a vontade de Constituição.

Ainda no aspecto da prática constitucional, Hesse alude acerca da interpretação constitucional que deve ser voltada para a ótima concretização da norma constitucional, cabendo ao intérprete verificar as possibilidades evolutivas do texto, adaptando-o às contingências e mudanças de tempo, sem que haja necessidade de  revisão constitucional, bastando mudar a interpretação sem mudar o texto.

Eis o sumário das principais teses de Hesse (1991, pp. 24-27):

A Constituição jurídica está condicionada pela realidade histórica. Ela não pode ser separada da realidade concreta de seu tempo. A pretensão de eficácia da Constituição somente pode ser realizada se se levar em conta essa realidade. Graças ao elemento normativo, ela ordena e conforma a realidade política e social. As possibilidades, mas também os limites da força normativa da Constituição resultam da correlação entre ser (Sein) e dever-ser (Sollen).

A Constituição jurídica logra conferir forma e modificação da realidade. (...) Portanto, a intensidade da força normativa da Constituição apresenta-se, em primeiro plano, como uma questão de vontade normativa, de vontade da Constituição (Wille zur Verfassung).

[...]

Quanto mais intensa for a vontade de Constituição, menos significativas hão de ser as restrições e os limites impostos à força normativa da Constituição. A vontade de Constituição não é capaz, porém, de suprimir esses limites. Nenhum poder do mundo, nem mesmo a Constituição, pode alterar as condicionantes naturais. Tudo depende, portanto, de que se conforme a Constituição a esses limites. Se os pressupostos da força normativa encontrarem correspondência na Constituição, se as forças em condições de violá-la ou de alterá-la mostrarem-se dispostas a render-lhe homenagem, se, também em tempos difíceis, a Constituição lograr preservar a sua força normativa, então ela configura verdadeira força viva capaz de proteger a vida do Estado contra as desmedidas investidas do arbítrio. Não é, portanto, em tempos tranqüilos e felizes que a Constituição normativa vê-se submetida à sua prova de força. Em verdade, esta prova dá-se nas situações de emergência, nos tempos de necessidade.

[...]

 Por isso, o Direito Constitucional depende das ciências da realidade mais próximas, como a História, a Sociologia e a Economia.

Isso significa que o Direito Constitucional deve preservar, modestamente, a consciência dos seus limites. Até porque a força normativa da Constituição é apenas uma das forças de cuja atuação resulta a realidade do Estado. E esta força tem limites. A sua eficácia depende da satisfação dos pressupostos acima enunciados.

[...]

Essa orientação torna imperiosa a assunção de uma visão crítica pelo Direito Constitucional, pois nada seria mais perigoso do que permitir o surgimento de ilusões sobre questões fundamentais para a vida do Estado.

Hesse analisa a situação peculiar da Alemanha submetida às forças militares de ocupação e visita o “estado de necessidade constitucional”. Alfim conclui (1991, p. 32):

Não se deve esperar que as tensões entre ordenação constitucional e realidade política e social venham a deflagrar sério conflito. Não se poderia, todavia, prever o desfecho de tal embate, uma vez que os pressupostos asseguradores da força normativa da Constituição não foram plenamente satisfeitos. A resposta à indagação sobre se o futuro do nosso Estado  é uma questão de poder ou um problema jurídico depende da preservação e do fortalecimento da força normativa da Constituição, bem como de seu pressuposto fundamental, a vontade de Constituição. Essa tarefa foi confiada a todos nós.

Conquanto estivesse falando da Constituição alemã e para os alemães, as lições de Hesse podem ser aproveitadas por todos os povos e nações e em todas as épocas. Assim como as de Lassalle.

Creio que Ferdinand Lassalle e Konrad Hesse falam coisas similares. Com efeito, a “Constituição jurídica” – a folha de papel –  tem sucumbido em face da “Constituição real” – dos fatores reais do poder – por conta da ausência de organização dos maiores interessados na concretização da Constituição: o povo.

Se houver uma consciência constitucional do povo e dos governantes, mas sobretudo do povo, como alude Hesse, a Constituição se apresentará como um verdadeiro fator real de poder por conta de sua força normativa conformadora e transformadora da realidade. Esse tem sido o principal desafio do Direito Constitucional enquanto instrumento normativo de transformação social.  Como a Constituição de um país se torna norma jurídica efetiva e eficaz?

Para esse complexo problema, utilizaremos as contribuições de Karl Loewenstein (1965).

A edição original da aludida obra de Loewenstein surgiu no ano de 1957 com o título em inglês Political Power and the governmental Process, é que nada obstante seja o autor alemão, teve de emigrar para os Estados Unidos em decorrência da Segunda Guerra Mundial, haja vista a sua ascendência judaica. 

Pois bem, Loewenstein (1965, p. 23) analisa a anatomia do processo político-governamental e a dinâmica desse processo, principia seu texto com a “tríade enigmática” que domina a vida humana: “Os três incentivos fundamentais que dominam a vida do homem na sociedade e regem a totalidade das relações humanas, são: o amor, a fé e o poder; de uma maneira misteriosa, estão unidos e entrelaçados” (tradução livre).

Para Loewenstein o poder tem um caráter demoníaco e patológico que leva ao cometimento de abusos e à corrupção e degeneração dos costumes, por isso é imprescindível controlá-lo. Eis o núcleo do constitucionalismo: limitar e controlar os detentores do exercício do poder político; constranger o governante.

Após percorrer os principais temas do direito constitucional e da ciência política, Loewenstein (1965, p.  149) intitula o Capítulo V de sua obra com o rótulo “A Constituição” e aduz:

A classificação de um sistema político como democrático constitucional depende da existência ou carência de instituições efetivas por meio das quais o exercício do poder político esteja distribuído entre os detentores do poder, e por meio dos quais os detentores do poder estejam submetidos ao controle dos destinatários do poder, constituídos em detentores supremos do poder.

Sendo a natureza humana como é, não cabe esperar que o detentor ou os detentores do poder sejam capazes, por autolimitação voluntária, de liberar os destinatários do poder e a si mesmos do trágico abuso do poder. Instituições para controlar o poder não nascem nem operam por si sós, senão que deveriam ser criadas ordenadamente e incorporadas conscientemente no processo do poder. Há passados muitos séculos desde que o homem político aprendeu que a sociedade justa, que lhe outorga e garante seus direitos individuais, depende da existência de limites impostos aos detentores do poder no exercício de seu poder, independentemente de se a legitimação de seu domínio tem fundamentos fáticos, religiosos ou jurídicos. Com o tempo se tem reconhecido que a melhor maneira de alcançar este objetivo será fazendo constar os freios que a sociedade deseja impor aos detentores do poder em forma de um sistema de regras fixas – a Constituição – destinada a limitar o exercício do poder político. A Constituição se converteu assim no dispositivo fundamental para o controle do poder político. (Tradução livre)

Segundo Loewenstein, o telos (a finalidade) da Constituição consiste em criar mecanismos institucionais que sirvam de limites ao exercício do poder político, especialmente em face dos abusos governamentais, e que permitam a participação legítima dos destinatários do poder no processo político.

Loewenstein (1965, p. 200), após analisar a dinâmica das mudanças constitucionais, fere o tema do “sentimento constitucional”, e aduz:

Com a expressão ‘sentimento constitucional’ (Verfassungsgefûhl) se toca um dos fenômenos psicológico-sociais do existencialismo político mais difíceis de captar. Se poderia descrever como aquela consciência da comunidade que, transcendendo a todos os antangonismos e tensões existentes político-partidários, econômico-sociais, religiosos ou de outro tipo, integra a detentores e a destinatários do poder no marco de uma ordem comunitária obrigatória, justamente a constituição, submetendo o processo político aos interesses da comunidade. Este fenômeno pertence ao imponderável da existência nacional e não pode ser produzido racionalmente, ainda que possa ser fomentado por uma educação da juventude [...] Sem embargo, a formação do sentimento de constitucionalidade depende amplamente dos fatores irracionais, da mentalidade e da experiência histórica de um povo, especialmente se a constituição tiver se saído bem em épocas de necessidade nacional. (Tradução livre)

No ponto que nos interessa mais imediatamente, Loewenstein inicia a apresentação de sua classificação ontológica das Constituições, aquilo que essencialmente têm sido as Constituições. Antes, contudo, ele jocosamente fala dos modelos tradicionais de classificação das Constituições e recorda a figura do proverbial “homem de Marte”, que se a esse alienígena fossem apresentadas as Constituições dos países não poderia imaginar de sob as coincidência estruturais, freqüentemente, textuais dessas disposições jazem as mais diferentes conformações da dinâmica do poder.

Com efeito, as tradicionais classificações constitucionais não dizem nada acerca da essência (ontologia) da Constituição naquilo que efetivamente interessa, ou seja, se a Constituição se revela um instrumento normativo de controle efetivo do exercício do poder político, segundo Loewenstein.

Isso quer dizer as clivagens entre as constituições materiais ou formais, rígidas ou flexíveis, sintéticas ou analíticas, liberais ou sociais, monárquicas ou republicanas, presidencialistas ou parlamentaristas, não revelam a essência do fenômeno constitucional, que será capturada se se analisar a realidade normativa, em vez de simples leitura do texto constitucional.

Nessa perspectiva, Loewenstein propõe um novo critério classificatório: o ontológico, que visa considerar o grau de concordância e conformidade entre as normas constitucionais e a realidade do processo político, que verifica a correspondência entre o texto normativo e o contexto social.

Por esse critério, Loewenstein diferencia as constituições em normativas ou nominais ou semânticas.

Segundo Loewenstein (1965, p. 217), a Constituição é normativa na medida em que os detentores e os destinatários do poder observam e cumprem as normas dimanadas dela – a Constituição. As condições para o surgimento da Constituição normativa são as seguintes:

Em uma ampla medida, a questão fundamental sobre se fará realidade a conformação específica do poder prevista constitucionalmente depende do meio social e político onde a constituição tem que valer. Quando se implanta, sem uma prévia educação política, uma democracia constitucional plenamente articulada em um Estado, recém liberado de uma autocracia tradicional ou da tutela colonial, é quase um milagre se deita raízes imediatamente. Para que uma constituição seja viva, deve ser, para tanto, efetivamente “vivida” por destinatários e detentores do poder, necessitando um ambiente nacional favorável para sua realização. A tradição autocrática no processo governamental tem que haver-se perdido o suficiente entre os governantes e os governados, para que o Estado constitucional tenham uma “faire chance” de êxito. Para que uma constituição seja viva, não é suficiente que seja válida em sentido jurídico. Para ser real e efetiva, a constituição terá que ser observada lealmente por todos os interessados e terá que estar integrada na sociedade política, e esta nela. A constituição e a comunidade terão que ter passado por uma simbiose. Somente neste caso cabe falar de uma constituição normativa: suas normas dominam o processo político ou, ao inverso, o processo de poder se adapta às normas da Constituição e se submete a elas. Para usar de uma expressão da vida diária: a constituição é como um traje que serve bem e que se usa realmente. (Tradução livre)

O outro tipo de constituição é o nominal, que vem a ser aquele sistema jurídico válido, mas que ainda não tem força normativa suficiente para domesticar o processo político, de sorte que há uma clivagem entre o texto constitucional e a realidade social. Eis a motivação do sistema constitucional nominal, segundo Loewenstein (1965, p. 218):

O que a constituição nominal implica é que os pressupostos sociais e econômicos existentes – por exemplo, a ausência de educação geral e, no particular, de educação política, a inexistência de uma classe média independente e outros fatores – no momento atual operam contra uma concordância absoluta entre as normas constitucionais e as exigências do processo político. A situação, de fato, impede, ou não permite por agora, a completa integração das normas constitucionais na dinâmica da vida política. Provavelmente, a decisão política que conduziu a promulgar a constituição, ou este tipo de constituição, foi prematura. A esperança, sem embargo, persiste, dada a boa vontade dos detentores e dos destinatários do poder, de que cedo ou tarde a realidade do processo político corresponderá ao modelo estabelecido na constituição. A função primeira da constituição nominal é educativa; seu objetivo é, em um futuro mais ou menos distante, converter-se em uma constituição normativa e determinar realmente a dinâmica do processo político no lugar de estar submetida a ela. E para continuar com nosso exemplo: o traje está pendurado no armário durante um certo tempo e será usado quando o corpo nacional houver crescido.(Tradução livre)

Por fim, Loewenstein visita o terceiro tipo de sistema constitucional, o semântico, que vem a ser aquela Constituição que, ao invés de controlar e limitar os abusos governamentais, é utilizada para justificar, dando uma aparência de legalidade constitucional, os abusos políticos. É uma Constituição paradoxal, pois a essência de toda Constituição é frear o abuso político, mas a semântica torna o poder sem peias e sem amarras. Eis a explicação de Loewenstein (1965, p. 219):

A conformação do poder está congelada em benefício dos detentores fáticos do poder, independentemente de que esses sejam uma pessoa individual (ditador), uma junta, um comitê, uma assembléia ou um partido. Esse tipo se pode designar como constituição semântica. Se não houvesse em absoluto nenhuma constituição formal, o desenvolvimento fático do processo político não seria notavelmente diferente. Em lugar de servir à limitação do poder, a constituição semântica é aqui um instrumento para estabilizar e eternizar a intervenção dos dominantes fáticos da localização do poder político. E para continuar com o exemplo anterior: o traje não é em absoluto um traje, mas um disfarce. (Tradução livre)

A Constituição semântica é típica dos regimes políticos antidemocráticos ou autoritários. A nominal é típica dos países em desenvolvimento social, econômico e político, que têm pouca tradição democrática ou recém saídos do autoritarismo. E a normativa é própria dos países mais desenvolvidos, com instituições mais estáveis e com a sociedade civil melhor organizada.

Loewenstein chama a atenção para o simbolismo constitucional e para as aparências de constitucionalidade, e critica uma ingenuidade otimista do mundo ocidental que apostou todas as suas esperanças nos textos constitucionais escritos, e fala dos perigos em torno da erosão da consciência ou do sentimento de constitucionalidade decorrente dessas imensas expectativas depositadas nas Constituições, muitas vezes divorciadas da realidade social de cada povo e nação.

Essas frustrações constitucionais, segundo Loewenstein, podem atrair panacéias escatológicas das “flautas mágicas dos caçadores de ratos”, com o surgimento de salvadores da pátria, com fortes tendências autoritárias, pois, continua Loewenstein, a crise de normatividade da constituição escrita se reflete na crise do próprio Estado democrático constitucional do futuro.

Segundo Loewenstein, a normatividade constitucional passa necessariamente por uma consciência constitucional dos governantes e dos governados. Essa é praticamente a mesma tese de Hesse. E inclusive de Lassalle, na medida em que o povo deve ser o principal fator real de poder integrante de uma Constituição.

Pois bem, à luz do que expusemos, podemos visitar os sistemas constitucionais lusófonos e verificar se as suas Constituições não passam de “folhas de papel”, seqüestradas pelos fatores reais de poder; ou se têm “força normativa”, capazes de conformar e ordenar o poder político e a sociedade; e nessa linha, se são sistemas constitucionais normativos, nominais ou semânticos.

Tenha-se que além dessas aludidas perspectivas constitucionais, utilizaremos informações e dados acerca das condições de vida das populações dos Estados ora examinados, veremos o grau de respeito aos direitos fundamentais da pessoa humana, se vige um sistema democrático com respeito pelas liberdades fundamentais, se o exercício do poder público é pautado pela decência e honestidade do administrador e do político, ou seja, surpreenderemos se os indivíduos e a coletividade vivenciam um sistema verdadeiramente de justiça e de paz, a partir ou a despeito dos textos constitucionais respectivos.

Para alcançar essa finalidade, utilizaremos de dados e informações de organismos ou entidades internacionais de reconhecida seriedade e insuspeita corretude.


III. A COMUNIDADE LUSÓFONA (www.cplp.org)

Antes de visitar os específicos sistemas constitucionais de cada um dos países da comunidade lusófona será ferida a própria lusofonia, que vem a ser processo histórico de transmissão cultural imposta pelos portugueses aos povos e nações submetidos a sua dominação política e social, tendo como principal elemento de integração comum o idioma português.

Com efeito, a partir desse elemento comum idiomático surgiu, inclusive, a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, organização criada em 17.7.1996, com sede em Lisboa, cuja principal finalidade é amplificar a integração entre as pessoas e as instituições, nos variados domínios do conhecimento e da vida, envolvendo, a política, o direito, a educação, as artes, as ciências, enfim, aproximando os governos, as instituições e sobretudo e principalmente as pessoas.

Essa lusofonia tem como ponto de partida a experiência colonial portuguesa iniciada no alvorecer do século XV, fruto da ambição expansionista lusitana.

 Segundo se extrai da leitura de Raymundo Faoro (2001), o português foi forjado na luta e na guerra, e a sua ambição econômica fê-lo explorar os mares nunca dantes navegados.

Ao lado dessa motivação econômica, extrai-se de Darcy Ribeiro (2006) que havia um componente de salvacionismo religioso por força do poder e da influência da Igreja Católica na vida do homem medieval europeu, e do português ibérico em particular, no sentido de levar a cristandade católica para todo o orbe terrestre.

Pois bem, pode-se acreditar em Gilberto Freyre (2001) que foram esses os principais móveis do expansionismo português: a ambição econômica aliada a uma perspectiva soteriológica cristã.

Com esses impulsos (ambição econômica e fé religiosa), o português singrou os mares e se estabeleceu em várias localidades, nas Américas, na África e na Ásia, fincando raízes, dominando e submetendo povos e nações menos organizados.

É certo que dos portugueses herdamos muitos caracteres, sendo que a figura do “homem cordial” é um dos principais aspectos, segundo Sérgio Buarque de Holanda (1995), no sentido de um indivíduo inadequado para as relações impessoais, especialmente no trato das coisas públicas ou coletivas, visto que as relações familiares ou afetivas são mais relevantes do que os deveres sociais ou jurídicos.

Sem embargo da sucessão de muitos débitos, é certo que recebemos coisas positivas, pois os portugueses estavam contidos em mundo no qual a dominação e a subjugação de outros povos e nações fazia parte do cotidiano e, dentre os créditos dos lusitanos, indiscutivelmente temos o idioma português, que o poeta certeiramente alcunhou de a “última flor do Lácio”.

Após essa brevíssima análise da lusofonia, passarei a visitar cada um dos respectivos sistemas constitucionais dos países lusófonos, começando com Portugal, ponto de partida de toda essa rica experiência social e política, passando pelo Brasil, primeira das ex-colônias a se desvencilhar do domínio português, e seguindo, por ordem alfabética, os demais Estados lusófonos: Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, São Tomé e Príncipe e, finalmente, o caçula Timor-Leste.

Jorge Miranda (1997), em tópico intitulado “os sistemas constitucionais dos países africanos de língua portuguesa”,  leciona que o acesso à independência dos cinco países africanos lusófonos não se fez ao mesmo tempo e nos mesmos termos dos demais países da África, porquanto somente com a derrocada do “Estado Novo” português e a queda do regime salazarista o ritmo de libertação foi acelerado pelos vários “movimentos de libertação”.

A primeira fase dos mencionados países foi marcada por intensas lutas internas, que agravaram uma situação de pobreza e abandono de sua população. A partir dos anos 90 do século passado, esses Estados iniciam uma mudança de eixo no rumo da democracia e da paz.

Portugal e o Brasil têm servido de bússolas para que essas novas democracias se institucionalizem, de sorte a propiciarem um regime político onde os direitos e liberdades individuais e sociais possam ser exercitados, com segurança e prosperidade.


IV. PORTUGAL (www.portugal.gov.pt)

Como é de sobejo conhecimento, a história de Portugal tem início com as lutas dos reinos cristãos pela reconquista da península ibérica e conseqüente expulsão dos mouros islâmicos daquele pedaço do continente europeu, finalizada no ano de 1249.

O Reino de Portugal foi estabelecido em 1139, sendo provavelmente o primeiro Estado-nação moderno europeu. Talvez por isso, tenha sido um dos primeiros a iniciar o processo de expansão marítima e de colonização e dominação dos povos e nações das Américas, da África e da Ásia, cujo apogeu se deu no início do século XVI, no reinado de Dom Manuel I, alcunhado de “o Venturoso”, e que se intitulava “Rei de Portugal e dos Algarves, senhor da África, da Índia, da China, do Japão, do Egito, da Etiópia e do Brasil”, no período de 1495 até 1521.

Após um período de apogeu econômico e político, Portugal entra em crise e vê os seus domínios se dissolverem, conquistados por outras potências européias, mormente França, Inglaterra e Holanda, sem prejuízo das permanentes investidas da Espanha contra o seu próprio território e contra os seus domínios.

Sacudido pelos ventos revolucionários que varreram a Europa continental no final do século XVIII e inicio do século XIX, oriundos da França, a família real portuguesa, ante a iminente invasão das forças napoleônicas, foge para o Brasil e instala o centro administrativo e político do Império na América.

Solucionada a questão napoleônica, a família real é constrangida a retornar a Portugal e se submete ao novo regime político exigido após a experiência revolucionária: a monarquia constitucional, em face da promulgação da Constituição Política da Monarquia Portuguesa, em 23.9.1822.

Poucos dias antes da promulgação de sua primeira Constituição, Portugal vê o Brasil, então Reino Unido, outrora sua colônia mais próspera, proclamar a sua independência, em 7 de setembro, por meio do príncipe herdeiro Dom Pedro, que se auto-intitulou “Defensor Perpétuo do Brasil, por obra e graça da Santíssima Trindade e por unânime aclamação dos povos”.

Durante o século XIX, Portugal enfrenta crises econômicas e políticas que vão resultar no início do século XX na implantação do regime republicano em 5.10.1910. Após um período conturbado, em 1932 ascende ao poder Antonio de Oliveira Salazar que instituiu em solo português o regime do “Estado Novo”, marcado pelo autoritarismo político e castração das franquias liberais democráticas, e pelo isolamento político de Portugal.

Salazar, por motivo de doença, afasta-se do poder em 1968, vindo a falecer em 27.7.1970. Sucede-lhe Marcelo Caetano até o golpe de estado ocorrido em 25.4.1974, no evento denominado “Revolução dos Cravos”, conduzido pelo Movimento das Forças Armadas, composto de militares que participaram das “Guerras Coloniais” (conflitos com Angola, Guiné e Moçambique).

Em 25.4.1976 ocorreu a promulgação da atual Constituição de Portugal que abriu uma nova perspectiva nas relações portuguesas com a Europa e com o restante do mundo, especialmente com as suas antigas colônias, e com a própria população em solo português.

Pedagógico o enunciado contido no preâmbulo da Constituição portuguesa de 1976:

 A 25 de Abril de 1974, o Movimento das Forças Armadas, coroando a longa resistência do povo português e interpretando os seus sentimentos profundos, derrubou o regime fascista.

Libertar Portugal da ditadura, da opressão e do colonialismo representou uma transformação revolucionária e o início de uma viragem histórica da sociedade portuguesa.

A Revolução restituiu aos Portugueses os direitos e liberdades fundamentais. No exercício destes direitos e liberdades, os legítimos representantes do povo reúnem-se para elaborar uma Constituição que corresponde às aspirações do país.

A Assembleia Constituinte afirma a decisão do povo português de defender a independência nacional, de garantir os direitos fundamentais dos cidadãos, de estabelecer os princípios basilares da democracia, de assegurar o primado do Estado de Direito democrático e de abrir caminho para uma sociedade socialista, no respeito da vontade do povo português, tendo em vista a construção de um país mais livre, mais justo e mais fraterno.

A Assembleia Constituinte, reunida na sessão plenária de 2 de Abril de 1976, aprova e decreta a seguinte Constituição da República Portuguesa:

A aludida Constituição positiva uma nova realidade social e política no cenário português e abre as portas de Portugal para um novo período de democracia, com o respeito às franquias liberais e das indispensáveis conquistas sociais, como preconiza José Carlos Vieira de Andrade (2006).

Tenha-se que Portugal ostenta, hodiernamente, índices sociais que situam o país entre aqueles que possuem a população com boa qualidade de vida, como revelam os dados contidos nos organismos e agências internacionais.

No critério das liberdades fundamentais, Portugal é visto como um Estado plenamente democrático. Segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD (www.un.org), 95% dos portugueses são alfabetizados.

Em Portugal, segundo a Organização das Nações Unidas, a expectativa de vida gira em redor de 78 anos, sendo 75 anos para os homens e 81 anos para as mulheres. A mortalidade infantil, segundo a Organização Mundial da Saúde – OMS, é de 4 crianças para cada 1.000 nascimentos, no ano de 2005. Cuide-se que segundo a OMS o índice “aceitável” é de até 10 mortes para cada 1.000 nascimentos.

Ainda no plano das condições sociais e econômicas, o Índice de Desenvolvimento Humano – IDH de Portugal é de “0,909”, considerando que o máximo é de 1. O aludido índice leva em consideração a renda per capita, o grau de educação e a expectativa de vida das populações. O melhor IDH é o da Noruega (0,938). IDH acima de 0,9 implica país com desenvolvimento humano muito elevado.

Sucede, no entanto, que o índice de percepção de corrupção é relativamente baixo (5,8), nos termos da Transparência Internacional (www.transparency.org), em uma escala que varia de 0 a 10. O melhor desempenho é o da Nova Zelândia, com índice 9,4. O pior é o da Somália: 1,1.

Cuide-se que o Estado português foi beneficiado pelo ingresso na Comunidade Européia, e integra União Européia, que vitaminou sensivelmente a economia local, permitindo a melhoria substantiva das condições sociais da população portuguesa.

Em suma, as promessas constitucionais estampadas no Texto Fundamental de 1976 não se transformaram em “letra morta”, e a Constituição portuguesa não é uma “simples folha de papel”, mercê dos “fatores reais de poder”, mas é dotada de “força normativa” conformadora e transformadora da realidade social dos portugueses, como defende José Joaquim Gomes Canotilho (1997).

Nesse passo, concordamos com Jorge Miranda (2002) no sentido de que o sistema constitucional português é de caráter normativo, pois há uma consciência ou sentimento constitucional que favorece à obediência e ao respeito da Constituição, pelos governantes e pelos governados, e tanto os direitos e garantias individuais e coletivas quanto os direitos sociais e democráticos têm sido exercidos com adequada compatibilidade, de acordo com as necessidades das pessoas e dentro das capacidades do Estado e da própria sociedade,  na medida do possível.


V. BRASIL (www.brasil.gov.br)

A história constitucional propriamente brasileira tem início em 7.9.1822 com a promulgação da Independência e a dissolução dos laços jurídico-políticos entre Brasil e Portugal, confirmada pela outorga da Carta Constitucional de 1824, que foi o documento político que regeu o império brasileiro.

O Brasil tem sofrido profundas mudanças econômicas, sociais e políticas, e passou por crises de variadas ordens, até a estabilização institucional ocorrida com a promulgação da Constituição de 5.10.1988, que demarca o ingresso definitivo do País no plano democrático, após o período autoritário marcado pelo regime militar instaurado no Brasil em 1º.4.1964.

Com efeito, até a Constituição de 1988, a experiência institucional brasileira foi marcada por sucessivas crises constitucionais, inclusive com golpes de Estado, que revelavam a quebra da legalidade constitucional.

Convém, assim como feito em relação ao texto fundamental português, recordar o disposto no Preâmbulo da Constituição brasileira vigente:

Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL.

A Constituição brasileira de 1988 se enquadra no paradigma constitucional democrático, síntese e superação dos paradigmas constitucionais liberal e social, na medida em que o primeiro se consubstanciava em modelo no qual o Estado deveria ser o mais omisso possível, enquanto que no segundo o Estado deveria intervir o máximo possível. Na perspectiva democrática, o Estado deve agir tendo em mira a fraternidade entre os brasileiros e entre os demais povos e nações.

Forte nesse modelo fraternal, o texto constitucional brasileiro se revela repleto de promessas constitucionais que se apresentam como verdadeiras utopias coletivas, cujas concretizações dependem de um esforço conjugado do Governo, das instituições e das pessoas. É um texto ambicioso, auspicioso, e que requer um forte sentimento ou consciência constitucional para se tornar realidade normativa, em vez de retórica vazia e meramente simbólica, como adverte o magistério de Marcelo Neves (2007).

Cuide-se que o Brasil já se apresenta como uma democracia madura, com instituições sólidas, com respeito às franquias liberais fundamentais, onde viceja a possibilidade real de alternância republicana de poder, mediante eleições livres e legítimas.

Todavia, no plano dos direitos sociais básicos, o País apresenta índices obscenos de desigualdade social e há uma parcela considerável de brasileiros alijados das benesses econômicas.

Nesse quadro, calha verificar os indicadores sociais e econômicos do Brasil e de sua população. 

No critério das liberdades fundamentais, como assinalado o Brasil é um Estado que vivencia a plenitude do regime político-democrático. No entanto, como mencionado, no plano dos direitos sociais, o País não se encontra em situação privilegiada, a despeito dos avanços, como sucede com o índice de quase 90% de alfabetização, segundo o PNUD.

Segundo a ONU, a expectativa de vida do brasileiro gira em redor de 72 anos, sendo 69 para os homens e 76 para as mulheres. Por seu turno, a mortalidade infantil, segundo a OMS, é de 19,3 crianças por mil nascimentos, o dobro do índice “aceitável” estabelecido pela OMS.  O IDH brasileiro é 0,699, colocando o país na 73ª posição mundial.  O índice de percepção de corrupção é 3,7, revelador que para nós brasileiros grassa em nossas relações um alto grau de abuso do poder.

Em suma, no tópico relativo às liberdades e direitos fundamentais individuais ou coletivas, inclusive nos direitos políticos, a Constituição brasileira não é uma simples “folha de papel” a serviço dos “fatores reais de poder”.

Todavia, no plano dos direitos sociais, a Constituição não tem se revelado em sua força normativa máxima, podendo, por essa razão, ser compreendida como “nominal”, porquanto dependente de uma maior conscientização constitucional dos governantes e dos governados, sobretudo no plano das políticas públicas de caráter social.


VI. ANGOLA (www.angola.gov.ao)

A história constitucional moderna de Angola tem início em 11.11.1975, após o fim das “Guerras Coloniais”, data da independência de Angola em face de Portugal, por força dos “movimentos de libertação”, no caso angolano o Movimento Popular de Libertação de Angola – MPLA, a Frente Nacional de Libertação de Angola - FNLA e a União Nacional pela Independência Total de Angola – UNITA, como giza Fernando José de França Dias Van-Dúnem (2008).

Após a conquista da independência, Angola sofreu o flagelo de uma guerra civil que perdurou 27 anos, e que ceifou a vida de milhões de pessoas e vitimou, com danos físicos e morais irreparáveis, um imenso contingente de pessoas. Angola é um país em reconstrução.

Cuide-se que na região de Cabinda, rica em petróleo, há a Frente de Libertação do Estado de Cabinda – FLEC (www.cabinda.org), mas há dez anos foi assinado um acordo de paz na busca de se por fim à tentativa de secessão no território angolano, nada obstante as resistências do aludido movimento de guerrilha política.

Nada obstante essa situação, a atual Lei Constitucional angolana foi aprovada em 16.9.1992, e sofreu grande influência dos textos constitucionais português e brasileiro, possuindo uma estrutura clássica de separação dos poderes e direitos fundamentais individuais e sociais, contendo promessas que exigem um avançado grau de consciência constitucional dos governantes e dos governados.

O preâmbulo constitucional angolano dispõe:

Nós, o Povo de Angola, através dos seus lídimos representantes, legisladores da Nação livremente eleitos nas eleições parlamentares de Setembro de 2008;

Cientes de que essas eleições se inserem na longa tradição de luta do povo angolano pela conquista da sua cidadania e independência, proclamada no dia 11 de Novembro de 1975, data em que entrou em vigor a primeira Lei Constitucional da história de Angola e corajosamente preservada, graças aos sacrifícios colectivos para defender a soberania nacional e a integridade territorial do país;

Tendo recebido, por via da referida escolha popular e por força do disposto no artigo 158.º da Lei Constitucional de 1992, o nobre e indeclinável mandato de proceder à elaboração e aprovação da Constituição da República de Angola;

Cônscios da grande importância e magna valia de que se reveste a feitura e adopção da lei primeira e fundamental do Estado e da sociedade angolana;

Destacando que a Constituição da República de Angola se filia e enquadra directamente na já longa e persistente luta do povo angolano, primeiro, para resistir à ocupação colonizadora, depois para conquistar a independência e a dignidade de um Estado soberano e, mais tarde, para edificar, em Angola, um Estado democrático de direito e uma sociedade justa;

Invocando a memória dos nossos antepassados e apelando à sabedoria das lições da nossa história comum, das nossas raízes seculares e das culturas que enriquecem a nossa unidade;

Inspirados pelas melhores lições da tradição africana – substrato fundamental da cultura e da identidade angolanas;

Revestidos de uma cultura de tolerância e profundamente comprometidos com a reconciliação, a igualdade, a justiça e o desenvolvimento;

Decididos a construir uma sociedade fundada na equidade de oportunidades, no compromisso, na fraternidade e na unidade na diversidade;

Determinados a edificar, todos juntos, uma sociedade justa e de progresso que respeita a vida, a igualdade, a diversidade e a dignidade das pessoas;

Relembrando que a actual Constituição representa o culminar do processo de transição constitucional iniciado em 1991, com a aprovação, pela Assembleia do Povo, da Lei n.º 12/91, que consagrou a democracia multipartidária, as garantias dos direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos e o sistema económico de mercado, mudanças aprofundadas, mais tarde, pela Lei de Revisão Constitucional n.º 23/92;

Reafirmando o nosso comprometimento com os valores e princípios fundamentais da Independência, Soberania e Unidade do Estado democrático de direito, do pluralismo de expressão e de organização política, da separação e equilíbrio de poderes dos órgãos de soberania, do sistema económico de mercado e do respeito e garantia dos direitos e liberdades fundamentais do ser humano, que constituem as traves mestras que suportam e estruturam a presente Constituição;

Conscientes de que uma Constituição como a presente é, pela partilha dos valores, princípios e normas nela plasmados, um importante factor de unidade nacional e uma forte alavanca para o desenvolvimento do Estado e da sociedade;

Empenhando-nos, solenemente, no cumprimento estrito e no respeito da presente Constituição e aspirando a que a mesma postura seja a matriz do comportamento dos cidadãos, das forças políticas e de toda a sociedade angolana;

Assim, invocando e rendendo preito à memória de todos os heróis e de todos e cada uma das angolanas e dos angolanos que perderam a sua vida na defesa da Pátria;

Fieis aos mais altos anseios do povo angolano de estabilidade, dignidade, liberdade, desenvolvimento e edificação de um país moderno, próspero, inclusivo, democrático e socialmente justo;

Comprometidos com o legado para as futuras gerações e no exercício da nossa soberania;

Aprovamos a presente Constituição como Lei Suprema e Fundamental da República de Angola.

Tenha-se que Angola é um Estado que possui imensas riquezas naturais, especialmente petróleo e diamantes, além de outros bens que podem ser canalizados para a melhoria das condições de vida do povo angolano.

Sucede, nada obstante, que essas citadas riquezas alimentaram a guerra civil que tanto açoitou a população angolana. Angola deverá aprender a conviver com as suas imensas riquezas e deverá ampliar o acesso do povo às benesses sociais propiciadas pelo crescimento econômico fundado na exploração dessas riquezas naturais.

Com efeito, no critério das liberdades fundamentais, Angola, segundo o critério de democracia, se enquadra no regime autoritário, com índice 3,35. O melhor índice é o da Suécia (9,8) e o pior é o da Coréia do Norte (0,86), segundo o “Economist Intelligence Unit Democracy Index” (www.economist.com).

Seguindo as informações relativas aos indicadores sociais de Portugal e do Brasil, em Angola o IDH é de 0,564; a expectativa de vida é de 43 anos; a mortalidade infantil é de 132 crianças por mil nascimentos; a taxa de alfabetização é de 68% e a percepção de corrupção é de 1,9.

De posse desses dados, temos que a Constituição angolana se revela como uma simples “folha de papel”, mercê da vontade dos “fatores reais de poder”. Nessa linha, como o País está em reconstrução democrática, convém reconhecer o caráter nominal de seu sistema constitucional.


VII. CABO VERDE (www.governo.cv)

Assim como Angola, a moderna história constitucional de Cabo Verde tem início nas lutas de libertação do jugo colonial português, precisamente em 5.7.1975, data de sua independência política.

O arquipélago de Cabo Verde tem uma economia baseada na agricultura e na exploração marinha.

Pois bem, no plano político, segundo José André Leitão da Graça (2008), o processo caboverdiano é um caso típico de transição iniciada por uma elite autoritária até o surgimento e fortalecimento das oposições.

Com efeito, as lutas de libertação iniciadas na década de 60 do século passado foram assumidas pelo Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde - PAIGC.

Sucede que as dissensões políticas entre Cabo Verde e a Guiné-Bissau levaram ao fim as possibilidades de união política entre esses Estados, e o PAIGC se transformou, em solo caboverdeano, no PAICV – Partido Africano da Independência de Cabo Verde, que detinha o monopólio partidário no País.

A partir dos anos 90, do século XX, inicia-se um processo de democratização, com o reconhecimento do pluripartidarismo em Cabo Verde, de sorte que a livre competitividade político-eleitoral se instalou no País.

Nesse passo, no critério democrático, Cabo Verde tem o índice 7,81, cuidando-se de uma democracia imperfeita, segundo a “The Economist”.  O IDH de Cabo Verde é 0,708; a expectativa de vida é de 72 anos; a mortalidade infantil gira em redor de 25 crianças por mil nascimentos; a taxa de alfabetização é 81% e a percepção de corrupção é 5,1, abaixo de Portugal, mas acima do Brasil que é de 3,7.

Ante esse quadro, o sistema constitucional de Cabo Verde se afivela na categoria de nominal, pois superou o aspecto semântico do regime autoritário e monopartidário, mas ainda não alcançou o nível de plena normatividade constitucional.


VIII. GUINÉ-BISSAU (www.republica-da-guine-bissau.org)

A moderna história constitucional guineense nasceu em 24.9.1973, com a independência em face de Portugal.

A luta armada foi iniciada pelo PAIGC resultou na promulgação da primeira Constituição, em 1973, oriunda da Assembléia Nacional Popular, mas, segundo Antonio Duarte Silva (2008) houve verdadeira outorga constitucional realizada pelo citado PAIGC.

Infelizmente lá são rotineiras as crises políticas e institucionais, que têm agravado a situação de vida do povo guineense, de sorte que até o presente momento não se pode falar em estabilização política na Guiné-Bissau, pois recentemente, ainda neste ano de 2010, houve nova tentativa de golpe militar contra o governo instituído.

A vigente Constituição da Guiné-Bissau foi promulgada em dezembro de 1996. Eis o seu preâmbulo:

O PAIGC, fundado em 19 de Setembro de 1956, cumpriu exemplarmente o seu Programa Mínimo, que consiste em libertar os povos da Guiné e Cabo Verde, conquistando a soberania dos respectivos Estados, ao mesmo tempo que lançava as bases de construção de uma sociedade livre, democrática e de justiça social em cada país.

O Partido conseguiu, após a independência, granjear nos planos interno e internacional, simpatia, respeito e admiração pela forma como tem conduzido os destinos da Nação Guineense, nomeadamente através da criação e institucionalização do aparelho estatal.

Com o Movimento Reajustador do 14 de Novembro, o Partido reorientou a sua acção, corrigindo os erros que estavam a entravar a edificação de uma sociedade unida, forte e democrática.

Ao adoptar a presente Constituição, que se situa fielmente na linha de uma evolução institucional que nunca se afastou das ideias e opções do nosso povo, linha reafirmada pelas transformações profundas operadas na nossa sociedade pela legalidade, pelo direito e pelo gozo das liberdades fundamentais, a Assembleia Nacional Popular da Guiné-Bissau revela o facto de o seu articulado se encontrar imbuído do humanismo que sempre nos inspirou e que se reflecte nos direitos e liberdades aqui garantidos aos cidadãos como conquistas irreversíveis do nosso povo.

A Assembleia Nacional Popular felicita o PAIGC pelo papel de vanguarda que sempre desempenhou na condução dos destinos da Nação Guineense e congratula-se pela decisão corajosa e oportuna que o partido de Amílcar Cabral tomou ao implementar o desafio da abertura democrática rumo a construção de uma sociedade pluralista, justa e livre.

A decisão do PAIGC situa-se na esteira da sua tradição histórica de procurar a cada momento as respostas às profundas aspirações do nosso povo.

Por isso, agindo como intérprete fiel da vontade do povo e no exercício das responsabilidades que lhe cabem como órgão máximo da soberania, a Assembleia Nacional Popular aprova e adopta, como lei fundamental e para vigorar a partir de 16 de Maio de 1984, a presente Constituição da República da Guiné-Bissau.

No critério democrático, o índice da Guiné-Bissau é 1,99, consistindo em regime político autoritário. O seu IDH é 0,397; a expectativa de vida é de 46 anos; a mortalidade infantil é de 113 crianças por mil nascimentos; a taxa de alfabetização é de 45%; e a percepção da corrupção é de 1,9.

A Constituição da Guiné-Bissau é um caso clássico de simples “folha de papel”, se revelando um sistema constitucional semântico e meramente simbólico. Todavia, nada impede que haja um processo de educação constitucional e pedagogia cívica, sobretudo dos que são titulares dos “fatores reais do poder”, no sentido de obediência e respeito às instituições e à Constituição.


IX. MOÇAMBIQUE (www.portaldogoverno.gov.mz)

Como soe acontecer com os demais países africanos aqui citados, a moderna história constitucional moçambicana nasceu em 25.6.1975, com a independência em face de Portugal.

Moçambique foi castigada por uma guerra civil entre os partidários da FRELIMO – Frente de Libertação de Moçambique, e pela RENAMO – Resistência Nacional Moçambicana, que perdurou de 1976 até 1992.

Em decorrência das fraturas causadas pela guerra, Moçambique tem muitos problemas econômicos, políticos e sociais.

Segundo José Miguel Nunes Júnior (2008), a atual Constituição é de 2.11.1990, oriunda dos acordos de paz de Lusaka, que puseram cobro na odiosa guerra civil entre os moçambicanos. Eis o seu preâmbulo:

A Luta Armada de Libertação Nacional, respondendo aos anseios seculares do nosso Povo, aglutinou todas as camadas patrióticas da sociedade moçambicana num mesmo ideal de liberdade, unidade, justiça e progresso, cujo escopo era libertar a terra e o Homem.

Conquistada a Independência Nacional em 25 de Junho de 1975, devolveram-se ao povo moçambicano os direitos e as liberdades fundamentais.

A Constituição de 1990 introduziu o Estado de Direito Democrático, alicerçado na separação e interdependência dos poderes e no pluralismo, lançando os parâmetros estruturais da modernização, contribuindo de forma decisiva para a instauração de um clima democrático que levou o país à realização das primeiras eleições multipartidárias.

A presente Constituição reafirma, desenvolve e aprofunda os princípios fundamentais do Estado moçambicano, consagra o carácter soberano do Estado de Direito Democrático, baseado no pluralismo de expressão, organização partidária e no respeito e garantia dos direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos.

A ampla participação dos cidadãos na feitura da Lei Fundamental traduz o consenso resultante da sabedoria de todos no reforço da democracia e da unidade nacional.

No critério democrático, o índice de Moçambique é de 5,99, consistindo em regime político híbrido, nem plenamente democrático nem plenamente autautoritário. O seu IDH é 0,402; a expectativa de vida é de 42 anos; a mortalidade infantil é de 96 crianças por mil nascimentos; a taxa de alfabetização é de 39%; e a percepção da corrupção é de 2,5.

A Constituição moçambicana não se revela com “força normativa” suficientemente conformadora ou transformadora da realidade social e política, mas  à luz dos esforços que têm sido feitos, pode ser encartada como nominal, pois em busca de uma concretização, que depende da vontade dos governantes e dos governados.


X. SÃO TOMÉ E PRÍNCIPE (www.governo.st)

A moderna história constitucional das ilhas de São Tomé e Príncipe nasce em 12.7.1975, com a independência em face de Portugal, após as lutas encetadas pelo Movimento de Libertação de São Tomé e Príncipe (MLSTP), que resultou inicialmente na implantação de um regime político socialista e autoritário.

Somente a partir de 1990, o País ingressa no caminho do constitucionalismo democrático, como ensina José Paquete D’Alva Teixeira (2008) fruto da experiência constitucional iniciada em 1975.

Eis o preâmbulo constitucional:

Durante cinco séculos o Povo São-tomense travou contra a dominação colonial, um combate difícil e heróico, pela libertação da sua Pátria ocupada, pela conquista da Soberania e Independência Nacional, pela restauração dos seus direitos usurpados e pela reafirmação da sua dignidade humana e personalidade africana.

A 12 de Julho de 1975, sob a esclarecida direcção do Movimento de Libertação de São Tomé e Príncipe (MLSTP), o Povo São-tomense alcançou a sua Independência Nacional e proclamou perante a África e a Humanidade inteira a República Democrática de São Tomé e Príncipe. Essa vitória, a maior da nossa história, só foi possível graças aos sacrifícios e à determinação de valorosos e heróicos filhos de São Tomé e Príncipe que, durante séculos, sempre resistiram à presença colonial, e em 1960 se organizaram em CLSTP e mais tarde, 1972, em MLSTP, até atingir o supremo objectivo da libertação nacional.

Com a proclamação da Independência Nacional, a Assembleia Representativa do Povo São-tomense confiou ao Bureau Político do MLSTP, através do estipulado no Artigo 3.º da Lei Fundamental então aprovada, a pesada responsabilidade de, como mais alto órgão político da Nação, assumir a direcção da sociedade e do Estado em São Tomé e Príncipe, visando o nobre objectivo de garantir a independência e a unidade nacionais, mediante a construção dum Estado Democrático, segundo o programa máximo do MLSTP.

Quinze anos depois, e após análise aprofundada da experiência de exercício legítimo do poder pelo MLSTP, o Comité Central, na sua sessão de Dezembro de 1989, fiel ao dever patriótico de promover o desenvolvimento  equilibrado e harmonioso de São Tomé e Príncipe, decidiu ratificar as justas aspirações nacionais, expressas durante a Conferência Nacional, de 5 a 8 de Dezembro de 1989, no sentido da abertura do necessário espaço à participação de outras forças politicamente organizadas, com vista ao aprofundamento da democracia, em prol da modernidade em São Tomé e Príncipe.

Inspirada na necessidade histórica de se promover a participação cada vez mais ampla e responsabilizada do cidadão nos vários domínios da vida  nacional, a presente revisão ao texto constitucional, para além de consagrar o princípio de que o monopólio do poder não constitui por si só garantia suficiente de progresso, representa a vontade colectiva dos São-tomenses em darem a sua parcela de contribuição à universalidade dos direitos e liberdades fundamentais do Homem.

Nestes termos, após a aprovação pela Assembleia Popular Nacional, no uso das atribuições que lhe são conferidas ao abrigo da alínea i) do artigo 32.º, e ratificação por Referendo Popular, ao abrigo do n.º 2 do artigo 70.º, todos da Constituição vigente, promulgo a seguinte Constituição:

São Tomé e Príncipe é uma democracia incipiente. O seu IDH é 0,651; a expectativa de vida é de 66 anos; a mortalidade infantil é de 72 crianças por mil nascimentos; a taxa de alfabetização é de 85%; e a percepção da corrupção é de 2,8.

Nesse quadro, o sistema constitucional tomeense é nominal, pois se a Constituição não se apresenta como “folha de papel”, ainda não é instrumento transformador da realidade social.


XI. TIMOR-LESTE (www.timor-leste.gov.tl)

O caçula dos Estados soberanos lusófonos é o Timor-Leste, que obteve sua independência de Portugal em 28.11.1975, mas foi logo ocupado pelas forças da Indonésia e somente em 20.5.2002 teve reconhecida sua soberania política, após novas lutas de independência e a intervenção da comunidade internacional, mormente da ONU.

Na análise que procedeu ao texto constitucional do Timor Leste, Jorge Bacelar Gouveia (2008) explica as estruturas e as fontes do sistema timorense, enquadrando nos contemporâneos paradigmas constitucionais, e que a principal inspiração foi o texto constitucional português.

Eis o preâmbulo da Constituição de 22.3.2002:

A independência de Timor-Leste, proclamada pela Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (FRETILIN) em 28 de Novembro de 1975, vê-se internacionalmente reconhecida a 20 de Maio de 2002, uma vez concretizada a libertação do povo timorense da colonização e da ocupação ilegal da Pátria Maubere por potências estrangeiras.

A elaboração e adopção da Constituição da República Democrática de Timor-Leste culmina a secular resistência do povo timorense, intensificada com a invasão de 7 de Dezembro de 1975.

A luta travada contra o inimigo, inicialmente sob a liderança da FRETILIN, deu lugar a formas mais abrangentes de participação política, com a criação sucessiva do Conselho Nacional de Resistência Maubere (CNRM), em 1987, e do Conselho Nacional de Resistência Timorense (CNRT), em 1998.

A Resistência desdobrou-se em três frentes.

A frente armada foi protagonizada pelas gloriosas Forças Armadas de Libertação Nacional de Timor-Leste (FALINTIL), cuja gesta histórica cabe exaltar.

A acção da frente clandestina, astutamente desencadeada em território hostil, envolveu o sacrifício de milhares de vidas de mulheres e homens, em especial jovens, que lutaram com abnegação em prol da liberdade e independência.

A frente diplomática, conjugadamente desenvolvida em todo o Mundo, permitiu abrir caminho para a libertação definitiva.

Na sua vertente cultural e humana, a Igreja Católica em Timor-Leste sempre soube assumir com dignidade o sofrimento de todo o Povo, colocando-se ao seu lado na defesa dos seus mais elementares direitos.

Esta Constituição representa, finalmente, uma sentida homenagem a todos os mártires da Pátria.

Assim, os Deputados da Assembleia Constituinte, legítimos representantes do Povo eleitos a 30 de Agosto de 2001, alicerçados ainda no acto referendário de 30 de Agosto de 1999, que, concretizado sob os auspícios da Organização das Nações Unidas, confirmou a vontade autodeterminada de independência;

Plenamente conscientes da necessidade de se erigir uma cultura democrática e institucional própria de um Estado de Direito onde o respeito pela Constituição, pelas leis e pelas instituições democraticamente eleitas sejam a sua base inquestionável;Interpretando o profundo sentimento, as aspirações e a fé em Deus do povo de Timor-Leste;

Reafirmam solenemente a sua determinação em combater todas as formas de tirania, opressão, dominação e segregação social, cultural ou religiosa, defender a independência nacional, respeitar e garantir os direitos humanos e os direitos fundamentais do cidadão, assegurar o princípio da separação de poderes na organização do Estado e estabelecer as regras essenciais da democracia pluralista, tendo em vista a construção de um país justo e próspero e o desenvolvimento de uma sociedade solidária e fraterna.

A Assembleia Constituinte, reunida na sessão plenária de 22 de Março de 2002, aprova e decreta a seguinte Constituição da República Democrática de Timor-Leste:

O Timor-Leste engatinha no caminho da democracia. O seu IDH é 0,489; a expectativa de vida é de 61 anos; a mortalidade infantil é de 67 crianças por mil nascimentos; a taxa de alfabetização é de 50%; e a percepção da corrupção é de 2,2.

Ante essa paisagem, e tendo em vista o caráter político imaturo do Timor-Leste, é de fácil percepção a natureza nominal do seu sistema constitucional.


XII. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os países lusófonos, à exceção de Portugal e do Brasil, encontram-se no processo de amadurecimento constitucional e solidificação de suas instituições políticas e sociais.

Se os regimes democráticos estão cada vez mais enraizados na realidade dos aludidos Estados lusófonos, com as referidas exceções, é preciso concretizar radicalmente os direitos sociais fundamentais, mormente aqueles vocacionados para a proteção da vida e da liberdade do indivíduo (de todos os indivíduos) e tenham como finalidade a emancipação da pessoa humana.

Com efeito, todo ser humano deve receber um tratamento digno e igual, ou seja, deve ser tratado com respeito, consideração e justiça, de modo a que todos e cada um possam buscar e realizar a felicidade, razão de ser de nossa própria existência.

Finalizo evocando o arauto do mito lusófono, o bardo Luís Vaz de Camões, no clássico e eterno épico de Portugal e de todos os filhos da epopéia lusitana “Os Lusíadas” (Canto Primeiro, estrofes 68, 105 e 106):

As bombas vêm de fogo, e juntamente

As panelas sulfúreas, tão danosas;

Porém aos de Vulcano não consente

Que dem fogo às bombardas temerosas;

Porque o generoso ânimo e valente,

Entre gentes tão poucas e medrosas,

Não mostra quanto pode; e com razão:

Que é fraqueza entre ovelhas ser leão.

[...]

O recado que trazem é de amigos,

Mas debaixo o veneno vem coberto,

Que os pensamentos eram de inimigos,

Segundo foi o engano descoberto.

Oh! Grandes e gravíssimos perigos,

Oh! Caminho de vida nunca certo,

Que aonde a gente põe sua esperança

Tenha a vida tão pouca segurança.

No mar tanta tormenta e tanto dano,

Tantas vezes a morte apercebida;

Na terra tanta guerra, tanto engano,

Tanta necessidade avorrecida!

Onde pode acolher-se um fraco humano,

Onde terá segura a curta vida,

Que não se arme e se indigne o Céu sereno

Contra um bicho da terra tão pequeno?


XIII. REFERÊNCIAS

ALVES JR., Luís Carlos Martins. O Supremo Tribunal Federal nas Constituições Brasileiras. Belo Horizonte: Mandamentos, 2004.

BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Mandado de Segurança n. 3.557, Plenário, Relator Ministro Hahnemann Guimarães, julgado em 7.11.1956.

FAORO, Raymundo. Os donos do poder – formação do patronato político brasileiro. Rio de Janeiro: Globo, 3ª ed., 2001.

FREYRE, Gilberto. Casa-grande & senzala – introdução à história da sociedade patriarcal no Brasil. Rio de Janeiro: Record, 45ª ed., 2001.

GOUVEIA, Jorge Bacelar. A Novíssima Constituição de Timor-Leste; in As Constituições dos Países de Língua Portuguesa Comentadas. Brasília: Senado Federal, 2008.

GRAU, Eros Roberto. Ensaio e Discurso sobre a interpretação/aplicação do direito. São Paulo: Malheiros, 4ª ed., 2006.

HESSE, Konrad. A Força Normativa da Constituição. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1991.

HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 26ª ed., 1995.

KELSEN, Hans. Jurisdição Constitucional. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

LASSALLE, Ferdinan. A Essência da Constituição. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 6ª ed., 2001.

LEITÃO DA GRAÇA, José André. A Constituição Cabo-verdiana de 1991 revista pela Lei Constitucional n. 1/V/99; in As Constituições dos Países de Língua Portuguesa  Comentadas.  Brasília: Senado Federal, 2008.

LOEWENSTEIN, Karl. Teoría de la Constitución. Barcelona: Editorial Ariel, 1965.

MIRANDA, Jorge Miranda. Manual de direito constitucional, tomo I. Coimbra: Coimbra, 6ª ed., 1997.

MIRANDA, Jorge. Teoria do Estado e da Constituição. Rio de Janeiro: Forense, 2002.

NEVES, Marcelo. A constitucionalização simbólica.  São Paulo: Martins Fontes, 2ª ed., 2007.

NUNES JÚNIOR, José Miguel. Comentário Jurídico da Constituição de 1990, da República de Moçambique; in As Constituições dos Países de Língua Portuguesa Comentadas. Brasília: Senado Federal, 2008.

RIBEIRO, Darcy. O povo brasileiro – a formação e o sentido do Brasil São Paulo: Companhia das Letras, 2006.

SCHMITT, Carl. O Guardião da Constituição. Belo Horizonte: Del Rey, 2007.

SILVA, Antonio Duarte. O Constitucionalismo da Guiné-Bissau; in As Constituições dos Países de Língua Portuguesa Comentadas.  Brasília: Senado Federal, 2008.

TEIXEIRA, José Paquete D’Alva. Comentário à Constituição Política Santomense; in As Constituições dos Países de Língua Portuguesa Comentadas. Brasília: Senado Federal, 2008.

VAN-DÚNEM, Fernando José de França Dias. A Constituição de Angola: uma análise histórico-jurídica; in As Constituições dos países de língua portuguesa comentadas. Brasília: Senado Federal, 2008.

VIEIRA DE ANDRADE, José Carlos. Os direitos fundamentais na Constituição portuguesa de 1976. Coimbra: Almedina, 3ª ed., 2006.

XIV. SÍTIOS VIRTUAIS

ANGOLA (www.angola.gov.ao)

BRASIL (www.brasil.gov.br)

CABO VERDE (www.governo.cv)

COMUNIDADE LUSÓFONA (www.cplp.org)

FLEC - Frente de Libertação do Estado de Cabinda (www.cabinda.org)

GUINÉ-BISSAU (www.republica-da-guine-bissau.org)

MOÇAMBIQUE (www.portaldogoverno.gov.mz)

PNUD - Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (www.un.org)

PORTUGAL (www.portugal.gov.pt)

SÃO TOMÉ E PRÍNCIPE (www.governo.st)

THE ECONOMIST - Economist Intelligence Unit Democracy Index (www.economist.com)

TIMOR-LESTE (www.timor-leste.gov.tl)


SUMARY: This essay aims to analyze the constitutional systems of the Lusophone countries (Angola, Brazil, Cape Verde, East Timor, Guinea-Bissau, Mozambique, São Tomé and Príncipe and Portugal), from the categories launched by the Ferdinand Lassalle, Konrad Hesse and Karl Loewenstein, checking over the legal and political reality of the constitutional text.

KEY-WORDS: Comparative Constitutional Law – Lusophonie – Constitutional System – Angola – Brazil – Cape Verde – Guinea-Bissau – Mozambique – São Tomé and Príncipe – Portugal – East Timor – Ferdinand Lassalle – Konrad Hesse – Karl Loewenstein.


Autor

  • Luís Carlos Martins Alves Jr.

    Luís Carlos Martins Alves Jr.

    Piauiense de Campo Maior; bacharel em Direito, Universidade Federal do Piauí - UFPI; doutor em Direito Constitucional, Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG; professor de Direito Constitucional, Centro Universitário do Distrito Federal - UDF; procurador da Fazenda Nacional; e procurador-geral da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico - ANA. Exerceu as seguintes funções públicas: assessor-técnico da procuradora-geral do Estado de Minas Gerais; advogado-geral da União adjunto; assessor especial da Subchefia para Assuntos Jurídicos da Presidência da República; chefe-de-gabinete do ministro de Estado dos Direitos Humanos; secretário nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente; e subchefe-adjunto de Assuntos Parlamentares da Presidência da República. Na iniciativa privada foi advogado-chefe do escritório de Brasília da firma Gaia, Silva, Rolim & Associados – Advocacia e Consultoria Jurídica e consultor jurídico da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil - CNBB. No plano acadêmico, foi professor de direito constitucional do curso de Administração Pública da Escola de Governo do Estado de Minas Gerais na Fundação João Pinheiro e dos cursos de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - PUC/MG, da Universidade Católica de Brasília - UCB do Instituto de Ensino Superior de Brasília - IESB, do Centro Universitário de Anápolis - UNIEVANGÉLICA e do Centro Universitário de Brasília - CEUB. É autor dos livros "O Supremo Tribunal Federal nas Constituições Brasileiras", "Memória Jurisprudencial - Ministro Evandro Lins", "Direitos Constitucionais Fundamentais", "Direito Constitucional Fazendário", "Constituição, Política & Retórica"; "Tributo, Direito & Retórica"; "Lições de Direito Constitucional - Lição 1 A Constituição da República Federativa do Brasil" e "Lições de Direito Constitucional - Lição 2 os princípios fundamentais e os direitos fundamentais" .

    Textos publicados pelo autor

    Fale com o autor

    Site(s):

Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALVES JR., Luís Carlos Martins. O sistema constitucional dos países lusófonos. Um breve passeio no modelo jurídico-político de Angola, do Brasil, de Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste, à luz das concepções de Ferdinand Lassalle, Konrad Hesse e Karl Loewenstein. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3494, 24 jan. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23514. Acesso em: 6 maio 2024.