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O estrangeiro residente no Brasil e a concessão do benefício assistencial de prestação continuada

O estrangeiro residente no Brasil e a concessão do benefício assistencial de prestação continuada

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Considerando o princípio da universalidade de atendimento e de cobertura, analisa-se a vedação do pagamento do benefício assistencial de prestação continuada a estrangeiros, mesmo que residentes no Brasil.

Resumo: A concessão do benefício assistencial de prestação continuada ao estrangeiro residente no Brasil é vedada pela regulamentação do dispositivo. Tal questão jurídica teve sua repercussão geral reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal, justificando a atualidade da análise. Para tanto, é imperativo verificar as razões pelas quais o ordenamento nacional veda a concessão do benefício a tais pessoas, cotejando-as com a Constituição Brasileira, com os Tratados Internacionais que o Brasil é signatário e com as Leis nacionais para, só então, analisar se a restrição é correta.

Palavras-chave: Assistência Social. Benefício Assistencial. Estrangeiro residente.


INTRODUÇÃO

A Seguridade Social no Brasil foi pensada para ser uma grande rede de proteção social, a qual visa tutelar todas as etapas de proteção (prevenção, reparação e recuperação) nas áreas da saúde, da assistência social e da previdência social.

Um dos princípios constitucionais da Seguridade Social é a Universalidade de Atendimento e de Cobertura. Num primeiro raciocínio básico, tal princípio tem por escopo que todos sejam integralmente tutelados pela rede de proteção social.

O objeto de estudo, neste trabalho, é o subsistema da Assistência Social, verificando se essa faceta da rede de proteção social está atendendo à sua previsão constitucional.

Isto porque há grande controvérsia atual sobre o descumprimento de tal vertente, vez que parte da população residente no país estaria de fora de uma parte da rede. Isto porque o Benefício Assistencial de Prestação Continuada – que garante o pagamento de um salário mínimo ao idoso ou à pessoa com deficiência que não tem condições de se manter ou de ser mantido por sua família – não pode ser concedido a estrangeiros, mesmo que residentes no Brasil.

Tal questão é de grande indagação jurídica, e está atualmente com sua repercussão geral reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal. Este trabalho buscará tecer considerações sobre a problemática, posicionando-se sobre o tema.


1. ASSISTÊNCIA SOCIAL

Conforme já asseverado, a Seguridade Social se traduz em uma grande rede de proteção social, e está apoiada em um tripé: Saúde, Assistência Social e Previdência Social.

A Constituição Federal, ao definir a Assistência Social, assim dispôs:

Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:

I - a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice;

II - o amparo às crianças e adolescentes carentes;

III - a promoção da integração ao mercado de trabalho;

IV - a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária;

V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.

A ideia por detrás da Assistência Social é justamente a de assistir àqueles que, por alguma razão, estejam em situação de exclusão social ou vulnerabilidade social. O fundamento é a aplicação do princípio da isonomia, tutelando aqueles que realmente necessitem, a fim de que consigam participar na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.

José Afonso da Silva (1995), ao discorrer sobre a Assistência Social, assim se manifesta:

“O direito à assistência social constitui a face universalizante da seguridade social, porque ‘será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição’ (art. 203). Nela é que, também, assenta outra característica da seguridade social: a solidariedade financeira, já que os recursos procedem do orçamento geral da seguridade social e não de contribuições específicas de eventuais destinatários (art. 204), até porque estes são impersonalizáveis a priori, porquanto se constituem daqueles que não dispõem de meios de sobrevivência: os desvalidos em geral...” (p. 300)

Ou seja, o espírito da Assistência Social é a universalização do acesso, tutelando a todos que dela necessitem, independentemente de qualquer contribuição prévia. É justamente este o preceito básico, insculpido no artigo 1º da Lei Orgânica da Assistência Social, Lei nº 8.742, de 1993:

Art. 1º A assistência social, direito do cidadão e dever do Estado, é Política de Seguridade Social não contributiva, que provê os mínimos sociais, realizada através de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade, para garantir o atendimento às necessidades básicas.

Wladimir Novaes Martinez (1992), ao definir a Assistência Social, afirma ser ela “um conjunto de atividades particulares e estatais direcionadas para o atendimento dos hipossuficientes, consistindo os bens oferecidos em pequenos benefícios em dinheiro, assistência à saúde, fornecimento de alimentos e outras pequenas prestações. Não só complementa os serviços da Previdência Social, como a amplia em razão da natureza da clientela e das necessidades providas” (p. 83).

Ou seja, a Assistência Social é o ramo da Seguridade Social que busca atender aos necessitados que, por alguma razão – social, familiar ou médica – estejam em situação de vulnerabilidade, merecendo sua tutela pelo Estado e pela Sociedade. A ação é realizada com o objetivo de prover os mínimos sociais. Para tal assistência, não há necessidade de qualquer contribuição ao sistema, vez que a base é, justamente, a solidariedade social que envolve este sistema.


2. O Benefício Assistencial de Prestação Continuada

2.1. Regulamentação do instituto

Conforme já visto, a Assistência Social é o subssistema da Seguridade Social responsável em prover os mínimos sociais àqueles de necessitem.

Dentre as ações possíveis da Assistência Social, há uma de comando constitucional, prevista dentro de seus objetivos. Tal objetivo já foi supratranscrito, mas merece destaque:

Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:

...

V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.

Ou seja, o constituinte elegeu o idoso e a pessoa com deficiência como merecedores de uma tutela especial. Nos casos em que eles não tiverem condições de se manter ou de ser mantido por suas famílias, o Estado deverá garantir o pagamento de um salário mínimo mensal.

Tal benefício, chamado de benefício da LOAS, ou de BPC/LOAS (benefício de prestação continuada da Lei Orgânica da Assistência Social), tem por escopo tutelar aqueles idosos e as pessoas com deficiência que se encontram em situação de desassistência em virtude de impossibilidade financeira de sua manutenção.

Mas, o próprio constituinte foi claro ao determinar que os requisitos seriam aqueles previstos em lei, que serviria para regulamentar o benefício.

A regulamentação veio com a edição da Lei nº 8.742, de 1993, a LOAS, cujo artigo 20 (que regulamenta o instituto) possui a seguinte redação atual:

Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)

§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)

§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)

§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)

§ 4º O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)

§ 5º A condição de acolhimento em instituições de longa permanência não prejudica o direito do idoso ou da pessoa com deficiência ao benefício de prestação continuada. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)

§ 6º A concessão do benefício ficará sujeita à avaliação da deficiência e do grau de impedimento de que trata o § 2o, composta por avaliação médica e avaliação social realizadas por médicos peritos e por assistentes sociais do Instituto Nacional de Seguro Social - INSS. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)

§ 7º Na hipótese de não existirem serviços no município de residência do beneficiário, fica assegurado, na forma prevista em regulamento, o seu encaminhamento ao município mais próximo que contar com tal estrutura. (Incluído pela Lei nº 9.720, de 30.11.1998)

§ 8º A renda familiar mensal a que se refere o § 3º deverá ser declarada pelo requerente ou seu representante legal, sujeitando-se aos demais procedimentos previstos no regulamento para o deferimento do pedido. (Incluído pela Lei nº 9.720, de 30.11.1998)

§ 9º A remuneração da pessoa com deficiência na condição de aprendiz não será considerada para fins do cálculo a que se refere o § 3o deste artigo. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)

§ 10. Considera-se impedimento de longo prazo, para os fins do § 2º deste artigo, aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)

Da leitura do referido artigo, extraem-se três requisitos básicos: um primeiro, subjetivo (ser idoso ou pessoa com deficiência); além disso, deve integrar um núcleo familiar dentro da zona de miserabilidade social e não titularizar outro benefício dentro da Seguridade Social.

Há, ainda, um quarto requisito, que não consta deste artigo 20, mas é extraído do artigo 1º, da LOAS, que é a nacionalidade brasileira. É este requisito o objeto deste trabalho, ante sua atual discussão jurídica.

Todavia, é importante conhecer os demais requisitos necessários a serem preenchidos para a concessão do BPC/LOAS, para – só então – analisarmos e pontuarmos a problemática acerca da nacionalidade.

2.2. Requisitos subjetivos

2.2.1. Idade Avançada

Os chamados requisitos subjetivos são aqueles inerentes à própria pessoa que requer o BPC/LOAS. É a razão, o motivo para que esta pessoa seja tutelada – por esta determinada ação – dentro da Assistência Social.

É o motivo que faz a pessoa ser diferente e que enseja a especial atuação do Estado. É a desigualdade que impõe o agir diferenciado do Estado, visando a inclusão social.

São requisitos alternativos, ou seja, o requerente deve preencher, apenas, um deles – idade ou ser pessoa com deficiência.

O primeiro requisito subjetivo é a idade avançada, ser idoso. Neste ponto, é importante ressaltar que – atualmente – a idade mínima como requisito para tal benefício é de 65 anos.

Ressalte-se que, para o BPC/LOAS, não há diferença entre homens e mulheres: todos se tornam idosos na mesma idade (65 anos), não havendo requisitos diferenciados por conta do sexo de cada um.

Outro fato a ser ressaltado é que a idade – na redação originária da LOAS – era de 70 anos para concessão do benefício. O limite foi reduzido pelo Estatuto do Idoso para 65 anos de idade, sendo que a atual redação da LOAS, trazida em 2011, prevê o mesmo requisito etário.

2.2.2. Pessoa com deficiência

O segundo requisito subjetivo determina que o requerente seja uma pessoa com deficiência. Novamente é importante frisar que o requisito subjetivo é alternativo: ou o requerente precisa ser idoso ou uma pessoa com deficiência. Apenas um deles deve ser preenchido.

Todavia, o requisito da deficiência gerou grande discussão, vez que a redação original da LOAS não era a mais adequada.

Para a redação originária da LOAS, pessoa com deficiência era aquela que estaria incapacitada para o trabalho e para os atos da vida independente.

Ora, com todo o respeito, incapacidade não tem qualquer relação com a conceituação de pessoa com deficiência. Incapacidade traz a impressão de impossibilidade de ação, de trabalho.

Mas, uma pessoa com deficiência pode sim trabalhar e ser capaz para atos da vida independente. Uma pessoa biamputada das pernas pode exercer atividade laborativa e ser capaz de praticar todo e qualquer ato da vida independente. Mas, mesmo assim, é uma pessoa com deficiência, devendo ser especialmente tutelada.

Incapacidade (laborativa ou para atos da vida independente) não tem qualquer relação com o conceito de pessoa com deficiência, razão pela qual a escolha legislativa não foi a mais feliz.

Obviamente que gerou inúmeras ações judiciais. Isto porque não bastava a incapacidade laborativa para caracterização de uma pessoa com deficiência; ela também deveria estar impossibilitada de exercer os atos da vida independente. Deveria necessitar de um terceiro para exercer seus atos básicos, sob pena de não preenchimento do requisito legal.

A jurisprudência, por sua vez, entendeu de forma maciça que o requisito legal estava totalmente equivocado, e que a capacidade para atos da vida independente se traduzia num discrímen não autorizado.

Dessa forma, pacificou a jurisprudência que pessoa com deficiência seria aquela que estivesse incapacitada para o trabalho. Ou seja, confundiu, ainda mais, os termos “incapacidade” e “pessoa com deficiência”, agindo como se fossem a mesma coisa.

Tais interpretações eram – por demais – equivocadas, vez que tratavam a definição de pessoa com deficiência como sendo a aptidão para exercício de atividade laborativa. Ora, uma pessoa com mobilidade reduzida é, muitas vezes, totalmente capaz para o exercício de certas atividades laborativas; todavia, será uma pessoa com deficiência, merecendo especial atenção, com fornecimento de transporte público adaptado e acessibilidade nos ambientes.

Não pensar dessa maneira é restringir a definição de pessoa com deficiência, excluindo grande parte das pessoas que deveriam ser protegidas, além de incluir outras que não teriam o direito a tal tutela.

Ou seja, a confusão terminológica trazida pela redação original da LOAS acabou por desvirtuar, num primeiro momento, o espectro de proteção do BPC/LOAS, excluindo a população que deveria ser tutelada, e incluindo parte da sociedade que não possuía qualquer direito.

No dia 25 de agosto de 2009 tal problemática foi expressamente resolvida pela publicação do Decreto nº 6.949, o qual promulgou o texto da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, ambos assinados em Nova York.

Considerando que tal Tratado Internacional foi o primeiro (e único até o presente momento) aprovado pelo Congresso Nacional de acordo com o disposto no § 3º, do artigo 5º, da Constituição Federal, os conceitos tratados em seu texto tem status de norma constitucional, vez que possuem a mesma hierarquia e força de uma Emenda Constitucional.

O conceito de pessoa com deficiência é trazido pelo artigo 1º da referida Convenção, e assim dispõe:

“Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas.”

Ou seja, o conceito trazido pela Convenção não é, apenas, médico. Tampouco se refere à capacidade laborativa ou à aptidão para exercício de atos da vida independente.

A ideia trazida é que seja realizada uma dupla análise na pessoa: uma médica, a fim de se averiguar a existência de algum tipo de impedimento de longo prazo (de natureza física, mental, intelectual ou sensorial) e, outra, de natureza social, a fim de verificar se a presença de tal impedimento interage com eventuais barreiras, impedindo a participação da pessoa na sociedade de forma plena e efetiva, em igualdade de condições com as demais pessoas.

Este é, atualmente, o conceito trazido na LOAS, com a redação dada em 2011. O único acréscimo foi o do conceito de longo prazo, que se traduziu como sendo aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos.

2.3. Miserabilidade do núcleo familiar

Outro requisito para a concessão do benefício assistencial é que o beneficiário (idoso ou pessoa com deficiência) não consiga se manter ou ser mantido por sua família.

A LOAS regulamentou tal dispositivo constitucional, determinando que essa impossibilidade de manutenção equivaleria à zona de miserabilidade social ou indigência social.

Assim sendo, para que o núcleo familiar que o pretendente seja considerado como miserável e, portanto, estar apto ao recebimento do benefício, a renda mensal per capita de tal grupo deve ser inferior a um quarto do valor do salário mínimo.

Aqui deve ser trazido um esclarecimento: o BPC/LOAS não é um benefício para complementação de renda familiar. Ele serve para suprir os mínimos sociais àqueles idosos ou pessoas com deficiência que se encontrem na zona de miserabilidade social.

Ele não visa tutelar os núcleos familiares pobres (com renda mensal por capita de até meio salário mínimo), mas sim abarcar os excluídos dos excluídos da nossa sociedade, garantindo o pagamento de um salário mínimo mensal.

A constitucionalidade do requisito “miserabilidade” foi atacada através de Ação Direta de Inconstitucionalidade, mas o Supremo Tribunal Federal julgou que a regulamentação da LOAS não foi inconstitucional neste ponto.

A jurisprudência, então, analisou sobre a obrigatoriedade de utilização – em todos os casos – deste requisito objetivo, ou se era possível ao magistrado, à luz do caso concreto e analisando outras provas, aferir que aquele determinado núcleo familiar era miserável, mesmo recebendo pouco acima do limite legal.

Esta tese foi devidamente analisada e aprovada pelo Superior Tribunal de Justiça, asseverando que pode o magistrado, em obediência ao princípio do livre convencimento motivado, julgar que determinado núcleo familiar é miserável por outras provas que não apenas a renda familiar per capita.

Ressalte-se que tal questão jurídica foi submetida recentemente para nova análise perante o Supremo Tribunal Federal, e ele julgou inconstitucional o critério objetivo trazido pela lei, mas sem declarar a nulidade do texto legal, tampouco sem modular os efeitos da decisão.

Tal declaração de inconstitucionalidade também atingiu o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso, que mandava excluir do cálculo de um BPC/LOAS Idoso o valor recebido por um idoso a título de outro BPC/LOAS Idoso.

Assim sendo, o juiz, à luz do caso concreto, e de acordo com as provas produzidas, poderá apurar a miserabilidade sem seguir os parâmetros legais. Mas a solução trazida pelo STF prejudica, sobremaneira, a concessão de benefícios na esfera administrativa.

Isto porque a Administração Pública está adstrita ao princípio da legalidade estrita, ou seja, ela só pode agir de acordo com os dizeres da lei. Se a lei é inconstitucional, mas não há um regramento objetivo a seguir, ficará o administrador impossibilitado de apreciar a miserabilidade, causando enormes instabilidades.

Independentemente de tal discussão, que apenas se iniciou, há outros pontos a serem analisados sobre miserabilidade. A LOAS, com sua atual redação, também coloca fim a uma celeuma que existia antes, no tocante a quais pessoais integrariam o núcleo familiar. A atual redação, trazida em 2011, assim preconiza:

“Art. 20.

“§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.” (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)

Resta saber, então, como se procede ao cálculo da renda mensal familiar per capita, ou da miserabilidade. O parágrafo oitavo do referido artigo vinte determina que a renda familiar deverá ser declarada pelo requerente ou seu representante legal.

Deve trazer, neste momento, que um dos princípios da Assistência Social é, justamente, o “respeito à dignidade do cidadão, à sua autonomia e ao seu direito a benefícios e serviços de qualidade, bem como à convivência familiar e comunitária, vedando-se qualquer comprovação vexatória de necessidade” (art. 4º, III, LOAS).

Assim sendo, a declaração, pelo segurado, de sua renda familiar atende a tal princípio, evitando a comprovação – por outros meios de prova que não a declaração sob as penas da lei – da necessidade.

O princípio parte do pressuposto de que aquele que necessita da Assistência Social já se encontra em uma situação de exclusão, razão pela qual fazer com que comprove sua miserabilidade por vários documentos, testemunhos, iria trazer uma situação vexatória não aceita por esse subsistema.

Todavia, é claro que o Estado pode – e deve – averiguar as informações prestadas, mas desde que não coloque o requerente em situação vexatória. Por tal razão que todos os integrantes do grupo familiar tem sua situação analisada no Cadastro Nacional de Informações Sociais – CNIS.

Além disso, pode ser realizada uma pesquisa externa, a fim de se averiguar se a declaração emanada corresponde com a realidade.

Assim sendo, para se apurar a renda familiar per capita, deve-se averiguar o total de rendimentos brutos aferidos por todos os integrantes do grupo familiar. Ressalte-se que há alguns valores que não integram tal cálculo, conforme previsto no Decreto nº 6.214, de 2007, cuja atual redação do artigo 4º, assim preconiza:

“Art. 4º Para os fins do reconhecimento do direito ao benefício, considera-se:

“...

“VI - renda mensal bruta familiar: a soma dos rendimentos brutos auferidos mensalmente pelos membros da família composta por salários, proventos, pensões, pensões alimentícias, benefícios de previdência pública ou privada, seguro-desemprego, comissões, pro-labore, outros rendimentos do trabalho não assalariado, rendimentos do mercado informal ou autônomo, rendimentos auferidos do patrimônio, Renda Mensal Vitalícia e Benefício de Prestação Continuada, ressalvado o disposto no parágrafo único do art. 19. (Redação dada pelo Decreto nº 7.617, de 2011)

“...

“§ 2º Para fins do disposto no inciso VI do caput, não serão computados como renda mensal bruta familiar: (Redação dada pelo Decreto nº 7.617, de 2011)

“I - benefícios e auxílios assistenciais de natureza eventual e temporária; (Incluído pelo Decreto nº 7.617, de 2011)

“II - valores oriundos de programas sociais de transferência de renda; (Incluído pelo Decreto nº 7.617, de 2011)

“III - bolsas de estágio curricular; (Incluído pelo Decreto nº 7.617, de 2011)

“IV - pensão especial de natureza indenizatória e benefícios de assistência médica, conforme disposto no art. 5o; (Incluído pelo Decreto nº 7.617, de 2011)

“V - rendas de natureza eventual ou sazonal, a serem regulamentadas em ato conjunto do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e do INSS; e (Incluído pelo Decreto nº 7.617, de 2011)

“VI - remuneração da pessoa com deficiência na condição de aprendiz. (Incluído pelo Decreto nº 7.617, de 2011)”.

A transcrição de tal dispositivo é importante para deixar bem claro que eventual valor recebido pelo núcleo familiar a título de Bolsa Família não integra o cálculo do valor da renda mensal per capita.

Após aferir todos os recebimentos brutos mensais de todos os integrantes deste núcleo familiar, deve-se dividir pelo número total de integrantes deste mesmo grupo, chegando-se ao valor da renda mensal familiar per capita.

Se este resultado for inferior a um quarto do salário mínimo o requisito da miserabilidade estará preenchido.

Obviamente que, com o atual posicionamento do STF, toda a discussão sobre renda mensal per capita cai por terra. Assim, para apurar miserabilidade no caso concreto, todos os valores deveriam integrar a apuração. Só para exemplificar, o grupo familiar para concessão dos benefícios trazidos pelo Programa Bolsa Família é maior do que aquele previsto na LOAS.

Neste atual momento, este requisito (miserabilidade) é aquele que traz mais instabilidade jurídica, vez que não há, ainda, um norte a ser trilhado; mas este não é o objeto do presente trabalho.

2.4. Não cumulatividade

Muitos autores não colocam a não cumulatividade como requisito do BPC/LOAS. Aliás, há doutrina que só coloca como requisitos o subjetivo e a miserabilidade.

Todavia, a não cumulatividade é requisito legal, e está previsto no art. 20, § 4º, da LOAS, que assim dispõe:

“Art.20.

“...

“§ 4º O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011”.)

Tal restrição também inclui o seguro desemprego, fato este explicitado pelo Decreto nª 6.214, de 2007.

A maior discussão sobre este ponto diz respeito à possibilidade de cumulação do BPC/LOAS com o Bolsa Família. Já foi analisado fato de que a renda oriunda do Bolsa Família não integra o cálculo da renda familiar per capita, vez que oriundo de programa social de transferência de renda.

Mas renda é uma coisa e titularidade de benefício é totalmente diferente. Pode a pessoa que é titular de um benefício pago pelo Bolsa Família receber BPC/LOAS? Seria esta uma vedação imposta pelo requisito da não cumulatividade?

Em que pese todas as manifestações em sentido contrário, entendemos que, neste ponto específico, é possível a cumulação.

Frise-se que não estaremos, propriamente, diante de cumulação de benefícios vedada pela LOAS. Estaremos, na realidade, diante de uma situação que aquele determinado núcleo familiar – miserável – preenche também os requisitos para sua inclusão no Bolsa Família, percebendo um ou todos os benefícios de tal Programa.

Mas deve-se deixar claro que no Bolsa Família o próprio grupo familiar que é analisado como um todo e, se preencher os requisitos legais, acabará recebendo o benefício. A pessoa para a qual os valores são depositados é a titular, segundo a lei, deste benefício, mas sua natureza jurídica não é, propriamente, de titular de benefício.

Isto porque o titular o benefício não é uma pessoa, mas sim aquele determinado grupo familiar. A pessoa em cujo nome os valores são depositados age como representante legal, perante o programa, deste núcleo familiar, mas não é – propriamente dito – a titular do benefício.

Assim sendo, a melhor análise é a de que uma pessoa pode ser titular do BPC/LOAS e, também, ser a representante legal de um determinado grupo familiar perante o Programa Bolsa Família, sem que, com isso, haja violação ao requisito da não cumulatividade.


3. A nacionalidade brasileira como requisito

O último requisito – que é o objeto do presente trabalho – repousa na necessidade de ser o requerente brasileiro residente no território nacional. O objetivo de tal requisito é impedir que haja o tratamento desigual entre brasileiros residentes no estrangeiro e estrangeiros residentes no Brasil.

A base de tal requisito é o artigo 1º da Lei Orgânica de Assistência Social, que assim dispõe:

Art. 1º A assistência social, direito do cidadão e dever do Estado, é Política de Seguridade Social não contributiva, que provê os mínimos sociais, realizada através de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade, para garantir o atendimento às necessidades básicas.

Os defensores de tal posicionamento retiram da leitura deste artigo a nacionalidade como requisito para a concessão do BPC/LOAS, vez que a Assistência Social é, apenas, direito do cidadão brasileiro.

A primeira regulamentação do BPC/LOAS veio com a edição do Decreto nº 1.744, de 1995, que assim dispunha:

Art 4° São também beneficiários os idosos e as pessoas portadoras de deficiência estrangeiros naturalizados e domiciliados no Brasil, desde que não amparados pelo sistema previdenciário do país de origem.

Ou seja, desde a primeira regulamentação, o estrangeiro residente não poderia receber o BPC/LOAS, a não ser que se naturalizasse, mantivesse residência no Brasil e não estivesse coberto pelo sistema previdenciário do seu país de origem.

A atual redação do artigo 7º, do Decreto nº 6.214, de 2007, que regulamenta atualmente o referido benefício, tem redação similar àquela inicial, e assim preconiza:

Art. 7º É devido o Benefício de Prestação Continuada ao brasileiro, naturalizado ou nato, que comprove domicílio e residência no Brasil e atenda a todos os demais critérios estabelecidos neste Regulamento. (Redação dada pelo Decreto nº 7.617, de 2011)

Ou seja, a regulamentação opta por destinar o BPC/LOAS apenas aos brasileiros – natos ou naturalizados – que residam em território nacional. Os estrangeiros residentes, novamente, foram excluídos da proteção, mesmo que estejam fora do sistema previdenciário de seu país de origem.

A base para tal discrímen é a seletividade e distributividade, que permitiriam ao legislador escolher quais são os beneficiários atingidos e seus requisitos.

Outro argumento trazido é a falta de reciprocidade de proteção aos brasileiros residentes nos países estrangeiros. Assim, se o brasileiro residente em um determinado país estrangeiro não tem direito à proteção assistencial, o estrangeiro nacional de tal país também não poderia ser tutelado pelo nosso sistema nacional de assistência social.

E, como ainda não há tratados internacionais firmados pelo Brasil acerca de cooperação em Assistência Social, não pode haver tal tutela especial, devendo ser pago, apenas, aos nacionais brasileiros que residam neste território.

Se assim não agir, não haveria prévia fonte de custeio total para o benefício, vez que a lei só tutela os nacionais residentes.

Com todo o respeito aos defensores de tal requisito, o mesmo não deve prosperar. Isto porque o estrangeiro residente em território nacional tem autorização para tal e, por isso, deve ser tutelado, não havendo qualquer discriminação. Só assim o sistema de Assistência Social será universal, conforme a seguir se verificará.


4. Incorreção da expressão legal

Conforme já demonstrado, a regulamentação do BPC/LOAS destina a concessão do benefício apenas aos nacionais residentes no território nacional. Isto porque o artigo primeiro da referida Lei afirma que a Assistência Social é direito do cidadão.

Antes de tudo, é imperativo afirmar e fixar de forma peremptória que a Lei contém uma terminologia errada, que não pode ser usada para criar mais restrições.

Isto porque ela afirma ser a Assistência Social um direito do cidadão, usando esta expressão, obviamente, sem a sua conotação jurídica. Talvez quisesse utilizar nacionalidade, mas não o fez. A diferença é bem tratada por MUTA (2007), ao assim dispor:

“A nacionalidade é um vínculo com o Estado, que permite ao indivíduo o exercício de certos direitos, alguns dos quais próprios e exclusivos de tal condição. Embora seja requisito necessário, a nacionalidade não é suficiente para a titularidade de todo e qualquer direito, perante o próprio Estado, como no caso dos direitos políticos. Para o gozo destes, o requisito adicional exigido é a aquisição da cidadania, enquanto condição, atributo ou qualidade, exclusiva do nacional, que o habilita à participação no processo político, na formação do governo e no controle das atividades estatais”. (p. 193)

Ou seja, nacionalidade é vínculo do nacional com o seu Estado Pátrio, o qual gera certos direitos decorrentes de tal condição. Cidadania é um plus à nacionalidade, e permite o gozo de certos direitos políticos.

O mesmo autor discorre sobre a aquisição da cidadania, assim asseverando:

“Tendo como pressuposto a condição de nacional, o indivíduo adquire a cidadania de forma gradual, a partir da idade superior a 16 anos, mediante alistamento eleitoral, que consiste na qualificação e inscrição perante a Justiça Eleitoral para habilitação ao exercício do direito de voto”. (p.194)

Partindo do pressuposto que a LOAS utilizou a terminologia jurídica correta, o nacional brasileiro menor de 16 anos jamais poderia ser objeto de atuação da Assistência Social. Obviamente que tal utilização terminológica está totalmente equivocada, vez que a proteção à infância é um dos objetivos da Assistência Social.

Assim, mais do que evidente que a Lei não quis ser restritiva quando colocou a expressão “cidadão” em seu texto. Interpretar de tal maneira seria, por demais, equivocado, impossibilitando a atuação da Assistência Social a uma grande parcela da população que integra seus objetivos.

Resta saber se o legislador quis utilizar a expressão “cidadão” no sentido de nacional brasileiro, ou se o sentido buscado foi o de tutelar toda e qualquer pessoa residente no território nacional.

A regulamentação optou por trilhar o caminho da nacionalidade brasileira, desde que haja residência fixada no território nacional. Mas este espírito se coaduna com a Assistência Social? Excluir os estrangeiros residentes no território nacional é cumprir a Universalidade de Atendimento da Seguridade Social? Tais indagações que devem ser analisadas para se alcançar a solução ao tema.


5. Situação jurídica do estrangeiro

Antes de tudo, é imperativo diferenciar um estrangeiro irregular e o estrangeiro residente para fins de concessão do BPC/LOAS. Isto porque não é todo e qualquer estrangeiro que pode permanecer no território brasileiro, havendo requisitos para a concessão do visto permanente.

Rezek (1998), ao dispor sobre o ingresso e a permanência de estrangeiros no território nacional, assim se manifesta:

“Diversos são os países que, mediante tratado bilateral ou mero exercício de reciprocidade, dispensam a prévia aposição de um visto – por suas autoridades consulares no exterior – nos passaportes de súditos de nações amigas. O Brasil não requer visto de entrada para os nacionais da maioria dos países da América latina e da Europa ocidental. O ingresso de um estrangeiro com passaporte não visado faz presumir que sua presença no país será temporária: jamais a dispensa do visto poderia interpretar-se como abertura generalizada à imigração”

“...

“A deportação é uma forma de exclusão, do território nacional, daquele estrangeiro que aqui se encontra após uma entrada irregular – geralmente clandestina -, ou cuja estada tenha-se tornado irregular - quase sempre por excesso de prazo, ou por exercício de trabalho remunerado, no caso do turista.” (p. 194/196).

Ora, não é porque para alguns países o Brasil não exige visto de entrada que o estrangeiro pode aqui ingressar e livremente permanecer. Se aqui permanecer de forma irregular ou clandestina pode e deve ser deportado pelas autoridades. Estrangeiro só pode ser residente no território nacional se expressamente permitido, através da concessão de um visto especial.

Os requisitos para a concessão do visto permanente estão previstos no Estatuto do Estrangeiro, Lei nº 6.815, de 1980, que assim dispõe:

Art. 16. O visto permanente poderá ser concedido ao estrangeiro que pretenda se fixar definitivamente no Brasil.

Parágrafo único. A imigração objetivará, primordialmente, propiciar mão-de-obra especializada aos vários setores da economia nacional, visando à Política Nacional de Desenvolvimento em todos os aspectos e, em especial, ao aumento da produtividade, à assimilação de tecnologia e à captação de recursos para setores específicos. (Redação dada pela Lei nº 6.964, de 09/12/81)

Art. 17. Para obter visto permanente o estrangeiro deverá satisfazer, além dos requisitos referidos no artigo 5º, as exigências de caráter especial previstas nas normas de seleção de imigrantes estabelecidas pelo Conselho Nacional de Imigração.

Ou seja, só pode se fixar no território nacional aquele estrangeiro que preencha os requisitos legais, tendo recebido um visto permanente para tal. Os demais são passíveis de deportação a partir do momento em que sua situação de permanência irregular é comprovada.

Frise-se, ainda, que o trabalho no território nacional pode ser autorizado ao natural de país limítrofe, sem que, com isso, haja a concessão do visto permanente. Ele será autorizado a ingressar e trabalhar no território nacional, mas não poderá fixar residência, vez que o visto permanente não foi concedido. Tal previsão também consta do Estatuto do Estrangeiro:

Art. 21. Ao natural de país limítrofe, domiciliado em cidade contígua ao território nacional, respeitados os interesses da segurança nacional, poder-se-á permitir a entrada nos municípios fronteiriços a seu respectivo país, desde que apresente prova de identidade.

§ 1º Ao estrangeiro, referido neste artigo, que pretenda exercer atividade remunerada ou freqüentar estabelecimento de ensino naqueles municípios, será fornecido documento especial que o identifique e caracterize a sua condição, e, ainda, Carteira de Trabalho e Previdência Social, quando for o caso.

§ 2º Os documentos referidos no parágrafo anterior não conferem o direito de residência no Brasil, nem autorizam o afastamento dos limites territoriais daqueles municípios.

Assim sendo, fica claro que o estrangeiro residente no Brasil é, apenas, aquele para o qual foi concedido visto permanente, ou seja, cuja fixação de residência no território nacional foi devidamente autorizada. O que se discute é justamente se este estrangeiro pode ser tutelado pelo Sistema da Assistência Social, vez que a LOAS destina sua proteção social aos cidadãos.


6. Estrangeiro residente e a Assistência Social

Feitas as considerações até o presente momento, resta, agora, apreciar se o requisito regulamentar “nacionalidade brasileira com residência no território nacional” é legal e constitucional.

Conforme já visto, tal requisito não é legal. Está disposto, apenas, no regulamento do benefício de prestação continuada. Assim, deve-se averiguar se o mesmo apenas regulamentou ou se extrapolou a competência regulamentar.

A única forma de se concluir no sentido de que a competência regulamentar não foi extrapolada seria asseverar que a base para tal restrição é, justamente, a utilização da expressão “cidadão” pela LOAS, sendo que tal expressão foi utilizada pelo legislador de forma equivocada, vez que quis dizer “nacional”.

Mas será que o legislador quis, realmente, excluir os estrangeiros legalmente residentes em território nacional da proteção do sistema de Assistência Social? Para responder tal indagação, deve-se averiguar se tal diferenciação é realizada em outros dispositivos legais.

No tocante ao português residente em território nacional, visível que o mesmo deve ser tutelado pelo sistema da Assistência Social, inclusive com eventual concessão do BPC/LOAS. Isto porque ao português residente no território nacional são garantidos os mesmos direitos do que o brasileiro residente no mesmo território, por força de um tratado internacional.

O chamado “Estatuto da Igualdade”, que é a Convenção sobre Igualdade de Direitos e Deveres entre Brasileiros e Portugueses, foi promulgada através do Decreto nº 70.391, de 1972, tem como premissa básica o reconhecimento da igualdade entre brasileiros e portugueses, sejam residentes no Brasil, sejam em Portugal.

É reconhecendo tal direito que o artigo 1º de tal Convenção assim dispõe:

“Art . 1º Os portugueses no Brasil e os brasileiros em Portugal gozarão de igualdade de direitos e deveres com os respectivos nacionais.”

E o artigo segundo da referida Convenção garante que o exercício de tal igualdade não importa em renúncia da nacionalidade de origem. Ou seja, por expressa determinação Convencional, o português residente no Brasil goza dos mesmos direitos e deveres dos nacionais brasileiros que aqui também residam.

Então, seria inviável a negativa de concessão de BPC/LOAS para um português residente no Brasil. Tal requisito seria inaplicável aos portugueses, mas, infelizmente, é oposto também a eles.

Só para se ter uma ideia, os portugueses residentes no território brasileiro, se preenchidos certos requisitos, podem exercer também os direitos políticos, ou seja, seriam cidadãos brasileiros, sem serem nacionais brasileiros...

Aliás, sobre tal tema o Superior Tribunal de Justiça, ao decidir os Embargos de Declaração no Recurso Especial nº 538.240, afirmou que “considera-se cidadãos os brasileiros natos ou naturalizados e os portugueses equiparados no pleno exercício de seus direitos políticos”.

Ora, se os portugueses no pleno exercício de seus direitos políticos são considerados cidadãos brasileiros, preencheriam o requisito legal de “cidadão” previsto na LOAS, mas não lhe é deferido o BPC/LOAS administrativamente, vez que o regulamento o veda...

Assim, o requisito “nacionalidade” não poderia, em nenhum momento, ser oposto ao português residente no território nacional, vez que ele goza dos mesmos direitos e deveres dos brasileiros residentes no Brasil. Aliás, para ele há tratado internacional garantindo reciprocidade, então não se pode trazer, também, tal argumento.

E, se há Convenção garantindo os mesmos direitos aos nacionais residentes, há prévia fonte de custeio total, não havendo nenhum óbice à concessão do BPC/LOAS aos portugueses.

Frise-se que a vedação era a posição administrativamente adotada até o dia 17 de maio de 2013, quando da edição do Memorando-Circular nº 13 DIRBEN/INSS, o qual determinou que todos os requerimentos de concessão de BPC/LOAS realizados a partir de 1º de maio de 2013 por portugueses residentes no território brasileiro não poderiam ser negados pelo requisito nacionalidade, devendo ser analisados os demais requisitos.

O referido Memorando-Circular foi além: ele reconheceu que esse direito já existia. Na esfera administrativa, todas as vezes em que há alteração de algum tipo de entendimento, a nova interpretação é só aplicada para o futuro, jamais alterando as decisões prolatadas anteriormente.

Todavia, no tocante aos portugueses residentes no Brasil que requereram o BPC/LOAS, o referido normativo trouxe a determinação de que os benefícios requeridos e indeferidos antes de 1º de maio de 2013 deveriam ser revistos.

Essa aplicação retroativa só é possível se partirmos do pressuposto de que não houve qualquer alteração normativa ou de interpretação. Houve o reconhecimento de um determinado erro, já que a legislação garantia a igualdade entre portugueses estrangeiros e os brasileiros.

Resta indagar sobre como proceder com os demais estrangeiros, já que ao português residente é assegurada a igualdade de tratamento.

O Brasil é integrante do Mercado Comum do Sul – Mercosul, bloco que nasceu buscando o livre comércio entre seus integrantes mas cresceu, abarcando outros direitos e relações que não apenas as comerciais.

Em dezembro de 2002 foi assinado o Acordo sobre Residência para Nacionais dos Estados Partes do Mercado Comum do Sul – Mercosul, Bolívia e Chile, o qual só foi promulgado pelo Brasil através do Decreto nº 6.975, de 2009.

Antes de se analisar tais disposições, deve-se ressaltar que este acordo só está em vigor, até a presente data, para o Brasil, Uruguai e Argentina, pendendo de aprovação interna nos demais países signatários.

Mas, a regra de tratamento igualitário entre nacionais e estrangeiros residentes também consta de tal tratado internacional, conforme se verifica pelo artigo 9 a seguir transcrito:

Artigo 9

DIREITO DOS IMIGRANTES E DOS MEMBROS DE SUAS FAMÍLIAS

1. IGUALDADE DE DIREITOS CIVIS: Os nacionais das Partes e suas famílias, que houverem obtido residência, nos termos do presente Acordo, gozarão dos mesmos direitos e liberdades civis, sociais, culturais e econômicas dos nacionais do país de recepção, em particular o direito a trabalhar e exercer toda atividade lícita, nas condições que dispõem as leis; peticionar às autoridades; entrar, permanecer, transitar e sair do território das Partes; associar-se para fins lícitos e professar livremente seu culto, conforme as leis que regulamentam seu exercício.

2. REUNIÃO FAMILIAR: Aos membros da família que não tenham a nacionalidade de um dos Estados Partes, será concedida uma autorização de residência de idêntica vigência a da pessoa da qual dependam, sempre e quando apresentem a documentação que estabelece o artigo 3o e não possuam impedimentos. Se, por sua nacionalidade, os membros da família necessitarem de vistos para ingressar no país, deverão tramitar a residência ante a autoridade consular, salvo quando, nos termos das normas internas do país de recepção, este último requisito não seja necessário.

3. IGUALDADE DE TRATAMENTO COM OS NACIONAIS: Os imigrantes gozarão, no território das Partes, de tratamento não menos favorável do que recebem os nacionais do país de recepção, no que concerne à aplicação da legislação trabalhista, especialmente em matéria de remuneração, condições de trabalho e seguro social.

4. COMPROMISSO EM MATÉRIA PREVIDÊNCIÁRIA: As partes analizarão a exequibilidade de firmar acordos de reciprocidade em matéria previdênciária.

5. DIREITO DE TRANSFERIR RECURSOS: Os imigrantes das Partes terão direito a transferir livremente, ao seu país de origem, sua renda e suas economias pessoais, em particular os valores necessários ao sustento de seus familiares, em conformidade com as normativas e legislação interna de cada uma das Partes.

6. DIREITO DOS FILHOS DOS IMIGRANTES: Os filhos dos imigrantes, que houverem nascido no território de uma das Partes, terão direito a ter um nome, ao registro de seu nascimento e a ter uma nacionalidade, em conformidade com as respectivas legislações internas.

Os filhos dos imigrantes gozarão, no território das Partes, do direito fundamental de acesso à educação em condições de igualdade com os nacionais do país de recepção. O acesso às instituições de ensino pré-escolar ou às escolas públicas não poderá ser negado ou limitar-se a circunstancial situação irregular de permanência dos pais.

Só para deixar bem claro: tal Tratado Internacional abarca os nacionais dos Estados Partes e dos Países Associados do Mercosul, mas, até a presente data, só está em vigor entre Brasil, Argentina e Uruguai.

Assim, neste atual momento, estrangeiros argentinos e uruguaios que residam permanentemente no território brasileiro também tem os mesmos direitos que os brasileiros, ou seja, a eles também não pode ser negado o BPC/LOAS com base no requisito regulamentar.

Frise-se que tal regra pode, a qualquer momento, ser aumentada para os demais Estados Membros do MERCOSUL (Paraguai – atualmente suspenso do MERCOSUL – e Venezuela) ou para os Países Associados do MERCOSUL (Bolívia, Chile, Colômbia, Equador e Peru), a depender do processo de validação interno de cada Estado.

Pelo exposto, o requisito de nacionalidade brasileira não pode ser oposto aos estrangeiros residentes de nacionalidade portuguesa, argentina ou uruguaia, sendo que aos nacionais dos demais Estados Membros ou Países Associados do Mercosul deve ser analisado, no momento a apreciação, se tal Estado já ratificou o Tratado Internacional acima referido.

E os estrangeiros das demais nacionalidades?

Bom, apesar do Regulamento do BPC/LOAS vedar a concessão, essa também não é a melhor solução, vez que, inclusive, é contra legem.

Isto porque o Estatuto do Estrangeiro, Lei nº 6.815, de 1980, também tem uma disposição expressa sobre o tratamento igualitário entre estrangeiros residentes e os nacionais brasileiros. Leia-se:

Art. 95. O estrangeiro residente no Brasil goza de todos os direitos reconhecidos aos brasileiros, nos termos da Constituição e das leis.

Ora, se o estrangeiro residente no Brasil goza dos mesmos direitos reconhecidos aos brasileiros, nos termos da Constituição e das Leis, impossível que um artigo de um decreto regulamentar tenha força de excluí-los do âmbito de concessão do BPC/LOAS.

Relembre-se que o BPC/LOAS é um dos objetivos constitucionais da Assistência Social (art. 203, V, CRFB), e a Constituição não o restringe apenas aos idosos e às pessoas com deficiências brasileiros. E, mesmo que reconhecesse aos brasileiros, este direito seria estendido por força de lei aos estrangeiros residentes, não havendo, portanto, razão de ser de tal requisito regulamentar.


CONCLUSÃO

Este trabalho buscou apreciar se a nacionalidade brasileira pode ser considerada como um requisito válido para a concessão do BPC/LOAS.

O que se verificou, pela análise da presente, é que não há razão para existir tal discriminação no tocante à concessão de tal espécie de benefício, vez que a Assistência Social busca proteger a todos que residam – devidamente autorizados – no território nacional.

A imposição da nacionalidade brasileira como requisito decorreu do Regulamento do benefício, veiculado por um Decreto. A questão que se deve analisar é se este Decreto é apenas regulamentar ou se criou direitos ou restrições cabíveis apenas à Lei.

A Lei Orgânica da Assistência Social não fala em nenhum momento em nacionalidade brasileira. Fala em cidadania, mas de maneira equivocada, já que, por óbvio, que não buscava a exclusão da proteção de todos aqueles que não são cidadãos.

O que se vê, na realidade, é que – pelo menos em relação aos portugueses, argentinos e uruguaios – há reciprocidade expressa decorrente de tratados internacionais, sendo que, para os nacionais de tais Estados que residam no Brasil, o benefício não poderia ser negado com base neste requisito.

Aliás, uma recente inovação na regulamentação do Instituto deixou bem claro o direito dos portugueses residentes no Brasil à concessão do BPC/LOAS.

Para os demais estrangeiros, há a previsão legal do Estatuto do Estrangeiro que estipula aos estrangeiros residentes os mesmos direitos garantidos pela Constituição e pelas Leis aos brasileiros.

Assim sendo, a conclusão que se tira é que a nacionalidade brasileira não é um requisito legal para a concessão do BPC/LOAS, mas sim um requisito previsto no Decreto Regulamentar.

Todavia, tal regulamento foi muito além de sua função, criando requisito restritivo não previsto na LOAS, requisito este contra legem e contra o espírito da Constituição, razão pela qual não há outra conclusão senão a no sentido de que a nacionalidade brasileira não é necessária para a concessão do BPC/LOAS.


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The granting of the benefit of providing continued assistance to the resident foreign in Brazil is prohibited by the regulations of the device. Such legal issue had its impact generally recognized by the Supreme Court, justifying the present analysis. Therefore, it is imperative to check the reasons why the national law prohibits the granting of benefits to such people, comparing them to the Brazilian Constitution, with the international treaties signed by Brazil and the national laws, only then analyze if the constraint is right.

Assistance. Assistential benefit. Resident foreigner.


Autor

  • Leonardo Monteiro Xexéo

    Leonardo Monteiro Xexéo

    Procurador Federal, lotado na PSF-Taubaté-SP. Professor de Direito Civil da Universidade de Taubaté-SP. Pós Graduado em Direito Público da Economia pela Universidade Salgado de Oliveira e pela Universidade de Coimbra. Pós Graduado em Direito Público pela Universidade de Brasília.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

XEXÉO, Leonardo Monteiro. O estrangeiro residente no Brasil e a concessão do benefício assistencial de prestação continuada. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3874, 8 fev. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/26594. Acesso em: 19 abr. 2024.