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As micro e pequenas empresas como propulsoras do desenvolvimento econômico e social.

Contribuição para o incremento das atividades econômicas no âmbito do Mercosul.

As micro e pequenas empresas como propulsoras do desenvolvimento econômico e social. Contribuição para o incremento das atividades econômicas no âmbito do Mercosul.

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Sumário: 1 INTRODUÇÃO; 2 PRECEDENTES HISTÓRICOS E NORMATIVOS; 3 AS MICRO E PEQUENAS EMPRESAS, 3.1 Classificação, 3.2 Ciclo de vida, 3.3 Contextualização, 3.4 Globalização, 3.5 Legislação; 4 ATIVIDADES ECONÔMICAS NO MERCOSUL, 4.1 Aspectos positivos e negativos do MERCOSUL, 4.2 MERCOSUL, União Européia e as micro e pequenas empresas; 5 SOLUÇÕES PARA A PROPULSÃO DO DESENVOLVIMENTO, 5.1 Redes, cooperativas e consórcios, 5.2 Integração comunitária; 6 CONCLUSÃO; 7 BIBLIOGRAFIA.


1. INTRODUÇÃO

O presente estudo advém de uma análise da conjuntura atual das micro e pequenas empresas no Brasil. Suas perspectivas de crescimento e conseqüente avaliação dos principais fatores que possam ser causas impeditivas deste serão demonstradas a nível de direito pátrio, para que se possam traçar algumas sugestões para solucionar os percalços que envolvem a retomada do desenvolvimento econômico e social do país, através da inequívoca contribuição de agentes como micro e pequenos empresários através de seu trabalho.

A contribuição deste esforço também deverá ser vicejada ao se tratar dos aspectos atinentes ao Mercado Comum do Sul (MERCOSUL), que ao se ver imbuído de uma série de fatos impeditivos para uma atuação eficaz, denota cuidados urgentes para que se efetive como mediador das atividades econômicas entre os países que lhe são integrantes.

Inicialmente, há a necessidade de se perscrutar a respeito dos precedentes históricos e normativos para que se compreenda o atual estado de contextualização das micro e pequenas empresas na fase de desenvolvimento na qual se encontram.

Esta análise dar-se-á através de uma aproximação conceitual, para que através de uma conseqüente classificação, tracem-se diretrizes sobre seu ciclo de vida, inserindo-as no contexto global, contingente inexorável e premente na atualidade.

As principais leis que lhe dizem respeito também devem ser colocadas, de modo a poder-se compreender o limite do avanço jurídico nesta questão e os modos pelos quais este limite ainda pode ser transposto, para que o escopo de fortalecimento e crescimento das micro e pequenas empresas seja alcançado.

Como complementação a estes estudos, busca-se novos caminhos para o incremento das atividades do MERCOSUL, através da concepção do atual estado em que se encontra e inserindo-o num plano de aproximação aos caminhos traçados a priori pela União Européia, com o surgimento do direito comunitário.

Através desta premissa de aproximação, buscam-se modos de integração, os quais indicam que somente a efetiva união em um nível de cooperação entre as partes irá poder tornar o desenvolvimento economicamente viável.

Esta cooperação dar-se-á através do incremento e conseqüente viabilidade jurídica de redes, cooperativas e consórcios, os quais, após estarem consolidados, farão parte da chamada integração comunitária, tentativa de aproximação do MERCOSUL com a União Européia.

Com o presente trabalho, pretende-se contribuir para que no futuro, esta aproximação seja concretizada, de modo a que o desenvolvimento econômico e social seja retomado.


2. PRECEDENTES HISTÓRICOS E NORMATIVOS

Foi o direito italiano que melhor sistematizou o capítulo da empresa e mais perfeitamente disciplinou o regime da pequena empresa. A primeira pesquisa no direito italiano visa a esclarecer se a pequena empresa é um conceito meramente de ordem quantitativa, hipótese em que ela só diferirá da empresa normal pelo volume de negócios e de relações jurídicas, ou se a pequena empresa é qualitativamente distinta das demais, conclusão que faria da "piccola impresa" uma nova entidade, com regramento próprio e pouca referência à empresa normal.

Foi árdua a discussão entre os juristas peninsulares, trazendo os partidários de uma e outra corrente os melhores argumentos, quer de Direito, quer de Economia. A conclusão dominante a que a doutrina chegou, foi no sentido de sufragar a opinião, segundo a qual a relação entre os artigos 2.082 e 2.083 do Código Civil italiano (de 1942), é de gênero para espécie, pois o conceito de empresa acolhido no Código foi o de atividade, e o termo se presta tanto para caracterizar as relações de uma empresa normal, como de uma empresa média ou pequena.

Tem-se como conclusão que são aplicáveis à pequena empresa todas as leis e normas que regulam a atividade das demais empresas, salvo, é lógico, as que tragam uma derrogação implícita ou explícita.

Embora seja italiana a melhor sistematização do regime das pequenas empresas, é justo lembrar que foi o Código alemão do comércio o primeiro a estatuir um regime especial para os pequenos comerciantes.

Com efeito, já em 1897, o Código alemão distinguia os comerciantes plenos ou normais dos pequenos comerciantes, para o fim de declarar que não se aplicavam, quanto a estes, as disposições sobre firma, registro comercial, livros de comércio e mandato mercantil.

Com relação ao precedentes normativos no direito brasileiro, Wilson de Souza Campos Batalha [1], atesta que as pequenas atividades autônomas foram objeto de cogitação do legislador brasileiro, anteriormente ao Estatuto da Microempresa, Lei n. 7.256, de 27.11.84, que atualmente foi revogada expressamente pelo novo Estatuto da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte, Lei n. 9.841 de 5.10.99.

A Lei n. 6.586, de 6.11.78, classificou o comerciante ambulante para fins trabalhistas e previdenciários. O Decreto n. 83.290, de 23.03.79, estabeleceu a classificação de produtos artesanais e identificação profissional do artesão. O Regulamento do Imposto sobre Produto Industrializado (Dec. n. 87.981, de 23.12.82) definiu a figura do "mascate". O garimpeiro organizado como empresa foi considerado pelo Parecer Normativo CST n. 23, de 27.09.84. A Lei n. 6.939, de 9.09.81, estabeleceu o regime sumário de registro e arquivamento no Registro do Comércio para as firmas individuais e sociedades mercantis que preencham, cumulativamente, alguns requisitos. O Decreto-Lei n. 1.780, de 14.04.80, concedeu isenção de imposto sobre a renda em relação às empresas de pequeno porte, dispensando o cumprimento de obrigações acessórias.


3.AS MICRO E PEQUENAS EMPRESAS

Microempresa é um conceito criado pela Lei n. 7.256/84 e, atualmente, regulado pela Lei n. 9.841, de 5.10.99, que estabelece normas também para as empresas de pequeno porte, em atendimento ao disposto nos arts. 170 e 179 da Constituição Federal, favorecendo-as com tratamento diferenciado e simplificado nos campos administrativo, fiscal, previdenciário, trabalhista, creditício e de desenvolvimento empresarial.

A microempresa é fruto de uma política de desburocratização, iniciada em 1979, para agilizar o funcionamento dos pequenos organismos empresariais. Considera-se microempresa, para fins de enquadramento no SIMPLES - Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e Contribuições de Microempresas e das Empresas de Pequeno Porte, nos termos da Lei n. 9.317, de 5.12.96, a pessoa jurídica e a firma individual que tiverem receita bruta anual igual ou inferior a R$ 244.000,00. E empresa de pequeno porte a pessoa jurídica e a firma individual que, não enquadradas como microempresas, tiverem receita bruta anual igual ou inferior a R$ 1.200.000,00 (art. 2º da Lei n. 9.841/99). Por força da lei, as microempresas devem adotar, para sua identificação, em seguida à sua denominação ou firma, a expressão microempresa ou, abreviadamente ME, e a empresa de pequeno porte, essa expressão, ou EPP (art. 7º). Podem ter natureza comercial ou civil, sendo microempresas e empresas de pequeno porte comerciais apenas as que exercem atividades de natureza comercial.

Em julho de 1972 foi fundada uma associação civil, sem fins lucrativos, que teve como sócios fundadores o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE), a Financiadora de Estudos e Projetos S/A. - FINEP e a Associação Brasileira de Bancos de Desenvolvimento - ABDe, cujo objetivo social consistia na prestação de serviços de organização empresarial em todos os seus aspectos, notadamente o tecnológico, econômico, financeiro e administrativo, e como finalidade a adoção de um sistema brasileiro de assistência à pequena e média empresa - entidade essa, que recebeu o nome de Centro Brasileiro de Assistência Gerencial à Pequena e Média Empresa - CEBRAE.

A Lei n. 8.029/90, no seu artigo 8º, desvinculou da Administração Pública Federal o CEBRAE, mediante sua transformação em serviço social autônomo, criando assim o SEBRAE, Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas.

O SEBRAE é uma instituição técnica de apoio ao desenvolvimento da atividade empresarial de pequeno porte, voltada para o fomento e difusão de programas e projetos que visam à promoção e ao fortalecimento das micro e pequenas empresas.

Seu propósito é trabalhar de forma estratégica, inovadora e pragmática para fazer com que o universo dos pequenos negócios no Brasil tenha as melhores condições possíveis para uma evolução sustentável, contribuindo para o desenvolvimento do país como um todo.

Foi criado por lei de iniciativa do Poder Executivo, concebida em harmonia com as confederações representativas das forças produtivas nacionais. Sem essa parceria entre os setores públicos, privado e as principais entidades de fomento e pesquisa do país, esse modelo não seria eficaz.

O SEBRAE é predominantemente administrado pela iniciativa privada. Constitui-se em serviço social autônomo - uma sociedade civil sem fins lucrativos que, embora operando em sintonia com o setor público, não se vincula à estrutura pública federal.

A instituição é fruto, portanto, de uma decisão política da cúpula empresarial e do Estado, que se associaram para criá-la e cooperam na busca de objetivos comuns. É, por isso mesmo, uma entidade empresarial voltada para atender ao segmento privado, embora desempenhe função pública.

Dentre os diversos programas de apoio às micro e pequenas empresas, destaca-se o programa de incubadora de empresas, que cria um ambiente especialmente planejado para acolher as micro e pequenas empresas nascentes e em operação, que buscam a modernização de suas atividades de forma a transformar idéias em produtos, processos e serviços.

Faz-se mister a análise das micro e pequenas empresas em suas mais diversas vertentes, para que se cumpra o escopo de torná-las propulsoras do desenvolvimento econômico e social no Brasil.

3.1 Classificação

Encontram-se na literatura e publicações pertinentes diversos parâmetros para definir e classificar as empresas que são consideradas micro e pequenas empresas, para fins de estudo e para enquadramento com o intuito de usufruir dos benefícios da lei.

Para fins didáticos, encontra-se em primeiro lugar a classificação referente à estrutura da organização da microempresa e da pequena empresa, na qual o proprietário centraliza quase todas as atividades, exercendo várias funções ao mesmo tempo.

Uma segunda classificação é aquela em que o parâmetro utilizado é o volume monetário ou econômico da empresa. Esta classificação é utilizada pelas leis federais e estaduais para fins de tributação, considerando os limites de faturamento e seu enquadramento como micro e pequena empresa. A lei federal 9.841, de 5.10.99, classifica-as de acordo com o limite de R$ 244.000,00 para microempresa, e para as de pequeno porte, de R$ 244.000,01 até R$ 1.200.000,00, como já aludido anteriormente. No âmbito estadual, a Lei n. 10.669, de 24.10.00 alterou os limites a partir de janeiro de 2001: microempresa R$ 120.000,00; empresas de pequeno porte classe A R$ 720.000,00 e classe B - R$ 1.200.000,00.

Um terceiro parâmetro, utilizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE), é a quantidade de pessoas que trabalham nessas empresas. Assim, é considerada microempresa aquela que emprega até nove pessoas no ramo de atividade de comércio e serviços e até dezenove pessoas na indústria. A pequena empresa emprega de dez a quarenta e nove pessoas no comércio e serviços e de vinte a noventa e nove pessoas na indústria.

3.2 Ciclo de vida

No Brasil, a maioria das microempresas encerram suas atividades com pouco mais de um ano de exercício social, conforme pesquisas existentes. Algumas conseguem prolongar seu ciclo de vida, desempenhando o seu papel na vida econômica e social, de sua comunidade, como geradoras de empregos e produtos que representam a riqueza da comunidade e de uma nação.

Dentre os principais fatores que contribuem para o encerramento das atividades, encontram-se aqueles relacionados à falta de tecnologia. Ações relacionadas à flexibilidade e agilidade nas decisões são indispensáveis para a solução destes problemas.

A obtenção de crédito também está relacionada a uma importante preocupação dos micro e pequenos empresários. O Estatuto da Microempresa (Lei n. 9.841/99) estabelece tratamento diferenciado simplificado e facilitado na obtenção de crédito nas Instituições Financeiras Oficiais, assim como o SEBRAE, que através de suas sedes estaduais e site oficial na Internet, viabiliza programas de microcrédito, através de editais. O Estatuto também estabelece que o limite de crédito deve ser concedido sem as exigências de garantias, permitindo o aval.

O micro ou pequeno empresário, ao procurar recursos para sua empresa, encontra na burocracia grandes dificuldades. Necessita de tempo e dinheiro, para atender a todas as exigências, mesmo que o valor do financiamento seja mínimo. Neste momento de dificuldades, ele busca empréstimos direcionados à Pessoa Física, com menos burocracia, mas com juros mais elevados. Os lucros obtidos nas vendas de seus produtos não cobrem estes juros. Esta decisão representa, para o micro ou pequeno empresário, o fechamento de sua empresa.

Para que melhor se avalie as dificuldades burocráticas pelas quais estes empresários passam, é necessário que se analise o manual de abertura de empresa passo-a-passo, fornecido pelo SEBRAE, assim como é imprescindível que se mencione também que a mesma problemática se estende quando há a necessidade de fechamento das micro ou pequenas empresas.

Sem encerramento legal, as empresas podem acumular débitos com impostos e taxas. A maioria dos empresários imagina que, ao cerrar as portas do estabelecimento, os tributos caducarão em cinco anos e o governo abrirá mão da cobrança de impostos. Desconhecem que apesar do tributo caducar após cinco anos, sempre haverá pendência porque eles são cobrados anualmente. Por isso, para não ocorrer risco de ficar em débito com o governo, é necessário dar baixa na Junta Comercial ou no Cartório de Registro de Títulos e Documentos para Pessoa Jurídica (em caso de empresas prestadoras de serviços) e pedir o cancelamento do comprovante de inscrição. Em seguida, deve-se requerer o encerramento do CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica), na Receita Federal; do Número de Inscrição de Registro Estadual, na Secretaria Estadual da Fazenda (as prestadoras de serviço estão isentas dessa inscrição); do Comprovante de Cancelamento de Inscrição, na prefeitura; e do INSS.

Antes de iniciar o fechamento de uma micro ou pequena empresa, é necessário ter conhecimento do Estatuto das Micro e Pequenas Empresas (Lei n. 9.841/99). Um dos benefícios proporcionados pela legislação é que as empresas inativas por cinco anos ou mais estarão dispensadas da apresentação de certidões negativas para a Junta Comercial ou para o cartório.

3.3 Contextualização

De acordo com dados do final da década de noventa, as micro e pequenas empresas no Brasil correspondem a noventa e sete por cento do total de estabelecimentos do Estado de São Paulo. Desse grupo, oitenta e sete por cento são microempresas e treze por cento são estabelecimentos de pequeno porte.

Para que se contextualize a realidade destas empresas no atual cenário brasileiro, a enumeração de alguns fatores associados ao seu sucesso e insucesso, são pertinentes. Os fatores associados ao seu sucesso são:

  1. Empresa de maior porte (mais de dois empregados);

  2. Maior escolaridade do proprietário;

  3. Experiência prévia;

  4. Experiência como funcionário de empresa em ramo similar;

  5. Certa disponibilidade de capital;

  6. Apoio / ajuda de profissionais;

  7. Foco no cliente/mercado;

  8. Boa concepção do negócio;

  9. Vocação e/ou treino; e

  10. Empreendimento mais maduro (com mais tempo de atividade/experiência).

Já os fatores associados ao seu insucesso são os seguintes:

  1. Empresa muito pequena (até dois empregados);

  2. Baixa escolaridade do proprietário;

  3. Ausência de experiência prévia do proprietário;

  4. Experiência apenas como autônomo no ramo;

  5. Falta de capital;

  6. Falta de apoio profissional (consultoria);

  7. Pouca preocupação com o cliente/mercado;

  8. Concepção errônea do negócio;

  9. Origem associada a pressão social/econômica; e

  10. Pouco tempo de atividade.

O SEBRAE, sendo constituído para o serviço de apoio a estas empresas, como já explicitado anteriormente, apesar de haver sido idealizado para a geração de bons programas que viabilizem uma melhor implementação para a continuidade das empresas, vê-se envolvido em denúncias sobre a abertura de CPFs falsos, em um de seus programas de apoio, chamado "Brasil Empreendedor".

Este programa, que tem como objetivo fortalecer a micro e pequena empresa, e foi lançado pelo governo federal em outubro de 1999, faz com que o SEBRAE forneça cursos para orientar o micro ou pequeno empresário a tomar empréstimo em bancos, com menos riscos (o governo abriu linhas no Banco do Brasil, na Caixa Econômica Federal e no Banco do Nordeste).

Sem estrutura própria para cumprir sua meta, o SEBRAE fez parcerias com seiscentas e cinqüenta e cinco instituições, às quais deu a tarefa de montar os cursos. Cada instituição recebia do SEBRAE, R$ 50,00 por aluno capacitado. Como os pagamentos eram feitos pelos números de CPFs apresentados, abriu-se uma janela para a falsificação.

Sendo o SEBRAE uma entidade privada que trabalha com dinheiro da sociedade, pois é mantida com recursos provenientes do recolhimento de 0,3% sobre a folha de pagamento das empresas (R$ 700 milhões é o orçamento deste ano), faz-se urgente a abertura de procedimento legal que apure os responsáveis por acontecimento tão descabido.

Para uma melhor compreensão da dimensão deste problema, far-se-á a análise da micro e pequena empresa na era da globalização, a seguir.

3.4 Globalização

O processo de globalização que se inicia nas últimas décadas do século XX faz com que os governos do ocidente comecem a liberar o comércio, o fluxo de capitais, a privatização de empresas estatais, conscientes de que esta nova arma estratégica sirva para o desenvolvimento da economia de mercado, orientados por organismos tais como o Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco Mundial e a Organização Mundial de Comércio (OMC).

O espaço então delegado à sociedade civil por meio de seu pretenso controle sobre a economia de mercado (controle este não representado de forma majoritária, pois é feito pelo contingente populacional que detém o poder econômico), é onde melhor se coadunam as forças capitalistas, que viabilizam a cultura do neoliberalismo, que vai de encontro aos interesses dos países que possuem a hegemonia econômica mundial.

De acordo com os ensinamentos de Carlos Montaño [2], esta nova alternativa de legitimação da lógica do capital dentro da órbita da sociedade civil não implica o total afastamento do Estado. Ele apenas se desvencilha das áreas econômicas (lucrativas), privatizando-as, enquanto mantém certo nível de respostas à questão social (em parceria com o chamado terceiro setor).

Este terceiro setor se organiza em torno de instituições de promoção daqueles setores prejudicados no mercado, dentre eles as micro e pequenas empresas. Para que isto ocorra, aparece a oferta de créditos, capacitação e assessoria através de serviços de apoio como o SEBRAE, por exemplo.

De acordo com o autor supracitado [3], do ponto de vista da sua inserção no mercado, podem-se distinguir duas formas fundamentais de micro e pequenas empresas:

  1. aquelas que produzem certa mercadoria ou serviço para o consumidor direto, ou para o distribuidor (ou intermediário comercial); e

  2. aquelas que produzem certa mercadoria ou serviço para uma grande ou média empresa.

No primeiro caso, as chamadas empresas de produção final, por encontrarem-se livres no mercado, definem o tipo de produto, sua qualidade, seu preço e seu público-alvo.

Na outra forma, do segundo caso, as chamadas empresas satélites, produzem uma mercadoria (ou serviço) para uma grande empresa matriz ou subcontratante. Assim, o mercado destas formas de micro e pequenas empresas está restrito às empresas subcontratadas que utilizam sua produção como insumo.

Estas duas formas fundamentais encontram-se em dificuldades para enfrentar o mercado, pois têm condições menos favoráveis de competitividade, no primeiro caso, e de cooperação, no segundo.

Para que, em face de uma economia globalizada, as micro e pequenas empresas possam se estabelecer de modo coerente e plenamente eficaz, precisam estar aptas a um processo de centralização, por meio de estratégias integracionistas.

Estas estratégias desenvolvem-se tanto no sentido de uma integração vertical, polarizando uma relação complementar (e não concorrencial) entre as micro e pequenas empresas e as grandes empresas, como no sentido de uma integração horizontal, mediante a associação ou cooperação de empresários de micro e pequenas empresas, para a compra de matérias primas, materiais, maquinaria, para a comercialização, para o uso comum de máquinas etc., de forma a conquistar, no conjunto, maior poder que as forças individuais.

As soluções podem ser apontadas tanto a nível nacional, como o incremento das relações com os países pertencentes ao MERCOSUL e deste com a União Européia. Estas questões serão abordadas a seguir, após algumas considerações sobre a legislação nacional que regulamenta as micro e pequenas empresas.

3.5 Legislação

As principais leis que dizem respeito às micro e pequenas empresas são as seguintes:

  1. Decreto n. 3.474, de 19.05.2000, regulamenta a Lei n. 9.841, de 5.10.99, que institui o Estatuto da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte;

  2. Lei n. 9.841, de 5.10.99, Estatuto da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte, regulamenta o tratamento para as micro e pequenas empresas ; e

  3. Lei n. 9.317, de 5.12.96, Lei do Simples Federal, tratamento fiscal concedido às micro e pequenas empresas.

Com a aprovação do novo Estatuto da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte foram revogadas, expressamente, as Leis n. 7.256/84 e a Lei n. 8.864/94, passando assim, a regular matérias de competência destas legislações, além de prever novos campos de atuação. Também recebeu a denominação de Estatuto da Microempresa e da Empresas de Pequeno Porte em razão de ter recepcionado integralmente a Lei do Simples e, principalmente, por tratar de assuntos diversos de interesses destas empresas em um só diploma legal.

Com o advento do novo Estado, a microempresa e a empresa de pequeno porte continuam a ser regidas por leis distintas, isto porque, a Lei do Simples não foi revogada, estando portanto, em plena vigência.

Assim, o novo Estatuto passa a prever tratamento favorecido às microempresas e empresas de pequeno porte nos campos não abrangidos pela Lei do Simples, o que significa que, enquanto o Estatuto tem por objetivo facilitar a constituição e o funcionamento da microempresa e da empresa de pequeno porte, de modo a assegurar o fortalecimento de sua participação no processo de desenvolvimento econômico e social, o Simples estabelece tratamento diferenciado nos campos dos impostos e contribuições, conforme menciona.

Conclui-se, portanto, que são duas as leis das microempresas e empresas de pequeno porte em vigor: o novo Estatuto da Microempresa e Empresa de Pequeno Porte e a Lei n. 9.317/96 (Simples). Cada qual com o seu conceito de receita bruta e exigências para enquadramento, próprios.

Assim, nada impede que uma mesma empresa seja considerada microempresa perante o novo Estatuto e empresa de pequeno porte segundo a Lei do Simples. Nada impede também que uma mesma empresa esteja enquadrada como microempresa ou empresa de pequeno porte segundo as regras do novo Estatuto, mas impedida de optar pelo sistema Simples.

Nos campos previdenciário e trabalhista, apoio creditício, desenvolvimento empresarial, a lei prevê que o Poder Executivo estabelecerá mecanismos que facilitem o desenvolvimento das microempresas e empresas de pequeno porte.

Quanto à concessão de créditos, há também previsões importantes, as quais da mesma forma necessitam de regulamentação para tornarem-se aplicáveis. Para fins de apoio à exportação, foram utilizados os conceitos de microempresa e empresa de pequeno porte, segundo as regras adotadas pelo MERCOSUL.

Estes parâmetros foram previstos no documento aprovado pelo Grupo Mercado Comum do MERCOSUL, através da Resolução n. 59/98, tendo sido adotado critérios quantitativo e qualitativo.

Quanto ao critério quantitativo, utilizam-se dois modos: pessoal empregado e nível de faturamento. Para os fins de classificação prevalecerá o nível de faturamento, o número de pessoas ocupadas será adotado como referência. Será considerada microempresa em termos industriais, aquela cujas vendas anuais sejam de até US$ 400.000,00. Será considerada empresa de pequeno porte, aquela cujas vendas sejam de US$ 400.001,00 a US$ 3.500.000,00. Com relação ao comércio e serviços, será considerada microempresa aquela cujas vendas anuais sejam de até US$ 200.000,00. Será considerada empresa de pequeno porte, aquela cujas vendas sejam de US$ 200.001,00 a US$ 1.500.000,00.

Quanto ao critério qualitativo, as micro e pequenas empresas não deverão estar controladas por outra empresa ou pertencer a um grupo econômico que em seu conjunto supere os valores estabelecidos.

Outro aspecto interessante que o Projeto de Lei previa, mas que foi vetado pelo Presidente da República quando sancionou o Estatuto, era o que alterava a lei das cooperativas permitindo a organização de microempresas e empresas de pequeno porte na formação de cooperativas para fins de desenvolvimento de suas atividades, inclusive cooperativas de crédito.

Segundo as razões do veto, a redação final do dispositivo inovaria o próprio conceito de cooperativa singular, pois permitiria a constituição de cooperativas com a adesão de microempresas e empresas de pequeno porte, não mais em caráter excepcional.

Como conseqüência, poder-se-ia estabelecer cooperativas de crédito de grande porte, no que diz respeito ao número de associados e ao escopo de atividades de seus integrantes. Disso resulta que tal inovação daria margem à criação de bancos cooperativos, tendência incompatível com a política hoje desenvolvida pelo Conselho Monetário Nacional e pelo Banco Central do Brasil.

Há a previsão do surgimento de uma nova sociedade denominada "Sociedade de Garantia Solidária" que se trata de empresa do tipo sociedade anônima, constituída por sócios investidores e, no mínimo dez microempresas e/ou empresas de pequeno porte que detenham o controle acionário, denominados sócios participantes. Esta empresa tem como objetivo regular a concessão de garantia pela sociedade aos sócios participantes, mediante uma taxa de remuneração. Trata-se de uma espécie de sociedade que garantirá um fundo de aval aos sócios participantes que se habilitarem.

Para uma análise jurisprudencial de decisões ocorridas nos tribunais sobre questões inerentes às micro e pequenas empresas, faz-se menção às seguintes ementas:

MICROEMPRESA - Isenção de Imposto sobre Serviços - Município da Capital - Segurança concedida - Apelação parcialmente provida para excluir condenação da impetrada na verba honorária (Súmula 512 - STF).

A Lei n. 7.256/84 firmou o princípio geral de que tanto as pessoas jurídicas como as firmas individuais seriam consideradas microempresas (art. 2º.) e o firmou usando de competência constitucional exclusiva, que juridicamente não pode ser delegada aos Estados-membros e aos municípios. É bem de ver que o conceito de empresa é de natureza jurídica, não cabendo ao legislador municipal pretender alterá-lo, ainda mais para estabelecer distinção inadmissível, como a ocorrida no caso, em que se discriminou entre pessoas jurídicas e firmas individuais, para privilegiar aquelas e excluir estas últimas dos mesmos benefícios fiscais. (1.9.86).

ANISTIA CONSTITUCIONAL - Avalista - Inoponibilidade do avalizado - Dilação - Agravo de instrumento não provido - Possibilidade - Agravo desprovido.

Doutrina de Pontes de Miranda: O benefício da Constituição Federal, relativamente ao afastamento da correção monetária às sociedades mercantis ou aos comerciantes caracterizados como microempresas (pequenos empreendimentos) é pessoal e não aproveita ao avalista. (27.4.89).

CONCORDATA - Microempresa - Exibição do livro diário determinada - Dispensabilidade desta apresentação, bastando o arquivamento da documentação dos atos e negócios jurídicos que pratique - Inteligência dos arts. 15 de Lei Federal 7.256/84 e 12, parágrafo único, da Lei Federal 8.864/94 - Mandado de Segurança concedido - Voto vencido.

A microempresa, dispensada de escrituração, não tem dever jurídico de manter e exibir os chamados livros obrigatórios, sequer perante as regras de direito falimentar. (12.6.95).

MICROEMPRESA - Representação comercial - Imposto de Renda - Retenção na fonte sobre comissões recebidas - Isenção.

As relações tributárias são revestidas de estrita legalidade, pelo que a isenção por lei concedida, somente por lei poderá ser revogada. Não é admissível que ato normativo infralegal acrescente ou exclua alguém do campo de incidência de determinado tributo, quanto mais por analogia, visto que tal hipótese fere a lei (C.T.N., art. 108, § 1º) e o próprio princípio constitucional da reserva legal.

É inaceitável a retenção, na fonte, de imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza, tributo ao qual a microempresa dedicada à representação comercial não está obrigada, por força da isenção legalmente concedida.

O Ato Declaratório 24/89 - SRF padece de legalidade. A microempresa dedicada à representação comercial não está excluída dos benefícios fiscais concedidos às microempresas. (11.7.96).


4. ATIVIDADES ECONÔMICAS NO MERCOSUL

Primeiramente, é importante que se façam algumas considerações sobre aspectos gerais concernentes ao MERCOSUL. MERCOSUL (Mercado Comum do Sul) é um bloco econômico que tem como membros fundadores o Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, sendo que o Chile e a Bolívia foram aceitos, inicialmente, como membros associados.

Foi criado visando ao fortalecimento interno das economias dos países integrantes deste bloco econômico, além de facilitar e agilizar suas relações comerciais em comparação ao mercado internacional.

Como seu próprio nome indica, seu objetivo é eliminar as tarifas alfandegárias nas operações de comércio exterior entre seus membros, tornando-o um único mercado, sem barreiras tarifárias. Deve-se destacar que, as tarifas alfandegárias dispensadas de pagamento são aquelas destinadas a dar proteção à indústria nacional, ou seja, o I.I. - Imposto de Importação e o AFRMM - Adicional ao Frete para Renovação da Marinha Mercante. A isenção do II somente ocorrerá se o produto final exportado tiver índice de nacionalização mínima de sessenta por cento, o que é comprovado pela emissão do Certificado de Origem Mercosul.

4.1 Aspectos positivos e negativos do MERCOSUL

Como bem preleciona Roberto Luiz Silva [4], existem aspectos positivos e negativos que cercam a execução das propostas do MERCOSUL.

Quanto aos aspectos positivos, o primeiro ponto a destacar é o cenário internacional, marcado por uma forte tendência para a formação de grandes Blocos Econômicos. Esse fator estimula a classe política à implantação do MERCOSUL; outro aspecto é o incremento do comércio entre os Estados-Partes, a partir de 1995, com a possibilidade de esse organismo se constituir, a médio prazo, numa aliança política inter-regional para preservar vantagens comparativas, já acumuladas pelos países-membros, formar um bloco negociador, em favor de uma política comercial comum, com relação a outros Blocos Econômicos; por fim, o MERCOSUL propicia condições político-institucionais para a manutenção do regime democrático nos períodos de maior turbulência.

Considerando-se os aspectos negativos, o primeiro obstáculo do MERCOSUL é a diferença de potencial existente entre os quatro países. Não se pode, ainda, ignorar a significativa diferença entre as características estruturais das economias de cada um dos Estados-Partes, os estágios em que se encontram os respectivos parques industriais, a necessidade de harmonia fiscal, monetária e cambial, como entraves à Integração Regional; há, também, desigualdades entre as unidades de produção dos setores industriais; por fim, há a falta de infra-estrutura nos países-membros.

Estes quatro países-membros assinaram, a 26 de março de 1991, o Tratado de Assunção, para a formação do MERCOSUL. Sendo uma proposta de integração, visa promover a inserção competitiva dos quatro países no mercado internacional.

4.2 MERCOSUL, União Européia e as micro e pequenas empresas

Para que a inserção competitiva aludida acima se efetive, é importante que se analise o contexto econômico-jurídico do Mercado Comum Europeu.

Segundo os ensinamentos de Benedito Hespanha [5], a situação dos Estados parceiros do MERCOSUL pressupõe uma autolimitação da soberania nacional e uma transferência do exercício de poderes soberanos. Diferentemente da União Européia, que possui natureza jurídica supranacional, desvinculada do poder soberano dos Estados, a estrutura institucional do MERCOSUL é de natureza jurídica intergovernamental.

Ao se traçar uma comparação entre as Diretivas da União Européia com as Diretrizes do MERCOSUL, Carla Izolda Fiuza Costa Marshall [6] assevera que as Diretivas da União Européia diferem fundamentalmente das Diretrizes do MERCOSUL, pois neste há a necessidade de passar-se por um processo de nacionalização das normas, enquanto na União Européia não, pois no momento em que a norma é elaborada já entra em vigor, cabendo ao Estado-membro aplicá-la, sem necessidade de qualquer processo de incorporação à ordem legislativa interna do Estado.

Quando as Diretrizes do MERCOSUL tornarem-se auto-aplicáveis, ocorrerá uma grande flexibilização nos institutos jurídicos que pretendem aperfeiçoar as condições de corporação entre as micro e pequenas empresas dos países-membros do MERCOSUL. Após esta medida, poder-se-á prever que a futura zona de livre comércio MERCOSUL - União Européia implicará significativas transformações no quadro institucional em que se desenvolve a atividade econômica intercontinental.

É imprescindível ressaltar-se o fato de que o setor privado é uma força de alta magnitude nos processos de integração econômica e deve participar intensamente do processo de estabelecimento da zona de livre comércio intercontinental. As micro e pequenas empresas devem participar, portanto, ativamente das negociações para que possam ser tomadas as oportunas medidas com vistas a enfrentar a nova realidade nas melhores condições possíveis. Para que isto ocorra, serão apresentados algumas sugestões no próximo item.


5. SOLUÇÕES PARA A PROPULSÃO DO DESENVOLVIMENTO

Muitos são os caminhos a serem perseguidos para a propulsão do desenvolvimento das atividades econômicas no âmbito do MERCOSUL. Por ora, apresentam-se algumas sugestões para a propugnação deste objetivo.

5.1 Redes, cooperativas e consórcios

A desverticalização dos ciclos de produção, rompendo as cadeias integradas de origem fordista, criou um espaço para a micro e pequena empresa, também nos setores de tecnologia avançada. E o crescimento do mercado, acessível agora de qualquer parte do mundo, provocou um processo de crescimento da variedade de produtos, que abre novos espaços às micros e pequenas empresas que souberem se inserir, de forma inteligente e maleável, nos muitos nichos abertos ao desenvolvimento.

No entanto, existem elementos de descontinuidade no futuro competitivo que devem ser combatidos através de sistemas econômicos locais, como instrumentos de uma rede ampla. Estes sistemas permitem potencializar recursos que aumentam a velocidade de reação à inovação contínua, basicamente conhecimento, experimentação, relacionamento, sistemas logísticos comunicativos e garantia financeira.

Os novos modelos de desenvolvimento local implicam na participação de toda a sociedade. Com o estudo sistemático e comparado de modelos italianos de implementação de redes, em cooperativas e consórcios, Nelson Casarotto Filho e Luiz Henrique Pires [7] demonstram que a vontade de se unir, de se associar, pode desencadear um processo extraordinário de desenvolvimento equilibrado; vontade esta que pode se manifestar no Brasil e que já vem ocorrendo com uma experiência no oeste do Estado de Santa Catarina, onde vinte municípios criaram um Fórum que reuniu todos que poderiam dar suporte e promover o desenvolvimento econômico - o Fórum de Desenvolvimento Regional Integrado.

Este Fórum representa a sociedade, e visa integrar os trabalhos das instituições locais, governamentais e privadas, voltadas ao desenvolvimento, como o próprio governo, bancos, universidades, associações empresariais e rurais, institutos de pesquisa, além de empresas, tanto grandes, como médias e pequenas.

Representantes de entidades catarinenses ligadas ao Fórum foram à Província de Bologna, na região italiana da Emilia Romagna, para conhecer os mecanismos que possibilitaram àquela região um PIB acima de US$ 25.000,00 per capita e ser ao mesmo tempo um "eldorado" das pequenas empresas.

Os mecanismos são simples, como o modelo Consórcio de Valorização de Produto, cujo exemplo é o Consórcio da Batata Típica da Bologna, em que cooperativas e empresas de comercialização, além dos produtores, se uniram num esforço de marketing e qualidade para tornar esse produto conhecido além-fronteiras, conseguindo sobrepreços de até trinta por cento.

Na área industrial, sobressaem-se os Consórcios de Formação de Produto em que, por exemplo, pequenos fabricantes, cada um especialista num equipamento, fornecem uma vinícola inteira, simulando uma grande empresa, mas com mais agilidade e flexibilidade. Consórcios de Marcas e Consórcios de Exportação são outros exemplos.

São importantíssimos ainda, as Cooperativas e os Consórcios de Garantia de Crédito, que possibilitam crédito barato, abundante e ágil para as pequenas empresas. O Consórcio Artigian Credit Emilia Romagna apresenta-se como um consórcio formado por vinte e três cooperativas de garantia de crédito da região, apoiado pelas associações empresariais das pequenas empresas, governos da região, províncias e Câmaras de Comércio. Esse consórcio é uma espécie de ressegurador das cooperativas de garantia, ou seja, ele veio fortalecer o sistema, dando condições melhores às cooperativas e associações para negociações de recursos junto ao sistema bancário.

No Brasil existe um sistema financeiro oficial, com recursos, que para inúmeros micro e pequenos empresários são demasiadamente caros. O que falta é justamente um mecanismo que proporcione diminuição de custos operacionais aos bancos, permeabilidade e diminuição do risco. Este mecanismo é o das cooperativas de garantia de crédito e do consórcio de garantia de crédito.

Entretanto, é importante salientar que a experiência italiana recomenda a criação de Cooperativas de Garantia de Crédito e não Cooperativas de Crédito. E há uma explicação lógica: a cooperativa de crédito é, na realidade, um banco, e como banco, terá seus objetivos de lucro nas operações conflitando com os objetivos dos associados, que é a obtenção de crédito barato.

A legislação brasileira tem que se adequar, pois prevê somente cooperativas de crédito que, em operações de aval, este apenas pode dar-se por convênio com os bancos, e não diretamente nos contratos. Há ainda a exigência das cooperativas serem setoriais, o que dificulta a criação de cooperativas que abranjam os vários segmentos produtivos de um sistema econômico local.

Para melhor visualização de um modelo geral de rede para o desenvolvimento de um sistema econômico local, Nelson Casarotto Filho e Nelson Pires [8] propuseram a seguinte figura:

Figura 1.1 Modelo geral de rede para o desenvolvimento de um sistema econômico local.

As cooperativas são também firmemente defendidas na tradição alemã. Frederick L. Mckitrick [9], ao dissertar sobre a solução institucional dos artesãos alemães, assevera que as cooperativas compensam por várias maneiras, se comparadas às desvantagens herdadas do pequeno ofício: recursos de capital limitados que impossibilitam economicamente o poder de compra; capacidade de gerenciamento limitada para organizar leilões, compras, marketing, etc.; e o comando e conhecimento de um mercado geográfico limitado, especialmente para exportação (em tradução livre).

A partir desta concepção, viceja-se a capacidade de micro e pequenas empresas integrarem-se através do apoio organizacional e creditício de cooperativas, as quais, através de consórcios específicos, viabilizem sua produção para a exportação, para os incrementos das atividades no próprio MERCOSUL, e posteriormente, criando mecanismos de otimização que venham a facilitar sua ingerência no Mercado Comum Europeu, que pode estar situado próximo a nós, devido a nossas raízes ibéricas.

5.2 Integração comunitária

Partindo-se da premissa de que somente após um estágio de evolução contínua, estará o MERCOSUL apto a se desenvolver nos moldes jurídicos adaptáveis a o que se chamaria direito comunitário do MERCOSUL, enquadrar-se-ia este num processo que corroborasse a crescente necessidade de exploração de mercado para fins de exportação a nível de União Européia.

Através dos ensinamentos de Elvira Méndez Pinedo [10], e através da adaptação advinda das lindes do direito comparado, demonstrando uma série de estudos feitos para viabilizar as relações de consumo entre os países integrantes da União Européia, retiram-se lições proveitosas para a consecução de uma integração efetiva e comunitária, entre os blocos econômicos supracitados.

Estas lições são enumeradas através das seguintes propostas de reforma:

  1. criação de mecanismos extrajudiciais, que através de procedimentos como a conciliação, mediação e arbitragem, pudessem informar, dirimir e institucionalizar os conflitos surgidos entre os blocos econômicos;

  2. modelo de demanda simplificada para litígios transfronteiriços, que por ser facilmente disponibilizado na Internet, nas línguas de origem dos países-membros, poderia tornar-se um instrumento de comunicação entre cooperativas, consórcios e associações dos diferentes blocos, que tivessem questões conflitantes a serem discutidas.

  3. criação de um órgão específico para as devidas reclamações: o Ombudsman dos blocos em questão;

  4. os seguros de defesa jurídica, que viabilizaram a consultoria e eventuais procedimentos jurisdicionais entre as partes que não dispusessem de recursos suficientes;

  5. a cooperação transfronteiriça;

  6. programas de formação de Direito Internacional Privado e Direito comunitário para juristas e demais partes empenhadas no sucesso das relações entre os blocos.


6. CONCLUSÃO

É incontestável que o surgimento das micro e pequenas empresas advém de um programa estatal que visa absorver e empregar parte importante das massas desocupadas ou expulsas do mercado formal, promoção que se faz mediante o desenvolvimento, no próprio Estado, de certas condições sociais (legislação que desburocratize e favoreça sua criação, que reduza ou isente a micro e pequena empresa de certas obrigações tributárias, etc.) e financeiras (fundamentalmente créditos mais acessíveis, mas socializando os custos) para seu fomento, e mediante o estímulo à terceirização, via, fundamentalmente, programas de Incentivo à Demissão Voluntária (PDV) e à flexibilização do contrato de trabalho.

Esta ingerência estatal somente serve para demonstrar sua incapacidade na harmonização entre os setores econômicos, que após tão numerosas crises, enfrenta grandes problemas. As micro e pequenas empresas, que apresentam-se como meios de inserção social no trabalho daquela massa de desempregados advindos das médias e grandes indústrias, não se expressa de modo realmente eficaz para propugnarem melhoria de vida de seus trabalhadores.

O SEBRAE, Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas, tem condições de oferecer grande colaboração para que estas empresas sintam-se consolidadas no mercado, no entanto, existem inegáveis discrepâncias quanto ao seu objetivo e o real comprometimento de seus dirigentes e urge àqueles que contribuem para que este serviço exista e seja eficaz, atentar à fiscalização do que realmente ocorre.

O programa de desburocratização para que se ofereçam melhores oportunidades e maior facilitação para se iniciar, ou até mesmo finalizar, um micro ou pequeno empreendimento necessita ser revisto, atentando sempre ao pragmatismo.

Devido à imposições da nova ordem global, o sucesso pleno do MERCOSUL, como instituição transnacional, depende de um sistema de intensa e leal cooperação política e jurídica. Contrariamente à formação das estruturas comunitárias na Europa, o MERCOSUL fundou-se no modelo de sociedade internacional sob o ponto de vista do Direito Internacional Público, e não do direito comunitário. Ou seja, com órgãos intergovernamentais de representação dos Estados, não se constitui em uma estrutura supranacional, mas em organismo de natureza intergovernamental. A efetiva internacionalização de suas normas depende de decisões isoladas das autoridades internas de cada Estado-parte. Na realidade, no caso do MERCOSUL, o que existe são políticas integracionais, enquanto na União Européia há a fundação de um direito novo: o direito comunitário.

A união entre as micro e pequenas empresas, estimulada pela inserção de regramentos que possibilitem o surgimento de Cooperativas de Garantia de Crédito, as quais, também interligadas através de consórcios, abririam novos e importantes caminhos para o incremento das exportações no MERCOSUL, representa o marco inicial, de um profundo processo de transformação, no sentido de se criar um direito comunitário próprio às lindes deste bloco econômico.

Atentando-se sempre ao fato de que os princípios da subsidiariedade e proporcionalidade gozam de uma posição privilegiada no seio do direito comunitário, pois revestem mecanismos de inestimável valor como balizamento e contenção do poder no âmbito comunitário, em todos os níveis de organização, conclui-se que estes mesmos princípios concorrerão para que as Diretrizes do MERCOSUL sejam auto-aplicáveis, como são as Diretivas da União Européia.

Com esta assertiva, viceja-se a aproximação integracionista dos blocos econômicos, que através de soluções práticas, como explicitadas anteriormente, cumprirão seu iter finalístico.


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8.NOTAS

1. BATALHA, Wilson de Souza Campos. Estatuto da microempresa. Rio de Janeiro: Forense, 1989. p.45.

2. MONTAÑO, Carlos. Microempresa na era da globalização. São Paulo: Cortez Editora, 1999. p.55. v.69.

3. Idem, ibidem, p.21.

4. SILVA, Roberto Luiz. Direito econômico internacional e direito comunitário. Belo Horizonte: Del Rey, 1995. p.236.

5. HESPANHA, Benedito. Uma visão crítica de problemas constitucionais no direito comparado, no direito comunitário e no Mercosul. Revista do Direito Constitucional e Internacional. São Paulo: Revista dos Triobunais, ano 8, n.30, jan. - mar. 2000. p.30.

6. MARSHALL, Carla Izolda Fiuza Costa. Responsabilidade civil do fabricante por produto defeituoso na União Européia e no Brasil. Revista de Direito do Consumidor. São Paulo: Revista dos Tribunais, v.25, jan. - mar. 1998. p.117-118.

7. CASAROTTO FILHO, Nelson, PIRES, Luiz Henrique. Redes de pequenas e médias empresas e desenvolvimento local. São Paulo: Atlas, 1999. p.13.

8. CASAROTTO FILHO, PIRES. op. cit., p.21.

9. MCKITRICK, Frederick L. Flexible and efficient: the institutional solution of German artisans. European Yearbook of Business History. Hampshire: Ashgate, v.1, 1998. p.27. Cooperatives make up for several inherent disadvantages of the small shop: limited capital resources that preclude purchasing economically; limited managerial capacity to organize bidding, buying, marketing, etc.; and the command over and knowledge of a limited geographical market, especially for export.

10. PINEDO, Elvira Méndez. La protección de consumidores en la Unión Europea. Madrid: Marcial Pons, 1998. p.378-379.


Autor

  • Fernanda Kellner De Oliveira Palermo

    Pós-graduada em Master of Laws (LL.M.) na The George Washington University Law School, em Washington, D.C., EUA,(2007/2008);Mestre em Direito Administrativo, com ênfase em Obrigações Públicas pela Universidade Estadual Paulista (UNESP); Bolsista da Organização dos Estados Americanos (OEA) para estudos acadêmicos de Pós-Graduação, advogada

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PALERMO, Fernanda Kellner De Oliveira. As micro e pequenas empresas como propulsoras do desenvolvimento econômico e social. Contribuição para o incremento das atividades econômicas no âmbito do Mercosul.. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. -488, 1 mar. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2735. Acesso em: 20 abr. 2024.