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Acumulação de cargos

Acumulação de cargos

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A jornada máxima de sessenta horas semanais determinada em parecer da Advocacia-Geral da União não tem status de lei, devendo o administrador se valer de juízo valorativo de análise da eficiência nos serviços e não na carga horária.

SUMÁRIO: Conceito. Dispositivos constitucionais e exceções.  Conceito de cargos técnicos e científicos. Análise crítica. Possibilidade de extensão do acúmulo a todos os servidores. Surgimento da jornada máxima de 60 (sessenta) horas semanais para o acúmulo. Crítica. Tratamento Constitucional da percepção simultânea de proventos de aposentadoria e remuneração. Regras do Estatuto dos Servidores Públicos Civis Federais. Acumulação Ilegal e o Processo Administrativo Disciplinar.  Procedimento após a detecção do acúmulo ilegal. Acumulação lícita e resguardo à integridade física e mental do servidor. Acumulação de proventos de aposentadoria e remuneração na ativa. Licença de servidor para provimento em outro cargo público. Magistério. Acumulação de proventos de uma aposentadoria com duas remunerações. Retorno ao serviço público por concurso público antes do advento da EC 20/1998. Possibilidade.   Cargo de professor com emprego privado de professor. Militar. Acumulação de cargo. Emenda Constitucional nº 77, de 11 de fevereiro de 2014.  Cumulação Tríplice de Proventos. Professora. Acúmulo de Militar com cargos permissivos, permanente e temporário. Delegado de Polícia e professor. Acumulação de cargo técnico e outro de professor. Possibilidade. Analista de Controle Externo e Professor. Acumulação de cargos de profissionais de saúde quando excede as sessenta horas semanais. Cargo de Professor. Dedicação Exclusiva. Acumulo. Proibição. Crítica. Cumulação. Professor e Procurador de Estado. Possibilidade. Acumulação ilegal e reposição ao erário. Acúmulo de Cargos em locais distantes. Acúmulo de cargos e Lei de Improbidade. Conclusão.


 1. Conceito

Utiliza-se o termo “acumulação de cargos” para designar a viabilidade constitucional do exercício simultâneo e remunerado de cargos, empregos ou funções públicas.


2.       Conceito

A regra insculpida constitucionalmente é pela impossibilidade da acumulação remunerada de cargos, empregos ou funções públicas (inciso XVI do art. 37 da CF/88).

Apesar de se falar que a regra advém do princípio da moralidade administrativa, não vislumbramos fundamentos para um rol taxativo ou mesmo pela impossibilidade de extensão do acúmulo legal a todos os agentes providos em cargos, empregos e funções públicas, desde que houvesse compatibilidade de horário.

Não podemos olvidar que o êxito no certamente do concurso público é pessoal e meritório.

O princípio da moralidade não fica afastado pelo fato de servidor exercer mais de um cargo público decorrente de ato isonômico, impessoal, meritório e disputado, que é o procedimento do concurso.  


3.       Dispositivos constitucionais e exceções    

Os incisos XVI e XVII do art. 37 da Constituição de República tratam do tema “acumulação remunerada de cargos, empregos ou de funções públicas”.  Assim prescrevem:

“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (...)

XVI - é vedada a acumulação remunerada de cargos públicos, exceto, quando houver compatibilidade de horários, observado em qualquer caso o disposto no inciso XI: a) a de dois cargos de professor; b) a de um cargo de professor com outro técnico ou científico; c) a de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas;

XVII - a proibição de acumular estende-se a empregos e funções e abrange autarquias, fundações, empresas públicas, sociedades de economia mista, suas subsidiárias, e sociedades controladas, direta ou indiretamente, pelo poder público; (...)”.

Como referido, a regra é a proibição do acúmulo remunerado. As exceções são constitucionalmente previstas. Entendemos que a lei seria instrumento suficiente para elencar as exceções. Contudo, quis assim o Poder Constituinte.

Ressaltamos que a alínea “c” do inciso XVI, limitava aos médicos a possibilidade acúmulo. Com a alteração pela EC nº 34, de 13 de dezembro de 2001, o permissivo foi estendido a todos ocupantes de cargos, empregos ou funções de profissionais da saúde, com profissões regulamentadas.

Ressaltamos que além das exceções estabelecidas no artigo epigrafado, a Constituição traz mais três situações viáveis de acúmulo: a) para cargo eletivo de vereador quando houver compatibilidade de hora; b)para os magistrados no exercício de atividade de docência; c) e para os membro do Ministério Público, viabilizando o acúmulo do magistério.

A Constituição delineou os seguintes requisitos para a permissão da cumulação de  cargos: a) a compatibilidade de horário e; b) o exercício de funções e profissões constitucionalmente viáveis.

Como veremos ambos os requisitos são passíveis de questionamento, tendo em vista a imprecisão dos conceitos  que desaguam na quebra da isonomia entre os servidores públicos.

Assim, além das possibilidades elencadas no inciso XVI do art. 37, a Constituição ainda traz outras, que estão topograficamente relacionadas com os assuntos tratados em capítulos próprios, vejamos:

“Art. 38. Ao servidor público da administração direta, autárquica e fundacional, no exercício de mandato eletivo, aplicam-se as seguintes disposições: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

I - tratando-se de mandato eletivo federal, estadual ou distrital, ficará afastado de seu cargo, emprego ou função;

II - investido no mandato de Prefeito, será afastado do cargo, emprego ou função, sendo-lhe facultado optar pela sua remuneração;

III - investido no mandato de Vereador, havendo compatibilidade de horários, perceberá as vantagens de seu cargo, emprego ou função, sem prejuízo da remuneração do cargo eletivo, e, não havendo compatibilidade será aplicada a norma do inciso anterior;

IV - em qualquer caso que exija o afastamento para o exercício de mandato eletivo, seu tempo de serviço será contado para todos os efeitos legais, exceto para promoção por merecimento;

V - para efeito de benefício previdenciário, no caso de afastamento, os valores serão determinados como se no exercício estivesse.”

Em princípio, para o exercício de mandato eletivo o servidor público ficará afastado do cargo ou emprego. Contudo, em qualquer caso que exija o afastamento para o exercício de mandato eletivo, seu tempo de serviço será contado para todos os efeitos legais, exceto para promoção por merecimento.

Para mandato de Prefeito o servidor poderá optar pela remuneração do cargo ou emprego público ou pelo subsídio do Chefe do Poder Executivo Municipal.

Quando do exercício de mandato de vereador, se houver compatibilidade de horário, o servidor poderá receber as vantagens do cargo, emprego ou função pública.  Interessante foi o julgado o Tribunal Regional Federal da 1ª Região sobre a possibilidade do acúmulo, no caso concreto, do cargo eletivo de vereador e de policial rodoviário federal.

TRF1. AC 2005.40.00.004891-5 / PI; APELAÇÃO CIVEL.APELAÇÃO CÍVEL. ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. SERVIDOR PÚBLICO. ACUMULAÇÃO DE CARGOS. VEREADOR E POLICIAL RODOVIÁRIO FEDERAL. POSSIBILIDADE. COMPATIBILIDADE DE HORÁRIOS. SENTENÇA MANTIDA. 1. A Constituição Federal, em seu art. 38, inciso III, traz a possibilidade de acumulação do cargo de vereador com outro cargo no emprego público, desde que haja compatibilidade de horários. 2. Deve-se compreender a restrição contida na Lei 9.654/98, quando fala em "integral e exclusiva dedicação" à atividade de Policial Rodoviário Federal, sob a luz do texto da Constituição, o qual garante a acumulação de qualquer cargo público não-eletivo, sem exceção, com o exercício da vereança, desde que haja compatibilidade, esta amplamente demonstrada (fls. 26 e 34), e que não foi sequer questionada pela autoridade coatora. 3. Apelação e remessa oficial não providas.”

O Tribunal levou em consideração a comprovação efetiva da compatibilidade de horários, pois apesar de a lei se referir a “integral e exclusive dedicação” proibi-se jornada semanal superior à quarenta horas por servidor público.  Nada impede, por exemplo, que o vereador labore na Câmara de Vereadores do Município sob jornada de vinte horas semanais, por exemplo.

Como visto, no caso de mandato para o Executivo, o servidor ficará afastado do cargo público. Indagamos: mas se ele tiver acumulo legal de cargos? Simplesmente ficará afastado de ambos os cargos.

Não olvidamos que, para efeito de benefício previdenciário, no caso de afastamento, os valores serão determinados como se no exercício estivesse. É uma contagem fictícia. Acumulando dois cargos o servidor, a contagem ficta será em ambos os cargos para fins previdenciários.

“APOSENTADORIA. PREFEITO. ACUMULAÇÃO DE CARGOS. CÔMPUTO DO TEMPO DO EXERCÍCIO DO MANDATO NAS APOSENTADORIAS CONCEDIDAS. 1. O servidor que acumular legalmente dois cargos ou empregos públicos (CF, art. 37, XVI) e vier a ocupar cargo eletivo que determine o seu afastamento de ambos (CF, artigo 38, II, IV, V e Lei nº 8.112/90, art. 94) tem direito à contagem ficta do período em que exercer o mandato como tempo de serviço em cada um deles para todos os efeitos, exceto para promoção por merecimento, não havendo nisso duplicidade alguma. 2. A par de ser esse o inequívoco sentido literal das normas constitucionais e legais, é evidente que a intenção delas é o de evitar o prejuízo para o servidor que vier a ocupar cargo eletivo que determine seu afastamento durante o mandato. 3. Não se trata de contar o tempo de serviço como Prefeito para duas finalidades, porque ele não antecede aos vínculos funcionais com os dois entes públicos. 4. Conciliando-se facilmente as regras constitucionais, verifica-se ser devida a contagem do tempo de serviço como médico do Município para aposentar-se como servidor municipal, e de médico do INSS para aposentar-se como servidor público federal, em vínculos distintos e concomitantes que dão direito a duas prestações previdenciárias inteiramente autônomas. Tal contagem prossegue durante o exercício do mandato de Prefeito, como se continuasse a trabalhar como médico nos dois órgãos públicos. Em tal hipótese, o tempo de efetivo trabalho como alcaide é que não pode ser contado para nenhum efeito previdenciário, uma vez que esse período foi utilizado para contagem ficta. 5. Apelação provida.”

O parágrafo único do art. 95 da Constituição Federal veda aos juízes (servidores públicos vitalícios) o exercício, ainda que em disponibilidade de outro cargo ou função pública, salvo uma de magistério. A regra a exceção referida se estendem aos membros do Ministério Público, conforme a alínea “d”, inciso II, § 5º do art. 128 da Lei Fundamental.

Conforme a doutrina, o § 2º do art. 17 do ADCT, que assegura o exercício cumulativo de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde que estejam sendo exercidos na administração pública direta ou indireta, se tornou inócuo, diante a abertura ao demais profissionais de saúde pela Emenda Constitucional nº 34/2001. Esta emenda alterou e garantiu isonomia entre os profissionais de saúde, diante a natureza dos serviços desempenhados. Assim, a viabilidade do acumulo foi estendida a todos os profissionais de saúde, desde que as profissões sejam regulamentadas.

O § 1º do art. 17 do ADCT, opinativamente, viabilizou o acúmulo de dois cargos de médico (um civil e um militar) mais um emprego público de médico, ou de um cargo de médico militar e dois de cargos civis de médico. Possibilitou, ainda, o acumulo de um cargo  de médico militar e dois empregos públicos de médico. Vamos à redação do parágrafo:

“ Art. 17. Os vencimentos, a remuneração, as vantagens e os adicionais, bem como os proventos de aposentadoria que estejam sendo percebidos em desacordo com a Constituição serão imediatamente reduzidos aos limites dela decorrentes, não se admitindo, neste caso, invocação de direito adquirido ou percepção de excesso a qualquer título. (Vide Emenda Constitucional nº 41, 19.12.2003)

§ 1º - É assegurado o exercício cumulativo de dois cargos ou empregos privativos de médico que estejam sendo exercidos por médico militar na administração pública direta ou indireta.”

O médico militar é munido de cargo sob o regime estatutário militar. Tal parágrafo possibilitou o acúmulo de dois empregos privativos de médicos, excluindo o de médico militar. Assim, além do cargo de médico militar, o agente ainda poderia exercer dois empregos públicos de médico.

Consequentemente, a regra se estenderia aos cargos públicos efetivos civis de médico. Como sabido, administrativamente (o que é um equívoco) a jornada de trabalho não pode ultrapassar 60 (sessenta) horas semanais. No caso do médico militar com mais dois vínculos, seriam três vínculos de 20 (vinte) horas semanais. Caso contrário, haveria acumulo ilegal por incompatibilidade de jornada.

Entendemos, porém, que esta ressalva constitucional somente seria aplicável aos médicos militares que estariam nessa condição no momento do permissivo. Aparentemente, a Constituição considerou direito adquirido. Ressaltamos que deve haver compatibilidade de horário.

Devemos ressaltar que a regra e as exceções da cumulatividade aplica-se à todas unidades federativas e todas as empresas públicas e sociedades de economia mista (Administração Indireta de natureza privada), suas subsidiárias, e sociedades controladas, direta ou indiretamente pelo poder público.

Não podemos esquecer que o acumulo remuneratório tem o limite do teto do funcionalismo estabelecido no inciso XI do art. 37 da CF/88.

Proíbe-se, ainda, a percepção acumulada de remuneração ou subsídio com a pensão e proventos de aposentadoria, ressalvada nos casos em que a Constituição Federal permita. Nos termos do § 10 do art. 37, é vedada a percepção simultânea de proventos de aposentadoria decorrentes do art. 40 ou dos arts. 42 e 142 com a remuneração de cargo, emprego ou função pública, ressalvados os cargos acumuláveis na forma desta Constituição, os cargos eletivos e os cargos em comissão declarados em lei de livre nomeação e exoneração.

“No presente caso, o que se pretende é acumular proventos de uma aposentadoria no cargo de professor, com duas remunerações, também referentes ao cargo de professor, nos quais ingressou antes da publicação da EC 20/1998. É correto concluir que a permissão constante do art. 11 da EC 20/1998 deve ser interpretada de forma restritiva. Trata -se de possibilidade de acumulação de um provento de aposentadoria com a remuneração de um cargo na ativa, no qual se tenha ingressado antes da publicação da referida emenda, ainda que inacumuláveis os cargos. Com efeito, nessas condições, é vedada, em qualquer hipótese, a acumulação tríplice de remunerações, sejam proventos ou vencimentos, bem como a percepção de mais de uma aposentadoria.” (RE 328.109?AgR, voto do Rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 22-2-2011, Segunda Turma, DJE de 11-3-2011.).

“A acumulação de proventos e vencimentos somente é permitida quando se tratar de cargos, funções ou empregos acumuláveis na atividade, na forma permitida na Constituição. Não é permitida a acumulação de proventos de duas aposentadorias com os vencimentos de cargo público, ainda que proveniente de aprovação em concurso público antes da EC 20/1998.” (AI 484.756?AgR, Rel. Min. Carlos Velloso, julgamento em 15-2-2005, Segunda Turma, DJ de 1º-4-2005.).

Apenas para ilustrar, concluída pela cumulação ilegal o servidor público de boa fé poderá optar por um dos cargos. No caso da cumulação ilegal advir da incompatibilidade de horário, poderá ele solicitar junto ao órgão de Recursos Humanos redução da jornada com redução proporcional da remuneração.

“Servidor público em situação de acumulação ilícita de cargos ou empregos pode se valer da oportunidade prevista no art. 133, § 5º, da Lei 8.112/1990 para apresentar proposta de solução, comprovando o desfazimento dos vínculos, de forma a se enquadrar nas hipóteses de cumulação lícita. Contudo, o art. 133, § 5º, da Lei 8.112/1990 não autoriza que o servidor prolongue indefinidamente a situação ilegal, esperando se valer do dispositivo legal para caracterizar, como sendo de boa- fé, a proposta de solução apresentada com atraso. No caso em exame, os empregadores do impetrante, quando consultados a respeito do desfazimento dos vínculos – fato que tinha sido informado pelo próprio impetrante ao INSS –, informa- ram que estes não haviam sido desfeitos, tendo um deles sido inclusive renovado. Recurso ordinário a que se nega provimento.” (RMS 26.929, Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgamento em 19-10-2010, Segunda Turma, DJE de 11-11-2010.)

Conforme o Supremo Tribunal Federal, configura-se a má fé do servidor que acumula cargos públicos de forma ilegal quando, embora notificado para optar por um dos cargos, não o faz, consubstanciando, sua omissão, disposição de persistir na prática do ilícito. 


4.       Conceito de cargos técnicos e científicos.

O conceito de cargos técnicos e científicos não é um conceito preciso. Demanda análise concreta diante a sua indeterminação.   Dessa maneira, qualquer intuito de taxar ou elencar, via lei, todos os cargos que seriam compreendidos pelos conceitos, seria frustrado,  poderia por em risco o princípio da isonomia.  A lei estaria eivada pelo vício da inconstitucionalidade por tratar diferentemente os iguais.  Alguns agentes sentir-se-iam lesados pelos pontos em comuns das atribuições dos cargos que fizessem parte ou fossem excluídos do rol legal.

Obviamente que há incessante controvérsia quanto aos enquadramentos. A Constituição não contém termos destituídos de significado, por isso, não podemos assemelhar o termo “técnico” ao “científico”. 

Para nós, o termo “técnico” relaciona-se à prática, à vivência ou mesmo à atividade de natureza  material e especializada. Atividade técnica é aquela dominada na prática, vivenciada.

 Assim, o cargo técnico seria aquele de natureza substancial, que exige do agente o domínio concreto e não científico da atividade. Por isso que nos Editais de concursos públicos o “cargo de técnico em...”, em regra, exige tão somente a formação técnica, de nível médio.

Cargo Científico relaciona-se à Ciência, ou seja, exige do agente público conhecimentos acerca  de determina área do saber. As atribuições desempenhadas são preponderantemente voltadas para a metodologia do conhecimento específico da área. A questão prática, em princípio fica em segundo plano.

Dessa forma, nos concursos públicos exigem-se, em regra, nível médio para os cargos de técnicos e nível superior para os cargos científicos.

A nomenclatura utilizada pelos Editais é “técnico em...” sem se tratando de cargos de nível médio, e “analista com formação em” ou “especialista em”.

Cargos Científicos: médico, advogado, economista; engenheiro, etc. São aqueles cujo exercício exige curso de nível superior;

Cargos Técnicos: técnico em nutrição; técnico em radiologia; técnico em enfermagem; técnico em laboratório; técnico em transportes; etc. São aqueles cuja atividade exige, quanto ao nível de escolaridade, no mínimo, o nível médio, e com atribuições qualificadas como técnicas. Não impedimento de exigência de nível superior quando a própria ciência se utiliza do termo “técnico” para se referir a disciplina de conhecimentos. Por isso é possível vermos cargos técnicos de nível superior.

O Tribunal de Contas e os Tribunais Superiores adotam tal posicionamento.

Para os fins estabelecidos na Constituição compreendem  cargos ou empregos privativos de profissionais da saúde  aqueles cujas atribuições estejam voltadas para a área de saúde, exclusivamente.

Mais uma vez ressaltamos que  indispensável é a verificação da compatibilidade de horários. Neste se incluem os intervalos para repouso, para alimentação, bem como a distância a ser percorrida entre os locais de exercício dos cargos, empregos ou funções.


5.       Análise crítica. Possibilidade de extensão do acúmulo a todos os servidores

Vamos polemizar.

A Constituição estabeleceu que: “é vedada a acumulação remunerada de cargo público, exceto quanto houver compatibilidade de horário”.  Primeiramente, a Constituição não utilizou o conectivo “e” depois de referido período para considerar taxativo o rol do inciso XVI do art. 37.  Além disso, ao falarmos de cargos técnicos e científicos as porteiras estariam abertas para nos posicionamos no sentido da abertura a todos os cargos e empregos públicos, pois ou são técnicos, ou são científicos.

Se assim pensarmos, a Constituição teria tão somente exemplificado profissões que, em princípio, a legislação permite a jornada de 20 (vinte) e 30 (trinta) horas semanais e, logo, presumir-se-ia a compatibilidade de horário.

Vejamos que o permissivo constitucional de dois cargos de professor; de um cargo de professor com outro técnico ou científico; a de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas, pela natureza das profissões (desgastantes, por sinal), foi elencado ciente que nos casos referidos haveria legalmente compatibilidade de horário.

Se aceitássemos a ideia, a regra e a exceção do acúmulo se encontrariam tão somente no seguinte período: “É vedada a acumulação remunerada de cargo público, exceto quanto houver compatibilidade de horário” ou “É permitido o acúmulo remunerado de cargo, emprego ou função pública, desde que haja compatibilidade de horário e as atribuições sejam compatíveis juridicamente”.  Diríamos que o rol elencado no inciso XVI do art. 37 da CF/88 seria meramente exemplificativo.

Como sabido, o êxito em concurso público, apesar de democrático, restringe-se aos interessados que preencham parte de suas vidas dedicada aos estudos. A dedicação em si não é para qualquer um, demanda interesse, vontade e perseverança. Se a pessoa tiver interesse e houver possibilidade psíquica e física, além de jornada compatível para o exercício de outro cargo, emprego ou função pública, não há o porquê da negativa, tendo em vista que o Estado, por meio do concurso público, busca os mais eficientes e preparados para o exercício das atribuições públicas.

Indagamos: se o servidor não se encontrar nesse rol constitucional e possuir jornada de trabalho de vinte ou trinta horas semanais ele não poderá exercer função, cargo ou emprego público remunerado com jornada de trabalho entre 20 (vinte) e 30 (trinta) horas, tendo em vista que a jornada semanal (ao menos administrativamente) é limitada à sessenta horas?  Não se estaria ferindo o princípio da isonomia entre os agentes públicos, e proibindo o exercício do labor? A questão seria mesmo de moralidade administrativa?

Não vemos assim, tendo em vista que o procedimento do concurso público é meritório.

Por isso que pensamos: não haveria proibição para a acumulação de dois cargos ou empregos públicos, desde que houvesse compatibilidade de horário, ou a lei permitisse redução da jornada com proporcional redução remuneratória. Obviamente que as atribuições devem possuir compatibilidade jurídica.

A Nota Técnica nº 41/2010 da Secretaria de Recursos Humanos do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão enfatiza a impossibilidade de acumulação de dois cargos atrelados aos profissionais de saúde, ao se considerar a extrapolação das 60 (sessenta) horas semanais. Assim, haveria necessidade desses servidores exercerem o direito de opção pela redução da jornada de trabalho, na forma das disposições exaradas na Medida Provisória n° 2.174-28, de 24 de agosto de 2001.

Vejamos que apesar de a Nota Técnica se referir aos “profissionais de saúde”, o seu objeto principal foi a incompatibilidade da jornada de trabalho (máxima de sessenta horas). Dessa forma, a NT foi clara de que haveria necessidade de os servidores exercerem redução da jornada de trabalho. Significa que poderiam permanecer em exercício em dois cargos ou empregos públicos, desde que a jornada semanal não ultrapassasse 60 (sessenta) horas.  No caso, ficou claro não bastar a adjetivação “profissionais de saúde”, pois o requisito “jornada compatível” é a principal condição de existência dos dois vínculos.  Inclusive, adotamos posicionamento distinto, excluindo o requisito objeto da jornada máxima de sessenta horas e incluindo tão somente a compatibilidade saudável. Este, inclusive é o posicionamento dos Tribunais Federal, como o da 1ª e 2ª Região.

“ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL – MANDADO DE SEGURANÇA – ACUMULAÇÃO DE CARGOS – LIMITAÇÃO DA CARGA HORÁRIA TOTAL – FUNDAMENTO – PARECER DA AGU – IMPOSSIBILIDADE – ART. 37, XVI, DA CF/88 E ART. 118, § 2º, DA LEI Nº 8.112/90 – EXEGESE. I – O ato impugnado admite a acumulação, determinando apenas – com base no Parecer AGU nº 145 – que  a carga horária de um dos cargos seja reduzida, a fim de que a jornada de trabalho total seja limitada a 60 (sessenta) horas. II – Dessume-se, portanto, que não está em discussão, na presente ação, se os  cargos são ou não acumuláveis, mas se é lícita a determinação de redução da carga horária. III – Tanto a Constituição Federal, em seu art. 37, XVI, como a Lei nº 8.112/90, em seu art. 118, § 2º, condicionam a acumulação à compatibilidade de horários, não fazendo qualquer referência à carga horária. IV – Sendo assim, desde que comprovada a compatibilidade de horários, como, de fato, ocorreu no caso em análise, fls. 24 e 26, não há que se falar em limitação da jornada de trabalho. V – Remessa e apelação desprovidas.” (TRF 2ª Região, AMS 20065101001220-5, Rel. Des. Sérgio Schwaitzer, Sétima Turma, DJ 26.10.2006, p.207).

Apenas para ilustrar, os profissionais de saúde possuem um desgaste físico e psíquico ainda maior do que qualquer outro servidor público de natureza administrativa, que executa as suas atribuições de forma rotineira, sem riscos à saúde na maioria das vezes.

Em verdade, a Constituição não está tutelando o saúde do profissional ao permitir, por exemplo, dois vínculos de vinte horas do técnico em radiologia, exposto à radiação.

“CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO. TÉCNICO EM RADIOLOGIA. ACUMULAÇÃO DE CARGOS PÚBLICOS. COMPATIBILIDADE DE HORÁRIOS COMPROVADA. 1. O mandado de segurança é destinado a garantir direito líquido e certo, ou seja, aquele que pode ser provado de plano.2. A impetrante comprovou, pelas provas juntadas com a inicial, a existência do direito líquido e certo invocado de compatibilidade de horários (CR/88, art. 37, XVI), relativamente aos dois cargos públicos que exerce cumulativamente como técnico em radiologia, com jornada de trabalho total de 48 horas semanais. 3. A Lei 7.394/85, que regula o exercício da profissão de Técnico em Radiologia, não pode criar óbice ao exercício de dois cargos, se a única exigência constitucional para a acumulação na área de saúde é a existência de compatibilidade de horário, demonstrada de plano na presente hipótese. Precedentes. 4. Apelação e remessa oficial não providas.”

O médico que labora quarenta horas em um vínculo e vinte horas em outro está sujeito a doenças das mais variadas, bem mais que servidores outros das demais searas das ciências. Não estamos defendendo a proibição de acumulo dos profissionais de saúde, mas a extensão do direito ao acúmulo aos cargos e empregos que possibilitam a compatibilidade de horário.

O art. 19 da Lei nº 8.112/90 estabelece que os servidores cumprirão jornada de trabalho fixada em razão das atribuições pertinentes aos respectivos cargos, respeitada a duração máxima do trabalho semanal de quarenta horas e observados os limites mínimo e máximo de seis horas e oito horas diárias, respectivamente.

Quer-se dizer que para a determinação da jornada de trabalho de dado cargo público deve-se ater às atribuições pertinentes aos respectivos cargos. Ressaltamos que a jornada variará, conforme o caso entre seis (mínima) e oito (máxima) horas diárias. O § 2º do art. 19 da Lei nº 8.112/90 é bastante claro ao estabelecer não se aplicar a duração do trabalho referida quando houver leis especiais. Quais seriam essas leis?

Obviamente que seriam as leis específicas que regulamentam as profissões. Não poderia haver uma lei dirigida aos servidores públicos  e outra lei privada para a regulamentação. Feriria de forma gritante o princípio da isonomia. Como duas leis tratariam diferentemente a mesma profissão pelo mero fato de uma pessoa ser provida em cargo público e outra em emprego público ou provado?

Por isso, deve-se adotar a jornada estabelecida pelas normas especiais que tratam especificamente das profissões. Os profissionais não poderiam exercer, em princípio, atribuições distintas na seara pública e privada para nortear possível distinção de jornadas.

A determinação da jornada, estabelecida pelas normas especiais, estão municiadas por estudos da capacidade psíquica e física do profissional.

Nossa concepção anda de acordo com a isonomia ao defender a abertura do acumulo de cargos a todos servidores públicos que seja possibilitada a redução da jornada de trabalho ou que já possuam tal redução em lei especial, conforme a profissão. Observemos a decisão do Tribunal Regional Federal da Primeira Região:

“TRF 1ª. PROCESSUAL CIVIL. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. SERVIDORES PÚBLICOS DO IBAMA. ESPECIFICAÇÃO DOS CARGOS PREVISTOS NO ART 9º DA LEI N. 10.410, DE 11.01.2002. ADMINISTRATIVO. ODONTÓLOGO. AUSÊNCIA DE PROVA DAS ATIVIDADES EXERCIDAS. PREMISSA EQUIVOCADA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS. CARGO E ATRIBUIÇÕES: FATO INCONTROVERSO. DESNECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. QUESTÃO EXCLUSIVAMENTE DE DIREITO. JORNADA DE TRABALHO DIFERENCIADA. POSSIBILIDADE. CUMULAÇÃO DE CARGOS PÚBLICOS. INEXISTÊNCIA DE VEDAÇÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL. NÃO CABIMENTO. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA .

1. (...).

3. Apesar da previsão legal de que "os ocupantes dos cargos da Carreira de Especialista em Meio Ambiente cumprirão jornada de trabalho de 40 (quarenta) horas", a própria Lei n. 10.410/2002 possibilitou a "flexibilização" da jornada de acordo com as especialidades profissionais. É clara a intenção do legislador em propiciar instrumento legal ao Administrador para observância das peculiaridades de alguns cargos genericamente criados/transformados em analista, técnico ou auxiliar administrativo da carreira especialista em meio ambiente.

4. Especificamente, para os dentistas, a jornada de 30 (trinta) horas semanais restou garantida pela Lei n. 3.999/61 (arts. 8º e 22), bem como pelo Decreto-lei n. 2.140/84 (art. 6º), que, por se harmonizarem com o art. 19 da Lei n. 8.112/90 e não terem sido modificados por lei especial, permanecem em pleno vigor.

5. Dispondo a Lei n. 10.410/2002 genericamente a respeito de criação de cargos e a imputação de remunerações, com menção à possibilidade de especificação de atribuições, em óbvia observância à peculiaridade de algumas "profissões", incabível serem afastadas as prerrogativas inerentes ao cargo de profissional de saúde, no caso, odontólogas, quais sejam, a jornada diferenciada de trabalho e a possibilidade de acumulação de cargos públicos, desde que preenchidos os demais requisitos constitucionais e legais.

6. Incabível, no entanto, o pedido de especificação do cargo ocupado pelas impetrantes para fins de preservação do direito à aposentadoria especial. Isto porque, nos termos da legislação previdenciária aplicável ao caso por analogia (ex vi Mandado de Injunção n. 1.841 AgR/DF, Relator Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 06/02/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-049 DIVULG 13-03-2013 PUBLIC 14-03-2013), o simples enquadramento por categoria profissional não é suficiente à contagem diferenciada do tempo de serviço. Ressalva-se, a todo modo, às impetrantes as vias ordinárias para a discussão deste pleito.

7. Embargos de declaração acolhidos parcialmente para, reformando em parte a sentença monocrática, conceder parcialmente a segurança.”

O Decreto nº 1.590, de 10 de agosto de 1995, dispõe sobre a jornada de trabalho dos servidores da Administração Pública Federal direta, das autarquias e das fundações públicas federais.  O Decreto referido regulamenta o art. 19 da Lei nº 8.112/90.

Primeiramente, trata-se de Decreto e não de lei. Assim, lei especial que regulamente uma profissão e imponha jornada específica de trabalho prevalece sobre o Decreto. Além disso, o art. 19 da Lei nº 8.112/90 possibilita a análise em cada caso da jornada diária de cada profissão, que variará entre seis e oito horas diárias.

O Decreto nº 1.590, de 10 de agosto de 1995 estabelece, em regra, que a  jornada de trabalho dos servidores da Administração Pública Federal direta, das autarquias e das fundações públicas federais, será de oito horas diárias e carga horária de quarenta horas semanais, exceto nos casos previstos em lei específica, para os ocupantes de cargos de provimento efetivo.

Vejamos que para os serviços que exigirem atividades contínuas de 24 (vinte e quatro) horas, é facultada a adoção do regime de turno ininterrupto de revezamento. Assim, quando os serviços exigirem atividades contínuas de regime de turnos ou escalas, em período igual ou superior a doze horas ininterruptas, em função de atendimento ao público ou trabalho no período noturno, é facultado ao dirigente máximo do órgão ou da entidade autorizar os servidores a cumprir jornada de trabalho de seis horas diárias e carga horária de trinta horas semanais, devendo-se, neste caso, dispensar o intervalo para refeições.

Entendamos: além das possibilidades constitucionais de compatibilidade de horário com acumulação de vínculo, defendemos que todo e qualquer servidor público possa acumular cargo público quando houver compatibilidade de horário. No caso de turno ininterrupto, o igualaríamos à possibilidade de o servidor solicitar redução da jornada de trabalho, o que viabilizaria o acumulo de cargo, desde que não ultrapassasse sessenta horas semanais.

Quando o dirigente máximo do órgão ou da entidade autorizar os servidores a cumprirem jornada de trabalho de seis horas diárias e carga horária de trinta horas semanais, entendemos que abrirá caminho para o acúmulo de cargo. Porém, se o dirigente retornar às oito horas, o servidor terá que optar por  um ou outro ou reduzir a jornada em sessenta horas semanais quando somadas.

No âmbito do Poder Executivo Federal, os Ministros de Estado e os dirigentes máximos de autarquias e fundações públicas federais fixarão o horário de funcionamento dos órgãos e entidades sob cuja supervisão se encontrem. Os horários de início e de término da jornada de trabalho e dos intervalos de refeição e descanso, observado o interesse do serviço, deverão ser estabelecidos previamente e adequados às conveniências e às peculiaridades de cada órgão ou entidade, unidade administrativa ou atividade, respeitada a carga horária correspondente aos cargos.

Quanto à redução da jornada pelo servidor com redução proporcional da remuneração, a Medida Provisória nº 2.174, de 24 de agosto de 2001, institui, no âmbito do Poder Executivo da União a jornada de trabalho reduzida com remuneração proporcional.

Conforme o art. 5º do Decreto nº 2.174/01, é facultado ao servidor da administração pública direta, autárquica e fundacional, ocupante exclusivamente de cargo de provimento efetivo, requerer a redução da jornada de trabalho de oito horas diárias e quarenta semanais para seis ou quatro horas diárias e trinta ou vinte horas semanais, respectivamente, com remuneração proporcional, calculada sobre a totalidade da remuneração. Inclui o vencimento básico e as gratificações. As verbas indenizatórias ficam de fora da contabilidade.

Solicitada a redução pelo servidor, observado o interesse da administração, a jornada reduzida com remuneração proporcional poderá ser concedida a critério da autoridade máxima do órgão ou da entidade a que se vincula o servidor, vedada a delegação de competência. A jornada reduzida poderá ser revertida em integral, a qualquer tempo, de ofício ou a pedido do servidor, de acordo com o juízo de conveniência e oportunidade da administração.

Vejamos que não se aplica aos servidores públicos cujas profissões tenha jornada especificada em lei especial. Conforme o Decreto, é vedada a concessão de jornada de trabalho reduzida com remuneração proporcional ao servidor sujeito à duração de trabalho estabelecida em leis especiais  ou ocupante de cargo efetivo submetido à dedicação exclusiva.

A redução da jornada não implica perda de vantagens permanentes inerentes ao cargo efetivo ocupado, ainda que concedidas em virtude de leis que estabeleçam o cumprimento de quarenta horas semanais, hipóteses em que serão pagas com a redução proporcional à jornada de trabalho reduzida.

Se há dois vínculos, se é descontada a contribuição previdenciária em cada um deles, ainda que sob o mesmo regime, obviamente que o servidor, legalmente, poderá aposentar-se em ambos os vínculos, ter dupla aposentadoria. 


6.       Surgimento da jornada máxima de 60 (sessenta) horas semanais para o acúmulo. Crítica

O surgimento da praxe que exige que o acúmulo de cargo não ultrapasse a jornada máxima de 60 (sessenta) horas semanais adveio com os fundamentos do Parecer nº GQ – 145/1998 – publicado no Diário Oficial da União em 01 de abril de 1998.

A Ementa do Parecer explicita: “Ilícita a acumulação de dois cargos ou empregos de que decorra a sujeição do servidor a regimes de trabalho que perfaçam o total de oitenta horas semanais, pois não se considera atendido, em tais casos, o requisito da compatibilidade de horários”.

No caso apreciado, o objeto de análise do parecer foi a acumulação de cargos de Assistente Jurídico do quadro de pessoal da própria Advocacia-Geral da União e de Professor Adjunto do quadro permanente da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

O Parecer nº GQ – 145/1998 concluiu que a acumulação, no regime de sessenta horas semanais, não impede a inativação no cargo técnico ou científico, observadas as normas pertinentes, mas não ensejará a posterior inclusão dos servidores no regime de quarenta horas, relativa ao cargo de magistério: caracterizar-se-ia acumulação proibida, por força do art. 118, § 3º, da Lei nº 8.112, com a redação dada pela Lei nº 9.527.

A grande problemática, no caso,  ocorreu em razão do fato de nos dois vínculos o agente público em princípio teria cumprido inicialmente a jornada, em cada, de quarenta horas semanais. Assim, ficou comprovado vício da jornada ilegal de 80 horas semanais desde fevereiro/92, somente corrigida em agosto/96, 5 meses após a orientação da Secretaria de Controle Interno da Presidência da República pela ilegalidade.  A correção resultou na carga horária de vinte horas semanais na Universidade.

Conforme a Consultoria Geral da República, da aplicação dessa orientação, na prática, está resultando a configuração de acumulação ilícita, por parte dos professores, de estabelecimento oficiais de ensino, que acumulam atividades de magistério ou esta com outra de caráter técnico ou científico, por período superior, no seu conjunto, às 60 horas semanais. 

Mas com razão, salientou que a nova Constituição, no inciso XVI do seu artigo 37, permitiu tal acumulação, sem nenhuma limitação, bastando para tanto haver compatibilidade horária. Assim, não havendo norma legal, limitando as acumulações à jornada semanal de 60 horas, torna-se arbitrária e injurídica aquela restrição, pela via que foi feita. Continuando: “ Uma vez que o servidor, no exercício de uma faculdade assegurada na Carta Magna, desempenho dois cargos ou empregos, no setor público, cumprindo com os deveres a eles inerentes, não pode ser penalizado nem ter declarada ilegal essa acumulação, por força de Orientação Normativa, de caráter restritivo, a qual não encontra nenhum suporte legal.Restrições, só a Lei pode impor. Torna-se mais absurda aquele limitação, ao limitar em 60 horas a cargo horária semanal, porque o permissivo constitucional da acumulação, sem nenhuma outra restrição, condicionou-a somente à compatibilidade horária. Compatibilidade horária é uma condição objetiva.Qualquer outra vedação, que não decorra de lei, sobretudo quando baseada em aspectos de índole subjetiva, não pode prosperar, porquanto estará afetando preceito fundamental decorrente da Constituição."

Concordamos plenamente com referido posicionamento, pois a Constituição restringiu, de forma objetiva, à compatibilidade de horário.

Conforme o item 11 do Parecer, os ocupantes de cargos técnicos ou científicos estão sujeitos, de lege lata, em regra, a quarenta horas (v. a Lei nº 8.112, de 11/12/90, art. 19, e a M.P. nº 1.587-7, de 5/3/98, art. 18, e normas posteriores) e os docentes dos estabelecimentos federais de ensino aos regimes de vinte ou quarenta horas, todos semanais. O professor submetido à carga de quarenta horas, com dedicação exclusiva, é obrigatório a trabalhar em dois turnos diários completos e com impedimento para o desempenho de outra atividade remunerada, pública ou privada (cfr. o Decreto nº 94.664, de 23/7/87, art. 14, 15 e 58, e normas posteriores.

  Por fim, ressalta no Parecer que, nos casos em exame, os servidores somente poderiam ser submetidos, necessariamente, às cargas de sessenta ou oitenta horas semanais, presente a exigência da compatibilidade horária, cuja acepção, a seguir delineada, indica a inviabilidade de acumulação de que provenha o último quantitativo.

Por fim, conforme o item 15: “De maneira consentânea com o interesse público e do próprio servidor, a compatibilidade horária deve ser considerada como condição limitativa do direito subjetivo constitucional de acumular e irrestrita sua noção exclusivamente à possibilidade do desempenho de dois cargos ou empregos com observância dos respectivos horários, no tocante unicamente ao início e término dos expedientes do pessoal em regime de acumulação, de modo a não se abstraírem dos intervalos de repouso, fundamentais ao regular exercício das atribuições e do desenvolvimento e à preservação da higidez física e mental do servidor."

Assim, fortalecendo o argumento pelas sessenta horas semanais, elucidou que, por mais apto e dotado, física e mentalmente, que seja o servidor, não se concebe razoável entender compatíveis os horários cumpridos cumulativamente de forma a remanescer, diariamente, apenas oito horas para atenderem-se à locomoção, higiene física e mental, alimentação e repouso, como ocorreria nos casos em que o servidor exercesse dois cargos ou empregos em regime de quarenta horas semanais, em relação a cada um.  “Condições tais de trabalho seriam até mesmo incompatíveis com o fim colimado pela disciplina trabalhista, ao estatuir o repouso de onze horas, no mínimo, entre duas jornadas: este tem o fito de salvaguardar a integridade física e mental do empregado e a eficiência laborativa, intenção que, obviamente, não foi desautorizada pelo constituinte na oportunidade em que excepcionou a regra proibitiva da acumulação de cargos, até mesmo porque estendeu aos servidores públicos as normas trabalhistas sobre o repouso, contidas nos itens XIII e XV do art. 7º, a teor do art. 39, § 2º, ambos da Carta Federal”.

No caso de dois vínculos de quarenta horas semanais afirma-se, indubitavelmente que a acumulação implica prejuízo para exercício de ambos os cargos, empregos ou funções públicas.

Concordamos plenamente com os argumentos esposados no Parecer da Advocacia Geral da União, contudo, a delimitação objetiva de 60 (sessenta) horas semanais é questionável, tendo em vista que, opinativamente poderia ser flexibilizada em caso concreto apreciado. Por exemplo, há cargos cuja jornada é de 24 (vinte quatro horas semanais), ou mesmo 35 (trinta e cinco) horas semanais. Servidor com jornada de quarenta horas, não poderia exercer outra de vinte quatro por exemplo, pois somaria 64 (sessenta e quatro) horas semanais.  O mesmo ocorreria com servidor com vinculo de trinta horas semanais lograr êxito em concurso com 35 (trinta e cinco) horas semanais. Este, também, estaria proibido.

“AMS 0035860-33.2010.4.01.3400 / DF; APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇAAPELAÇÃO CÍVEL. REMESSA OFICIAL. CONCURSO PÚBLICO. ACUMULAÇÃO LEGAL DE CARGOS PÚBLICOS NA ÁREA DE SAÚDE CONDICIONADA À COMPATIBILIDADE DE HORÁRIO. ART. 37, XVI, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PARECER DA ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO IMPONDO LIMITE DE CARGA HORÁRIA SEMANAL. IMPOSSIBILIDADE DE NOMEAÇÃO DE CANDIDATO SUB JUDICE. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE.

1. Remessa oficial, tida por interposta, visto que nos termos do art. 14, § 1º, da Lei 12.016/2009, concedida a segurança, a sentença estará sujeita obrigatoriamente ao duplo grau de jurisdição.

2. A Constituição de 1988, em seu art. 37, § 3º, inciso X, e o art. 118, § 2°, da Lei 8.112/90 determina a possibilidade de acumulação remunerada de dois cargos privativos de profissionais da saúde, desde que haja compatibilidade de horários.

3. "Não havendo norma legal regulamentando a carga horária passível de acumulação, não pode a garantia constitucional ser afastada por mera interpretação da Administração." (AMS 0000487-04.2011.4.01.3400 / DF, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL JIRAIR ARAM MEGUERIAN, SEXTA TURMA, e-DJF1 p.45 de 10/04/2013)

4. Na hipótese, tendo sido comprovada a compatibilidade de horários, não há que se falar em limitação da jornada de trabalho, sendo que entendimento contrário implicaria, sem respaldo legal, criar outro requisito para acumulação de cargos.5. Ao candidato sub judice não se reconhece direito à nomeação e posse, antes do trânsito em julgado da decisão, já que inexiste, em Direito Administrativo, o instituto da posse precária em cargo público. Precedentes.

6. Apelação e remessa oficial, tida por interposta, parcialmente providas para assegurar a nomeação da impetrante no cargo de Técnico em Higiene dental do Hospital das Forças Armadas apenas após o trânsito em julgado da sentença em análise..

Portanto o critério de julgamento seria: a) observar a possibilidade constitucional e legal de acumulação; b) analisar se há compatibilidade de horário; c) verificar, no caso concreto, o desgaste físico e mental do servidor com laudo médico oficial; d) o limite máximo de 60 (sessenta) horas se considerado como mera presunção relativa da possibilidade de acumulação; e) haja compatibilidade entre as funções cumuláveis.

“ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. MANDADO DE SEGURANÇA. TEMPESTIVIDADE. PRELIMINAR DE INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA AFASTADA. CUMULAÇÃO LEGAL DE CARGOS PÚBLICOS. TÉCNICO EMHEMOTERAPIA. COMPATIBILIDADE DE HORÁRIO. GARANTIA CONSTITUCIONAL. [...] 3. O impetrante é servidor público da Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal, no cargo de Técnico em Hemoterapia, cumprindo a carga horária de 24 (vinte e quatro) horas semanais. O impetrante prestou concurso público do Hospital das Forças Armadas e foi aprovado para o cargo de Técnico em Hemoterapia, com jornada de trabalho de 40 (quarenta) horas semanais, nos termos do Edital n. 1/2004 - HFA, datado de 16.09.2004. No entanto, afirma a União em seu recurso de apelação, que o Parecer GQ 145 da Advocacia Geral da União, de 30 de março de 1998, e a orientação contida no Oficio-Circular nº 10, de 26 de fevereiro de 2002, do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão limitam a carga horária de trabalho no âmbito federal no total de 60 (sessenta) horas semanais.  4. Falta respaldo jurídico ao entendimento que considera ilícita a acumulação de cargos apenas por totalizarem uma jornada de trabalho superior a sessenta horas semanais. Ora, tanto a Constituição Federal, em seu art. 37, XVI, como a Lei 8.112/90, em seu art. 118, § 2°, condicionam a acumulação à compatibilidade de horários, não fazendo qualquer referência à carga horária. Nestes termos, desde que comprovada a compatibilidade de horários, como de fato ocorreu no caso em analise, não há que se falar em limitação da jornada de trabalho, sendo que entendimento contrário implicaria, sem respaldo legal, criar outro requisito para cumulação de cargos. O Parecer GQ-145 da AGU, de 30.08.98, não tem força normativa que possa preponderar sobre a garantia constitucional. Precedentes dos Tribunais Regionais Federais. 5. Apelação e remessa oficial desprovidas.  (TRF 1ª Região, AC 2005.34.00.004019-5/DF, Des. Fed. Antônio Sávio de Oliveira Chaves, Primeira Turma, e-DJF1 25.11.2008).”

“AMS 0002771-58.2011.4.01.3602 / MT; APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. ACUMULAÇÃO DE CARGOS. PÚBLICO DE MÉDICO. POSSIBILIDADE CONDICIONADA À COMPATIBILIDADE DE HORÁRIOS. ART. 37, XVI DA CF C/C ART. 118, §2°, DA LEI 8.112/90. SENTENÇA REFORMADA.I. Posse no cargo de Perito Médico no município de Nova Xavantina-MT, submetido à jornada de 40 horas semanais acumulando-o com o cargo de Médico no município de Rondonópolis, com a jornada de trabalho de 50 horas semanais. II. Não havendo norma legal regulamentando a carga horária passível de acumulação, não pode a garantia constitucional ser afastada por mera interpretação da Administração, em parecer interno. III. A acumulação de cargos públicos é condicionada à compatibilidade de horários, nos termos do art. 37, XVI da CF e do art. 118, § 2°, da Lei 8.112/90, aplicável no âmbito federal. IV. Fixado o fundamento do ato administrativo exclusivamente sobre o total da carga horária semanal, não cabe discutir ou exigir comprovação de compatibilidade de horários, aspecto não ventilado no ato administrativo impugnado. V. Recurso provido. Segurança concedida.”

Entendendo que não há atribuições com maior desgaste físico e mental que a dos professores e médicos, para que a Constituição os taxe como exceções.  Por isso que defendi a extensão do acúmulo a todos os servidores, se preenchidos os requisitos da possibilidade temporal da jornada e viabilidade psicossomática.

Além disso, deve haver compatibilidade entre as funções. Pois, não seria possível, por exemplo, se lei determinasse 30 (trinta) horas semanais, o exercício de um cargo de técnico judiciário e outro de técnico do Ministério Público na mesma entidade política. O processo judicial poderia tramitar nas mãos do servidor nos dois vínculos o que, efetivamente, lesaria o princípio da moralidade administrativa.

A Unidade de Recursos Humanos decidiria com base em Parecer da Consultoria Jurídica.

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. ACUMULAÇÃO DE CARGOS. COMPATIBILIDADE DE HORÁRIOS. ARQUITETO E PROFESSOR. ART. 37, XVI, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PARECER DA ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO IMPONDO LIMITE DE CARGA HORÁRIA SEMANAL. IMPOSSIBILIDADE. I - Nos termos do art. 37, inciso XVI, alínea "b", da Constituição Federal, é possível a acumulação remunerada do cargo de professor com outro técnico, desde que haja compatibilidade de horários. II - Em sendo o cargo de Arquiteto considerado técnico pela própria Administração, e havendo compatibilidade de horários, afigura-se legítima a acumulação de cargos pretendida na espécie dos autos. III - Registre-se, ainda, que é ilegítima, na espécie, a aplicação de restrição imposta por Parecer da Advocacia Geral da União, limitando a carga horária semanal, posto que mero parecer administrativo não tem o condão de afastar direito assegurado constitucionalmente. IV - Apelação e remessa oficial desprovidas. Sentença confirmada

TRF 1ª. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. PROFISSIONAL DA ÁREA DE SAÚDE. MÉDICO. ACUMULAÇÃO DE CARGOS. COMPATIBILIDADE DE HORÁRIOS. POSSIBILIDADE. RECURSO PROVIDO. CONCESSÃO DA SEGURANÇA. 1. A Constituição Federal, em seu art. 37, inciso XVI, alínea "c", garante que havendo compatibilidade de horários é possível a cumulação remunerada de dois cargos públicos privativos de profissionais da saúde. 2. O impetrante apresentou Atestado Funcional comprovando jornada de trabalho de 30 horas, na Secretaria de Estado de Saúde de Mato Grosso, em escala noturna e pleiteia cumulação com cargo público de 40 horas, extrapolando, assim, o limite semanal de sessenta horas para os casos de cumulação de cargos e empregos públicos na área de saúde. 3. Consoante ressaltou o Juízo "o pressuposto de compatibilidade de horários não é atendido pela mera inocorrência abstrata de sobreposição de horários de trabalho.(...) as regras da experiência comum ensinam, o ser humano não tem condições biológicas para agüentar por muito tempo, uma carga de trabalho exercida em quantidade e períodos excessivos, pois caso contrário, desempenharia mal suas atribuições num e/ou noutro cargo acumulado". 4. Apelação a que se nega provimento.

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO - AGRAVO RETIDO - APELAÇÃO - REMESSA NECESSÁRIA - SERVIDOR PÚBLICO - PROFISSIONAL DE SAÚDE - POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO DE CARGOS PÚBLICOS - ARTIGO 37, XVI, C, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL - COMPATIBILIDADE DE HORÁRIOS - PARECER GQ-145 - AUSÊNCIA DE FORÇA NORMATIVA - PRECEDENTES. 1. Sentença que julgou procedente o pedido, nos termos do art. 269, I do CPC, para declarar a licitude da acumulação dos cargos público que a Autora exerce no Hospital Municipal de Piedade, antes unidade federal sob a gestão do Ministério da Saúde, e no Hospital Municipal Souza Aguiar. 2. As jornadas de trabalho dos cargos descritos na exordial podem ser compatibilizadas mediante escala de serviço com a Administração. Não se pode prejudicar a Autora por presunção de que a realização de jornada de trabalho superior a sessenta horas compromete a qualidade do serviço prestado. 3. Pelos documentos acostados aos autos, a Autora cumpre carga horária total de 62,5 horas semanais em dois cargos de Enfermeira, sendo um no Hospital Municipal de Piedade, antes unidade federal sob a gestão do Ministério da Saúde, desde 1996, cumprindo carga horária de 30 horas semanais, no horário 07:00h às 19:00h (escala 12x60h), em novembro de 2011 estava de plantão nos dias 02, 05, 08, 11, 14, 17, 20, 23, 26 e 29; e outro cargo público de Enfermeira junto à Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro (Hospital Municipal Souza Aguiar), desde 1988, com carga horária de 32,5 horas semanais, no horário de 07:00h às 19:00h (escala 12x 60h), em novembro de 2011 estava de plantão nos dias 03, 06, 09, 15, 18, 21, 24, 27, e 30 e complementação de 08:00h às 18:00h no dia 01 de novembro de 2011. 4. Pode-se confirmar que a Autora suporta uma carga semanal de trabalho compatível com os dois cargos e que não há choque de horários em ambos os cargos públicos ocupados, principalmente em razão da escala. 5. A garantia de cumulação de dois cargos privativos de profissionais de saúde encontra previsão no art. 37, inciso XVI, alínea c, da Constituição Federal, com a nova redação dada pela Emenda Constitucional nº 34, de 13 de dezembro de 2001. Tal hipótese é assegurada desde que haja compatibilidade de horários e que seja respeitado o teto remuneratório previsto no art. 37, XI, consoante o inciso XVI deste mesmo dispositivo. 6. A Lei nº 8.112/90, em seu art. 118, § 2°, também condiciona a acumulação à compatibilidade de horários, o que é o caso, não havendo qualquer previsão de carga horária máxima. 7. O Parecer GQ-145 da AGU, de 30.08.98, não tem força normativa que possa preponderar sobre a garantia constitucional. 8. Precedentes: STJ: MS 15.415/DF, Relator Ministro Humberto Martins, Primeira Seção, DJe 04/05/2011; TRF2: AC nº 2011.51.01.014836-6/RJ - Relator Desembargador Federal Guilherme Couto Sexta Turma Especializada- E-DJF2R: 18/10/2012; APELREEX nº 201050010156265/ RJ - Relator Juiz Federal Convocado Ricardo Perlingeiro - Quinta Turma Especializada - E-DJF2R: 28/02/2012. 9. A compatibilidade ora reconhecida tem suporte nas declarações fornecidas pelos hospitais, as quais são relativas apenas às jornadas referentes aos meses ali declarados, cabendo à Administração, por este motivo, aferir se, nos meses/períodos subsequentes, não ocorrerá a modificação nas escalas e/ou horários estabelecidos de modo a tornar insubsistente a compatibilidade. 10. Apelação e remessa necessária desprovidas. Agravo não conhecido. Sentença mantida.


7. Tratamento Constitucional da percepção simultânea de proventos de aposentadoria e remuneração

O § 10º do art. 37 da Constituição Federal foi introduzido pela Emenda Constitucional nº 20/98.

“§ 10. É vedada a percepção simultânea de proventos de aposentadoria decorrentes do art. 40 ou dos arts. 42 e 142 com a remuneração de cargo, emprego ou função pública, ressalvados os cargos acumuláveis na forma desta Constituição, os cargos eletivos e os cargos em comissão declarados em lei de livre nomeação e exoneração. (EC 20/1998).” (negritamos)

Nos termos do § 6º do art. 40, ressalvadas as aposentadorias decorrentes dos cargos acumuláveis na forma da Constituição, é vedada a percepção de mais de uma aposentadoria à conta do regime de previdência previsto neste artigo.

Primeiramente, pelo texto constitucional concluímos: não se enquadram no óbice constitucional os proventos percebidos sob o Regime Geral de Previdência Social de que trata o art. 201 da Constituição Federal, quando derivados de relação de emprego de natureza privada. Vejamos que a própria Constituição faz referência aos arts. 40, 42 e 142 que tratam de regime próprio, civil e militar.

Assim, aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas. Ressalvadas as aposentadorias decorrentes dos cargos acumuláveis é vedada a percepção de mais de uma aposentadoria à conta do regime próprio de previdência.

Porém, antes da Emenda nº 20/98  era possível a acumulação. Direito adquirido garantido por casos apreciados pelo Supremo Tribunal Federal:

 “Magistério. Acumulação de proventos de uma aposentadoria com duas remunerações. Retorno ao serviço público por concurso público antes do advento da EC 20/1998. Possibilidade. É possível a acumulação de proventos oriundos de uma aposentadoria com duas remunerações quando o servidor foi aprovado em concurso público antes do advento da EC 20. O art. 11 da EC 20 convalidou o reingresso – até a data da sua publicação – do inativo no serviço público, por meio de concurso. A convalidação alcança os vencimentos em duplicidade se os cargos são acumuláveis na forma do disposto no art. 37, XVI, da CB, vedada, todavia, a percepção de mais de uma aposentadoria.” (RE 489.776-AgR, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 17-6-2008, Segunda Turma, DJE de 1º-8-2008.) No mesmo sentido: RE 547.900-AgR, Rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 13-12-2011, Primeira Turma, DJE de 15-2-2012; RE 599.909-AgR, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 7-12-2010, Segunda Turma, DJE de 1º-2-2011; AI 483.076-AgR-AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 16-11-2010, Segunda Turma, DJE de 1º-12-2010.

Resumindo, havendo acumulação legal, o servidor poderá perceber duas aposentadorias do regime próprio de previdência. Do mesmo modo, a acumulação legal permite o percebimento de remuneração e proventos de forma simultânea. Possível, ainda, a acumulação de proventos de uma aposentadoria com duas remunerações quando o servidor foi aprovado em concurso público antes do advento da EC 20/98 se os cargos são acumuláveis na forma do disposto no art. 37, XVI, da CB.

No caso dos militares, há a possibilidade de cumulação de cargos de militares da saúde que não exerçam atividade típica militar. A Emenda Constitucional nº 77/14,  deu ao inciso II o seguinte texto: “o militar em atividade que tomar posse em cargo ou emprego público civil permanente, ressalvada a hipótese prevista no art. 37, inciso XVI, alínea "c", será transferido para a reserva, nos termos da lei.”

Além disso, os servidores públicos militares que já percebem benefício previdenciário, e que retornaram ao serviço público antes da edição da Emenda Constitucional 20/98, como servidores públicos civis têm direito de cumular, e de mais um benefício previdenciário.

"O art. 93, § 9º, da CB de 1967, na redação da EC 1/1969, bem como a Constituição de 1988, antes da EC 20/1998, não obstavam o retorno do militar reformado ao serviço público e a posterior aposentadoria no cargo civil, acumulando os respectivos proventos. Precedente (MS 24.742, Rel. Min. Marco Aurélio, Informativo 360). Reformado o militar sob a Constituição de 1967 e aposentado como servidor civil na vigência da Constituição de 1988, antes da edição da EC 20/1998, não há falar-se em acumulação de proventos do art. 40 da CF/1988, vedada pelo art. 11 da EC 20/1998, mas a percepção de provento civil (art. 40 da CF/1988) cumulado com provento militar (art. 42 da CF/1988), situação não abarcada pela proibição da emenda." (MS 24.997, MS 25.015, MS 25.036, MS 25.037, MS 25.090 e MS 25.095, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 2-2-2005, Plenário, DJ de 1º-4-2005.) No mesmo sentido: AI 801.096-AgR,Rel. Min. Luiz Fux, julgamento em 6-12-2011, Primeira Turma, DJE de 19-12-2011; MS 25.149, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 9-6-2005, Plenário, DJE de 18-9-2009; MS 24.448, Rel. Min. Ayres Britto, julgamento em 27-9- 2007, Plenário, DJE de 14-11-2007; MS 25.045, Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgamento em 7-4-2005, Plenário, DJ de 14-10-2005; MS 24.958, Rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 2-2-2005, Plenário, DJ de 1º-4-2005.

Conforme a súmula nº 359 do Supremo Tribunal Federal: "Ressalvada a revisão prevista em lei, os proventos da inatividade regulam-se pela lei vigente ao tempo em que o militar, ou o servidor civil reuniu os requisitos necessários." .


8.       Regras do Estatuto dos Servidores Públicos Civis Federais

O art. 118 da Lei nº 8.112/90, prescreve que, ressalvados os casos previstos na Constituição, é vedada a acumulação remunerada de cargos públicos.

Ressaltamos que a lei em comento tem por objeto o Regime Jurídico do servidor público civil provido em cargo público estatutário. Porém, nos termos do parágrafo primeiro do artigo, a proibição de acumular estende-se aos cargos, empregos e funções em autarquias, fundações públicas, empresas públicas, sociedades de economia mista da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Territórios e dos Municípios. Questionável seria a sua constitucionalidade se não fosse a extensão advinda da própria Constituição Federal.

Conforme a lei, a acumulação de cargos, ainda que lícita, fica condicionada à comprovação da compatibilidade de horários.

Como a Constituição Federal faz referência à “acumulação remunerada de cargos, empregos e funções públicas”, a lei considerou, e com razão, acumulação proibida a percepção de vencimento de cargo ou emprego público efetivo com proventos da inatividade, salvo quando os cargos de que decorram essas remunerações forem acumuláveis na atividade.

“A acumulação de proventos e vencimentos somente é permitida quando se tratar de cargos, funções ou empregos acumuláveis na atividade, na forma permitida pela Constituição. Inaplicabilidade à espécie da EC 20/1998, porquanto não admitida a acumulação, na ativa, de três cargos de professora.” (AI 419.426?AgR, Rel. Min. Carlos Velloso, julgamento em 13-4-2004, Segunda Turma, DJ de 7-5-2004.) No mesmo sentido: AI 529.499?AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 19-10-2010, Primeira Turma, DJE de 17-11-2010.

Interessante é a regra do art. 120 do Estatuto que diz:

“ Art. 120.  O servidor vinculado ao regime desta Lei, que acumular licitamente dois cargos efetivos, quando investido em cargo de provimento em comissão, ficará afastado de ambos os cargos efetivos, salvo na hipótese em que houver compatibilidade de horário e local com o exercício de um deles, declarada pelas autoridades máximas dos órgãos ou entidades envolvidos.”

Para ilustrar, vejamos a situação de um médico que possua um vínculo de quarenta horas semanais e outro vinculo de vinte horas.  Fala-se no limite máximo de oito horas diárias e quarenta horas semanais.  Quando se fala em regime integral de dedicação ao serviço dos cargos comissionados entendo que há variantes: a) deverão efetivamente cumprir as oito horas diárias e quarenta horas semanais; b) ou caso exerçam jornada inferior poderão ser convocados sempre que houver interesse da Administração dentro das quarenta horas semanais, que é o limite legal. As variantes, apesar de questionáveis teriam sua base de fundamento no próprio art. 19 da Lei, já que estabelece o respeito à duração máxima do trabalho semanal de quarenta horas.

Apesar dos discrepantes posicionamentos, não vemos empecilho para o provimento em cargo comissionado de servidor que acumula dois cargos, desde que o cargo em comissão esteja compreendido no vínculo das quarenta horas semanais, como o caso de médico que tenha um vínculo de quarenta e outro de vinte.  Porém, se o servidor possuir dois vínculos, um de trinta horas e outro de vinte horas, acreditamos que também poderá exercer cargo comissionado no vínculo das trinta horas, já que a soma total semanal é de cinquenta horas, restando dez a serem cumpridas, que poderiam ser utilizadas  para o denominado regime integral de dedicação, que também não poderá ultrapassar quarenta horas semanais. Assim, ele cumpriria com o regime integral até quarenta horas no vínculo de trinta e mais vinte horas no outro vínculo, somando sessenta horas semanais.

A Controladoria Geral da União - Manual de Processo Administrativo Disciplinar  se pronuncia no seguinte sentido: “O tema de acumulação de cargos públicos apresenta algumas peculiaridades quando se traz à tona cargo em comissão (também chamado de cargo de confiança). Por sua própria definição, um cargo em comissão pode ser exercido por quem já possua cargo efetivo (cabendo ao servidor a opção quanto à composição de sua remuneração) e por aposentado, conforme leitura conjunta do art. 37, V e § 10 da CF. Infraconstitucionalmente, o art. 120, em conjunto com o art. 19, § 1º, ambos da Lei nº 8.112, de 11/12/90,estabelecem que, como regra, devido à necessária dedicação exclusiva à relação de confiança depositada (que autoriza a convocação do servidor sempre que houver interesse da administração), o cargo em comissão não pode ser acumulado quando o servidor licitamente já acumula dois cargos efetivos, devendo então o servidor se afastar desses dois cargos, a menos que haja comprovada compatibilidade de horário e local com um deles. Ainda na Lei nº 8.112, de 11/12/90, novamente em função da exigida dedicação à confiança depositada, extrai-se que os cargos em comissão não são acumuláveis entre si, com exceção da interinidade, conforme leitura conjunta do art. 119 com o parágrafo único do art. 9º daquele Estatuto.”

Posicionamento que corrobora com o nosso.


9.       Acumulação Ilegal e o Processo Administrativo Disciplinar

O art. 132 do Estatuto prescreve que a pena capital de demissão será aplicada quando houver acumulação ilegal de cargos, empregos e funções públicas (inc. XII).

Antes do início do processo administrativo disciplinar que apurará a falta, a autoridade competente, após detectar a acumulação ilegal (deve haver certeza da ilegalidade, portanto, procedimento) de cargos, empregos ou funções públicas, notificará o servidor, por intermédio de sua chefia imediata, para apresentar opção no prazo improrrogável de dez dias, contados da data da ciência e, na hipótese de omissão, adotará o procedimento sumário para a sua apuração e regularização imediata. 

Assim, conforme a Lei, a opção pelo servidor até o último dia de prazo para defesa configurará sua boa-fé, hipótese em que se converterá automaticamente em pedido de exoneração do outro cargo.

“Servidor público em situação de acumulação ilícita de cargos ou empregos pode se valer da oportunidade prevista no art. 133, § 5º, da Lei 8.112/1990 para apresentar proposta de solução, comprovando o desfazimento dos vínculos, de forma a se enquadrar nas hipóteses de cumulação lícita. Contudo, o art. 133, § 5º, da Lei 8.112/1990 não autoriza que o servidor prolongue indefinidamente a situação ilegal, esperando se valer do dispositivo legal para caracterizar, como sendo de boa- fé, a proposta de solução apresentada com atraso. No caso em exame, os empregadores do impetrante, quando consultados a respeito do desfazimento dos vínculos – fato que tinha sido informado pelo próprio impetrante ao INSS –, informaram que estes não haviam sido desfeitos, tendo um deles sido inclusive renovado. Recurso ordinário a que se nega provimento.” (RMS 26.929, Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgamento em 19-10-2010, Segunda Turma, DJE de 11-11-2010.).

Porém, caracterizada a acumulação ilegal e provada a má-fé por meio do devido processo legal, aplicar-se-á a pena de demissão, destituição ou cassação de aposentadoria ou disponibilidade em relação aos cargos, empregos ou funções públicas em regime de acumulação ilegal, hipótese em que os órgãos ou entidades de vinculação serão comunicados. 

 O prazo para a conclusão do processo administrativo disciplinar submetido ao rito sumário não excederá trinta dias, contados da data de publicação do ato que constituir a comissão, admitida a sua prorrogação por até quinze dias, quando as circunstâncias o exigirem.  

A abertura a todos os servidores para o acumulo de cargo com compatibilidade de horário realmente abalaria o Processo Administrativo Disciplinar com este objeto.

Conforme a Controladoria Geral da União – CGU - o rito sumário não foi previsto originariamente pela Lei nº 8.112, de 11/12/90, sendo acrescentado pela Lei nº 9.527, de 10/12/97. O procedimento é aplicável na apuração de acumulação ilegal de cargos, de abandono de cargo e de inassiduidade habitual, sendo a todas cabível a pena de demissão. A regra geral é de que se trata de rito com instrução célere, pois visa a apurar casos em que já se tem materialidade pré-constituída.


10.     Procedimento após a detecção do acúmulo ilegal.

Assim, ao ser detectada a acumulação ilegal de cargos, empregos ou funções públicas, o órgão deverá observar o que determina o artigo 143 c/c o art. 133, da Lei n° 8.112, de 11 de dezembro de 1990, podendo, inclusive, culminar com a instauração de processo administrativo disciplinar.


11.    Acumulação lícita e resguardo à integridade física e mental do servidor.

Conforme a Nota informativa nº  401/2011/CGNOR/ DENOP/SRH/MP, a acumulação licita de cargos não se justifica somente em relação a compatibilidade de horário, pois  “na acumulação de cargos, mesmo que respeitado o limite de 60 (sessenta) horas semanais da jornada de trabalho, imposta pelo Parecer AGU nº GQ – 145, não dispensa a administração pública a submeter-se a outras normas correlatas, isto é, a acumulação lícita de cargos, não se justifica só em relação a compatibilidade de horário, mas também, da observância ao intervalo de descanso entre as jornadas (onze horas), ao repouso semanal remunerado, a fim de preservar a integridade física e mental, com vistas a demonstrar que a acumulação de cargos não interfere na vida profissional e no desenvolvimento de atividades relacionadas a vida privada do servidor.


12.    Acumulação de proventos de aposentadoria e remuneração na ativa.

Nos mesmos termos das decisões dos Tribunais, a Nota Técnica nº 110/2011 do Ministério do Planejamento  estabelece que a acumulação de proventos e vencimentos somente é permitida quando se tratar de cargos, funções ou empregos acumuláveis na atividade.

É vedada a percepção simultânea de proventos de aposentadoria com a remuneração de cargo, emprego ou função pública, ressalvados os cargos legalmente acumuláveis, os eletivos e os cargos em comissão declarados em Lei como de livre nomeação e exoneração;

A proibição acima descrita não se aplica aos servidores inativos que, até 16 de dezembro de 1998, tenham ingressado novamente no Serviço Público, por concurso público de provas ou de provas e títulos, e pelas demais formas previstas na Constituição Federal, sendo-lhes proibida a percepção de mais de uma aposentadoria pelo regime de previdência dos servidores públicos, aplicando-se, em qualquer hipótese, o teto remuneratório estipulado constitucionalmente.

Nos casos de acumulação ilegal, comprovada a boa-fé por meio de Processo Administrativo Disciplinar, o servidor poderá optar por um dos cargos, empregos ou funções.

Os casos de acumulação ilegal de cargos serão objeto de apuração, nos termos do art. 143, da Lei nº 8.112/90.


13.    Licença de servidor para provimento em outro cargo público

De acordo com a Súmula nº 246 do Tribunal de Contas da União, o fato de o servidor licenciar-se, sem vencimentos, do cargo público ou emprego que exerça em órgão ou entidade da administração direta ou indireta não o habilita a tomar posse em outro cargo ou emprego público, sem incidir no exercício cumulativo vedado pelo artigo 37 da Constituição Federal, pois que o instituto da acumulação de cargos se dirige à titularidade de cargos, empregos e funções públicas, e não apenas à percepção de vantagens pecuniárias.

Magistério. Acumulação de proventos de uma aposentadoria com duas remunerações. Retorno ao serviço público por concurso público antes do advento da EC 20/1998. Possibilidade.

Conforme o Supremo Tribunal Federal,  é possível a acumulação de proventos oriundos de uma aposentadoria com duas remunerações quando o servidor foi aprovado em concurso público antes do advento da EC 20/98.

O art. 11 da EC 20 convalidou o reingresso – até a data da sua publicação – do inativo no serviço público, por meio de concurso.

Dessa forma, “a convalidação alcança os vencimentos em duplicidade se os cargos são acumuláveis na forma do disposto no art. 37, XVI, da CB, vedada, todavia, a percepção de mais de uma aposentadoria.” (RE 489.776?AgR, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 17-6-2008, Segunda Turma, DJE de 1º-8-2008.) No mesmo sentido: RE 599.909?AgR, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 7-12-2010, Segunda Turma, DJE de 1º-2-2011; AI 483.076?AgR?AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 16-11-2010, Segunda Turma, DJE de 1º-12-2010.

Dessa maneira, é matéria que compreende o instituto do Direito Adquirido e da norma constitucional no tempo. Conforme a jurisprudência, a Emenda Constitucional n. 20/98 expressamente proibiu a acumulação de proventos e vencimentos, ressalvando, contudo, em seu art. 11, o direito dos servidores que percebessem aposentadoria e tivessem ingressado novamente no serviço público, até a data de sua edição.  Concluem que, sendo possível a percepção de uma aposentadoria cumulada com vencimentos de um cargo efetivo cujo ingresso tenha sido antes da EC n. 20/98, deve ser permitida, por simetria, a percepção de duas aposentadorias, desde que o novo ingresso no serviço público e a nova aposentadoria tenham ocorrido também antes da EC n. 20/98.

Por fim, a vedação de nova aposentadoria no mesmo regime deve ser considerada para aquelas obtidas em data posterior à EC n. 20/98, não devendo a norma transitória retroagir para proibir a cumulação de aposentadorias, já deferidas no regime anterior, decorrentes de dois cargos públicos exercidos cumulativamente. Esse é o posicionamento correto. 


14.A acumulação de proventos e vencimentos somente é permitida quando se tratar de cargos, funções ou empregos acumuláveis na atividade.

O Supremo Tribunal Federal é assente no posicionamento de que: “A acumulação de proventos e vencimentos somente é permitida quando se tratar de cargos, funções ou empregos acumuláveis na atividade, na forma permitida pela Constituição. Inaplicabilidade à espécie da EC 20/1998, porquanto não admitida a acumulação, na ativa, de três cargos de professora.” (AI 419.426?AgR, Rel. Min. Carlos Velloso, julgamento em 13-4-2004, Segunda Turma, DJ de 7-5-2004.) No mesmo sentido: AI 529.499?AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 19-10-2010, Primeira Turma, DJE de 17-11-2010.

 “A acumulação de proventos e vencimentos somente é permitida quando se tratar de cargos, funções ou empregos acumuláveis na atividade, na forma permitida pela Constituição. CF, art. 37, XVI, XVII; art. 95, parágrafo único, I. Na vigência da Constituição de 1946, art. 185, que continha norma igual à que está inscrita no art. 37, XVI, CF/1988, a jurisprudência do STF era no sentido da impossibilidade da acumulação de proventos com vencimentos, salvo se os cargos de que decorrem essas remunerações fossem acumuláveis. Precedentes do STF: RE 81.729/SP, RE 68.480-embargos, MS 19.902, RE 77.237/SP, RE 76.241/RJ.” (RE 163.204, Rel. Min. Carlos Velloso, julgamento em 9-11-2004, Plenário, DJ de 31-3-1995.)


15.Cargo de professor com emprego privado de professor.

 “É possível a acumulação de um cargo de professor com um emprego (celetista) de professor. Interpretação harmônica dos incisos XVI e XVII do art. 37 da CF.” (RE 169.807, Rel. Min. Carlos Velloso, julgamento em 24-6-1996, Segunda Turma, DJ de 8-11-1996.)b) a de um cargo de professor com outro técnico ou científico; (EC 19/1998) • “Acumulação de emprego de atendente de telecomunicações de sociedade de economia mista, com cargo público de magistério. Quando viável, em recurso extraordinário, o reexame das atribuições daquele emprego (atividade de telefonista), correto, ainda assim, o acórdão recorrido, no sentido de se revestirem elas de ‘características simples e repetitivas’, de modo a afastar- se a incidência do permissivo do art. 37, XVI, b, da Constituição.” (AI 192.918?AgR, Rel. Min. Octavio Gallotti, julgamento em 3-6-1997, Primeira Turma, DJ de 12-9-1997.)c) a de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas; (Redação da EC 19/1998)


16.Militar. Acumulação de cargo. Emenda Constitucional nº 77, de 11 de fevereiro de 2014.

Como sabido, as Forças Armadas é constituída pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica. Instituições organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.              

Para não deixar dúvidas sobre a possibilidade de cumulação de cargos de militares da saúde que não exerçam atividade típica militar, a Emenda Constitucional nº 77/14 deu ao inciso II o seguinte texto: “o militar em atividade que tomar posse em cargo ou emprego público civil permanente, ressalvada a hipótese prevista no art. 37, inciso XVI, alínea "c", será transferido para a reserva, nos termos da lei.”

Já o militar da ativa que, de acordo com a lei, tomar posse em cargo, emprego ou função pública civil temporária, não eletiva, ainda que da administração indireta, ressalvada a hipótese prevista no art. 37, inciso XVI, alínea "c", ficará agregado ao respectivo quadro e somente poderá, enquanto permanecer nessa situação, ser promovido por antiguidade, contando-se-lhe o tempo de serviço apenas para aquela promoção e transferência para a reserva, sendo depois de dois anos de afastamento, contínuos ou não, transferido para a reserva, nos termos da lei;  (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 77, de 2014)

Aplica-se aos militares o disposto no art. 7º, incisos VIII, XII, XVII, XVIII, XIX e XXV, e no art. 37, incisos XI, XIII, XIV e XV, bem como, na forma da lei e com prevalência da atividade militar, no art. 37, inciso XVI, alínea "c";   (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 77, de 2014)


17.Cumulação Tríplice de Proventos. Professora. 

Consoante a jurisprudência dos Tribunais é vedada a acumulação tríplice de proventos, ante a impossibilidade do acúmulo de três cargos públicos na atividade de professora ou de qualquer outra, cuja a Constituição permita a cumulatividade.

Vejamos que não poderá haver acumulação tríplice de proventos compreendidos numa mesma fonte de custeio (ex.  Regime Próprio).              


18.Acúmulo de Militar com cargos permissivos, permanente e temporário. 

É inviável constitucionalmente o acúmulo na ativa da atribuição de cargo militar típico e professor.  O militar em atividade que tomar posse em cargo ou emprego público civil permanente, ressalvada a hipótese prevista no art. 37, inciso XVI, alínea "c", será transferido para a reserva.

Como referido se o militar é provido em cargo que se enquadre como profissional de saúde, poderá acumular. Mas, nas demais ocasiões do inciso XVI do art. 37 da Constituição não há permissivo.

Assim, poderá haver cumulação em cargos de profissionais de saúde, militar e civil. Neste caso o militar não irá para a reserva.

Nas demais hipóteses de cumulação, o militar será transferido à reserva.

Diferentemente será para a ocupação de cargo permissivo e temporário. Neste caso,  o militar da ativa que, de acordo com a lei, tomar posse em cargo, emprego ou função pública civil temporária, não eletiva, ainda que da administração indireta, ressalvada a hipótese prevista no art. 37, inciso XVI, alínea "c", ficará agregado ao respectivo quadro e somente poderá, enquanto permanecer nessa situação, ser promovido por antiguidade, contando-se-lhe o tempo de serviço apenas para aquela promoção e transferência para a reserva, sendo depois de dois anos de afastamento, contínuos ou não, transferido para a reserva, nos termos da lei.

Neste caso, a Constituição fez distinção entre cargo permanente e temporário para o militar. Situação não aventa em relação aos servidores civis.                                                                                                                            

A Constituição de 1988, em seu art. 37, XVI, prevê a possibilidade de acumulação de cargo, mas não estabelece distinção quanto à forma de provimento se em caráter efetivo ou temporário, motivo pelo qual é razoável entender estar nele (art. 37, XVI, CF) incluída a possibilidade de contratação para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público prevista na Lei nº 8.745/93.   


19.Delegado de Polícia e professor

Hodiernamente, o Cargo de Delegado de Polícia é um cargo científico que exige a formação jurídica do candidato.

Ainda que falemos em regime integral de dedicação, é vedada jornada superior a oito horas diárias e quarenta horas semanais num mesmo cargo.                  

 A jurisprudência às vezes se utilizada dos termos “técnicos” e “científicos” como sinônimos.

Os Tribunais tem decidido que, nos termos do inciso XVI do art. 37 da Constituição Federal é possível a acumulação remunerada do cargo de professor com outro cargo técnico ou científico.                  

Considerando o cargo de Delegado como “técnico ou científico” é viável a cumulação com outro cargo de professor, desde que haja compatibilidade de horário. Assim, afigura-se legítima a acumulação de cargo de Delegado de polícia e Professor.

20.Acumulação de cargo técnico e outro de professor. Possibilidade

Como assente, é vedada a acumulação remunerada de cargos públicos, ressalvas as situações elencadas pela própria Constituição Federal, em seu art. 37, XVI. Dentre as exceções encontramos o a viabilidade de cumulação entre os cargos de professor com outro cargo técnico ou científico.

Consequentemente, os  proventos de aposentadoria poderão ser acumulados com a remuneração de cargo, emprego ou função pública, apenas quando estes forem acumuláveis na forma estabelecida pela Constituição (art. 37, § 10, da CF).


21.Analista de Controle Externo e Professor

Nos termos do art. 37, inciso XVI, alínea "b", da Constituição Federal, é possível a acumulação remunerada do cargo de professor com outro técnico, desde que haja compatibilidade de horários.

 No caso, consideramos que os cargos de analista ou especialista de nível superior dos órgãos e entidades públicas são considerados como cargos técnicos ou científicos.

Havendo compatibilidade de horário com o cargo de professor é viável constitucionalmente o acúmulo remunerado. 


22.Acumulação de cargos de profissionais de saúde quando excede as sessenta horas semanais

Já defendemos de a determinação objetiva das 60 (sessenta)  horas  semanais para se conclui pela impossibilidade do acúmulo é falho, tendo em vista que a eficiência na prestação dos serviços não se vincula diretamente à quantidade de hora, mas no efetivo cansaço físico e mental do serviço.

Referimos-nos, ainda, que as profissões de médico e professor são as mais exaustivas que há.

O critério que a Administração deve tomar por parâmetro para a cumulação é a análise concreta do caso.

Como tem decido os Tribunais Federais, falta respaldo jurídico do Parecer da AGU que impõe a proibição de jornada de trabalho superior a sessenta horas semanais sem a verificação da situação concreta.

Assim, nos casos dos profissionais de saúde, havendo compatibilidade de horários, é possível a cumulação de dois cargos privativos de profissionais de saúde.

O respaldo jurídico pela análise concreta da situação insere-se nos seguintes dispositivos: art. 37, XVI, da CF; arts. 19 e 118, da Lei n. 8.112/90.


23           Cargo de Professor. Dedicação Exclusiva. Acumulo. Proibição. Crítica.

A jurisprudência tem assentado que  o professor submetido ao regime de dedicação exclusiva é impedido de exercer outra atividade remunerada.

O que seria o regime de dedicação exclusiva?

Poderíamos ter três  ideias sobre o tema:  a) a de que significaria que o servidor não poderia ter qualquer outro cargo, emprego ou função pública; b) a de que o servidor deve ficar a disposição da Administração, ainda que ultrapasse a carga horária de quarenta horas semanais; c) a de que o servidor deve ficar a disposição até o limite quarenta horas semanais (posição que adotamos).

A primeira ideia configuraria prisão funcional do servidor e lesão à garantia do exercício da profissão, ou mesmo da viabilidade constitucional de acúmulo.  Dessa forma, nos casos permitidos constitucionalmente, como do cargo de professor, se concluir que a dedicação exclusiva proibiria o direito ao acúmulo garantido constitucionalmente é o mesmo que dizer que há incoerência no sistema. Como se pode permitir e não permitir ao mesmo tempo?

Se a ideia for a de que o servidor ficará a disposição da Administração, ainda que ultrapassasse a carga horária de quarenta horas semanais, diríamos que há algo errado, pois proíbe-se, em um  mesmo cargo, jornada superior a quarenta horas. Se ultrapassar, a dedicação exclusiva deverá compreender as horas extras a que fizerem jus os servidores. Diante tal fato, não poderíamos aceitar a jornada superior, num mesmo cargo, a quarenta horas semanais.

Adotamos o terceiro posicionamento pela limitação máxima estipulada de quarenta horas semanais para o exercício de cargo público. Para nós, a denominada dedicação exclusiva limita-se às quarenta horas semanais.

A dedicação exclusiva, para nós, diferencia-se do contrato exclusivo, que se refere à impossibilidade de o professor, por exemplo, não poder contratar com outra instituição de ensino.              

Se esse for o posicionamento adotado, infelizmente e efetivamente o professor ficaria limitado ao vínculo e, logo, não poderia exercer outro cargo ou emprego de professor.

Vejamos:

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR. REGIME DE TRABALHO. DEDICAÇÃO EXCLUSIVA. EXERCÍCIO DE OUTRA ATIVIDADE REMUNERADA. IMPOSSIBILIDADE. BOA-FÉ AFASTADA. REPOSIÇÃO AO ERÁRIO. ART. 46 DA LEI N.º 8.112/90. APELAÇÃO PROVIDA. SEGURANÇA DENEGADA. 1. Nos termos do Decreto n° 94.664, de 23 de julho de 1987, que aprovou o Plano Único de Classificação e Retribuição de Cargos e Empregos, de que trata a Lei nº 7.596, de 10 de abril de 1987, o professor de carreira do Magistério de 1º e 2º Graus, submetido ao regime de dedicação exclusiva, é impedido de exercer outra atividade remunerada, seja ela pública ou privada.  2. Caso contrário, haverá desrespeito à norma contratual de dedicação exclusiva a que se submeteu espontaneamente. Não se trata de proibição de acumulação de cargos, prevista no art. 37, XVI, da Constituição Federal, mas de impedimento funcional legalmente previsto. 3. Reconhecida como ilegal a acumulação de cargo de magistério, sob o regime de dedicação exclusiva, com outro vínculo empregatício, é devida a reposição ao erário dos valores percebidos indevidamente, é o que determina o art. 46 da Lei nº 8.112/90. Precedentes. 4. Apelação da União e remessa oficial providas para denegar a segurança.

O art. 14, I, do Decreto nº 94.664/87, estabelece, que o professor de carreira do Magistério será submetido a um dos seguintes regimes de trabalho: I – dedicação exclusiva, com obrigação de prestar 40 (quarenta) horas semanais de trabalho em 2 (dois) turnos diários, completos e impedimento do exercício de outra atividade remunerada, pública ou privada.

 Somos totalmente contrários a essa decisão tendo em vista que são atos infraconstitucionais e infralegais que estão fazendo ressalvas e exceções não determinadas constitucionalmente. Se adotarmos tal posicionamento, abriremos ao legislador ou ao executivo a feitura de atos normativos que elenquem outras exceções constitucionais de proibição e permissão de acúmulo. Sem contar na burla à questão da jornada máxima permitida de quarenta horas por cargo. Não entendemos como ato infralegal inferior e anterior á Constituição pode prevalecer sobre o permissivo estabelecido no inciso XVI do art. 37 da Lei Fundamental.


24.Cumulação. Professor e Procurador de Estado. Possibilidade

  Interessante decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região que possibilitou o acúmulo dos cargos de Procurador do Estado e de Professor Universitário, ambos com a jornada de quarenta horas semanais. Vejamos:

“CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. ACUMULAÇÃO DE CARGOS. PÚBLICOS. PROFESSOR UNIVERSITÁRIO E PROCURADOR DO ESTADO. POSSIBILIDADE CONDICIONADA À COMPATIBILIDADE DE HORÁRIOS. ART. 37, XVI DA CF C/C ART. 118, §2°, DA LEI 8.112/90. SENTENÇA MANTIDA. I. Posse no cargo de Professor Assistente da Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia, submetido à jornada de 40 horas semanais acumulando-o com o cargo de Procurador do Estado, de natureza técnico-científica, com a mesma jornada de trabalho. II. Não havendo norma legal regulamentando a carga horária passível de acumulação, não pode a garantia constitucional ser afastada por mera interpretação da Administração, em parecer interno. III. A acumulação de cargos públicos é condicionada à compatibilidade de horários, nos termos do art. 37, XVI da CF e do art. 118, § 2°, da Lei 8.112/90, aplicável no âmbito federal. IV. Fixado o fundamento do ato administrativo exclusivamente sobre o total da carga horária semanal, não cabe discutir ou exigir comprovação de compatibilidade de horários, aspecto não ventilado no ato administrativo impugnado. V. Comprovado, outrossim, nos autos a compatibilidade de horários.  VI. Apelação e remessa oficial desprovidas. Sentença mantida.”


 25.Acumulação ilegal e reposição ao erário 

Opinativamente a reposição ao erário por acumulação ilegal somente será devida se for comprovada má-fé do servidor em devido processo legal.

O Estado não pode enriquecer em detrimento do labor do agente público que teve dispêndio de tempo e esforço físico e mental.

Assim, comprovada a boa fé e a compatibilidade de horário, não há que se falar em reposição ao erário.

Contudo, advindo a ilegalidade do acúmulo, também, do cunho subjetivo do agente, que tenha agido de má-fé, deverá haver reposição na forma estabelecida no art. 46 da Lei 8.112/90.  Para isso, ressaltamos, a Administração deve comprovar a má-fé do servidor, pois esta não se presume.

O Parecer nº 145/98 da Advocacia da União corrobora nosso entendimento. No item 23 do Parecer, salientou que: “Com o objetivo maior de estabelecer rito processual permissivo da apuração deveras ágil dos casos de acumulação de cargos, o art. 1° da Lei n. 9.527, de 1997, inovou a ordem disciplinar e, no tópico relativo à acumulação (art. 133 da Lei n. 8.112), quanto ao detentor da titularidade inconstitucional de cargos, empregos e funções, dentre outros ângulos: a) facultou a escolha por um dos cargos, a fim de proporcionar a regularização da situação funcional com a agilidade desejada e independentemente da instauração de processo disciplinar; e b) silenciou no respeitante à devolução da importância percebida durante a comprovada acumulação de má fé, assim tornando-a inexigível, em face da conseqüência imediata do princípio da legalidade, que restringe a atuação do administrador público de modo a somente fazer o que a lei permite. Houve evolução legislativa no regramento do instituto, elidindo a reposição dos estipêndios pagos, às vezes por longos anos, em virtude da prestação de serviços, com o que o Estado fica impedido de locupletar-se com o trabalho de seus agentes administrativos.


26.Acúmulo de Cargos em locais distantes

A Administração deverá verificar efetivamente a assiduidade e a eficiência do servidor que cumular cargos legalmente, mas que os exerce em órgão ou entidades  localizados em lugares distantes.

Em determinados entes federativos a cumulação só é permitida se os locais forem bastantes próximos, como os Municípios limítrofes.

Para nós o empecilho deve ser visto no caso concreto, verificando o prejuízo efetivamente ocasionado pela distância entre os órgãos, entidades ou entes federativos.

Ressaltamos que apesar da Lei Fundamental nada se referir à distância, poderíamos incluir esse requisito como viés da própria compatibilidade de horário.


27.    Acúmulo de cargos e Lei de Improbidade

Como salientamos, em regra, a cumulação de cargos, empregos e funções é vedada.  Tem-se, configurado o Princípio da Proibição da Acumulação, como regra.

Tratando-se de um princípio de natureza administrativa e arraigado constitucionalmente, poderíamos pensar que a conduta do acúmulo ilegal seria ato de improbidade administrativa, pois  atentaria contra os princípios da Administração Pública e, consequentemente, seria enquadrada como ato tipificado no artigo 11, caput, da Lei 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa).

Entendemos que, para se concluir pela acumulação ilegal para fins de improbidade administrativa, bem como de demissão em processo administrativo disciplinar, indispensável a comprovação da má-fé do servidor público, comprovada em devido processo legal.

O Superior Tribunal de Justiça tem verificado a efetiva prestação do serviço e a boa fé do servidor para decidir. Significa que se o servidor prestou o serviço de boa fé não há de se falar em improbidade administrativa. Dessa forma, conforme o STJ: “ Na hipótese de acumulação de cargos, se consignada a efetiva prestação de serviço público, o valor irrisório da contraprestação paga ao profissional e a boa-fé do contratado, há de se afastar a violação do art. 11 da Lei n. 8.429/1992. Isso se dá sobretudo quando as premissas fáticas do acórdão recorrido evidenciam a ocorrência de simples irregularidade e inexistência de desvio ético ou inabilitação moral para o exercício do múnus público. (Precedente: REsp 996.791/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 8.6.2010, DJe 27.4.2011.)”

Agindo de boa fé e havendo compatibilidade horário, não se pode punir o servidor com a demissão e nem por improbidade administrativa.

A solução é encontrada no art. 133 da Lei nº 8.112/90, que estabelece a notificação previa do servidor para optar entre os cargos ou mesmo pela redução da jornada com redução proporcional (em se tratando de casos cuja cumulação seja viável constitucionalmente)

O  §5º, do art. 133 da Lei 8.112/90  determina que “a opção pelo servidor até o último dia de prazo para defesa configurará sua boa-fé, hipótese em que se converterá automaticamente em pedido de exoneração do outro cargo.

Dessa maneira podemos concluir o seguinte: não se configurará ato de improbidade administrativa a cumulação ilegal de boa-fé e efetivamente laborada. Conquanto a acumulação seja ilegal ferindo o  princípio da legalidade e o da  proibição da cumulação, improbidade não há tendo em vista não haver  prejuízo ao erário nem enriquecimento ilícito. O servidor percebeu valores, mas laborou para isso. 


Conclusão.

Entendo, particularmente, que a proibição da cumulatividade deve ser relacionada às fontes de custeio.

Havendo compatibilidade de horário e permissivo constitucional o servidor contribuirá para a mesma fonte e poderá perceber dois benefícios previdenciários.

Não pode ultrapassar  dois proventos, duas remunerações, ou um provento e uma remuneração, vinculados a uma mesma fonte.

Desde que haja compatibilidade de horário, não vemos óbices para a aquisição de três proventos, duas de uma mesma fonte de custeio (regime próprio, por exemplo, quando permitido) e uma de outra fonte (RGPS).

Seria o exemplo de uma enfermeira que tivesse dois vínculos de vinte horas com o Estado e um vínculo privado em hospital particular de vinte horas como empregada, contratada pelo Regime Geral de Previdência Social.

Além disso, ressaltamos que a jornada máxima de sessenta horas semanais determinada em Parecer da Advocacia Geral da União não pode ter status de lei, devendo o administrador se valer de juízo valorativo de análise da eficiência nos serviços e não na carga horária. Não se pode presumir deficiência no exercício de um ou  outro cargo com a mera análise objetiva de quantidade de hora.

                Vejamos decisão neste sentido do Tribunal Regional Federal da 1ª  Região:              

“HEMOTERAPIA. COMPATIBILIDADE DE HORÁRIO. GARANTIA CONSTITUCIONAL. [...] 3. O impetrante é servidor público da Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal, no cargo de Técnico em Hemoterapia, cumprindo a carga horária de 24 (vinte e quatro) horas semanais. O impetrante prestou concurso público do Hospital das Forças Armadas e foi aprovado para o cargo de Técnico em Hemoterapia, com jornada de trabalho de 40 (quarenta) horas semanais, nos termos do Edital n. 1/2004 - HFA, datado de 16.09.2004. No entanto, afirma a União em seu recurso de apelação, que o Parecer GQ 145 da Advocacia Geral da União, de 30 de março de 1998, e a orientação contida no Oficio-Circular nº 10, de 26 de fevereiro de 2002, do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão limitam a carga horária de trabalho no âmbito federal no total de 60 (sessenta) horas semanais.  4. Falta respaldo jurídico ao entendimento que considera ilícita a acumulação de cargos apenas por totalizarem uma jornada de trabalho superior a sessenta horas semanais. Ora, tanto a Constituição Federal, em seu art. 37, XVI, como a Lei 8.112/90, em seu art. 118, § 2°, condicionam a acumulação à compatibilidade de horários, não fazendo qualquer referência à carga horária. Nestes termos, desde que comprovada a compatibilidade de horários, como de fato ocorreu no caso em analise, não há que se falar em limitação da jornada de trabalho, sendo que entendimento contrário implicaria, sem respaldo legal, criar outro requisito para cumulação de cargos. O Parecer GQ-145 da AGU, de 30.08.98, não tem força normativa que possa preponderar sobre a garantia constitucional. Precedentes dos Tribunais Regionais Federais. 5. Apelação e remessa oficial desprovidas.  (TRF 1ª Região, AC 2005.34.00.004019-5/DF, Des. Fed. Antônio Sávio de Oliveira Chaves, Primeira Turma, e-DJF1 25.11.2008).

Dessa forma o Parecer nº GQ – 145/1998 da AGU que limitou a carga máxima semanal de labor em sessenta horas, não pode ser levado a efeito como lei, que possui a característica da abstração e generalidade, mas como parâmetro interpretativo.  Ato administrativo dessa natureza não tem o condão de obrigar toda a Administração Pública. A limitação ou determinação máxima da jornada de trabalho semanal é regra que deve ser ventilada por lei de iniciativa do Poder competente e formalizada pelo devido processo legislativo. Afinal, é a observância do Princípio da Legalidade.


Autor

  • David Augusto Souza Lopes Frota

    DAVID AUGUSTO SOUZA LOPES FROTA Advogado. Servidor Público Federal. Pós-graduado em Direito Tributário. Pós-graduado em Direito Processual. Especialista em Direito Administrativo. Especialista em Licitações Públicas. Especialista em Servidores Públicos. Foi analista da Diretoria de Reconhecimento Inicial de Direitos – INSS – Direito Previdenciário. Foi analista da Corregedoria Geral do INSS – assessoria jurídica e elaboração de pareceres em Processos Administrativos Disciplinares - PAD. Foi Analista da Diretoria de Recursos Humanos do INSS - Assessor Jurídico da Coordenação de Recursos Humanos do Ministério da Previdência Social – Lei nº 8.112/90. Chefe do Setor de Fraudes Previdenciárias – Inteligência previdenciária em parceria com o Departamento de Polícia Federal. Ex-membro do ENCCLA - Estratégia Nacional de Combate a Corrupção e à Lavagem de Dinheiro do Ministério da Justiça. Convidado para ser Conselheiro do Conselho de Recursos da Previdência Social - CRPS. Convidados para atuação junto ao Grupo Responsável pela Consolidação dos Decretos Federais da Presidência da República. Assessor da Coordenação Geral de Recursos Logísticos e Serviços Gerais do MPS - COGRL. Elaboração de Minutas de Contratos Administrativos. Elaboração de Termos de Referência. Pregoeiro. Equipe de Apoio. Análise das demandas de controle interno e externo do MPS. Análise das demandas de Controle Interno e Externo do Ministério da Fazenda - SPOA. Assessor da Coordenação Geral do Logística do Ministério da Fazenda - CGLOG – SPOA. Assessor da Superintendência do Ministério da Fazenda no Distrito Federal - SMF-DF. Membro Titular de Conselho na Secretaria de Direitos Humanos para julgamento de Processos. SEDH. Curso de Inteligência na Agência Brasileira de Inteligência - ABIN. Consultoria e Advocacia para prefeitos e demais agentes políticos. Colaborador das Revistas Zênite, Governet, Síntese Jurídica, Plenus. Coautor de 3 livros intitulados "O DEVIDO PROCESSO LICITATÓRIO" tecido em 3 volumes pela editora Lumen Juris.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FROTA, David Augusto Souza Lopes. Acumulação de cargos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3979, 24 maio 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/28032. Acesso em: 4 maio 2024.