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Notas sobre o art. 557 do CPC.

Competência do relator de prover e de negar seguimento a recurso

Notas sobre o art. 557 do CPC. Competência do relator de prover e de negar seguimento a recurso

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SUMÁRIO: 1. Disposições legais e regimentais. 2. Constitucionalidade da norma. 3. Modalidade de antecipação da tutela processual. 4. Natureza jurídica do agravo instituído pelo art. 557, § 1º. 5. O poder relatorial no reexame necessário. 6. Provimento do recurso pelo relator. 7. Negativa de seguimento do recurso. 7.1. Recurso inadmissível. 7.2. Recurso prejudicado. 7.3. Recurso improcedente. 7.4. Recurso em confronto com súmula ou jurisprudência dominante. 8. Multa pelo agravo manifestamente inadmissível ou infundado. 9. Conclusão.


1. DISPOSIÇÕES LEGAIS E REGIMENTAIS

Dispõe o art. 557 do Código de Processo Civil, mercê da redação que lhe foi dada inicialmente pela Lei nº 9.139, de 30 de novembro de 1995, e depois pela Lei nº 9.756, de 17 de dezembro de 1998, no bojo de reforma objetivando a simplificação e dinamização das leis processuais:1

"Art. 557. O relator negará seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior.

§ 1o-A2 Se a decisão recorrida estiver em manifesto confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal ou de Tribunal Superior, o relator poderá dar provimento ao recurso.

§ 1º Da decisão caberá agravo, no prazo de cinco dias, ao órgão competente para o julgamento do recurso, e, se não houver retratação, o relator apresentará o processo em mesa, proferindo voto; provido o agravo, o recurso terá seguimento.

§ 2o Quando manifestamente inadmissível ou infundado o agravo, o tribunal condenará o agravante a pagar ao agravado multa entre um e dez por cento do valor corrigido da causa, ficando a interposição de qualquer outro recurso condicionada ao depósito do respectivo valor".

Está no Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, no art. 21, § 1º:

"Poderá o relator arquivar ou negar seguimento a pedido ou recurso manifestamente intempestivo, incabível ou improcedente e, ainda, quando contrariar a jurisprudência predominante do Tribunal, ou for evidente a sua incompetência".3

Girando sobre o mesmo tema, com fundamento no art. 96, I, "a", da Constituição, embora as disposições legais automaticamente se integrem nos regimentos internos dos tribunais, poderá, ainda, o regimento interno de Tribunal ampliar o poder relatorial para alcançar também as ações originárias dos tribunais e os incidentes processuais autônomos, como, por exemplo, impugnações ao valor da causa e concessão de gratuidade dos serviços judiciários, incidentes de falsidade etc.

Emblemático de tal situação, embora com a redação inspirada pela então vigente Lei nº 9.139/95, dispõe o Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro:

"Art. 31. Compete ao relator, além do estabelecido na legislação processual e de organização judiciária:

I - ordenar e dirigir o processo, determinando as providências relativas ao seu andamento e instrução;

II - submeter ao Órgão Julgador ou ao seu Presidente, conforme a competência, quaisquer questões de ordem relacionadas com o andamento do processo, apresentando-o em mesa para esse fim, no primeiro caso;

III - decidir os incidentes que não dependerem de pronunciamento do Órgão Julgador, bem como fazer executar as diligências necessárias ao julgamento;

IV - requisitar, se necessário, os autos originais dos processos que subirem ao Tribunal em traslado ou certidão, ou ainda outros cujo exame lhe pareça indispensável, determinando, se for o caso, a extração de cópias das peças relevantes e a restituição dos autos ao Órgão de origem, dentro dos 05 (cinco) dias subseqüentes;

V - estudar os autos e elaborar o relatório, no prazo legal;

VI - lavrar o acórdão com a respectiva ementa, salvo o disposto no art. 89;

VII - expedir alvará de soltura nos casos determinados em lei e sempre que, por qualquer motivo, cessar a causa determinante da prisão;

VIII - decidir sobre pedidos ou recursos que hajam perdido o objeto, ou negar seguimento aos manifestamente intempestivos, incabíveis, improcedentes, prejudicados ou contrários a súmulas do Tribunal ou dos Tribunais Superiores e apreciar as desistências de pedidos ou recursos, cabendo de tais decisões agravo inominado para o Órgão Colegiado competente (art. 557, parágrafo único, do Código de Processo Civil).

Parágrafo único. Poderá o relator proceder pessoalmente à instrução, presidir as diligências que ele ou o Órgão Julgador determinar, bem como delegar competência a Juiz de primeiro grau para colher ou dirigir provas, cabendo-lhe nomear o perito desde logo, se lhe parecer necessário, ou submeter a indicação à aprovação do Órgão Julgador". 

Na mesma dimensão, dispõe o Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, embora também sem levar em conta a nova redação dada ao art. 557 do Digesto Processual:4

"Art. 34. São atribuições do relator:

. . .

VII – decidir agravo de instrumento interposto de decisão que inadmitir recurso especial;

. . .

IX – homologar as desistências,5 ainda que o feito se ache em pauta ou mesa para julgamento;

. . .

XI – julgar prejudicado pedido ou recurso que haja perdido o objeto;

. . .

XVIII – negar seguimento a pedido ou recurso manifestamente intempestivo, incabível, improcedente, contrário a súmula do Tribunal, ou quando for evidente a incompetência deste".6

Desde logo se vê que o poder relatorial concedido pelas normas que se extraem dos mencionados dispositivos legais e regimentais implica afastar do colegiado a cognição do recurso ou do pedido, deferindo ao relator – tradicionalmente considerado no nosso Direito como delegado do colegiado – os poderes de decisão ou de antecipação da decisão que caberia à turma julgadora.


2. CONSTITUCIONALIDADE DA NORMA

É constitucional tal poder relatorial, como decidiu o Supremo Tribunal Federal, mesmo porque não se consegue extrair do texto constitucional o princípio da colegialidade das decisões em país onde a justiça de primeiro grau é quase exclusivamente monocrática: "Tem legitimidade constitucional disposição regimental que confere ao relator competência para arquivar ou negar seguimento a pedido ou recurso, desde que as decisões possam ser submetidas ao controle do colegiado" (Pleno, Ag. 151354-3, MG, relator o Ministro Néri da Silveira, julgado em 18/2/99, unânime).7

O referido precedente do Excelso Pretório, consoante o disposto no art. 481, parágrafo único, do Código de Processo Civil, tem evidentes efeitos vinculantes para os demais tribunais, pois, em face do princípio da reserva de plenário instituído pelo art. 97 da Lei Maior, os órgãos fracionários ficam inibidos de submeter ao Pleno ou ao Órgão Especial a argüição de inconstitucionalidade incidental do mencionado art. 557 do Digesto Processual, se houver sobre o tema precedente manifestação do Pleno da Suprema Corte.8

Note-se que a constitucionalidade depende de circunstância relevante, qual seja, que a decisão do relator possa ser submetida ao controle do colegiado. Daí se extrai que o poder monocrático do relator é derivado do poder do colegiado,9 a quem o relator "presenta" e que a vontade manifestada pelo relator não é a sua, mas a do órgão que integra e que dele recebeu delegação.

O relator é, assim, delegado do órgão, pelo que não pode, salvo reconsideração, deixar de levar à turma o agravo referido no § 1º do art. 557 do Código de Processo Civil.


3. MODALIDADE DE ANTECIPAÇÃO DA TUTELA PROCESSUAL

No patamar da interpretação sistemática, a procurar a inteligência legislativa ou a mens legis (como preferem os exegéticos exarcerbados, ainda fiéis à decantada completude do sistema jurídico), deve ser ressaltado que a nova redação do art. 557 da lei processual é devida aos intensos esforços da comunidade jurídica – sob a denodada liderança de Ministros da Alta Corte de Direito Federal – visando agilizar e simplificar as formas procedimentais de forma a ensejar, tanto quanto possível, a efetividade do processo como pressuposto do Estado de Direito Democrático.

Não há efetividade do processo se este se arrasta como as preguiças do mato (na irada expressão de Rui Barbosa), sem qualquer utilidade ou necessidade.

E assim deve ser porque fere o senso comum a idéia de que se devesse permitir o inútil desenvolvimento do processo – em qualquer de suas fases, inclusive a recursal - se desde logo se convence do sucesso ou do insucesso do pleito.

É dever do Poder Público, por seus agentes (legislador, juiz e outros), prover ao cidadão serviço jurisdicional eficiente, pois a Constituição, que os legitima, promete ao cidadão o livre e amplo acesso à Justiça.

Por isso é dever (e não faculdade) do juiz zelar pela efetividade do processo, inclusive antecipando as fases procedimentais em cada caso, tanto quanto juridicamente possível, e desde logo conhecer e resolver as questões, pois o processo é instrumento e não o fim da realização do Direito.

Temos, agora, a previsão legal de mais uma antecipação de tutela como a que já está há quase trinta anos nos arts. 329 e 330 da lei processual quanto à extinção do processo (com ou sem julgamento do mérito), no art. 130 quanto à formulação de provas, e no art. 273 quanto à antecipação ainda que parcial do próprio mérito.

Na perspectiva processual, o provimento relatorial antecipa a cognição que seria feita pelo órgão competente (como diz a lei), forçado o decisor monocrata a projetar o seu espírito no adiantamento daquilo que razoavelmente seria decidido por seus pares.

Qualquer antecipação de tutela, como é acaciano, exige previsão anterior da decisão definitiva, o que, logicamente, faz ruir eventuais limites compartimentais que entre elas pudessem existir. A cognição do relator não é uma cognição mais superficial ou menos abrangente que a cognição que faria a turma julgadora; antes, deve ser mais densa porque o caput do art. 557 mantém a expressão manifestamente, e seu novo § 1o-A também se refere a manifesto.

Tais expressões exigem do aplicador do Direito a percepção, certamente só possível no caso concreto, de grau ou intensidade ou valoração do juízo tais que conduzam a, desde logo, dar acolhimento ao recurso ou lhe negar seguimento.

Se dúvida restar no espírito do relator – e isto é facilmente apurável pelos interessados no exame crítico da motivação que a Constituição exige, no art. 93, IX, para qualquer ato judicial –, deverá submeter o tema à apreciação de seus pares, pois deles recebeu delegação pela lei.

Autorizando a norma legal ao relator apurar o que é manifesto, dele vai exigir, além da imprescindível motivação de qualquer ato judicial, que examine o caso em julgamento, sopese os valores eventualmente em conflito, perscrute os efeitos que não são somente os processuais, mesmo porque, principalmente na jurisdição contenciosa, o processo nada mais é do que a vida em conflito.

Antes o relator podia antecipar decisões incidentais; agora, poderá fazê-lo quanto à decisão final do órgão competente. Mas deste é sempre o poder de decisão final, se provocado pelo agravo a que se refere o § 1º, caso não haja a retratação.10

Destaque-se: ao antecipar a tutela que seria concedida pelo órgão colegiado, o relator expressa a vontade deste, do qual é, tradicionalmente, considerado delegado.


4. NATUREZA JURÍDICA DO AGRAVO INSTITUÍDO PELO ART. 557, § 1º

O art. 557, ora em comento, prevê agravo a impugnar a decisão do relator, nos termos seguintes:

"§ 1º Da decisão caberá agravo, no prazo de cinco dias, ao órgão competente para o julgamento do recurso, e, se não houver retratação, o relator apresentará o processo em mesa, proferindo voto; provido o agravo, o recurso terá seguimento".

Referido agravo tem sede na própria lei, o que desde logo afasta a pecha de inconstitucionalidade que muitos ainda vislumbram no agravo com fonte no regimento interno de tribunal, sob o argumento de que recurso somente pode ser criado por lei federal (CF, art. 22, I) e não pela norma interna corporis de tribunal (CF, art. 96, I, "a").

Sobre a natureza jurídica de tal agravo – que, diversamente dos agravos retido ou de instrumento, não é recurso, mas meio integrativo da vontade do órgão colegiado do Tribunal –, colhe-se a lição de Moreira Alves:

"Com efeito, o agravo regimental – e essa denominação advém de serem eles instituídos pelos Regimentos Internos dos Tribunais – não sofre, atualmente, a crítica de ser inconstitucional por não ser criado por lei de competência exclusiva da União Federal, pela singela razão de que, em verdade, não é ele, como bem demonstram Moniz de Aragão (‘Do agravo regimental’, in Revista dos Tribunais, volume 315, no 19 e segs., ps. 140 e segs.) e Feu Rosa (‘Agravo regimental’, in Revista dos Tribunais, volume 738, ps. 729 e segs.), recurso, mas meio de promover-se a integração da vontade do órgão colegiado do Tribunal, quando a parte não concordar com a decisão monocrática do relator ou do presidente da Corte por lhe parecer que esta não representa a vontade daquele que deveria proferir o julgamento".11

Em conseqüência, mostra-se sem relevância jurídica o fato de que o agravo do art. 557, § 1º, muitas vezes é considerado como se fosse regimental, por sua perfeita identidade com aquele criado pela lei e pela relevante circunstância de que não poucos regimentos internos de tribunais – assim como está no art. 31, VIII, do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro – "incorporaram" as normas legais.

Ressalte-se: de fonte legal ou regimental, o agravo aqui sob comento não é recurso, mas meio de integração da vontade do órgão colegiado.12

O agravo é dirigido ao relator, mas atenderá aos requisitos, inclusive formais, dos demais recursos, nos termos gerais postos nos arts. 499 e seguintes da lei processual.

Ordinariamente se mostra desnecessária a abertura de prazo ao agravado para impugnação ou ao Ministério Público, se interveniente, salvo se o recurso evidenciar situação que assim exija para a validade do processo, como, no exemplo correntio, se o recorrente agita questão que antes não se aventara.

O relator poderá acolher o agravo e reconsiderar a sua decisão, no todo ou em parte. Se reconsiderar em parte, melhor seria que levasse o tema à turma, pois esta terá, assim, oportunidade de tomar conhecimento das questões.

O relator não poderá negar seguimento a esse agravo, porque o § 1º diz que, se não houver retratação, o "relator apresentará o processo em mesa". A expressão apresentará, constante do dispositivo legal, impõe dever funcional ao relator, inviabilizando a interpretação, decorrente do mesmo art. 557, de que lhe pudesse negar seguimento.

Aliás, seria tautológico que o relator rejeitasse o recurso do art. 557 com fundamento no próprio art. 557, negando-lhe o seguimento...

Diferentemente do que mandava a Lei nº 9.139/95 no parágrafo único do art. 557, o relator não mais necessitará de pedir dia para o julgamento do agravo – o que implicava a intimação dos advogados pelas vias referidas nos arts. 236 e 552 da lei processual –, bastando agora simplesmente apresentar o feito em mesa na sessão de julgamento.

Nesse aspecto, não foi feliz a nova redação legal.

Dificulta, em nome da celeridade processual, a atuação dos advogados, a quem já não se permite a intervenção oral – salvo questão de ordem ou esclarecimento sobre ponto fático - no procedimento do agravo (embora o art. 554 somente mencione a modalidade do agravo de instrumento!), e que agora deverão se limitar à distribuição de memoriais aos julgadores, além do sempre penoso acompanhamento da tramitação do feito na secretaria.

Mesmo assim, poderá o regimento interno especificamente admitir a defesa oral nessa modalidade de agravo, pela forma que estipular, como também poderá fazê-lo o Presidente da sessão, se assim exigirem as circunstâncias do julgamento, incidentes as regras de direção do processo a que se referem o art. 125 do Código e as normas regimentais.


5. O PODER RELATORIAL NO REEXAME NECESSÁRIO

Admitem doutrina e jurisprudência que, nos casos de reexame necessário (ou duplo grau de jurisdição, como está no art. 475, em que a sentença é subjetivamente complexa, carecendo de confirmação por outro órgão), possa o relator prover antecipadamente como se fosse o recurso referido no art. 557, caput.

Vivemos em época de desestatização e de desregulamentação, instrumentos que se apregoam como indutores do padrão liberal do chamado "Estado-mínimo".

E, no entanto, nunca o Estado foi tantas vezes chamado aos tribunais como agora.

Cada vez mais o Poder Público vem se posicionando como parte nas causas oferecidas ao julgamento dos órgãos judiciários em todas as instâncias.

E assim é porque tal é exigido pelo ordenamento jurídico - execuções fiscais, responsabilidade civil do Estado, desapropriações etc. - e pelos administrados que somente encontram no Poder Judiciário providencial socorro em face da lamentável ineficiência estatal - demandas sobre a omissão de prestação de serviços educacionais e de seguridade social (saúde e previdência) - e, o que é mais sintomático, nas causas deflagradas pela própria Administração Pública, que, desvestindo-se do poder de autoexecutoriedade, vai buscar na Toga a legitimidade que desconfia que os cidadãos não encontram nos seus atos, como se viu, em exemplo já clássico, quando município requereu autorização judicial para a implosão de prédio que ameaçava desabar.

Ao crescente volume das demandas fazendárias, impõe-se a efetiva resposta dos órgãos judiciários em todas as instâncias...

Nessa linha, o disposto no art. 557 do CPC permite que o relator negue seguimento também a reexame necessário quando se verifica a manifesta razoabilidade da decisão reexaminanda.

Se admitem diversos doutrinadores a incidência da tutela antecipada relatorial em caso de reexame necessário, até mesmo na Alta Corte de Direito Federal já se orientou em sentido contrário, antes da nova redação conferida ao dispositivo processual ora em comento:

Acórdão

RESP 153300/AL ; RECURSO ESPECIAL
(97/0076997-6)

Fonte

DJ DATA:25/02/1998 PG:00135

Relator

Ministro LUIZ VICENTE CERNICCHIARO (1084)

Ementa

RESP - PROCESSUAL CIVIL - REMESSA DE OFICIO - CPC, ART. 557. A EXTENSÃO NORMATIVA DO DISPOSTO NO ART. 557, CPC, É LIMITADA EM HAVENDO NECESSIDADE DE EXAME DA REMESSA DE OFÍCIO, PROCEDIDA PELO COLEGIADO.

Data da Decisão

02/12/1997

Órgão Julgador

T6 - SEXTA TURMA

Decisão

POR UNANIMIDADE, CONHECER DO RECURSO.

Indexação

IMPOSSIBILIDADE, DESPACHO, RELATOR, INDEFERIMENTO, REMESSA EX OFFICIO, PARTE VENCIDA, UNIÃO FEDERAL, OBRIGATORIEDADE, ÓRGÃO COLEGIADO, APRECIAÇÃO, OBSERVÂNCIA, DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO.

Catálogo

PC0967 DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO. REEXAME NECESSÁRIO. DECISÃO DO RELATOR - JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE

Referências
Legislativas

LEG:FED LEI:005869 ANO:1973 ***** CPC-73 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. ART:00557

Contudo, já na vigência da redação imposta pela última alteração legislativa, o Superior Tribunal de Justiça vigorosamente proclamou em decisão unânime de sua Segunda Turma, na voz do Ministro Adhemar Maciel:

Acórdão

RESP 156311/BA ; RECURSO ESPECIAL (97/0084205-3)

Fonte

DJ DATA:16/03/1998 PG:00102

Relator

Ministro ADHEMAR MACIEL (1099)

Ementa

PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA PROFERIDA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. REEXAME NECESSÁRIO EFETUADO PELO PRÓPRIO RELATOR: POSSIBILIDADE. INTELIGÊNCIA DO "NOVO" ART. 557 DO CPC. RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO.

I - O "NOVO" ART. DO CPC TEM COMO ESCOPO DESOBSTRUIR AS PAUTAS DOS TRIBUNAIS, A FIM DE QUE AS AÇÕES E OS RECURSOS QUE REALMENTE PRECISAM SER JULGADOS POR ÓRGÃO COLEGIADO POSSAM SER APRECIADOS O QUANTO ANTES POSSÍVEL. POR ESSA RAZÃO, OS RECURSOS INTEMPESTIVOS, INCABÍVEIS, DESERTOS E CONTRÁRIOS À JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA NO TRIBUNAL DE SEGUNDO GRAU OU NOS TRIBUNAIS SUPERIORES DEVERÃO SER JULGADOS IMEDIATAMENTE PELO PRÓPRIO RELATOR, ATRAVÉS DE DECISÃO SINGULAR, ACARRETANDO O TÃO DESEJADO ESVAZIAMENTO DAS PAUTAS. PRESTIGIOU-SE, PORTANTO, O PRINCÍPIO DA ECONOMIA PROCESSUAL E O PRINCÍPIO DA CELERIDADE PROCESSUAL, QUE NORTEIAM DIREITO PROCESSUAL MODERNO.

II - O "NOVO" ART. 557 DO CPC ALCANÇA OS RECURSOS ARROLADOS NO ART. 496 DO CPC, BEM COMO A REMESSA NECESSÁRIA PREVISTA NO ART. 475 DO CPC. POR ISSO, SE A SENTENÇA ESTIVER EM CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO TRIBUNAL DE SEGUNDO GRAU OU DOS TRIBUNAIS SUPERIORES, PODE O PRÓPRIO RELATOR EFETUAR O REEXAME OBRIGATÓRIO POR MEIO DE DECISÃO MONOCRÁTICA.

III - RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO, "CONFIRMANDO-SE" O ACÓRDÃO PROFERIDO PELO TRF. DA 1ª REGIÃO.

Data da Decisão

19/02/1998

Órgão Julgador

T2 - SEGUNDA TURMA

Decisão

POR UNANIMIDADE, NÃO CONHECER DO RECURSO.

Indexação

CABIMENTO, RELATOR, DENEGAÇÃO, SEGUIMENTO, APELAÇÃO CIVEL, REMESSA EX OFFICIO, EXISTÊNCIA, JURISPRUDÊNCIA FIRMADA, TRIBUNAL SUPERIOR, OBJETIVO, LIBERAÇÃO, PAUTA DE JULGAMENTO, OBSERVÂNCIA, PRINCÍPIO DA ECONOMIA PROCESSUAL, PRINCÍPIO DA CELERIDADE PROCESSUAL, DESNECESSIDADE, DECISÃO, ÓRGÃO COLEGIADO.

Catálogo

PC0957 NEGATIVA DE SEGUIMENTO A RECURSO DESPACHO DO RELATOR JURISPRUDÊNCIA REITERADA OU SÚMULA DE TRIBUNAL

Referências
Legislativas

LEG:FED LEI:009139 ANO:1995. LEG:FED LEI:005869 ANO:1973. ***** CPC-73 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. ART:00557 ART:00496 ART:00475

Doutrina

OBRA: HERMENÊUTICA E APLICAÇÃO DO DIREITO, 16ª ED, , FORENSE, 1996, PÁGS. 246/247. AUTOR: CARLOS MAXIMILIANO

OBRA: FUNDAMENTOS DEL DERECHO PROCESSAL CIVIL, EDITORA DEPALMA, 3ª ED., BUENOS AIRES, 1985, PAG. 349. AUTOR : EDUARDO J. COUTURE

Sucessivos

RESP 160947 BA 97/0093303-2 DECISÃO:03/03/1998

DJ DATA:06/04/1998 PG:00092

RESP 155656 BA 97/0093303-2 DECISÃO:03/03/1998

DJ DATA:06/04/1998 PG:00089

O poder relatorial em comento incide não só nas hipóteses em que a eficácia da sentença depende da confirmação pelo órgão judiciário superior, como referido no art. 475 do Código de Processo Civil e na Lei nº 9469, de 10 de julho de 1997 (cujo art. 10 diz que o disposto no art. 475 da lei processual se aplica às autarquias e fundações públicas) como nas hipóteses em que a sentença desde a sua prolação possui eficácia, embora careça de reexame, como se vê no art. 12 da Lei nº 1533, de 31 de dezembro de 1951, a admitir a execução provisória da sentença no mandado de segurança.13


6. PROVIMENTO DO RECURSO PELO RELATOR

Se o relator pode antecipar a tutela negando seguimento ao recurso, pela mesma ratio a lei autoriza que poderá também desde logo lhe dar provimento quando a decisão recorrida estiver em manifesto confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal ou de Tribunal Superior, como está no novo § 1o-A do art. 557.

Talvez seja desnecessário lembrar que somente é cabível o provimento antecipado se o recurso atender aos requisitos de admissibilidade (quanto aos pressupostos gerais e próprios, como legitimidade, interesse, tempestividade, preparo etc.), não se mostre prejudicado por fatos supervenientes (como, por exemplo, os referidos nos arts. 462 e 503 da lei processual) e esteja o procedimento recursal maduro para a decisão, como, por exemplo, já tenha se manifestado o Ministério Público quando interveniente. 

Melhor técnica legislativa seria se a hipótese de provimento do recurso, que está no § 1º do art. 557, estivesse no caput, porque este se refere à negação de seguimento e aquele ao provimento: é regra geral da Técnica de Redação das Leis (Nomografia) dispor o positivo antes do negativo.

Veja-se a diferença entre prover o recurso ou negar provimento ao recurso.

O caput do art. 557 refere-se à negativa de seguimento do recurso, desde que este se mostre manifestamente:

    1. inadmissível, não preenchendo os respectivos pressupostos;
    2. prejudicado, por fato superveniente à interposição (se já estava prejudicado quando da interposição, o recurso é inadmissível pela falta do objeto);
    3. improcedente (evidentemente não terá sucesso);
    4. em confronto com súmula ou jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior.

O § 1o A do art. 557 inova ao autorizar o relator a, desde logo, prover o recurso se a decisão recorrida estiver em manifesto confronto com súmula ou jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal ou de Tribunal Superior.

Note-se a distinção: para negar seguimento ao recurso, a lei se refere à orientação do respectivo tribunal, além do Supremo Tribunal e de Tribunal Superior; para prover o recurso só se a orientação for a ditada pelo Supremo Tribunal ou Tribunal Superior.

Observe-se também: nos tribunais inferiores, o relator não poderá prover o recurso ainda que o tema seja objeto de súmula do seu tribunal ou seja caso já albergado pela jurisprudência dominante da mesma Corte.

Explica-se tal orientação legislativa pelos fundamentos expostos no RESp 156513, da Paraíba, Relator o Ministro Milton Luiz Pereira:14

"Com os Tribunais Regionais Federais a situação é diferente. Sendo vários os Tribunais, cada um tem ou pode ter súmulas diferentes ou mesmo opostas à de outro Regional. Como no caso concreto, outro Regional pode ter uma súmula em sentido oposto à Súmula nº 10 do Regional da 5ª Região e aí teremos decisões contraditórias. Num Regional, determinada lei é constitucional e em outro é inconstitucional".

O disposto no art. 557, § 1o-A, como antes explicitado, somente permite ao relator prover o recurso na situação ali explicitada.

Poderia, no entanto, regimento interno do Tribunal dispor sobre o poder do relator em prover o recurso não só nas hipóteses do mencionado art. 557, § 1o-A (o que, aliás, seria desnecessário constar no regimento interno, pois tal norma legislativa automaticamente adentra na normatividade da Corte...), como em casos de a decisão recorrida afrontar súmula ou jurisprudência dominante do próprio Tribunal?

Tem-se que a resposta é positiva.

Em face da competência funcional que a Constituição defere aos tribunais para dispor sobre o funcionamento de seus órgãos jurisdicionais no respectivo regimento interno (art. 96, I, "a"), atendidas as leis processuais, não se evidencia injurídica a disposição regimental que venha conferir ao relator o poder de antecipar o provimento do recurso se a decisão recorrida confrontar com súmula ou com a jurisprudência dominante na mesma Corte.

Da Constituição os tribunais vão haurir a sua competência, pelo que prevalecem as súmulas e a jurisprudência dominante dos Tribunais nos temas próprios de sua jurisdição, atendida a prioridade da Suprema Corte em matéria constitucional, mas somente nesta.

É fácil discernir entre súmula e jurisprudência dominante: aquela tem o enunciado emitido nos termos regimentais e legais, esta expressa o entendimento ordinariamente seguido, mas que não mereceu ainda o patamar sumular.

A apuração do que é jurisprudência dominante pode oferecer óbices intransponíveis em face da natural alteração da orientação seguida pelas Cortes, embora muito facilitem as ementas de acórdão, como algumas das Seções do Superior Tribunal de Justiça, declarando tal condição.

A súmula do seu tribunal, ou de Tribunal Superior, é do conhecimento do relator, mesmo porque se diz que a súmula é menos do que uma ordem e mais do que uma recomendação; a jurisprudência dominante deve ser demonstrada ou ao menos indicada pelos interessados, embora ao relator reste o juízo sobre a incidência dos elementos normativos no caso em julgamento.


7. NEGATIVA DE SEGUIMENTO DO RECURSO

Desde logo, se vê que o dispositivo diz que o relator negará seguimento, em expressão imperativa, não colocando, assim, faculdade, mas poder/dever, mesmo porque se trata de norma processual, de direito público, e assim sem apresentar, salvo ressalva especial, qualquer disponibilidade aos participantes do processo.

O caput do art. 557 diz que o relator negará seguimento ao recurso na incidência de diversos suportes fáticos, todos eles precedidos pelo advérbio manifestamente, isto é, quando a ocorrência for manifesta ou que não deixe dúvidas15. Se dúvida houver sobre a incidência, deve o relator submeter o recurso à cognição da turma.

7.1. RECURSO INADMISSÍVEL

O recurso é inadmissível quando inocorrentes os seus pressupostos, como, por exemplo, se impugna ato processual que não constitui decisão16 (pois a decisão é pressuposto lógico de qualquer recurso), ou que o recorrente não se enquadre nas hipóteses do art. 499, que trata da legitimidade recursal, inclusive do terceiro prejudicado, ou que o recorrente não tenha interesse, como seria o caso em que ele não ficou sucumbente, ou que não decorra do ato qualquer gravame etc.

7.2. RECURSO PREJUDICADO

O recurso está prejudicado quando ocorre fato superveniente (ver conceito no art. 462) à sua interposição, embora deva se dizer que, se já estava prejudicado quando da interposição, o recurso é inadmissível pela falta do objeto).

7.3. RECURSO IMPROCEDENTE

O recurso improcedente é o que desde logo se verifica que, no seu ponto principal, não terá sucesso.17

Nesse caso, exige o art. 557 que o relator aprecie, inclusive, o mérito do recurso.18

Note-se que a expressão manifestamente improcedente exige do relator proceder à cognição que seria dada pela turma julgadora, em antevisão do que esta decidiria, e não em atenção ao entendimento próprio do relator, que é, no caso, como antes referido, delegado do colegiado, cujo poder "presenta".

Surge curiosa situação: a despeito de eventual entendimento do relator de que o recurso deveria ser julgado procedente, se o entendimento do colegiado é divergente, o que resta ao relator é negar seguimento ao recurso, por sua manifesta improcedência, ressalvando-se com a clássica nota de que assim procede com a ressalva do entendimento pessoal em contrário...

7.4. RECURSO EM CONFRONTO COM SÚMULA OU JURISPRUDÊNCIA DOMINANTE

O relator também negará seguimento ao recurso que estiver em confronto com súmula ou jurisprudência dominante do seu tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior.

Súmula é o enunciado decorrente do incidente de uniformização de jurisprudência e cujo conteúdo representa para o juiz, como antes referido, mais do que um conselho e menos do que uma ordem.

Pontes de Miranda extraiu da expressão "... e constituirá precedente na uniformização da jurisprudência", encontrada no art. 479, caput, do Código de Processo Civil, a idéia de vinculação dos órgãos do Tribunal ao enunciado sumular:

"Tal dever somente surge se houve a maioria absoluta, pois, aí, com a súmula, tem de debruçar-se diante da maioria absoluta, a que a lei atribuiu a missão de uniformizar a jurisprudência. O juiz pode dizer: continuo com a opinião que fundamentei no tribunal e fui vencido, e aplica no caso a interpretação vencedora porque o art. 479 o obriga a isso".19

Outros doutrinadores, como Plácido e Silva, sugerem que não havia vinculação:

"Do latim summula (resumo, epítome breve), tem o sentido de sumário, ou de índice de alguma coisa. É o que de modo abreviadíssimo explica o teor, ou o conteúdo integral de alguma coisa. Assim, a súmula de uma sentença, de um acórdão, é o resumo, ou a própria ementa da sentença ou do acórdão. No âmbito da uniformização da jurisprudência, indica a condensação de série de acórdãos, do mesmo tribunal, que adotem idêntica interpretação de preceito jurídico em tese, sem caráter obrigatório, mas, persuasivo, e que, devidamente numerados, se estampem em repertórios".20

Entendeu-se, por muito tempo, que somente haveria vinculação dos decisores monocratas e dos órgãos dos tribunais se tal fosse expresso no Regimento Interno da Corte, o que, aliás, consta nos tribunais superiores e raramente nos tribunais inferiores.

Enfim, a nova redação do art. 557 do Código de Processo Civil veio acabar com o debate sobre a aludida vinculação: de mera interpretação literal do dispositivo extrai-se a norma de que o relator negará seguimento a recurso em confronto com súmula do respectivo tribunal.

Evidentemente, tal norma não extrai do relator, nos termos legais e regimentais, o poder de instaurar o procedimento de revisão da súmula, inclusive no próprio feito em que deveria aplicar o disposto no art. 557. Contudo, se entender que não deve iniciar o processo de revisão da súmula do próprio Tribunal, o que resta ao relator, ainda que tenha entendimento pessoal em contrário, é negar seguimento ao recurso por afronta à súmula.21

E os efeitos da nova redação do art. 557, caput, são bem mais devastadores, pois, além de vincular o relator à súmula de seu tribunal, vinculou-o, ainda, às súmulas do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça. Se os enunciados sumulares não forem seguidos, haverá afronta ao disposto no art. 557 para fins do recurso especial a que se refere o disposto no art. 105 da Constituição da República.

E muito mais fez a nova redação do dispositivo ora em comento.

Implantou-se muito mais do que a "súmula vinculante" antes comentada, pois o que se tem agora é a vinculação às decisões do plenário do Supremo Tribunal Federal em tema constitucional (art. 481, parágrafo único, ao dispor que não haverá argüição de inconstitucionalidade a ser solvida na forma do art. 97 da Constituição, se sobre o tema houver decisão do Excelso Pretório ou do próprio Tribunal22) e, pelo caput do art. 557, vinculação à jurisprudência dominante do próprio Tribunal, da Suprema Corte e de Tribunal Superior.

Qual o significado da expressão "jurisprudência dominante"?

Certamente não é aquela expressa na súmula, pois o caput do art. 557 faz a distinção.

Retorne-se a Plácido e Silva:

"Assim é que se entende a jurisprudência como sábia interpretação e aplicação das leis a todos os casos concretos que se submetam a julgamento da justiça. Ou seja, o hábito de interpretar e aplicar as leis aos fatos concretos, para que, assim, se decidam as causas.

Desse modo, a jurisprudência não se forma isoladamente, isto é, pelas decisões isoladas. É necessário que se firme por sucessivas e uniformes decisões, constituindo-se em fonte criadora do Direito e produzindo um verdadeiro jus novum. É necessário que, pelo hábito, a interpretação e explicação das leis a venham formar.

Os romanos sempre a consideram como a fonte do Direito, designando-a como auctoritas rerum perpetuo similiter judicatarum, embora Justiniano aconselhasse que não se lhe desse uma autoridade exagerada, cum non exemplis sed legibus judicandum sit.

Aliás, é firmado hoje que a jurisprudência somente obriga a espécie julgada, não sendo, propriamente, fonte de Direito.

Mas, a verdade é que a jurisprudência firmada, em sucessivas decisões, vale como verdadeira lei. 

Jurisprudência. Extensivamente assim se diz para designar o conjunto de decisões acerca de um mesmo assunto ou a coleção de decisões de um tribunal".23

Daí se vê que a jurisprudência dominante deverá ser demonstrada por sucessivas decisões sobre o mesmo tema em orientação convergente. Admite-se que até mesmo uma única decisão expresse a jurisprudência dominante, se ela foi tomada pela maioria absoluta de órgão que disponha de competência exclusiva sobre o tema, como, por exemplo, o Plenário do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional, ao afirmar a compatibilidade ou a incompatibilidade da norma em face da Lei Maior.


8. MULTA PELO AGRAVO MANIFESTAMENTE INADMISSÍVEL OU INFUNDADO

A disposição do § 2º do art. 557, assim como a nova redação que a Lei nº 9.668, de 23 de junho de 1998, deu ao art. 18 do Código de Processo Civil ("o juiz ou tribunal, de ofício ou a requerimento, condenará o litigante de má-fé a pagar multa não excedente a um por cento sobre o valor da causa e a indenizar a parte contrária dos prejuízos que esta sofreu, mais os honorários advocatícios e todas as despesas que efetuou"), constitui previsão de sanção e a sua aplicação não pode surpreender o sancionado, sem lhe permitir prazo razoável para se manifestar sobre a possível incidência, mormente quando o processo está no último grau da instância ordinária.

Não se extraia do mencionado § 2º interpretação que conduza à inexorabilidade de aplicação da sanção sempre que ao recurso se negar seguimento porque inadmissível ou infundado.

Aí temos sanção e não indenização, e somente esta admite a responsabilidade objetiva, pela simples ocorrência do fato.

A apenação somente é legítima se ocorrente situação inexculpável que a decisão judicial deverá motivadamente explicitar.24

Se maior confiança tivesse o legislador no juiz, não teria pré-tarifado a multa nos estreitos limites de um a dez por cento do valor corrigido da causa, pois daí certamente decorrerão flagrantes injustiças principalmente nas causas extrapatrimoniais ou em que o valor não guarde relação com o aspecto monetário.

Qualquer pena deve guardar relação adequada e proporcional com o fato. O princípio da individualização da pena tem fundamento constitucional (art. 5º, XLVI) e sua aplicação fora do campo do Direito Penal está ao menos prometida pelo § 2º do art. 5º.

Além do mais, o regime de governo é presidencialista, e os Poderes da República são independentes e autônomos, ao legislador cabe editar a norma genérica e abstrata, ao juiz dizer a norma individual e concreta.

Impossível exigir-se do legislador a minuciosa previsão de todas as hipóteses, ao juiz basta apreciar a situação fática que as partes lhe apresentam.

Socorra-se o aplicador da excepcional via de interpretação da razoabilidade que o sistema da Constituição democrática defere a todos os juízes e, fundamentadamente, pronuncie sanção eqüitativa, ainda que extrapolando os desarrazoados limites legais.

Melhor seria se o legislador tivesse se remetido aos critérios do art. 20, pois no arbitramento dos honorários ao advogado vencedor, o seu § 3o fala em dez a vinte por cento da condenação (e não do valor da causa), deixando ao § 4º, com forte poder de eqüidade, o modo de arbitramento nas demais causas.

Além da multa, a lei também condiciona a interposição de outros recursos ao depósito do respectivo valor. Seria descabelado e vulnerador do direito de recurso o eventual entendimento no sentido de condicionar o agravo contra a decisão relatorial que aplicou a multa ao depósito do valor da multa aplicada pela mesma decisão...


9. CONCLUSÃO

O legislador cumpriu o seu dever ao editar as novas alterações sobre tal importante tema.

É desinfluente discutir se a lei é boa ou ruim - como todos os atos humanos, as leis têm qualidades e defeitos.

À comunidade forense (e não só aos juízes!), mais uma vez, mediante aplicação consciente e responsável da Lei, cabe a transcendental missão de ultrapassar o imenso abismo entre as disposições genéricas e abstratas e o mundo real, buscando, no caso concreto, o ideal de Justiça.


NOTAS

1 A Lei Complementar no 35, de 14 de março de 1979, dispondo sobre a Lei Orgânica da Magistratura Nacional, em seu art. 90, § 2o, autorizara no âmbito do antigo Tribunal Federal de Recursos: ´O relator julgará pedido ou recurso que manifestamente haja perdido o objeto, bem assim mandará arquivar ou negar seguimento a pedido ou recurso manifestamente intempestivo ou incabível ou, ainda, que contrarie em questões predominantemente de direito, súmula do tribunal ou do Supremo Tribunal Federal...´.

2 Tantas alterações legislativas conduziram o legislador à estranhíssima situação de inserir o § 1o-A antes do § 1o... Insólito que seja, não se extraia daí qualquer motivo de invalidade da norma, que, de conteúdo processual, e assim de direito público, é impositiva e não facultativa na sua aplicação.

3 Os termos da nova redação do art. 557, ora em comento, dispensam alterações nos regimentos dos tribunais para a sua incidência nos casos que lhe são submetidos, ainda que ampliem a normatividade em face de anteriores regras regimentais. As novas normas legais passam automaticamente a se incluir no sistema normativo dado pelos regimentos internos. É o que se vê, por exemplo, no Informativo 149, do Supremo Tribunal Federal, a noticiar: ´Lei 9.756/98: Agravo e Sustentação Oral. Preliminarmente, a Turma, por maioria, em face da natureza dinâmica da Lei 9.756/98, que deu nova redação ao art. 557 do CPC (´§ 1º-A Se a decisão recorrida estiver em manifesto confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior, o relator poderá dar provimento ao recurso. § 1º Da decisão caberá agravo, no prazo de cinco dias, ao órgão competente para o julgamento do recurso, e, se não houver retratação, o relator apresentará o processo em mesa, proferindo voto; provido o agravo, o recurso terá seguimento´), considerou dispensável a inclusão em pauta do agravo contra despacho do Min. Carlos Velloso, relator, que conheceu do recurso extraordinário e lhe deu provimento. Vencido o Min. Néri da Silveira, que, em face do sistema legal que assegura às partes a sustentação oral nos recursos extraordinários e diante do princípio constitucional da ampla defesa, concluía pela necessidade de se incluir em pauta o agravo´ (RE (AgRg) 227.030-RJ, rel. Min. Carlos Velloso, 11.5.99).

4 A redação do inciso VIII do art. 34 do RI-STJ foi dada pela Emenda Regimental no 1, de 23 de maio de 1991, revogando o parágrafo único que tinha teor semelhante ao do inciso que então foi acrescido.

5 Como o texto regimental não especifica, a competência do relator abrange a homologação de desistência em recurso, ação originária e incidentes.

6 Na última parte do dispositivo, há de se entender que, se incompetente o Tribunal, nem sempre o relator vai negar seguimento ao pedido ou recurso, mas, se for o caso, submeterá o feito ao colegiado para se determinar a remessa do feito ao órgão ou tribunal competente.

7 Em sentido contrário, o Ministro Peçanha Martins, do Superior Tribunal de Justiça, no artigo ´Exame do art. 557 do CPC´, que se pode ver em www.teiajuridica.com , a destacar o princípio da colegialidade das decisões, inclusive com a lição de Pontes de Miranda: ´7) Colegialidade das Decisões. - A regra, para os recursos, é a colegialidade das decisões. Quer dizer: a pluralidade de julgadores, com o fim político de assegurar diversos exames no mesmo tempo, além do duplo ou múltiplo exame, no tempo, pelo juiz do primeiro grau e os demais juízes superiores. A ciência ensina-nos, hoje, que a assembléia não nos veio da reflexão: foi a reflexão que veio da assembléia. Portanto, o homem é que é produto da assembléia. Essa prioridade do exame múltiplo ao mesmo tempo, em relação ao exame de um só, se transforma em superioridade sempre que desejamos maior certeza. A colegialidade para a decisão dos recursos obedece a esse pendor íntimo do homem quando se deseja guiar pela ´razão´ ´ (Comentários ao Código de Processo Civil, 1ª ed., Rio de Janeiro, Forense, t. VII, p. 11).

8 Sobre o tema, do autor, veja-se: ´A argüição de inconstitucionalidade nos tribunais - notas sobre a nova redação que a Lei 9.576/98 deu ao art. 481 do Código de Processo Civil´, em: Boletim da ADV/COAD, Informativo n.º 13, pp. 196 a 193, março de 1999; Revista da EMERJ, vol. 2, no 6, pp. 148 a 154, 1999, sob o título ´Sobre a argüição de inconstitucionalidade´; Doutrina, coordenado por James Tubenchlak, Niterói, Instituto de Direito, pp. 261 a 267, 1999; Revista de Direito do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, no 40, pp. 20 a 24, julho/setembro de 1999

9 O relator ´presenta´ e não representa o órgão colegiado, na linguagem de Pontes de Miranda, pois o órgão colegiado manifesta as suas decisões através de seus integrantes. Barbosa Moreira, sobre o tema, diz que o relator age como o ´porta-voz´ do colegiado (Comentários ao Código de Processo Civil, 7a ed., Rio de Janeiro, Forense, 1998, vol. 5, p. 637).

10 Embora afirmando a legitimidade do poder relatorial na decisão antes referida, o Supremo Tribunal Federal exigiu que o órgão colegiado continuasse a exercer o controle sobre a decisão monocrática do relator. Tal controle se faz através do agravo regimental ou do agravo referido no art. 557, § 1o, do Código de Processo Civil.

11 STF, 1a Turma, Agravo regimental em agravo de instrumento no 247.591-3, RS, relator o Ministro Moreira Alves, unânime, julgado em 14 de março de 2000, constando na ementa: ´O agravo regimental, não sendo recurso, mas meio de promover-se a integração da vontade do Colegiado que o relator representa, não é inconstitucional sob o fundamento de ofensa à competência da União para legislar sobre processo´.

12 Embora não seja aqui considerado como recurso, mas, como os embargos de declaração, meio de integração, leis estaduais, como no Rio de Janeiro a Lei no 3.350/99, instituíram o preparo do agravo, o que passou a ser pressuposto de sua admissibilidade. Tal instituição, a despeito do que muitos pensam justamente por não constituir recurso tal procedimento, não se mostra inconstitucional, pois compete ao Estado, enquanto não vier a legislação nacional, legislar sobre as custas do serviço forense (Constituição, art. 24, IV, e § 3o ).

13 O reexame necessário ou ´duplo grau de jurisdição´ perdeu, há muito, o seu prestígio como meio de controle das decisões da instância monocrática, não só pelo poder cautelar deferido aos juízes inclusive pelo disposto nos art. 273 e 461, do Código de Processo Civil, como pela edição da Medida Provisória no 2.102, já reeditada tantas vezes, a dispor no seu art. 12: ´Não estão sujeitas ao duplo grau de jurisdição obrigatório as sentenças proferidas contra a União, suas autarquias e fundações públicas, quanto a respeito da controvérsia o Advogado-Geral da União ou outro órgão administrativo competente houver editado súmula ou instrução normativa determinando a não-interposição de recurso voluntário´. Tal disposição traz um novo elemento: a norma processual que manda proceder ao reexame necessário somente incidirá se não houver ato normativo de Autoridade administrativa....

14 Citado por Tales Arvoreje Treiger, ´Dos poderes do relator no julgamento e no processamento dos recursos cíveis´, artigo em www.femperj.org.br , colhido em 14 de maio de 2001.

15 Sobre a inteligência do advérbio manifestamente, veja-se o item 3, supra.

16 A rigor, somente cabe recurso de ato comissivo e não de omissão, embora, sob tal aspecto, de omissão ou retardo na decisão decorra interesse recursal. Na doutrina comum, para impugnar omissão, caberia correição parcial ou reclamação (instituídas pelo Código de Organização Judiciária dos Estados, o que é de duvidosa constitucionalidade) ou até mesmo mandado de segurança pela omissão.

17 ´´Procedente´ vem do adjetivo latino procedens, procedentis, usado por Cícero para expressar o que se adianta, vai para diante, pois o verbo procedere significar ir adiante, adiantar-se, marchar, caminhar, ir para frente. Ao julgar procedente o pedido, que é a pretensão posta no processo, o juiz, pelo Estado, diz ao autor que sua pretensão pode ir adiante, pode continuar, agora sob as bênçãos da coerção do poder estatal´ (Nagib Slaibi Filho, Sentença cível, fundamentos e técnica, 5a ed., Rio de Janeiro, Forense, p. 396).

18 Superior Tribunal de Justiça, 2a Turma, Ari Pargendler, Ag. 142320-DF, unânime, julgado em 12 de junho de 1997, citado por Theotonio Negrão, CPC e legislação processual civil em vigor, 32ª ed., São Paulo, Saraiva, 2001, nota 4 ao art. 557.

19 Pontes de Miranda, Comentários ao Código de Processo Civil, 1a ed., Rio de Janeiro, Forense, 1975, pp. 39 e 40.

20 De Plácido e Silva, Vocabulário Jurídico, atualizado por Nagib Slaibi Filho e Geraldo Magela Alves, Rio, Forense, 1a ed. eletrônica, verbete ´súmula´.

21 Se o relator ou a turma não seguir o enunciado sumular, estarão desafiando recurso especial por afronta ao mencionado art. 557, caput.

22 Do autor, ´A argüição de inconstitucionalidade nos tribunais - notas sobre a nova redação que a Lei 9.576/98 deu ao art. 481 do CPC´, em: Boletim da ADV/COAD, Informativo nº 13, pp. 196 a 193, março de 1999; Revista da EMERJ, vol. 2, no 6, pp. 148 a 154, 1999, sob o título ´Sobre a argüição de inconstitucionalidade´; Doutrina, coordenado por James Tubenchlak, Niterói, Instituto de Direito, pp. 261 a 267, 1999; Revista de Direito do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, no 40, pp. 20 a 24, julho/setembro de 1999.

23 De Plácido e Silva, op. cit., verbete ´jurisprudência´.

24 Noticiou o Informativo 147, do Supremo Tribunal Federal: Agravo Regimental: Caráter Protelatório. A controvérsia relativa aos índices de correção monetária aplicáveis às contas vinculadas do FGTS tem natureza infraconstitucional, implicando, assim, a violação indireta ou reflexa à CF, que não dá margem a recurso extraordinário. Com esse entendimento, a Turma, reconhecendo o caráter protelatório de uma série de agravos regimentais interpostos pela Caixa Econômica Federal - CEF contra despachos que negaram seguimento a agravos de instrumento, a eles negou provimento, impondo à agravante a multa no percentual médio de 5% sobre o valor corrigido da causa, nos termos do § 3º do art. 557 do CPC, na redação dada pela Lei 9.756/98 (§ 3º: ´quando manifestamente inadmissível ou infundado o agravo, o tribunal condenará o agravante a pagar ao agravado multa entre um e dez por cento do valor corrigido da causa, ficando a interposição de qualquer outro recurso condicionada ao depósito do respectivo valor´). AG (AgRg) 198.810-PR, 231.663-RS, 232.264-DF, 232.884-RN, 233.008-RJ, 233.082-RJ, 233.126-PB, 233.464-RJ, 233.484-RJ, 233.866-SC, 234.164-SP, rel. Min Marco Aurélio, 27.4.99.


Autor

  • Nagib Slaibi Filho

    Desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, professor da Universidade Salgado de Oliveira (UNIVERSO), livre-docente em Direito do Estado pela Universidade Gama Filho.

    É membro honorário do Instituto de Advogados Brasileiros e especialista em Metodologia do Ensino Superior.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SLAIBI FILHO, Nagib. Notas sobre o art. 557 do CPC. Competência do relator de prover e de negar seguimento a recurso. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 62, 1 fev. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3792. Acesso em: 19 abr. 2024.