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Discricionariedade no novo CPC? Das provas como direito das partes

Discricionariedade no novo CPC? Das provas como direito das partes

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O mínimo movimento na fase de produção de provas pode produzir um efeito inimaginável na aplicação das regras relativas ao contraditório, fundamentação da decisão e, especialmente, ao direito material aplicável.

Resumo: O Direito não se resolve no a priori, extraindo-se do puro intelecto humano. Daí que a razão do Juiz não pode se sobrepor ao caso decidendo. Tampouco pode abdicar dos pressupostos legais previstos para dar respostas definitivas aos jurisdicionados. Igualmente, não pode dispor livremente do modo de agir que elas impõem. Assim, pressupondo que fato e direito estão imbricados, o presente empreendimento é demonstrar o papel fundamental da prova enquanto sua função de validar as pretensões normativas em jogo.

Palavras-chave: discricionariedade; fato; direito; prova.


Se antes havia dúvidas, a nova codificação processual civil pôs fim a qualquer celeuma a respeito da não recepção do “livre convencimento motivado” pelo ordenamento após a constitucionalização do Direito brasileiro. Como, por aqui, princípios só são normas quando servem para confirmarem convicções íntimas, mister se fez a positivação via texto, tendo o legislador suprimido intencionalmente o vocábulo ‘livre’ da redação do art.371 do CPC. Daí uma pergunta retórica: quantas vezes o termo ‘discricionariedade’ é citado no NOVO (frisa-se) Código de Processo Civil? Nem uma!! Logo, o juiz, muito embora não esteja amarrado na boca da lei, deve se conter na e pela normatividade, própria da autonomização do sistema jurídico. E nem se diga que a possibilidade de o Juiz produzir prova de ofício (art.370) confira, implicitamente, discricionariedade, pois, repita-se, sua aplicação está condicionada pelo princípio do devido processo legal, razão pela qual sua incidência está limitada às hipóteses de preservação do equilíbrio entre as partes[1].

A chamada emenda STRECK, portanto, não pode ser desconsiderada ou feita tabula rasa, mas entendida como uma alteração paradigmática[2], revisora da visão que se tinha sobre o papel e modo de produção da prova dentro do contraditório processual. Pois ela reforça, ainda mais, uma interpretação conforme a Constituição, e confere ganho (atribuição) de sentido[3] ao princípio do devido processo legal, cada vez mais ajustado à intersubjetividade[4].

O excurso desse impacto será conduzido pelo padrão de exigência da Integridade e Coerência, agora, positivada. Isso, por impor um padrão decisório holístico, chamando a atenção “para como, na interpretação de elementos do ordenamento jurídico, o sentido das partes é dependente do sentido do todo”[5], será essencial na verificação da interdependência entre os sentidos dos institutos e normas legais possivelmente aplicáveis, das quais de antemão devem ser afastadas aquelas atribuições de significado com carga autoritária, capazes de tolherem injustificadamente a autorrealização do indivíduo. Nesse sentido, parte-se de inferências que deem adequada aplicação aos direitos fundamentais, máxime o devido processo legal, eis que condições de possibilidade de qualquer debate sob a égide do constitucionalismo moderno[6]. Assim, uma vez que as normas processuais lhes devem obediência no momento de concreção (=aplicação), será realizada uma defesa irrestrita de uma interpretação que lhes levem em consideração de forma coerente e unitária, sob pena de enfraquecimento da força normativa da Constituição e dos princípios que preservam a autonomia do Direito[7].

Ao compreender o processo enquanto (ou quase) discurso, com pretensão de correção (ao menos jurídica), não pode prescindir-se de ferramentas que confiram aos participantes meios efetivos de demonstrarem as justezas de suas razões. E isso constitui um princípio que pode ser aceito por todos (inclusos os virtualmente afetados) que estejam de boa fé, em um sentido universal-recíproco. Isso porque a Constituição, à qual estamos todos submetidos, para além de sufragar um estado Democrático de Direito, prioriza liberdades frente às intervenções estatais (no caso do processo, o poder coercitivo da jurisdição).

Antes que trivial, a proposta é de que, se o devido processo legal foi erigido a direito fundamental do indivíduo, não há processo devido sem sua participação. E ao reconhecer a dignidade da pessoa humana como fundamento da Constituição, defere-se ao sujeito a responsabilidade de integrar (ou ser tomado em consideração) e influir nos processos de formação de normas que lhes digam respeito, tendo as provas papel primordial nesse mister.

Se, ao invocar um direito, precisa-se demonstrar que à hipótese há uma gama de elementos caracterizadores a ensejar a incidência normativa, e estes só o são após provados (daí a intersecção e interdependência entre fato e Direito), não há como afastar ou cindir o direito probatório – e em nenhum de seus estágios (ou acepções) dentro do processo, i.é, o ato de provar, meio de prova e sua valoração – , do direito material, nem lhe negligenciar o devido processo legal subjacente.

No processo, portanto, a premissa sobre a prova deve ser que o fato passado já foi e não volta mais. O que se tem é interpretação deles (e não sem eles), transmitida na e pela linguagem, em constante (re)construção[8]. No entremeio do turbilhão desses eventos, segundo as argumentações das partes, sempre com a pretensão de demonstrar o encontro com a norma (também interpretada) invocada, a prova assume o papel de reconectá-los. Soma-se a isso um complicador próprio da natureza do processo, qual seja, a tensão de se manter os olhos no passado, lidar com a fluidez e movimento contínuo para o futuro (ou do presente que se torna passado) e, por fim, a necessidade de se decidir um caso à luz do Direito.  Resume-se essa implicação: assim como os fatos não só são puros neles mesmos, os direitos não estão pré-dados (ou incrustados) na Lei, antes, ambos, pressupõem-se mutuamente e têm no processo sua condição de possibilidade[9].

Por isso, tão curial é a delimitação do objeto litigioso, o (in)deferimento das provas que se fazem imprescindíveis a tal mister e o respeito às regras (materiais e processuais) probatórias pertinentes, sempre com o protagonismo das partes, confiando no Juiz o papel de árbitro, para exercer, fundamentadamente, o controle daquilo que seja relevante à luz das argumentações deduzidas pelos utentes.

Sob essa perspectiva, a célebre (e infeliz) (des)assertiva que o juiz é o verdadeiro destinatário da prova não pode ser compreendida como uma carta coringa, que lhe confira a possibilidade de distorcer fato e regras legais, para fazer valer seu livre convencimento. Afinal de contas, aquilo que o Direito e os remetentes (partes) dizem importa (e muito).

Ao revés, a defesa irrestrita da discricionariedade na seleção, modus operandi e valoração da prova dizem respeito ao próprio pré-juízo ou pré-conceito que o Magistrado já possui e pode nele se enclausurar. Isto é, está encartado naquele ranço "decido primeiro e fundamento depois" (STRECK), no sentido de que a pré-compreensão havida a respeito do caso já é a própria resposta a ser dada, independentemente do contraditório dos autos, tendo as provas mero caráter retórico (ou ilusório – LUHMAN[10]) de corroborar aquilo já pré-julgado e sendo relevantes somente aqueles elementos confirmadores de convicções íntimas.

(Nessa altura, registra-se, aos alarmistas de plantão, isso não implica paralisia cerebral do Magistrado, pois, como se disse, inexiste neutralidade, isto é, antes de tudo há sempre um pré-compreendido condicionante, e o interpretar é próprio do modo de ser, limitado, porém, pela e na linguagem (e tempo) jurídica.)

Daí advém a responsabilidade de o Juiz não se cegar pelos seus preconceitos (GUNTHER[11]), porquanto, mesmo diante de um problema que lhe seja familiar (ou que se identifique), cada caso é único, cujos elementos fáticos diferenciadores podem ensejar, igualmente, aplicação de norma distinta ou, ainda, uma norma inicialmente cogitada, mas com atribuição de sentido não antevista. Ou seja, esses preconceitos devem servir, tão somente, como condição de possibilidade para compreensão do caso decidendo, os quais deverão estar submetidos e predispostos para, no transcurso do processo, sofrerem (re)ajustes segundo as pretensões normativas que vão se formando. E como isso se dá em virtude do mencionado entrelaçamento (inevitável) entre fato e norma, é imperioso se conter na antecipação de respostas definitivas, embora provisoriamente sempre estejam presentes quando da seleção desses elementos relevantes, ainda que inconscientemente. Do contrário, a má condução na colheita pode conduzir na injusta derrocada para uma das partes.

Nisso, reside a importância de o Juiz colocar-se como um terceiro[12] que quer compreender o que as partes dizem (sempre em confronto com seu incessante modo de ver no mundo), no sentido de “considerar os diferentes pontos de vista ou os sinais característicos relevantes da situação, ou seja, deixa valer contra mim (ou contra a minha interpretação situacional de necessidade)”[13]. Do contrário, “confiando aos julgadores liberdade para decidirem conforme pensam e segundo a prova que melhor se amolde ao seu pensamento, desde que depois se justifiquem, como se o dever de fundamentação (por mais oneroso que se apresente) impermeabilizasse sozinho o livre atribuir de sentidos”[14] chancelará a possibilidade de os Juízes não assumirem uma verdadeira função jurisdicional, pois, sob essa perspectiva, estarão fazendo qualquer outra coisa que não decidindo o caso à luz do direito aplicável.

A produção da prova pericial é um exemplo importante. Há elementos que dependem de experts, sobre os quais a ciência, segundo seus padrões, pode constar (prováveis) ocorrências e circunstâncias. Pressupondo o seu deferimento inicial, normalmente serão despendidas custas. Após, as partes poderão apresentar quesitos. Ao final disso, todavia, poderia, o Juiz, simplesmente desconsiderá-la por entender que fosse prescindível a comprovar os fatos narrados? A toda evidência, inexiste esse poder, eis que se trata de puro arbítrio capaz de surpreender as partes, à revelia do procedimento previsto no CPC que confere prerrogativas de controle prévio e concomitante, tais como “indeferir quesitos impertinentes” e/ou “formular os quesitos que entender necessários ao esclarecimento da causa (art.465, §5º[15] c.c art. 470, I e II, do NCPC)[16]. Afigura-se relevante essa questão, porquanto, conforme visto, prejulgamento todos possuem, todavia, apresentar-se-á como estorvo a partir do momento que obnubilar seu confronto com o caso atual. E o sintoma dessa doença é exatamente a relativização do conjunto probatório, dialeticamente produzido nos autos, sem que se arque com quaisquer ônus[17]. Afinal de contas, motivo se ajeita para tudo, especialmente quando se pretende confirmar a própria convicção.

Outro exemplo prático é a produção prova testemunhal realizada em audiência. Um cuidado especial a mais se exige, uma vez sua (maior) suscetibilidade inerente a fatores de caráter motivacional, cognitiva etc. Igualmente embaraçosa a situação, quando o teor da prova testemunhal é ignorada em sua plenitude, para, em seu lugar, dá-se mais valor a um trecho específico e descontextualizado[18]. Mais uma vez, para além do provável prognóstico da patológica contaminação da imparcialidade, deflui-se a violação ao procedimento previsto, que preveem um modus de neutralização dessas sequelas às quais esse tipo de prova está sujeita (v.g., artigo 459 do NCPC[19]).

Por esse relevante papel da prova dentro do contraditório, a comunidade jurídica deve atentar-se (e lutar para) que o “Princípio” (sic) do livre convencimento (em todas as fases do processo), outorgado pelos (veja, e não “aos”, pois a constituição prevê a separação de poderes e delimita as áreas de atuação) “juízes-deuses”, está morto. Inclusive, práticas performáticas que visam disfarçá-lo sorrateiramente, mediante escroques ou álibis retóricos não controláveis. De outro modo, estando a questão intimamente ligada à temática da verdade, sob a perspectiva paradigmática (STRECK[20]), urge revistar a crença em técnicas de extração ou acoplamento de verdades, as quais pretensamente poderiam demonstrá-la antecipada e rapidamente (o que não é sinônimo de efetiva), para passar a se atentar ao caso concreto que deve ser decido.

Na linha defendida por STRECK em sua quatrologia[21], é preciso que os Tribunais, especialmente o STJ[22], percebam (e revejam) que pouco importa fosse/seja essa (execrável) postura avalizada no passado sobre o Direito Probatório (em toda sua extensão). Não é mais possível dar continuidade a práticas passadas, quando estas estão fundadas em premissas ditatoriais, uma vez que uma mentira (precedente) contada diversas vezes (jurisprudência) não se torna verdade (sob a ótica da resposta adequada ao Direito).

Igualmente, na linha de autorresponsabilização das partes (STRECK[23]), por implicação da diretriz da Constituição, necessário apostar nelas como condutoras de seu destino, e no Juiz como guardião da Lei. Sob outro giro, o papel do Juiz não é teorizar sobre o direito deduzido[24], em termos abstratos e metalinguisticamente, mas decidir quem tem ou não direito de acordo com as regras de direito material e processual aplicáveis. E como a própria "lei" não representa um ente onipresente e onipotente, e nem questões de fato podem ser cindidas das de direito, a individualidade do caso decidendo, reconectado ou reconstruída pelas provas, não podem ser prescindidos.

Ao final, reforça-se: sem fatos não há Direito. Sem processo também não. E não há só fatos para o Direito. Mas há, também, Direito para os fatos. Assim, metaforicamente conclui-se: o bater de asas de uma borboleta na produção probatória pode produzir um furacão na aplicação das regras relativas ao contraditório, fundamentação da decisão e, especialmente, ao direito material aplicável[25].


[1] Lúcio Delfino e Ziel Ferreira Lopes parecem entender pela existência de duas vias que se excluem, uma corrente que se opõe a postura ativa por comprometer a imparcialidade, e outra que aposta no ativismo como forma de descoberta da verdade (STRECK, FONSECA COSTA, KAHNEMAN E TVERSKY: todos contra o ativismo judicial probatório de Michele Taruffo. in: http://www.luciodelfino.com.br/enviados/2016618105337.pdf. Acesso em Jul/2017). Entre elas, penso que a primeira, sem dúvida, apresenta as melhores razões, na mesma linha defendida pelos autores, a partir da CHD e sua apropriação hermenêutica da argumentação dogmática e científica. Todavia, ainda não tenho um posicionamento sobre a possibilidade de uma terceira via, desde que esta readequasse a norma à Constituição (declaração de nulidade sem redução de texto, v.g), atendendo a seguinte premissa: “significa justiça, quando esta é definida como imparcialidade ou equidade dos processos de atribuições de direitos e obrigações, encargos e benefícios”. (DWORKIN, Ronald. Levando o direito à sério. p.ix). De qualquer forma, eventual aprofundamento da pesquisa fugiria ao escopo do presente, em que se visa ao estudo específico das implicações da alteração da redação do art.371 do CPC.

[2] Assim como Lúcio Delfino e Ziel Ferreira Lopes (op. cit) parte da crítica hermenêutica para combater o ativismo probatório, especialmente consubstanciada nas razões de STRECK (“Processo Judicial como Espelho da Realidade? Notas Hermenêuticas à Teoria da Verdade em Michele Taruffo”. In: file:///C:/Users/User/Downloads/39384-161413-1-PB%20(1).pdf)  – que, também, lança mão de argumentos pragmáticos, quando aduz “Se a realidade é indiferente, porque não confiar nas partes para busca-la?” –, porém, a partir de uma perspectiva das próprias normas vigentes.

[3] A exigência de uma compreensão que, passo a passo, vai ampliando o horizonte original do preconceito e que se aproxima do ideal de uma fusão original com o sempre presente horizonte transmitido pela tradição (…)(KLAUS, Gunther. Teoria da argumentação da argumentação no Direito e na Moral: justificação e aplicação. Rio de Janeiro: Forense, 2011, p.180)  

[4] Sendo mais incisivo na crítica hermenêutica sobre a forma de se decidir “conforme sua consciência”,  Lúcio Delfino escancara essa patologia do Judiciário: “A verdade é que o “princípio” do livre convencimento motivado não se sustenta em um sistema normativo como o novo CPC, que aposta suas fichas no contraditório como garantia de influência e não surpresa e, por isso, alimenta esforços para se ajustar ao paradigma da intersubjetividade, em que o processo é encarado como um locus normativamente condutor de uma comunidade de trabalho na qual todos os sujeitos processuais atuam em viés interdependente e auxiliar, com responsabilidade na construção e efetivação dos provimentos judiciais.” (A expulsão do livre convencimento motivado do Novo CPC e os motivos pelos quais a razão está com os hermeneutas. In: http://justificando.cartacapital.com.br/2015/04/13/a-expulsao-do-livre-convencimento-motivado-do-novo-cpc-e-os-motivos-pelos-quais-a-razao-esta-com-os-hermeneutas/. Acesso em Jul/2017)

[5] COELHO, André. Dworkin E Gadamer: Qual Conexão? in: http://www.nexos.ufsc.br/index.php/peri/article/viewFile/905/408

[6] “No campo jurídico, a revolução copernicana do direito público mudou o centro gravitacional do direito: não mais os códigos do direito privado, mas as Constituições é que exercem, agora, a função capilarizadora da ordem jurídica.” (STRECK. Lênio. As Recepções Teóricas Inadequadas Em Terrae Brasilis. In: http://revistaeletronicardfd.unibrasil.com.br/index.php/rdfd/article/view/53/52. Acesso em jul/2017) Ver também: OLIVEIRA, Marcelo Andrade Cattoni. Direito, Política e Filosofia: contribuições para uma teoria discursiva da constituição democrática no marco do patriotismo constitucional. Rio de Janeiro: Lúmen Juis, 2007, p.136-153.

[7] STRECK. Lênio. As Recepções Teóricas Inadequadas Em Terrae Brasilis. In: http://revistaeletronicardfd.unibrasil.com.br/index.php/rdfd/article/view/53/52 (Acesso em jul/2017)

[8] “A partir de Gadamer, não há cisão entre interpretar e aplicar. Quando interpreto – porque antes compreendo – estou já sempre aplicando. Não interpreto in abstrato. De uns tempos para cá, tornou-se lugar comum repetir essa máxima de Gadamer: interpretar é aplicar” (STRECK, Lênio: “Processo Judicial como Espelho da Realidade? Notas Hermenêuticas à Teoria da Verdade em Michele Taruffo”. In: file:///C:/Users/User/Downloads/39384-161413-1-PB%20(1).pdf)

[9] A resposta correta já vem implicada numa adequação procedimental, à medida que o devido processo também é um direito. Muitas de suas supostas “limitações epistêmicas” (ônus da prova, presunções, prazos e etc.) são, com efeito, sua condição de possibilidade, na medida em que “existencializam” o procedimento judicial. Nessa contingência não deixa de haver verdade, sem necessário apelo a uma dimensão ideal (a pesquisa científica) que flerta com a tecnocracia no direito. (idem, ibidem)

[10] Em citação indireta, Klaus Gunther (op. cit) explicita a função da argumentação de adequação para aplicação das normas vigentes, segundo a visão de Luhman, no seguinte sentido: “As bases internas para estabelecer uma norma de decisão para o caso isolado são apenas uma questão retórica jurídica.”

[11] Em seu esforço para corroborar sua tese da necessidade da cisão discursiva, utiliza, como reforço argumentativo, sua interpretação de Gadamer, no seguinte sentido: “A experiência estética, do ponto de vista da finitude, significa, porém, que continua sendo igualmente impossível que o processo seja conclusivo, porque nunca conseguiremos tornar-nos plenamente transparentes a nós mesmos.” (op. cit., p.182). Depois, conclui, de acordo com sua teoria, que “Só conseguiremos descobrir quais são todos os elementos objetivamente determinantes em uma situação, se orientarmos a aplicação dos nossos preconceitos pelos critérios da integralidade e da adequação, que garantem a imparcialidade.” (op. cit., p.187).

[12] Nos termos propostos por Lúcio Delfino e Ziel Ferreira Lopes: Daí a pequena adaptação por nós proposta: o juiz que exerce iniciativa probatória, independentemente das suas intenções, atua como se parte fosse, sem imparcialidade objetiva (impartialidade, terceiridade), determinando provas cujo resultado tem aptidão exclusiva de sempre beneficiar aquele que tem sobre suas costas o ônus da prova. (op. cit.)

[13] GUNTHER, Klaus. op. cit.,p. 185.

[14]http://justificando.cartacapital.com.br/2015/04/13/a-expulsao-do-livre-convencimento-motivado-do-novo-cpc-e-os-motivos-pelos-quais-a-razao-esta-com-os-hermeneutas/

[15] § 5o Quando a perícia for inconclusiva ou deficiente, o juiz poderá reduzir a remuneração inicialmente arbitrada para o trabalho.

[16] Art. 470.  Incumbe ao juiz:

I - indeferir quesitos impertinentes;

II - formular os quesitos que entender necessários ao esclarecimento da causa.

[17] Embora o STJ tenha jurisprudência refratária sobre a admissão de Resp. para discussão a respeito de prova, colhem-se alguns precedentes em que a Corte abre os olhos para a evidente questão jurídica passível de se verificar, não construindo, por assim dizer, “mera rediscussão do conjunta probatório”, senão vejamos um exemplo: ”O juiz não está adstrito às conclusões do laudo oficial, como corretamente consignado na decisão recorrida. Não se pode, todavia, concluir, com base nessa premissa, que o laudo produzido por perito designado pelo juiz possa ser totalmente descartado, por ser considerado nulo, e serem utilizados outros dados constantes do processo, porquanto, se assim proceder, o juiz estará se substituindo ao perito, julgando com base em conhecimento pessoal dos fatos, adotando a tese de uma das partes, ou pela média dos valores apresentados nos laudos dos assistentes técnicos (STJ, REsp 1.298.315/MG, rel. Min. HUMBERTO MARTINS, 2.ª T., j. 2-10-2012, DJe 10-10-2012).”

[18] Sob a lógica da argumentação, há o seguinte ônus: “esgotamento das possibilidades de significado se situa, nesse caso, de novo sob a pergunta-guia: “Por que estes dados e não outros?”, isto é, também no caso de contestarmos uma afirmação de relevância com argumento de que o sinalo característico da descrição situacional não se enquadra, ou se enquadra de outra maneira, no termo da norma, deveremos recorrer à descrição situacional ampliada.” (op. cit.). Para nós, interessa a questão sob o seguinte sentido: em que medida, dentro das regras do processo, da argumentação das partes e das pretensões normativas em jogo, o Juiz deve conduzir e valorar a prova produzida.

[19] Art. 459.  As perguntas serão formuladas pelas partes diretamente à testemunha, começando pela que a arrolou, não admitindo o juiz aquelas que puderem induzir a resposta, não tiverem relação com as questões de fato objeto da atividade probatória ou importarem repetição de outra já respondida.

[20] op. cit.

[21] Daí a diferença entre pré-compreensões autênticas, enquanto condições de possibilidade de avanço na construção histórica de sentido, e meros pré-conceitos arraigados, inautênticos, que obstaculizam, não apenas o conhecer, mas o pensar, obstruindo o aprendizado histórico de construção do sentido da verdade, mas também do justo, do correto e mesmo do belo em sociedade. Não problematizar ou se apropriar reflexivamente de nossas próprias pré-compreensões a respeito de que seja o papel do Judiciário pode levar à reprodução, contra legem, de preconceitos arraigados e inautênticos à luz das novas e exigências legais. (Streck ANEXO: COMPLEMENTO DA QUATROLOGIA SOBRE “PRECEDENTESNO BRASIL)

[22] “(...) no nosso sistema processual o magistrado é o destinatário da prova, cabendo-lhe,  por força do artigo 131 do Código de Processo Civil, apreciar   livremente  as  provas   apresentadas, devendo apenas fundamentar os motivos que lhe formaram o convencimento.” (AgInt no AREsp 808081/DF, rel. min. RAUL ARAÚJO, DJe de 01/06/2017).

“O col. Tribunal a quo, à luz dos princípios da livre  apreciação  da  prova  e do livre convencimento motivado, bem como  mediante  análise  soberana  do contexto fático-probatório dos autos,  entendeu  que  as  provas  colhidas  demonstraram,  de forma inequívoca  e  robusta,  que a posse que os autores exerciam sobre o referido imóvel rural foi esbulhada pelos réus. A modificação de tal entendimento  demandaria o revolvimento de suporte fático-probatório dos autos, o que encontra óbice na Súmula 7/STJ. (...) (AgInt no AREsp 719.933/MG, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 25/04/2017, DJe 15/05/2017)

[23] op. cit.

[24] A despeito de que “isso não exime os juristas de estabilizar conceitos e guardar coerência na sua interrelação.” – conforme Lúcio Delfino e Ziel Ferreira Lopes (op.cit)

[25] Parafraseado André Coelho (op. cit.).


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROCHA, Antonio Carlos Sirqueira. Discricionariedade no novo CPC? Das provas como direito das partes. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5167, 24 ago. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/59532. Acesso em: 7 maio 2024.