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Corte de energia elétrica por falta de pagamento.

Prática abusiva. Código do Consumidor

Corte de energia elétrica por falta de pagamento. Prática abusiva. Código do Consumidor

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Sumário: 1. O fornecimento de energia elétrica como serviço essencial. 2. A qualidade do serviço público e o atendimento ao consumidor. 3. A teoria da lesão e o direito do consumidor a reparação por danos praticados pelo fornecedor. 4.Da abusividade das práticas comerciais nas relações de consumo. 5. O corte de energia e o constrangimento do consumidor. 6. A antinomia entre a norma do consumidor e outra norma jurídica. 7. O direito fundamental do consumidor e o princípio da proibição de retrocesso. 8. A prática abusiva do corte de serviço essencial. 9. Conclusão.


1. O fornecimento de energia elétrica como serviço essencial

Os serviços de energia elétrica são, sem dúvida, relações de consumo, considerado fornecedor a empresa de energia elétrica, na forma do art. 3º do CDC. e os usuários são consumidores na forma do art. 2 e parágrafo único da norma consumerista.

O serviço de energia é serviço público essencial, subordinado ao princípio da continuidade, na forma do art. 22 do Código do Consumidor, da mesma forma que o serviço de telefonia e água.(1)

Enuncia o art.22 e seu parágrafo único do CDC , que " Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais contínuos"

Cumpre registrar que a Portaria nº 03/99 da Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça (publicada em 19/0399), reconheceu como serviço essencial o fornecimento de água energia elétrica e telefonia.(2)


2. A qualidade do serviço público e o atendimento ao consumidor.

Verifica-se em muitos casos que o consumidor não efetua o pagamento não porque não quer, mas porque há situações imprevisíveis que foge a esfera de sua vontade, tais como o atraso no salário, problemas de saúde, etc...inviabilizando o pagamento da conta de energia elétrica.

Arrimado a este fato existem hipóteses de débitos indevidos praticados pelo fornecedor, que com a ameaça de desligamento, impossibilita o direito de revisão.

O art. 6, X do CDC. consigna que é direito básico do consumidor "a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral".

O art. 4º do CDC. estabelece a política nacional das relações de consumo, cujo objetivo é atender as necessidades dos consumidores, respeitando à sua dignidade, saúde e segurança, providenciando a melhoria de sua qualidade de vida.

Prescreve ainda a legislação consumerista, a ação governamental no sentido de proteger efetivamente o consumidor, garantindo que os produtos e serviços possuam padrões adequados de qualidade, segurança, durabilidade e desempenho.(art.4, II, d); devendo o Estado ainda providenciar a "harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (artigo 170, da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores;"(art.4.III).

O art. 175, parágrafo único, inciso IV da Constituição Federal estabelece:

"Art. 175 - Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos.

Parágrafo único - A lei disporá sobre:

IV - a obrigação de manter serviço adequado."

A lei 8.987/95 que dispõe sobre o regime de concessão e permissão de serviços públicos, estabelece no art. 6, que "Toda concessão ou permissão pressupõe a prestação de serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários", afirmando no § 1º o conceito de serviço adequado como sendo "o que satisfaz as condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas.(3)

Por fim registra-se que o art. 4, VII do CDC. imputa ao Estado o dever da melhoria dos serviços públicos.


3. A teoria da lesão e o direito do consumidor a reparação por danos praticados pelo fornecedor.

O Código do Consumidor assegura ao consumidor, o direito de reparação pelos danos sofridos. Estabelece o art. 6, VI do CDC:

Art. 6º - São direitos básicos do consumidor:

VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos;

No mesmo sentido estabelece o art. 22, parágrafo único do CDC,:

"Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados na forma prevista neste Código" .

Antônio Herman Benjamin conclui ao comentar o parágrafo único do art.22 do CDC. que: "Uma vez que a Administração não esteja cumprindo as quatro obrigações básicas enumeradas pelo caput do art.22 (adequação, eficiência, segurança e continuidade), o consumidor é legitimado para, em juízo, exigir que sejam as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las. Mas não é o bastante para satisfazer o consumidor, uma vez que a Administração é coagida a cumprir os seus deveres apenas a partir de decisão, ou seja, para o futuro, por isso mesmo, impõe o ressarcimento dos prejuízos sofridos pelos consumidores".(4)

Diante dos conflitos de consumo, que surgem a cada dia entre o fornecedor e o consumidor, verifica-se o desequilíbrio entre as partes, em face de uma prática comercial abusiva ditada pela parte mais forte, demonstrando a manifesta vantagem excessiva. Surge assim a necessidade do intervencionismo estatal, permitindo inclusive a revisão das cláusulas contratuais pactuadas em razão do abuso, que implica lesão ao direito do consumidor.

Demonstrado está que as práticas abusivas ocasionam um desequilíbrio na relação de consumo, podendo ocasionar uma lesão à parte mais desfavorecida.

Assim, o poderio econômico da parte mais forte faz evoluir o desequilíbrio da força contratual, que dita condições, faz prevalecer interesses egoístas, contrata sem combate, mascarando os privilégios e assegurando a eficiência e a rentabilidade.(5)

É cediço que, envolvendo relação de consumo, os princípios contratuais clássicos são mitigados e temperados pelo princípio da onerosidade excessiva, também conhecido pela máxima romana cláusula rebus sic stantibus-imprevisibilidade, (Teoria da imprevisão) e pela Teoria da lesão.(6)

Se existe uma desvantagem exagerada, fica caracterizado para o consumidor uma lesão (laesio), sendo este tema abordado pela doutrina como Teoria da Lesão.

A lesão é vício do negócio jurídico em grau de igualdade do dolo, erro ou vício do negócio jurídico, sendo certo que o fato de a parte contratar não implica que a mesma não possa discutir o contrato, buscando a revisão de cláusulas com onerosidade excessiva.(7)

Por isso, no caso da manifesta vantagem excessiva a doutrina denomina este fato de dolo de aproveitamento,(8) que é vedado pelo Código de Defesa do Consumidor, não prevalecendo em relação à parte mais vulnerável.

A Lei do Consumidor consagrou a Teoria da Lesão, bastando para a sua configuração o fato superveniente arrimado ao fato da onerosidade excessiva, concretizando assim a lesão ao direito do consumidor.

No magistério de Caio Mário, o instituto da lesão continua presente na proteção a parte contratual mais fraca, "e tudo indica que veio para ficar"(9)

Com acerto, o fato do fornecedor efetuar o desligamento de energia elétrica do consumidor inadimplente, ocasiona uma lesão ao direito do consumidor, dificultando o direito de acesso a justiça, para discussão do débito indevido, consolidando em vantagem manifesta excessiva para o fornecedor (autotutela).


4.Da abusividade das práticas comerciais nas relações de consumo

O CDC. consagra a ação governamental de coibição e repressão eficiente de todos os abusos praticados no mercado do consumo(art.4, VI).

Cada dia torna-se mais comum reclamações contra o fornecedor pelos serviços prestados.

Não são raras as vezes que o consumidor/usuário é surpreendido com um débito indevido em sua conta, e a solução outorgada pelo fornecedor consiste na orientação do consumidor pagar a conta indevida para após discutir, sob pena de corte do fornecimento.

Prescreve o art. 39, inciso IV do CDC. que prevalecer-se da fraqueza ou ignorância do consumidor, tendo em vista sua idade, saúde, conhecimento ou condição social, para impingir-lhe seus produtos ou serviços, constitui prática abusiva repudiado pela norma do consumidor.

O Código de Defesa do Consumidor traz preceito expresso a respeito do Princípio da Boa-fé (art. 4, inciso III da norma do consumidor), concretizando assim o Princípio da Boa-fé Objetiva.

No dizer da doutrinadora Cláudia Lima Marques, "Boa-fé significa aqui um nível mínimo e objetivo de cuidados, de respeito e de tratamento leal com a pessoa do parceiro contratual e seus dependentes. Este patamar de lealdade, cooperação informação e cuidados com o patrimônio e a pessoa do consumidor é imposto por norma legal, tendo em vista a aversão do direito ao abuso e aos atos abusivos praticados pelo contratante mais forte, o fornecedor, com base na liberdade assegurada pelo princípio da autonomia privada"(10)

O Código do Consumidor, presumindo o consumidor como parte contratual mais fraca, impõe aos fornecedores de serviços no mercado um mínimo de atuação conforme `a boa-fé. O princípio da Boa-fé nas relações de consumo, atua limitando o princípio a autonomia da vontade e combatendo os abusos praticados no mercado.

Há práticas comerciais que ocasionam desequilíbrio na relação contratual atentando contra o patamar mínimo de boa-fé nas relações contratuais de consumo, devendo ser declaradas abusivas tais práticas.

O Código do Consumidor prevê no art. 6, IV, como direito básico do consumidor, a proteção contra cláusulas abusivas. Também prevê, como direito básico do consumidor, no mesmo dispositivo legal, a proteção contra práticas abusivas impostas no fornecimento de produtos e serviços.(11)

Há que se observar que o Código de Defesa do Consumidor enumera no art. 39 uma lista de práticas abusivas, sendo certo que a lista não é taxativa, admitindo outras práticas comerciais como sendo abusivas, desde que figure o significativo desequilíbrio entre os direitos consumidor, a manifesta vantagem e a ofensa ao princípio da boa-fé objetiva.

Infere-se que sem boa-fé, princípio que norteia o sistema, a prática é abusiva.


5. O corte de energia e o constrangimento do consumidor

Conforme leciona Hélio Gama, a "Constituição Federal traz dispositivo de proteção da honra da pessoa, enquanto o Código Penal comina crime ao ato de exacerbação no exercício arbitrário das próprias razões." Assevera Hélio Gama, que "era comum submeter-se os devedores à execração pública ou constrange-lo até pagarem os seus débitos"; afiançando que certos credores se aproveitam dos mecanismos de cobrança, "para aviltar as dignidades dos seus devedores".(12)

O Código de Defesa do Consumidor contudo, veda a prática do constrangimento na cobrança de dívidas, determinando que o consumidor não pode ser submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça e nem exposto a ridículo, pela cobrança de dívida.

Consagra o art. 42 do CDC.:

"Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça."

Com se sabe, a lei do Consumidor repudiou a cobrança vexatória a tal ponto de tipificar como criminosa a conduta que expõe o consumidor a constrangimento em razão de dívida.

Estabelece o art. 71 do CDC.:

"Art. 71 - Utilizar, na cobrança de dívidas, de ameaça, coação, constrangimento físico ou moral, afirmações falsas, incorretas ou enganosas ou de qualquer outro procedimento que exponha o consumidor, injustificadamente, a ridículo ou interfira com seu trabalho, descanso ou lazer:

Pena - Detenção de 3 (três) meses a 1 (um) ano e multa."

Vale transcrever as lições do Prof. Hélio `a respeito do conceito de constrangimento, sustentando in verbis:

Ao nosso ver, o constrangimento de que fala o CDC é aquela imposição de situações que venham a atormentar o devedor, fazendo com que as agruras da cobrança que sofra se transformem em condenação adicional ou acessória.(13)

Seria o caso de indagarmos: Será que a cobrança do fornecedor de energia elétrica que ameaça de interromper o serviço público essencial do usuário/consumidor inadimplente, não configura para o consumidor um constrangimento ? Será que esta cobrança não dificulta o acesso a Justiça ?

O fornecimento de energia é serviço essencial. A sua interrupção acarreta o direito de o consumidor postular em juízo, buscando que se condene a Administração a fornecê-la. Importa assinalar que tal medida judicial tem em mira a defesa de um direito básico do consumidor, a ser observado, quando do fornecimento de produtos e serviços (relação de consumo), a teor do art.6º, VI, X e art. 22 do Código de Defesa do Consumidor:


6. A antinomia entre a norma do consumidor e outra norma jurídica.

Cumpre registrar a priori que a relação de consumo é prevista no Código do Consumidor como norma jurídica especial, que trata dos mecanismos de equilíbrio no mercado de consumo.

A bem da verdade, o Código do Consumidor não é uma simples norma jurídica e sim um sistema jurídico, contendo várias normas de direito material civil e penal, além do direito instrumental.

No magistério de Maria Helena Diniz, "sistema jurídico é o resultado de uma atividade instauradora que congrega os elementos do direito", estabelecendo as relações entre eles, projetando-se numa dimensão significativa. "O sistema jurídico não é, portanto, uma construção arbitrária"(14)

Nesse sentido surge a ponderação: Como entender a norma prevista no art. 22 do CDC que estabelece que os serviços públicos essenciais deverão ser prestados de forma contínua e a norma posterior que autoriza o corte do fornecimento do serviço essencial por falta de pagamento?

Estabelece o art. 22 do CDC:

"Art. 22 - Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos."

A lei nº 8987/95, que dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos estabelece no art. 6, § 3º:

"Art. 6º Toda concessão ou permissão pressupõe a prestação de serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários, conforme estabelecido nesta lei, nas normas pertinentes e no respectivo contrato.

§ 3º Não se caracteriza como descontinuidade do serviço a sua interrupção em situação de emergência ou após prévio aviso, quando:

II - por inadimplemento do usuário, considerado o interesse da coletividade".

A Portaria nº 466 de 12 de novembro de 1997 do DNAEE (Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica, atual Agência Nacional de Energia Elétrica), estabelece diversas situações em que o concessionário poderá suspender o fornecimento de energia elétrica, com destaque para o inciso I - art.76- " por atraso no pagamento da conta após o decurso de 15(quinze) dias de seu vencimento mediante prévia comunicação do consumidor".

Da análise dos textos legais seria o caso de interpretarmos que a lei 8.987/95 derrogou a lei 8.078/90(Código do Consumidor) no sentido que o serviço essencial pode ser interrompido ? Seria o caso de aplicarmos o critério cronológico de resolução de conflitos de normas: lex posteriori revoga legis a priori ?

Salvo melhor juízo, o critério para resolução deste possível conflito não traduz neste critério cronológico. É certo que ambas as normas jurídicas pertencem a mesma hierarquia e, que a lei da concessão do serviço público é posterior a lei do consumidor. Também é certo que a lei das concessões foi criada atendendo o dispositivo normativo constitucional previsto no art. 175 que prescreve:

"Art. 175 - Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos.

Parágrafo único - A lei disporá sobre:

I - o regime das empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos, o caráter especial de seu contrato e de sua prorrogação, bem como as condições de caducidade, fiscalização e rescisão da concessão ou permissão;

II - os direitos dos usuários;

III - política tarifária;

IV - a obrigação de manter serviço adequado."

Não vislumbramos no texto constitucional autorização as empresas concessionárias e permissionárias para efetuar o desligamento do serviço essencial. Ao contrário, a Carta Magna prescreve que a lei deverá dispor sobre os direitos dos usuários e a obrigação de manter os serviços adequados, fato este não verificado na atualidade.

Destarte, em caso de antinomia entre o critério de especialidade(Código do Consumidor) e o cronológico(lei das concessão do serviço público) não aplica-se o critério lex posteriori revoga legis a priori, e sim o critério lex posterior generalis non derrogat priori speciali".

Há que se atentar que a norma do consumidor como norma especial, contém o sistema jurídico do equilíbrio da relação de consumo, não podendo ser revogada por norma posterior que regula a concessão e permissão do serviço público, e não o direito do usuário/consumidor.


7. O direito fundamental do consumidor e o princípio da proibição de retrocesso

É cediço que o Código do Consumidor surgiu atendendo a um comando constitucional, estabelecendo um sistema de defesa do consumidor. Conforme já registrado anteriormente, se há relação de consumo, os direitos dos usuários/consumidores são regulados e tutelados pelo Código do Consumidor.

O art. 1 do CDC. é bem claro ao dispor que o presente Código estabelece normas de proteção e defesa do consumidor, de ordem pública e interesse social, nos termos dos artigos 5º, inciso XXXII, 170, inciso V, da Constituição Federal, e artigo 48 de suas Disposições Transitórias, atendendo assim a política nacional de relação de consumo, que tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria de sua qualidade de vida, bem como a transferência e harmonia das relações de consumo.(art.4 caput).

Com conhecimento jurídico sólido sobre o assunto, o jurista Marcos Maselli Gouvêa afirma que "a defesa do consumidor é uma garantia fundamental prevista no art. 5º, XXXII, e um princípio da ordem econômica, previsto no art. 170, V. "(15)

A Constituição Federal estabelece como princípios fundamentais a dignidade da pessoa humana como um fundamento básico (art. 1, III da C.F.) No art. 170, V da C.F. estabelece:

"Art. 170 - A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

V - defesa do consumidor;

No mesmo sentido, o direito do consumidor está elencado entre os direitos fundamentais da Constituição.

José Geraldo Brito Filomeno esclarece à respeito do art. 1 do CDC, que sua promulgação se deve a "mandamento constitucional expresso. Assim a começar pelo inc. XXXII do art. 5º da mesma Constituição, impõe-se ao Estado promover, na forma da lei, a defesa do consumidor."(16)

O 40º Congresso do Consumidor, realizado em Gramado concluiu que o direito de proteção ao consumidor é cláusula pétrea da Constituição Federal (art. 5, XXXII CF/88).(17)

Conforme demonstrado, o Código do Consumidor erigiu do comando Constitucional, estabelecendo expressamente no art. 1 do CDC. a despeito da norma Constitucional.

Nesse sentido, é correto a premissa, que qualquer norma infra constitucional que ofender os direitos consagrados pelo Código do Consumidor estará ferindo a Constituição e, mutatis mutandis deverá ser declarada como inconstitucional.

Nesta direção estabelece Arruda Alvim:

Garantia constitucional desta magnitude, possui, no mínimo, como efeito imediato e emergente, irradiado da sua condição de princípio geral da atividade econômica do país, conforme erigido em nossa Carta Magna, o condão de inquinar de inconstitucionalidade qualquer norma que possa consistir em óbice à defesa desta figura fundamental das relações de consumo, que é o consumidor.(18)

Sem embargo destas considerações, faz necessário comentar o princípio da proibição do retrocesso em face das garantias fundamentais.

Com efeito o direito do consumidor possui o status de direito constitucional e, com tal, não pode o legislador ordinário fazer regredir o "grau de garantia fundamental" conforme leciona Marcos Gouvêa.(19)

A lei da concessão do serviço público(lei nº 8.987/95) ao afirmar que não se caracteriza como descontinuidade do serviço a sua interrupção "por inadimplemento do usuário, considerado o interesse da coletividade"(art.6, §3º, II), na realidade está praticando o autêntico retrocesso ao direito do consumidor, haja vista que o art. 22 do CDC afirma que os fornecedores de serviço essencial são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes e "contínuos".

Arrimado a este fato acrescente-se que o direito do consumidor possui garantia fundamental na Constituição e que, a interrupção do fornecimento além de causar uma lesão, afeta diretamente a sua dignidade, sem embargo da dificuldade de acesso a Justiça que o dispositivo apresenta, consolidando assim na autotutela do direito do fornecedor.

Admitir a possibilidade do corte de energia elétrica implica em flagrante retrocesso ao direito do consumidor, consagrado a nível constitucional. Por isso o princípio de retrocesso veda que lei posterior possa desconstituir qualquer garantia constitucional. Ainda que lex posteriori estabeleça nesse sentido, a norma deverá ser considerada inconstitucional.

Por tais razões é manifesto a inconstitucionalidade do dispositivo legal previsto no art.6, §3º,II da lei 8.987/95 que autoriza a interrupção de serviço essencial, em razão do princípio da proibição de retrocesso.


8. A prática abusiva do corte de serviço essencial

Recentemente, o Juízo da 8ª Vara de Falências da Capital do Rio de Janeiro concedeu liminar em uma ação coletiva, proposta pelo núcleo de Defesa do Consumidor da Defensoria Pública, determinando a proibição de cortar a luz dos consumidores por falta de pagamento ou mesmo constatação de outras irregularidades.(20)

A ação coletiva foi interposta contra a Light e Cerj, sendo acolhido o argumento da Defensoria Pública, no sentido que o desligamento de energia, pautada na Portaria 466/97 do DNAEE (agora pela Agência Nacional de Energia Elétrica), ferem a Constituição, permitindo a imposição unilateral de dívidas sem observância do devido processo legal além de submeter o consumidor a constrangimento e ameaça na cobrança de dividas, o que é vedado pelo Código de Defesa do Consumidor, exigindo mecanismos legais para a cobrança de créditos.

Em Juiz de Fora/MG, o Ministério Público Estadual, através da Promotoria de Justiça do Consumidor, ingressou com Ação Civil Pública em face da CEMIG. por idêntico fundamento legal, argumentando a ilegalidade do corte de energia elétrica, que constitui prática abusiva, em flagrante desrespeito ao Código de Defesa do Consumidor.

O reconhecimento da ilegalidade do corte em relação ao serviço essencial é patente, a exemplo da sentença da Juíza Aparecida Oliveira, de Anápolis, Goiás, que expressamente considerou o corte ilegal, porque "a água é de necessidade da população, de consumo imprescindível e não pode ser cortada sob nenhum propósito"(21)

O STJ. já se pronunciou à respeito da impossibilidade da interrupção de serviço essencial, in verbis:

"Seu fornecimento é serviço público indispensável, subordinado ao princípio da continuidade, sendo impossível a sua interrupção e muito menos por atraso no seu pagamento"(22)

Desta forma o aresto do E. STJ decidiu por unanimidade que o Fornecimento de água não pode ser interrompido por inadimplência, fundamentando:

"O fornecimento de água, por se tratar de serviço público fundamental, essencial e vital ao ser humano, não pode ser suspenso pelo atraso no pagamento das respectivas tarifas, já que o Poder Público dispõe dos meios cabíveis para a cobrança dos débitos dos usuários".

Para o Ministro Garcia Vieira, relator do processo, "a Companhia Catarinense de Água cometeu um ato reprovável, desumano e ilegal. É ela obrigada a fornecer água à população de maneira adequada, eficiente, segura e contínua e, em caso de atraso por parte do usuário, não poderia cortar o seu fornecimento, expondo o consumidor ao ridículo e ao constrangimento", casos previstos no Código de Defesa do consumidor.

O Ministro Garcia Vieira afirma ainda em seu decisum, que para receber seus créditos, a CASAN deve usar os meios legais próprios, "não podendo fazer justiça privada porque não estamos mais vivendo nessa época e sim no império da lei, e os litígios são compostos pelo Poder Judiciário, e o não pelo particular. A água é bem essencial e indispensável à saúde e higiene da população.

No mesmo sentido, o fornecimento de energia é serviço essencial. A sua interrupção acarreta o direito de o consumidor postular em juízo, buscando que se condene a Administração a fornecê-la, sem prejuízo da condenação do fornecedor pelo dano moral e patrimonial sofrido pelo consumidor .(23)

Importa assinalar que tal medida judicial tem em mira a defesa de um direito básico do consumidor, a ser observado, quando do fornecimento de produtos e serviços (relação de consumo), na forma como prescreve o art.6, X do CDC.(adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral), sem prejuízo da reparação dos danos provocados(a teor do art.6º, VI do CDC. "a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos").

A respeito, claríssima a lição de Mário Aguiar Moura:

"A continuidade dos serviços essenciais significa que devem ser eles prestados de modo permanente sem interrupção, salvo ocorrência de caso fortuito ou força maior que determine sua paralisação passageira. A hipótese é a de o particular já estar recebendo o serviço. Não pode a pessoa jurídica criar descontinuidade. Serviços essenciais são todos os que se tornam indispensáveis para a conservação , preservação da vida, saúde, higiene, educação e trabalho das pessoas. Na época moderna , exemplificativamente, se tornaram essenciais, nas condições de já estarem sendo prestados, o transporte, água, esgoto, fornecimento de eletricidade com estabilidade, linha telefônica, limpeza urbana, etc."(24)

Leciona Mário de Aguiar, que "Uma inovação trazida pela atual Constituição é a extensão do mesmo critério às concessionárias ou permissionárias do serviço público. Assim, no caso dos serviços concedidos de transporte, fornecimento de água, eletricidade etc. as empresas respondem perante terceiro segundo os critérios da responsabilidade sem culpa nas mesmas condições do que ocorre com a pessoa jurídica pública."(25)

O ilustre jurista Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin, comentando o art.22, ressalta o seguinte:

"A segunda inovação importante é a determinação de que os serviços essenciais - e só eles - devem ser contínuos, isto é, não podem ser interrompidos. Cria-se para o consumidor um direito à continuidade do serviço.

Tratando-se de serviço essencial e não estando ele sendo prestado, o consumidor pode postular em juízo que se condene a Administração a fornecê-lo".(26)

Na esteira do entendimento pretoriano, a jurisprudência tem firmado o entendimento que, o corte de fornecimento de energia elétrica é ilegal, conforme julgado da Colenda Quarta Câmara Civil do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina. O r. aresto faz menção ao eminente Desembargador Protásio Leal, afirmando que deve a concessionária aguarda o pronunciamento da Justiça, não podendo exigir de imediato o pagamento do alegado débito sob ameaça de corte de fornecimento de energia elétrica, "sendo o serviço prestado bem indispensável, não pode ser ele suspenso bruscamente sem motivo justificado"(27)

Em idêntica direção, decidiu a Terceira Câmara Civil do Tribunal de Justiça Catarinense, em reexame de sentença de Ação de Mandado de Segurança, pela confirmação da sentença a quo, fundamentando que se "houver débito a cobrança deverá ser feita pela via própria. O que não pode é o usuário ser coagido a pagar o que julga razoavelmente não dever sob o teor de ver interrompido o fornecimento de energia elétrica bem indispensável na vida humana"(28)

Apreciando caso semelhante, assim decidiu a Colendo Tribunal de Justiça do Estado do Paraná:

Ementa: Mandado de segurança. Ato praticado por concessionária de serviço público. Ameaça de corte no fornecimento de energia elétrica, por falta de pagamento de fatura. Segurança concedida. Decisão confirmada. Tratando-se de serviço essencial o fornecimento de energia elétrica, para possibilitar a continuidade da empresa-impetrante, o ato da concessionária, que ameaça cortar tal fornecimento por falta de pagamento da fatura é ilegal e abusivo podendo ser afastado via mandado de segurança"(29)

Com efeito não há justificativas para a prática abusiva do corte de energia elétrica por falta de pagamento por parte do fornecedor de energia na cobrança de dívidas, expondo o consumidor a constrangimento, sendo certo que existem mecanismos legais de cobrança, não sendo possível referendar a autotutela.

Há que se referir que aos Juizes é permitido o controle das cláusulas e práticas abusivas. Destarte, faz-se necessário a providência jurisdicional, em prol dos consumidores para que o direito consagrado no Código do Consumidor, não seja violado, com o corte da energia elétrica que é considerado serviço essencial; coibindo o abuso na cobrança, que deve ser efetuada pelos meios legais em direito admitidos.

Estabelece o art.5º, XXXV, da CF que: "A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito".

Se a lei não pode excluir da apreciação do judiciário a simples ameaça a direito, como admitir-se que o fornecedor de energia elétrica se arrogue o poder de fazer "Justiça com as próprias mãos ?"

Nos casos de inadimplência, portanto, cabe às rés, com resguardo do Princípio da Isonomia, ingressar em Juízo para cobrar quanto lhe é devido. E, até mesmo para pedir ao Juiz que mande interromper o serviço de fornecimento de energia. Porque o Juiz que representa o Estado e diz o direito (jurisdição), pode determinar a providência excepcional em procedimento cautelar, se assim lhe parecer.

Por outro lado, o fornecimento de energia é serviço essencial. A sua interrupção acarreta o direito de o consumidor postular em juízo, buscando que se condene a Administração a fornecê-la. Importa assinalar que tal medida judicial tem em mira a defesa de um direito básico do consumidor, a ser observado, quando do fornecimento de serviços (relação de consumo), a teor do art.6º, VI e X, do Código de Defesa do Consumidor.


9. conclusão

Perfilhando o entendimento expressado, chega-se a conclusão que constitui prática abusiva o corte de energia elétrica por falta de pagamento, sendo vedado o corte de energia por parte do fornecedor, em razão do serviço ser considerado essencial, não prevalecendo a norma que autoriza a interrupção de serviço essencial(art.6, §3º,II da lei 8.987/95), pois a mesma conflita com o código do consumidor, prevalecendo a norma consumerista em razão do princípio da proibição de retrocesso ao invés do princípio lex posteriori revoga legis a priori.


NOTAS

1. Hermam Benjamim afiança que" O Código não disse o que entendia por serviços essenciais. Essencialidade, pelo menos neste ponto, há que ser interpretada em seu sentido vulgar, significando todo serviço público indispensável à vida em comunidade, ou melhor, em uma sociedade de consumo. Incluem-se aí não só os serviços públicos stricto sensu (os de polícia, os de proteção, os de saúde), mas ainda os serviços de utilidade pública (os de transporte coletivo, os de energia elétrica, os de gás, os de telefone, os de correios)..." (grifo nosso). Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin et. al. Comentários ao Código de Proteção ao Consumidor, São Paulo: Saraiva, 1991.p.111.

2. Estabelece a Portaria do Ministério da Justiça no item 3 :" 3. Permitam ao fornecedor de serviço essencial (água, energia elétrica, telefonia) incluir na conta...".

3. Estabelece ainda a lei da Concessão do serviço público que a atualidade do serviço "compreende a modernidade das técnicas do equipamento e das instalações e a sua conservação, bem como a melhoria e expansão do serviço(§2)

4. Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin. op. cit. p. 111

5. Apud. Maria Cecília Nunes Amarante, Justiça ou Equidade nas Relações de consumo. Rio de Janeiro: Lumem Juris. 1998.

No mesmo sentido O Ministro Ruy Rosado de Aguiar Júnior afirma em aresto que "O art. 4º do Código se dirige para o aspecto externo e quer que a intervenção na economia contratual, para a harmonização dos interesses, se dê com base na boa-fé, isto é com a superação dos interesses egoísticos das partes e com a salvaguarda dos princípios constitucionais sobre a ordem econômica através de comportamento fundado na lealdade e na confiança".A Boa fé na relação de Consumo. Revista Direito do Consumidor. v.14. São Paulo: RT, 1995. p.22.

6. A respeito das teorias sobre a base do negócio, em especial o trabalho da doutrina germânica adotando a teoria da base subjetiva do negócio apresentado por PAUL OERTMANN contrapondo a WINDSCHEID, que repudiava a correlação entre a pressuposição e a rebus sic stantibus; a teoria da base objetiva do negócio e a unitária e a teoria moderna de Karl Larenz. Ob. cit. em Luís Renato Ferreira da Silva. Revisão dos contratos : do Código Civil ao Código do Consumidor. Rio de Janeiro: Forense, 1999.p.133-137.

7. Palestra proferida pelo Prof. Silvio Capanema no GAMAJUR em 26/04/99, na Universidade Gama Filho, sobre o tema: "Os princípios Contratuais e a Nova Realidade Econômica".

8. O 40º Congresso Brasileiro de Direito do Consumidor realizado em Gramado(RS), concluiu no item 4 que "O CDC., no art. 39 V adota como causa de revisão do contrato(art.6,V) a lesão objetiva, prescindindo do estado de necessidade do consumidor ou do dolo de aproveitamento do fornecedor." Conclusões aprovadas no 40º Congresso Brasileiro de Direito do Consumidor realizado entre 8 a 11 de março de 1988 sob o título: "A Sociedade de serviços e a proteção do Consumidor no Mercado Global" - Gramado(RS), painel V, Serviços Bancários e Financeiros, item 4, aprovada por maioria.

9. Apud Caio Mário da Silva Pereira. Lesão nos contratos.6ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p.213.

10. Claudia Lima Marques, Congresso Mineiro de Direito do Consumidor, sobre Saúde e Qualidade-Belo Horizonte-MG.realizado em 15 a 17 de maio de 1996. p.32.

11. Estabelece o Código do Consumidor : Art. 6º - São direitos básicos do consumidor:

IV - a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços;

Sobre práticas abusivas ver art. 39 do CDC.

12. Hélio Zaghetto Gama. Curso de Direito do Consumidor. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p.91.

Afirma ainda Hélio Gama, que os fornecedores, quando são cobrados, sabem muito bem como contornar as cobranças e, até mesmo utilizam-se de protelações legais para deixar de pagar as suas dívidas. Já quando são credores submetem os consumidores a constrangimento. op. cit.p. 91..

13. op. cit. p. 92.

14. Maria Helena Diniz. Conflitos de Normas.2ª ed. São Paulo: Saraiva, 1996. p.9.

15. Marcos Maselli Gouvêa. Mestrando da UERJ e Promotor de Justiça da Coordenadoria de Defesa do Consumidor do Rio de Janeiro. trabalho jurídico apresentado nos autos da ação nº 98.001.047233-1. 5ª Vara de Falência e Concordatas da Comarca da Capital do R.J. 10/08/99.

16. José Geraldo Brito Filomeno et. al. Código brasileiro de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 1997.p.21.

17. 40º Congresso do Consumidor, op cit. painel I Mercosul, Privatização. Concorrência e Serviços Públicos. item 8, aprovado por unanimidade.

A Constituição Federal assegura no art. 5, XXXII que o "Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor", assegurando ainda no art.60, §4º, IV, os direitos e garantia individuais como cláusula pétrea.

18. Código do consumidor comentado. Arruda Alvim... et al. 2ª ed. São Paulo: RT, 1995. p.15.

19. Nesse sentido o Parecer de Marcos Maselli Gouvêa é incisivo ao comentar o princípio da proibição de retrocesso afirmando: "Em segundo lugar, há que se observar, na seara das garantias fundamentais, o princípio da proibição do retrocesso. Com efeito, se o legislador ordinário, ao elaborar a Lei nº 7.347/85 e a Lei nº 8.078/90, estabeleceu a legitimidade mesmo para os que não são associados, não pode o legislador teratológico das medidas provisórias fazer regredir o grau da garantia." op. cit.

20. "Light e Cerj não podem cortar fornecimento de luz".Jornal do Comércio. Caderno B, Direito e Justiça. Rio de Janeiro: 15/12/99. p.8.

21. publicada na Gazeta Mercantil, de 9.3.92.

22. Apud decisão unânime da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, que rejeitou o recurso especial da Companhia Catarinense de Águas e Saneamento - CASAN.Proc. RESP.201112

23. Á respeito, o doutrinador, Benjamim leciona ao comentar o parágrafo único do art.22 do CDC que: "o consumidor é legitimado para, em juízo, exigir que sejam as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las. Mas não é o bastante para satisfazer o consumidor, uma vez que a Administração é coagida a cumprir os seus deveres apenas a partir de decisão, ou seja, para o futuro, por isso mesmo, impõe o ressarcimento dos prejuízos sofridos pelos consumidores" Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin et. al. Comentários ao Código de Proteção ao Consumidor, São Paulo: Saraiva, 1991.p.111.

24. Mário Aguiar Moura. O Poder Público como fornecedor perante o Código de Defesa do Consumidor, Repertório de jurisprudência IOB, 2ª quinzena de abril/92, p.17.

25. Afiança ainda Mário de Aguiar, que "Dentro da obrigatoriedade de serem tais serviços contínuos e permanentes, vem à baila a regra administrativa de corte de fornecimento, v.g., de água, eletricidade, linha telefônica, no caso de o usuário deixar de pagar as taxas impostas pelo Poder Público. Sou de parecer que tal ação da Administração viola o princípio da continuidade, ofendendo norma cogente de proteção ao consumidor. Será ato contrário à lei e que enseje o remédio da restauração do serviço. Os meios que tem o Poder Público são o de promover a cobrança das taxas impagas na forma da lei. No geral, no caso de descumprimento dos deveres previstos no art.22, ou seja, se os serviços se mostram inadequados por vícios de qualidade, quantidade, diferentemente das opções que se abrem ao consumidor para a hipótese de ser fornecedor um particular ou uma pessoa jurídica de direito privado, contra o Poder Público deve ser ele compelido a normalizar, restaurar ou conservar os serviços, respondendo, ainda, pelos danos provenientes dos vícios verificados. Essa é a única via, eis que de maior interesse para o particular é a prestação do serviço". Mário de Aguiar, id ibid

26. Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin et. op.cit., p.110

27. Decisão proferida na Apelação Cível em mandado de segurança(acórdão n. 3.610-Comarca de Joinvile, Rel. Des. Nestor Silveira, 4ª Cam Civil, 29/10/92). A decisão foi motivada em razão da Ação de mandado de segurança impetrado contra a empresa concessionária de serviço de energia elétrica, Centrais Elétricas de Santa Catarina-CELESC, fundamentando o E. Tribunal de Justiça de Santa Catarina que a empresa concessionária "utilizou de meio coercitivo para o usuário pagar o débito vencido, sendo serviço fundamental que não pode ser interrompido. Violação manifesta a direito líquido e certo. Pedido procedente’, afirmando ainda que o ato praticado pela concessionária retirou do consumidor "o direito de exercitar sua defesa contra eventual cobrança abusiva, do que resulta violado direito líquido e certo(art.5, LV, da CRFB)".

28. Acórdão da 3ª Cam Civil TJ/SC. rel. Des.Wilson Guarany. Jurisprudência Catarinense. 46/71.

29. Trabalho apresentado no Curso de Direito do Consumidor, na Universidade Gama Filho. Corte no fornecimento de energia elétrica por falta de pagamento. Jur.168. UGF. Rio de Janeiro: 3/12/99., p.4.


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MARTINS, Plínio Lacerda. Corte de energia elétrica por falta de pagamento. Prática abusiva. Código do Consumidor. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 6, n. 49, 1 fev. 2001. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/711. Acesso em: 2 maio 2024.