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A estabilização da tutela de urgência antecipada requerida em caráter antecedente e a coisa julgada material

A estabilização da tutela de urgência antecipada requerida em caráter antecedente e a coisa julgada material

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Há aqueles que defendem que o instituto da estabilização da tutela antecipada retira do requerente parte do poder de ação e, do requerido, parte da amplitude de sua defesa. Contudo, essa restrição decorre de manifestação expressa ou tácita das partes, razão pela qual não se vislumbra violação do acesso à justiça.

1 INTRODUÇÃO

O tema abordado por este estudo tem sua relevância e atualidade demonstradas com a entrada em vigor da Lei n. 13.105/2015.

A nova legislação inovou ao possibilitar a satisfação do direito mesmo antes de se fazer pedido de provimento exauriente de mérito, tratando-se do instituito da tutela antecipada requerida em caráter antecedente, prevista nos artigos 303 e 304 do novo Código de Processo Civil.

Esse novo instituto busca a celeridade na concessão da tutela de urgência, que, além de proporcionar o resultado do processo em caráter antecedente, ou seja, antes mesmo de ouvida a parte contrária ou exauridas todas as fases do processo, ainda pode estabilizar a referida decisão que concedeu os efeitos da tutela de urgência.

Cabe destacar que no antigo Código de Processo Civil, do ano de 1973, o requerimento de tutela antecipada dependia da instauração prévia ou concomitante de processo de conhecimento, que visasse a resolução definitiva de mérito, pois, a tutela antecipada poderia ser requerida ou concedida a qualquer tempo no processo, e deveria ser confirmada na decisão final de mérito.

Esse novo instituto da tutela antecipada requerida em caráter antecedente, além de adiantar os efeitos pretendidos, ainda poderá torna-se estável, se, da decisão que a concedeu não for interposto o competente recurso (artigo 304 do Código de Processo Civil), ou seja, de acordo com o atual Código de Processo Civil, se o réu não interpuser recurso contra a decisão concessiva da tutela antecipada pretendida, a medida se tornará estável, e o processo será extinto, mantendo-se os efeitos da medida (§§ 1º e 3º do artigo 304).

Vê-se que se poderá ter uma decisão que conservará os seus efeitos enquanto não revista, reformada ou invalidada por decisão de mérito, tornando-a definitiva, caso as partes não se manifestem de forma cabível, no prazo de 02 (dois) anos (§ 5º do artigo 304 do Código de Processo Civil).

Contudo, a legislação estabelece, de outro modo, que, a decisão que concede a tutela antecipada requerida em caráter antecedente não fará coisa julgada, mas a estabilidade dos seus efeitos somente será afastada por decisão que a revir, reformar ou invalidar (§ 6º do artigo 304).

Assim, a decisão que concedeu a tutela antecipada em caráter antecedente poderá tornar-se definitiva caso não seja revista, reformada ou invalidada no prazo legal, sem, no entanto, tornar-se coisa julgada material.

Diante disso, o presente estudo analisará se a estabilização da tutela de urgência antecipada requerida em caráter antecedente fará coisa julgada material após o prazo decadencial para sua revisão ou revogação.

A análise será efetivada abordando o mecanismo das tutelas provisórias, que se dividem em Tutela de Urgência e Tutela de Evidência, sendo que a Tutela de Urgência se subdivide em Cautelar e Antecipatória, pleiteadas em caráter antecedente ou incidental, com ênfase na Tutela de urgência antecipada requerida em caráter antecedente, para após, abordar a coisa julgada material, sua conceituação, seus efeitos e seus limites, para ao final, analisar se a estabilização dos efeitos da decisão que concede a tutela antecipada em caráter antecedente faz coisa julgada material.


2 TUTELAS PROVISÓRIAS

As tutelas provisórias foram criadas no intuito de combater os riscos de injustiça ou de dano, resultante da espera pela decisão final dos conflitos submetidos à solução judicial, cuja função é conceder maior efetividade ao processo. (THEODORO JÚNIOR, 2017).

Aduzem Didier Jr, Braga e Oliveira (2017) que toda a tutela definitiva demora, e que o processo exige tempo, sendo, a criação das tutelas provisórias para situações de urgência, em que o tempo necessário para a obtenção da tutela definitiva pode colocar em risco a efetividade do processo.

Na conceituação explanada pelo Ilustre Goncalves (2017, p. 325), a tutela provisória é:

[...] tutela diferenciada, emitida em cognição superficial e caráter provisório, que satisfaz antecipadamente ou assegura e protege uma ou mais pretensões formuladas, e que pode ser deferida em situação de urgência ou nos casos de evidência.

Afirma Didier Jr., Braga e Oliveira (2015, p. 569) que a tutela provisória pode ser satisfativa (antecipada) ou cautelar. Pode-se, assim, antecipar provisoriamente a satisfação ou a cautela do direito afirmado, no intuito de amenizar os efeitos prejudiciais do tempo do processo, que permite o gozo antecipado e imediato dos efeitos próprios da tutela definitiva pretendida, cuja principal finalidade é garantir a efetividade da jurisdição e redistribuir o ônus do tempo no processo, em respeito ao princípio da igualdade, pois é preciso que o peso do tempo seja repartido entre as partes, e não somente o demandante arque com ele.

Segundo Marinoni, Arenhart e Mitidiero (2017, p. 208) A técnica antecipatória fundamenta-se na urgência e na evidência, do direito postulado em juízo.

As tutelas provisórias se encontram dispostas no artigo 294 e seguintes do Código de Processo Civil.

Streck, Nunes e Cunha (2016, p. 398), inferem-se que nas tutelas provisórias se estabelecem regras sobre a tutela de urgência cautelar, a tutela de urgência satisfativa e a tutela de evidência.

Gonçalves (2017, p. 325) aponta que a tutela provisória pode ser classificada de acordo com a sua natureza, com a sua fundamentação ou com o momento em que foi requerida. Sendo, no que tange a sua natureza, antecipada ou cautelar. No que concerne à sua fundamentação, é de urgência ou de evidência. E, por fim, quanto ao momento de sua concessão, é antecedente ou incidental.


3 TUTELA DE EVIDÊNCIA E TUTELA DE URGÊNCIA

3.1 TUTELA DE EVIDÊNCIA

A tutela provisória da evidência é regida pelo artigo 311 do Código de Processo Civil, na qual, diferentemente da tutela de urgência, não há a necessidade de demonstrar o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, mas sim, quando:

“I - ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte;

II - as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante;

III - se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de depósito, caso em que será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, sob cominação de multa;

IV - a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável.

Parágrafo único. Nas hipóteses dos incisos II e III, o juiz poderá decidir liminarmente.” (STRECK; NUNES; GARCIA,  2016, p. 449)

“O legislador procurou caracterizar a evidência do direito postulado em juízo capaz de justificar a prestação de “tutela provisória” a partir de quatro situações”, as quais, de acordo com Marinoni, Arenhart e Mitidiero (2017, p. 210), são essas acima citadas.

No entendimento de Donizetti (2017, p. 459), “não se tutela a evidência, mas sim, o direito evidente, isto é, aquela situação jurídica que permite inferir um alto grau de probabilidade do direito substancial afirmado”.

Em situações de evidência o tempo necessário para a obtenção da tutela definitiva não deve ser suportado pelo titular do direito fundamentado em afirmações de fato comprovadas, que se possam dizer evidentes, havendo, nesses casos, violação ao princípio da igualdade. (DIDIER JR. BRAGA, OLIVEIRA, 2017, p. 643).

Nos preceitos de Theodoro Júnior (2017), a tutela de evidência tem por escopo combater a injustiça suportada pela parte, que tem o seu direito material evidente, e mesmo assim, não pode usufruí-lo, em razão da resistência abusiva da parte adversa.

Nos mesmos termos, aduz o autor que: “A tutela da evidência não se funda no fato da situação geradora do perigo de dano, mas no fato de a pretensão de tutela imediata se apoiar em comprovação suficiente do direito material da parte”.

Didier Jr, Braga e Oliveira (2017) salientam que a evidência é um fato jurídico processual, que autoriza que se conceda uma tutela jurisdicional mediante uma técnica diferenciada, sendo um pressuposto fático de uma técnica processual para a obtenção da tutela.

Possuem dois pressupostos, segundo os autores, quais sejam: prova das alegações de fato e probabilidade de acolhimento da pretensão processual, dispensando-se a urgência ou o perigo, cujo objetivo é redistribuir o ônus que advem do tempo necessário para o transcurso do processo e a concessão de tutela definitiva.

Conforme já mecionado, as tutelas provisórias ou serão de urgência ou de evidência. As de evidência jamais serão antecedentes, não podendo ser deferidas enquanto não tiver sido formulado o pedido principal, de forma plena e integral e será sempre satisfativa. (GONÇALVES, 2017).

3.2 TUTELA DE URGÊNCIA

As tutelas provisórias de urgência pressupõe a demonstração da probabilidade do direito, tradicionalmente conhecida como fumus boni iuris e do perigo de dano ou resultado útil do processo, tradicionalmente conhecido como periculum in mora. (DIDIER JR.; BRAGA; OLIVEIRA, 2015, p. 570).

Do mesmo modo, dispõe o caput do artigo 300 do Código de Processo Civil: “A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo”.

Preceitua Marinoni, Arenhart e Mitidiero (2017, p. 208) “o legislador refere que a “tutela de urgência” serve para combater o “perigo de dano” ou o “risco ao resultado útil do processo””. (grifos do autor).

Se por meio de cognição sumária o juiz verificar que pode ser o autor o titular do direito material invocado e que há fundado receio de que esse direito possa experimentar dano ou que o resultado útil do processo possa ser comprometido, a tutela provisória será concedida sob o fundamento da urgência. (DONIZETTI, 2017, p. 420).

Nada obstante, conclui o processualista que, somente a urgência não é suficiente para a concessão da tutela provisória, e que, apesar de que a legislação estabeleça que o fundamento é a urgência, esta é menos relevante do que a probabilidade do direito. Sendo assim, mesmo que a parte demonstre extrema urgência no que tange ao possível dano ou resultado útil ao processo, se não demonstrar que o direito afirmado goza de razoável probabilidade, a tutela provisória não será deferida. 

A tutela provisória de urgência pode ser cautelar ou satisfativa (antecipada), e poderá ser concedida em caráter antecedente ou incidental. (artigo 294 do Código de Processo Civil).

3.2.1 Tutela Cautelar

A tutela provisória cautelar antecipa os efeitos de tutela definitiva não satisfativa, conferindo eficácia imediata ao direito à cautela, adiantando-se, assim, a cautela, a guarda, a segurança a determinado direito. Ela somente se justifica diante de uma situação de urgência do direito a ser acautelado, que exija sua preservação imediata, garantiando sua futura e eventual satisfação (DIDIER; BRAGA; OLIVEIRA, 2015, p. 569).

Assim, a sua existência se justifica pela natural demora na atuação e satisfação do direito, porque a atuação da jurisdição se embasa em análises definitivas e exaurientes, podendo conduzir à ineficácia da prestação jurisdicional. Surgem, portanto, as medidas cautelares como forma de garantir a efetividade da tutela pleiteada, mediante a averiguação superficial e provisória da probabilidade do direito do postulante e da possibilidade de ocorrência de dano de difícil reparação ou ocorrência de risco ao resultado útil do processo. (DONIZETTI, 2017, p. 435).

A tutela provisória de natureza cautelar se encontra regida pelo artigo 301 do atual Código de Processo Civil, que dispõe: “A tutela de urgência de natureza cautelar pode ser efetivada mediante arresto, sequestro, arrolamento de bens, registro de protesto contra alienação de bem e qualquer outra medida idônea para asseguração do direito”.

Donizetti (2017, p. 436) enfatiza que a tutela cautelar concedida em caráter incidental ou antecedente tem caráter instrumental, porquanto objetiva assegurar a utilidade do processo em qualquer de suas fases, afastando, assim, o risco de inocuidade da prestação jurisdicional.

É temporário os efeitos da tutela provisória cautelar, uma vez que a sua eficácia persiste enquanto perdurar a sua serventia, pois, se ao longo do tempo a sua utilidade desaparecer ou se transformar, o juiz, a requerimento da parte, ou até mesmo de ofício, poderá cassar ou readequar a medida. (STRECK; NUNES; CUNHA, 2016, p. 406).

3.2.1.1. Tutela de urgência cautelar requerida em caráter antecedente

A tutela de urgência, seja ela antecipada ou cautelar, pode ser concedida em caráter antecedente, assim sendo, antes que tenha sido efetuado o pedido principal. Ela tem previsão legal nos artigos 305 a 310 do Código de Processo Civil, na qual, a petição inicial indicará a lide e seu fundamento, terá a descrição sumária do direito ao qual se quer assegurar, demonstrando o perigo de dano ou o risco ao resultado a que se pretende o processo.

Preceitua Streck, Nunes e Cunha (2016, p. 437) que na tutela cautelar requerida em caráter antecedente “assegura-se a pretensão substancial objeto da lide principal [...] Isso explica o caráter antecipatório da liminar cautelar: como liminar que é, satisfaz provisoriamente a pretensão à segurança, antecipando os efeitos práticos da tutela cautelar pretendida ao final”.

Donizetti (2017, p. 438), ao analisar a tutela cautelar requerida em caráter antecedente, cita que:

Esse procedimento deverá ser utilizado naquelas hipóteses em que a urgência não permite que a petição inicial seja completa, isto é, que contemple os pedidos principal e cautelar, com os respectivos fundamentos e provas. A urgência, por ser contemporânea à propositura da ação – embora possa ter surgido anteriormente -, enseja o desmembramento do pedido: primeiro se formula o pedido de tutela cautelar e, depois, em aditamento, o pedido principal.

Considera-se antecedente toda medida urgente pleiteada antes da dedução em juízo do pedido principal. (THEODORO JÚNIOR, 2017, p. 658).

Destacam Didier Jr, Braga e Oliveira (2017) que o objetivo da tutela de urgência cautelar em caráter antecedente é adiantar provisoriamente a eficácia da tutela definitiva cautelar e assegurar a futura eficácia da tutela definitiva satisfativa.

Concedida uma tutela cautelar em caráter antecedente, esta deverá ser efetivada no prazo de 30 (trinta) dias, sob pena de cessação de sua eficácia, na forma do artigo 309, Inciso II do Código de Processo Civil, pois, presume-se que desapareceu o risco e que a parte não mais deseja a medida cautelar. Conquanto, efetuada a sua efetivação, começa a contar o prazo para que a parte que a requereu adite a causa de pedir correlata, sob pena de cessação da eficácia da medida (DIDIER JR. BRAGA, OLIVEIRA, 2017, p. 696-697).

Os doutrinadores supracitados acentuam que depois de formulado o pedido principal, há a realização de audiência de conciliação ou de mediação, e, em não havendo autocomposição o réu terá o prazo de 15 (quinze) dias para responder, prosseguindo o processo pelo procedimento comum, até a prolação da sentença, que julgará o pedido de tutela cautelar em definitivo.

Da mesma forma, a tutela cautelar pode ser concedida liminarmente, ou seja, antes da citação do réu, dependendo das provas que instruem o pedido inicial, bem como do perigo de que a parte demandada, uma vez citada, pode comprometer a eficácia da providência acautelatória. Em não sendo suficientes as provas para a aferição dos requisitos da tutela cautelar, haverá a possibilidade de justificação prévia, oportunidade em que é facultado ao requerente arrolar testemunhas. Tal justificação, dependendo do risco de ineficácia da providência, poderá ser efetuada tanto antes, quanto depois da citação do réu, dependendo do grau da probabilidade do direito afirmado, podendo, igualmente, o juiz determinar a prestação de caução. (DONIZETTI, 2017, p. 440-441).

É de se consignar que a eficácia da tutela concedida em caráter antecedente cessará nos seguintes casos (artigo 309 do Código de Processo Civil):

Art. 309.  Cessa a eficácia da tutela concedida em caráter antecedente, se:

I - o autor não deduzir o pedido principal no prazo legal;

II - não for efetivada dentro de 30 (trinta) dias;

III - o juiz julgar improcedente o pedido principal formulado pelo autor ou extinguir o processo sem resolução de mérito.

Parágrafo único.  Se por qualquer motivo cessar a eficácia da tutela cautelar, é vedado à parte renovar o pedido, salvo sob novo fundamento.

Cabe destacar ainda, acerca do tema, que ocorrendo o indeferimento da tutela cautelar, essa decisão não obsta que a parte formule o seu pedido principal, inclusive, a referida decisão não influi no julgamento do processo, salvo se o motivo do indeferimento for o reconhecimento de prescrição ou decadência (artigo 310), não fazendo, inclusive, a coisa julgada sobre o direito ora acautelado. (MARINONI; ARENHART; MITIDIERO, 2017, p. 228-229).

Nessa circunstância, aduz Donizetti (2017, p. 446), a decisão que apreciar a tutela cautelar antecedente vai compor definitivamente a demanda, impedindo, por força da coisa julgada, a formulação do pedido principal acerca do direito atingido pela decadência ou cuja pretensão foi declarada prescrita.

3.1.2.1.2. Tutela de urgência cautelar requerida em caráter incidental

A tutela de urgência cautelar pode ser requerida concomitantemente com o pedido principal, como incidentalmente no decorrer do processo, conforme estebelece o parágrafo único do artigo 294 do Código de Processo Civil.

Preceitua Donizetti (2017, p. 438) que, de regra, o pedido é formulado pelo autor, mas também o réu pode ter interesse nessa modalidade de tutela, desde que postule direito a ser acautelado, além do direito fundamental à defesa.

Salienta o autor que a cautelar incidental independe de maiores formalidades, sendo que a parte deverá pleitear a medida em petição simples, dirigida ao juízo competente para o processo que já se encontra em tramitação.         

3.2.2. Tutela Antecipada

A tutela provisória antecipada, também conhecida como tutela satisfativa, antecipa os efeitos da tutela definitiva, conferindo eficácia imediata ao direito afirmado. Adianta-se, assim, a satisfação do direito, com a atribuição do bem da vida. (DIDIER; BRAGA; OLIVEIRA, 2015, p. 569).

O artigo 303 do Código de Processo Civil autoriza a apresentanção de requerimento de tutela de urgência antecipada antes que seja apresentado o pedido de tutela final de maneira completa, cujo único requisito é que exista situação de urgência contemporânea à formulação do pedido de antecipação. (GONÇALVES, 2017, p. 359-360).

Uma vez concedida a tutela antecipada, não pode o juiz revogá-la ou modificá-la sem que haja requerimento expresso da parte, pois somente a sentença é capaz de absorver ou substituir a decisão antecipatória (STRECK; NUNES; CUNHA, 2016, p. 407).

Desta forma, elucida Donizetti (2017, p. 448), que já que a tutela antecipada é concedida com base num juízo provisório, formado a partir de fatos muitas vezes unilateralmente narrados, pode ocorrer que na sentença, em razão do contraditório e das provas apresentadas pela adversa parte, o juiz mude o seu convencimento e decida contrariamente aos interesses daquele que foi beneficiado com a antecipação.

Preleciona o mesmo autor, que a diferença fundamental entre a tutela antecipada e a tutela cautelar é que na antecipada, o juiz vai satisfazer, no todo ou em parte, o direito do postulante, de forma a permitir-lhe usufruir o direito almejado de forma imediata, recaindo o ônus da demora sobre a parte contrária, sendo que na tutela cautelar, não há a satisfatividade do direito postulado, restringindo-se ao acautelamento desse direito, que será usufruido somente ao final, com sentença de mérito.

3.2.2.1.Tutela de urgência antecipada requerida em caráter incidental

Considera-se tutela provisória incidental toda medida urgente efetuada por simples petição nos autos. (THEODORO JÚNIOR, 2017, p. 658).

A tutela incidental, de acordo com o contido no artigo 295 do Código de Processo Civil, “independe do pagamento de custas”.

O pedido de tutela antecipada em caráter incidental ocorrerá nos casos em que no momento do ajuizamento da ação a parte não disponha de elementos necessários à concessão da tutela, mas depois da contestação, exemplificativamente, esses elementos tornaram-se claros e evidentes. (DONIZETTI, 2017, p. 449).

Ensina Theodoro Júnior (2017, 657-658) que, mesmo requerida por meio de simples petição nos autos, a parte requerente da tutela incidental deverá comprovar a existência dos requisitos legais, quais sejam: fumus boni iuris e periculum in mora, e que, após deduzida a pretensão, diante do princípio do contraditório e da ampla defesa, a parte adversa poderá responder em 05 (cinco) dias, caso o juiz não estipule prazo diverso.

Pondera o processualista Donizetti (2017, p. 450), que “a tutela antecipada pode ser pedida em qualquer fase, inclusive em sede recursal”, caso em que o pedido é formulado em simples petição, direcionada ao juiz do feito, contendo as alegações e a indicação das provas quanto ao cumprimento dos requisitos da pretendida tutela antecipada.

Há de se destacar que, conforme já exarado acima, e de acordo com o mesmo autor, não haverá o pagamento de custas para a interposição do pedido, uma vez que, essas já foram adimplidas quando da distribuição da ação. Destarte, o juiz analisará o pedido, e, de acordo com o grau de probabilidade do direito, determinará ou não, caução para a concessão da tutela almejada.  

3.2.2.2. Tutela de urgência antecipada requerida em caráter antecedente e da sua estabilização

A tutela de urgência antecipada requerida em caráter antecedente se encontra disposta nos artigos 303 e 304 do Código de Processo Civil.

Sua necessidade se funda nos casos de ameaça, não à utilidade do processo, mas ao próprio direito subjetivo material da parte, que não se acha em condições de aguardar o desfecho natural do processo ordinário. (THEODORO JÚNIOR, 2017, p. 669).

Quando da sua postulação, não é necessário apresentar o pedido final, limitando-se a fazer somente uma indicação daquela, havendo a exposição sumária da lide, a indicação da pretensão final e do necessário para a obtenção da medida, sendo indispensável, igualmente, o valor da causa, o qual deverá corresponder a pretensão final, consoante disposto no § 4º do artigo 303 do Código de Processo Civil. (GONÇALVES, 2017, p. 360)

Desta forma, o juiz decidirá se há ou não os elementos para o deferimento da medida. Em não existindo, ordenará a emenda a petição inicial, sob pena de indeferimento e extinção do processo, isto a ser efetuado no prazo de 05 (cinco) dias, de acordo com a norma do § 6º do artigo 303 do Código de Processo Civil 2015.

Para a concessão da medida liminar, o magistrado precisa avaliar a probabilidade do direito, isto é, constatar que há verossimilhança fática e plausividade em torno da narrativa trazida pela parte, assim como, se convença, suficientemente, de que são prováveis as chances de vitória da parte. Da mesma forma, há de existir o perigo da demora no oferecimento da prestação jurisdicional, pois somente se justifica quando não for possível aguardar pelo término do processo, porque o dano que poderá causar a parte será irreversível ou de difícil reversibilidade. (DIDIER, BRAGA, OLIVEIRA, 2017, p. 675-678).

Se não for efetivado o aditamento, ou se, mesmo depois dele, não houver elementos aptos a concessão da liminar, o processo será extinto, sem resolução do mérito, conquanto, nada impede que após seja ajuizada ação definitiva. (GONCALVES, 2017, p. 360).

Caso seja deferida a medida, o autor deverá aditar a petição inicial, oportunidade em que complementará os pedidos antes tão somente indicados, apresentando suas razões de fato e de direito, bem como juntando todos os documentos ainda não apresentados. (GONÇALVES, 2017, p. 361).

Contudo, o mesmo autor destaca que é imprescindível a citação da parte demandada após o deferimento da tutela antecipada antecedente, marco em que começará a fluir o prazo para a interposição do recurso de agravo de instrumento. Do mesmo modo, o autor terá o prazo de 15 (quinze) dias para aditar a petição inicial, e após, é que é aberto o prazo para que a parte requerida possa contestar.

Destaca, ainda, o doutrinador supracitado, que a conduta das partes repercutirá sobre o prosseguimento do processo e sobre a estabilidade da medida, explicando: o autor da ação terá o prazo de 15 (quinze) dias, ou prazo maior concedido a critério do juiz, para aditar a petição inicial, em fazendo, o processo terá regular seguimento, com aplicação do artigo 296 do Código de Processo Civil:

Art. 296.  A tutela provisória conserva sua eficácia na pendência do processo, mas pode, a qualquer tempo, ser revogada ou modificada.

Parágrafo único.  Salvo decisão judicial em contrário, a tutela provisória conservará a eficácia durante o período de suspensão do processo.

Nesse caso, salienta Gonçalves (2017, p. 362), não há que se falar em estabilidade da tutela antecipada concedida em caráter antecedente, haverá apenas a manutenção da eficácia da medida, conforme destacado na legislação acima.

Donizetti (2017, p. 454) destaca que a tutela torna-se estável se não interposto o recurso de agravo de instrumento, nos termos do artigo 1.015, Inciso I, do Código de Processo Civil, tratando-se de ônus imposto ao demandado.

Contudo, caso não seja feito o aditamento, o processo será extinto sem resolução do mérito. Essa é a norma insculpida no § 2 do aritog 303 do Código de Processo Civil: “Não realizado o aditamento a que se refere o inciso I do § 1o deste artigo, o processo será extinto sem resolução do mérito”. Havendo, desta forma, a necessidade de verificar se a parte demandada apresentou ou não recurso de agravo de instrumento contra o deferimento da medida, se sim, a tutela antecedente não adquirirá estabilidade, perdendo a sua eficácia, e o agravo é considerado prejudicado, se não, o deferimento da tutela antecipada antecedente tornar-se-á estável. (GONÇALVES, 2017, p. 362).

Assim, poderá ocorrer a estabilização da tutela antecipada requerida em caráter antecedente não impugnada pelo réu, na qual, o processo é extinto e a decisão antecipatória continuará produzindo efeitos, enquanto não ajuizada ação autônoma, com o fim de revisá-la, reformá-la ou invalidá-la. (DIDIER; BRAGA; OLIVEIRA, 2015, p. 604).

Na estabilização de tutela antecipada, conforme preceitua Streck, Nunes e Cunha (2016) “obtem-se, em caráter definitivo, tutela judicial [...], embora sob cognição apenas sumária ou incompleta, imputando-se ao réu o ônus da iniciativa do contraditório”.

Salienta Theodoro Júnior (2017, p. 689) que o atual Código de Processo Civil trilhou a linha da evolução da tutela sumária, desvinculando-a da tutela de cognição plena ou o processo de mérito, permitindo a chamada autonomização e estabalização da tutela sumária, explicando que:

[...] a nova codificação admite que se estabilize e sobreviva a tutela de urgência satisfativa, postulada em caráter antecedente ao pedido principal, como decisão judicial hábil a regular a crise de direito material, mesmo após a extição do processo antecedente e sem o sequenciamento para o processo principal ou de cognição plena.        

Para Didier, Braga e Oliveira (2017) “a estabilização da decisão concessiva de tutela antecipada é uma técnica de monitorização do processo civil brasileiro”, sendo, segundo tal entedimento, a generalização da técnica monitória, na medida em que “viabiliza a obtenção de resultados práticos a partir da inércia do réu”.

De acordo com Alvim (2017), para que haja a estabilização da tutela antecipada requerida em caráter antecedente, é necessário o cumprimento dos seguintes pressupostos:

a) Indicação expressa do autor que pretende beneficiar-se do art. 303 do CPC;

b) O deferimento da tutela antecipada em caráter antecedente;

c) O deferimento da tutela antecipada sem a oitiva da outra parte; e

d) A inércia do réu em impugnar, via recurso, a decisão concessiva da medida de urgência.

Desta forma, após a inércia do réu em intepor recurso, o processo deverá ser extinto, conservando os efeitos da tutela antecipada, podendo, qualquer das partes, demandar a outra, para rever, reformar ou invalidar a tutela estabilizada, dentro do prazo de 02 (dois) anos, contados da ciência da decisão que extinguiu o processo. (STRECK; NUNES; GARCIA, 2016, p. 304 e 305).                                                              


4 A COISA JULGADA MATERIAL SEGUNDO A LEGISLAÇÃO VIGENTE e a decisão estabilizada DA TUTELA DE URGÊNCIA ANTECIPADA REQUERIDA EM CARÁTER ANTECEDENTE COMO COISA JULGADA MATERIAL

O artigo 502 do Código de Processo Civil estabelece o que é coisa julgada material, e assim prevê: “Denomina-se coisa julgada material a autoridade que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso”.

 Para Marinoni, Arenhart e Mitidiero (2017, p. 669), a coisa julgada é a imutabiliadde que qualifica a sentença de mérito não mais sujeita a recurso e que impede sua discussão posterior.

Acentuam que a Constituição da República dispõe que a lei não prejudicará a coisa julgada, norma contida em seu artigo 5º, Inciso XXXVI, intensificando o princípio constitucional da segurança jurídica, constituindo uma evidente opção da Lei Maior a favor da estabilidade das situações jurídicas em detrimento da possibilidade de infindáveis discussões dos problemas em busca de uma resolução supostamente mais justa do litígio.

Medina (2017, p. 739) descreve a coisa julgada como: “a imutabilidade e indiscutibilidade da determinação do conteúdo contido na decisão de mérito”.

Acerca da coisa julgada, ensinam Didier, Braga e Oliveira (2015, p. 513) que considera-se a coisa julgada uma autoridade, na qual, autoridade é decisão obrigatória e definitiva de uma situação jurídica, sendo a coisa julgada um efeito jurídico e, dessa autoridade, deriva a indiscutibilidade e a imutabilidade dessa decisão.

Tal indiscutibilidade, concluem os processualistas, opera em duas dimensões, quais sejam: “a coisa julgada impede que a mesma questão seja decidida novamente, cujo nome se dá de efeito negativo da coisa julgada”, e, na outra dimensão, “a coisa julgada deve ser observada, quando utilizada como fundamento de uma demanda”, não podendo ser resolvida de modo distinto, gerando a vinculação do julgador (de uma segunda causa) ao quanto decidido na causa em que a coisa julgada foi produzida.

Importante destacar o entendimento doutrinário de Marinoni, Arenhart e Mitidiero (2017, p. 671) a respeito da finalidade da coisa julgada:

Uma vez julgado o caso, restará aplicada ao caso concreto a disciplina que o direito confere à res in iudicium deducta, isto é, à causa debatida em juízo. Por isso, a fim de que o direito possa ser compreendido efetivamente como um discurso prático, isto é, como um discurso que tem como finalidade guiar o comportamento das pessoas em sociedade e resolver ameaças ou efetivas crises de colaboração na sua realização, uma vez prestada a tutela jurisdicional, haverá ela de ser imutável. Assim, a imutabilidade, caracterísitca essencial da coisa julgada, nada mais é do que um reflexo da necessidade de que os litígios não perdurem indefinidamente em nossa ordem jurídica.

Como ponderam os mesmos autores, considerando que na sentença o juiz concretiza a norma abstrata, fazendo a lei do caso concreto, nada mais normal que essa lei mostre-se imutável, haja vista a necessidade de que os litígios não se eternizem socialmente.

Ainda, oportuno consignar outro ponto declarado pelos doutrinadores, que entendem que a coisa julgada compatibiliza a imutabilidade da declaração judicial, sendo assim, para que possa ocorrer coisa julgada, é necessário que a sentença seja capaz de declarar a existência ou não de um direito (em razão de não ter sido concedida às partes ampla oportunidade de alegação e produção de prova – artigo 503, § 2º), o comando judicial não terá força suficiente para gerar a imutabilidade típica da coisa julgada. Se o juiz não possui condições de conhecer os fatos adequadamente, ou seja, com cognição exauriente, para fazer aplicar sobre esses uma norma jurídica, não é possível a imunização da decisão judicial, derivada da coisa julgada.

Nos dizeres que Donizetti (2017, p. 592-593), há a coisa julgada formal quando a sentença terminativa transita em julgado extinguindo a relação processual, “entretanto, sem haver qualquer alteração qualitativa nem repercussão alguma na relação de direito material”, não obstando que o autor ingresse com nova ação judicial de que o juiz regule o caso concreto. Também, há a coisa julgada material, ocorrendo com o trânsito em julgado da sentença, não somente encerrando a relação processual, mas igualmente, compondo o litígio, havendo, por conseguinte, a modificação qualitativa na relação de direito material subjacente ao processo.

O autor ainda aduz que a coisa julgada material representa a impossibilidade de rediscussão da matéria. Além da estabilidade relativa, a coisa julgada material proporciona, simultânea e concomitantemente, a estabilidade absoluta, tornando o julgamento intocável.

Assim, conforme elucidado pelo doutrinador, esgotadas as possibilidades de se recorrer da decisão que tenha resolvido definitivamente o mérito do litígio, opera-se a coisa julgada, em razão da qual a decisão torna-se imutável e indiscutível.

4.1. a decisão estabilizada DA TUTELA DE URGÊNCIA ANTECIPADA REQUERIDA EM CARÁTER ANTECEDENTE COMO COISA JULGADA MATERIAL

Questão polêmica e de extrema relevância é a que diz respeito à definitividade que surge da decisão estabilizada concedida em tutela de urgência antecipada requerida em caráter antecedente, visto que, a legislação em vigor traz que, uma vez transcorridos os 02 (dois) anos do prazo para a reforma da medida, está não poderá ser modificada.

Há uma dificuldade de se distinguir, na prática, os efeitos gerados pela estabilização da tutela e aqueles inerentes à coisa julgada. A questão que fica aparentemente em aberto, é como qualificar a força da estabilidade depois de transcorridos 02 (dois) anos sem que tenha sido proposta a ação exauriente?

O Código de Processo Civil adota o posicionamento explícito no sentido de que “a decisão que concede a tutela não fará coisa julgada”, porem, aduz que a sua estabilidade somente será afastada por decisão que a revir, reformar ou invalidar, o que poderá ser efetuado no prazo de 02 (dois) anos.

De acordo com a doutrina de Streck, Nunes e Garcia (2016, p. 432), “Transcorrido o prazo in albis para a revisão, reforma ou invalidação da medida, gera-se indiscutibilidade externa, que é efeito próprio da coisa julgada material”.

Preleciona Didier, Braga e Oliveira (2015, p. 612), “que a estabilização da tutela satisfativa antecedente não se confunde com a coisa julgada”. Que é uma estabilidade processual distinta da coisa julgada, porque, não se pode dizer que houve julgamento ou declaração suficiente para a coisa julgada.

Os autores destacam que somente os efeitos da decisão de tutela provisória de urgência, antecipada, requerida em caráter antecedente se tornam estáveis, e que, a coisa julgada recai sobre o conteúdo da decisão, não sobre os seus efeitos, sendo o conteúdo, não a eficácia que se torna indiscutível com a coisa julgada.

Referem que não houve o reconhecimento judicial do direito do autor, não podendo extrair dela um efeito positivo da coisa julgada, sendo essa estabilidade processual distinta da coisa julgada.

No entedimento de Marinoni, Arenhart e Mitidiero (2017), é evidente que, inexistindo ação posterior ajuizada no prazo legal, a estabilidade torna-se “inafastável”, em outras palavras, “imutável” e “indiscutível”, (norma insculpida no artigo 502 do Código de Processo Civil[1]).

Contudo, os mesmos doutrinadores salientam que é de ambígua legitimidade constitucional equiparar os efeitos do procedimento comum, com a realização do contraditório, ampla defesa e direito à produção de provas, com os efeitos de um procedimento de sumariedade formal e material extremamente ressaltado. Enfatizam que:

Sendo a obtenção de uma decisão justa uma das finalidades do processo civil no Estado Constitucional, o que remete para a necessidade de construirmos procedimentos orientados à sua busca, parece-nos que a limitação do direito ao contraditório e do direito à prova ínsita à sumarização procedimental e material da ação antecedente atua em sentido contrário à busca por uma decisão justa - e, pois, desmente uma das razões de ser da necessidade de um processo justo.A eficácia bloqueadora do direito fundamental ao processo justo, portanto, impede que se tenha como constitucional a formação da coisa julgada na tutela antecipada requerida de forma antecedente no caso de transcurso do prazo legal sem o exaurimento da cognição.

O direito à adequada cognição da lide constitui corolário do direito ao processo justo e determina a inafastabilidade da ação exauriente para a formação da coisa julgada. Em não sendo assim, há ofensa ao direito fundamental ao processo justo pelo próprio legislador insfraconstitucional. (MARINONI, 1994, p. 120-124).

Donizetti (2017, p. 454) pondera que, segundo o caput do artigo 304, a tutela torna-se estável se não interposto o respectivo recurso. O parágrafo único do artigo institui que, não interposto recurso, o processo será extinto, porém, não se trata de extinção sem resolução de mérito, uma vez que a referida extinção não se encontra prevista no rol estabelecido no artigo 485. De igual forma, não se trata de extinção com resolução do mérito, porque não houve cognição exauriente, ou, declaração de prescrição ou decadência, não tendo aptidão de formar coisa julgada material.

Seguindo o raciocínio do doutrinador, a decisão de extinção com estabilização produzida, trata-se de um tertium genus, a qual, para que alcance esse status, deve haver manifestação expressa da parte no requerimento de tutela antecipada em caráter antecedente, no sentido de que pretende se valer do benefício da estabilização.

A estabilização da tutela antecipada requerida em caráter antecedente não pode alcançar a autoridade da coisa julgada, que é própria aos procedimentos de cognição exauriente. Assim, transcorrido o lapso temporal de 02 (dois) anos, ainda é possível o exaurimento da cognição até que os prazos constantes no direito material para a estabilização das situações jurídicas atuem sobre a esfera jurídica das partes, a exemplo da ocorrência da prescrição ou decadência. (MARINONI; ARENHART; MITIDIERO, 2017, p. 227).

Em exemplo apresentador por Donizetti (2017, p. 455), se a decisão da tutela antecipada requerida em caráter antecedente foi para a retirada do nome dos cadastros de inadimplentes, é esse o efeito, “que é um minus em relação à tutela declaratória de inexistência da dívida”. O fundamento adotado na decisão         que concedeu a tutela foi a inexistência da dívida, que foi tida como adimplida, mas sobre esse fundamento não houve declaração, apenas cognição sumária. Sem declaração não há coisa julgada, uma vez que esta recai sobre o objeto da declaração, abrangendo, consequentemente, os efeitos dela.

Para o autor, mesmo depois de ultrapassado o prazo para rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada, não se pode falar em coisa julgada, havendo, portanto, tão somente a estabilização irreversível dos efeitos da tutela, não podendo mais ser inserido o nome do demandante nos cadastros restritivos de crédito.

Desta forma, nada impede que o ora réu nesta ação, mesmo depois de passados os 02 (dois) anos previstos na legislação vigente, ajuize ação de cobrança contra o demandante da tutela antecipada que restou estabilizada, evocando como fundamento a existência de um crédito a seu favor, pois, o fundamento não restou alcançado pelos limites objetivos da estabilização e pode ser atacado para demonstrar a existência da dívida, contudo, não poderá reinscrever o nome do autor da tutela estabilizada nos cadastros de inadimplentes. Conquanto, uma vez condenado e transitada em julgado a decisão condenatória, poderá o nome do requerente da tutela estabilizada ser reinscrito nos órgãos de proteção ao crédito. Antes, a reinscrição não era possível tendo por fundamento a mera existência da dívida, agora, pode-se proceder a inscrição, com base na coisa julgada emergente de decisão condenatória.                                                                       


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Realizados os estudos, cabe destacar a importância das tutelas provisórias como forma de garantia de direitos, visto que há situações em que a espera e a duração do processo geram prejuízos ou risco de prejuízos para uma das partes.

No primeiro capítulo, apuraram-se as tutelas provisórias, o que é e quais são, sendo a tutela de urgência e de evidência uma espécie do gênero tutela provisória.

No segundo capítulo, verificou-se que a tutela de urgência é concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, e a tutela de evidência, que tem por objetivo combater a injustiça suportada pela parte que, mesmo tendo evidente o seu direito material, se vê impossibilitada de usufruí-lo.

Cabe destacar ainda que a tutela provisória de urgência pode ser cautelar ou satisfativa podendo ser concedida em caráter antecedente ou incidental, todas voltadas para combater o perigo de dano que possa advir do tempo necessário para o cumprimento de todas as etapas do devido processo legal, sendo cautelar aquela que acautela, guarda e assegura determinado direito, justificando-se em vista da preservação imediata para a garantia de futura e eventual satisfação do direito, e a satisfativa que é aquela que já antecipa os efeitos da tutela definitiva, conferindo eficácia imediata ao direito afirmado, ou seja, a parte requerente já usufrui o direito alegado.

Igualmente, será antecedente quando a parte não possui condições de aguardar a cognição exauriente natural dos processos judiciais porque o dano que poderá causar à parte será irreversível ou de difícil reversibilidade, e, será incidental quando, no decorrer do processo, ou seja, em ação já proposta, houver a ameaça ao direito da parte, que poderá, por simples petição, e, comprovados os requisitos (fumus boni iuris e periculum in mora), pugnar a tutela específica.

No terceiro capítulo, explorou-se a coisa julgada material, a qual, consoante artigo 502 do Código de Processo Civil: “Denomina-se coisa julgada material a autoridade que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso”, ou seja, não poderá mais ser modiciada, impedindo qualquer discussão posterior. Assim, como, se a estabilização proveniente da tutela antecipada requerida em caráter antecedente, no intuito de se verificar se esta, faz coisa julgada material no ordenamento jurídico brasileiro, uma vez que é instituto novo trazido pelo atual Código de Processo Civil, que inovou ao possibilitar a satisfação do direito mesmo antes de se fazer pedido de provimento exauriente de mérito, e ainda, em situações específicas, pode estabilizar-se, extinguindo o processo e mantendo-se os efeitos da medida.

Há aqueles que defendem que o instituto da estabilização da tutela antecipada, criado com o objetivo de potencializar a celeridade processual, retira do requerente parte do poder de ação e do requerido, parte da amplitude de sua defesa. Contudo, essa restrição decorre de manifestação expressa ou tácita das partes, razão pela qual não se vislumbra afronta à garantia constitucional do acesso à justiça.

Da mesma forma, apurou-se que não se trata de extinção sem ou com resolução de mérito, trata-se de extinção com estabilização.

Desse modo, o que pode ser extraído dos estudos é que a concessão da estabilização da tutela de urgência satisfativa (antecipada) em caráter antecedente não gera coisa julgada material, isto porque somente os efeitos da decisão se tornam estáveis, e a coisa julgada recai sobre o conteúdo da decisão, não sobre os seus efeitos, sendo o conteúdo, e não a eficácia, que se torna indiscutível com a coisa julgada.


6 Referências

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BRASIL. Novo Código de Processo Civil. Lei n. 13.105, de 16 de março de 2015. Institui o Código de Processo Civil. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 16 mar. 2015. Disponível em:http://www.planalto.gov.br/ccivIl_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13105.htm. Acesso em: 11 ago. 2018.

DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso de direito processual civil: teoria da prova, direito probatório, decisão, precedente, coisa julgada e tutela provisória. 10 ed. Salvador: Jus Podivm, 2015.

________. Curso de Direito Processual Civil. Teoria da Prova, Direito Probatório, Decisão, Precedente, Coisa Julgada e Tutela Provisória. 12 ed. Salvador: Jus Podivm, 2017.

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MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Curso de processo civil. Tutela dos direitos mediante procedimento comum. 3 ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017.

________. Tutela cautelar e tutela antecipatória. 2 tir. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994.

MEDINA, José Miguel Garcia. Curso de direito processual civil moderno. 3 ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017.

ROVER, Ardinete; PEREIRA, Débora Diersmann Silva. Diretrizes para elaboração de trabalhos cintentíficos. Joaçaba: Unoesc, 2013.

STRECK, Lenio Luiz; NUNES, Dierle; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Comentários ao código de direito processual civil. São Paulo: Saraiva, 2016.

STRIEDER, Roque. Diretrizes para elaboração de projetos científicos. Joaçaba: Unoesc. 2009.

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 58 ed. rev. atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2017.


Notas

[1] Art. 502.  Denomina-se coisa julgada material a autoridade que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso.


Autores


Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

TRENTIN, Fernanda; BERTOLDO, Juliana Andréia. A estabilização da tutela de urgência antecipada requerida em caráter antecedente e a coisa julgada material. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5877, 4 ago. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/73965. Acesso em: 2 maio 2024.