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Omissão em apresentar documentos à auditoria-fiscal da Previdência Social no curso da ação fiscal

impossibilidade de corrigir a infração e ser de ser beneficiado com a relevação da multa

Omissão em apresentar documentos à auditoria-fiscal da Previdência Social no curso da ação fiscal: impossibilidade de corrigir a infração e ser de ser beneficiado com a relevação da multa

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            O descumprimento das obrigações acessórias tributárias (deveres instrumentais de fazer, não fazer ou tolerar no interesse da arrecadação ou fiscalização de tributos) rende ensejo à aplicação de multa punitiva (art. 113, §§ 2º e 3º, Código Tributário Nacional) em desfavor do contribuinte faltoso.

            Além da denúncia espontânea (art. 138 do CTN), a qual se verifica quando o contribuinte cumpre, mesmo que extemporaneamente mas sem estar sob ação fiscal, a obrigação acessória, há na seara previdenciária a possibilidade de aquele, dentro do prazo de impugnação à autuação, corrigir a infração (cumprir a obrigação acessória) e requerer a relevação da multa aplicada, nos termos do art. 291, § 1º, do Regulamento da Previdência Social (RPS), aprovado pelo Decreto n.º 3048/1999:

            "Art.291.. ..........................................................

             § 1º A multa será relevada, mediante pedido dentro do prazo de defesa, ainda que não contestada a infração, se o infrator for primário, tiver corrigido a falta e não tiver ocorrido nenhuma circunstância agravante."

            No caso da relevação, a infração subsiste, inclusive para fins de reincidência nos próximos 5 anos. A multa, de seu turno, é perdoada, cancelada.

            Trata-se de uma forma de incentivar os contribuintes a cumprirem seus deveres instrumentais previdenciários mesmo após a lavratura de autuação.

            Ocorre que, para alguns tipos de infração, descabe o benefício da relevação, haja vista a impossibilidade de corrigir a falta.

            A omissão em apresentar livros e documentos à Auditoria-Fiscal da Previdência Social no curso de uma ação fiscal, conduta que representa literal infração ao art. 33, § 2º, da Lei n.º 8212/1991, cuida de uma das exceções:

            "Art. 33.. ..................................................

             ................................................................

            § 2º A empresa, o servidor de órgãos públicos da administração direta e indireta, o segurado da Previdência Social, o serventuário da Justiça, o síndico ou seu representante, o comissário e o liqüidante de empresa em liquidação judicial ou extrajudicial são obrigados a exibir todos os documentos e livros relacionados com as contribuições previstas nesta Lei."

            O objetivo de a Auditoria-Fiscal previdenciária intimar o fiscalizado a apresentar livros e documentos relacionados às contribuições previdenciárias é apenas um: o de possibilitar o regular desenvolvimento da ação fiscal. Assim, o descumprimento desse dever instrumental provoca um prejuízo ao próprio desenvolvimento da ação fiscal.

            A infração ora focalizada se concretiza nos exatos dia e hora em que o contribuinte não exibe à Auditoria-Fiscal previdenciária os livros e documentos que esta intimou aquele a apresentar.

            Mas, para efeito de corrigir a falta, temos de distinguir duas situações: 1ª) o fiscalizado, após ser autuado, exibe, ainda durante a ação fiscal, os livros e documentos a que foi intimado a apresentar; e 2ª) o fiscalizado, após ser autuado, somente exibe os livros e documentos em sua impugnação contra a autuação.

            Na primeira situação, a conduta do fiscalizado ainda possibilitará o restabelecimento do normal transcurso da ação fiscal. O prejuízo provocado pela omissão inicial é superado pela apresentação dos livros e documentos, pois o agente fiscal poderá examiná-los para realizar seu mister. Já na segunda situação essa possibilidade não acontecerá, pois a ação fiscal já se encerrou, tendo o agente fiscal lançado mão de outros documentos ou até de presunções para cumprir seu mister. O prejuízo inicial não é superado.

            É uma situação semelhante ao arrependimento posterior previsto no art. 16 do Código Penal. Segundo esse preceito, se o infrator, por ato voluntário, reparar o dano, até o recebimento da denúncia ou da queixa, terá, como benefício, a redução da pena.

            Pois bem, reparar o dano, no caso da infração tributária contemplada em autuação fiscal, consiste, repita-se, apresentar os livros e documentos enquanto a ação fiscal ainda estiver em curso. Encerrada a ação fiscal, o dano ao regular desenvolvimento desta não pode mais ser reparado.

            Ressalte-se, ainda, que a interpretação a contrario sensu do §2º do art. 291 do RPS/1999 não autoriza a conclusão de que, excetuando as infrações relacionadas à falta de entrega de Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT) e àquelas cuja multa decorra de falta ou insuficiência de recolhimento tempestivo de contribuições ou outras importâncias devidas à Seguridade Social, as outras infrações sempre seriam passíveis de correção. Não!

            O dispositivo em pauta apregoa, tão-só, que as multas aplicadas em face das infrações nele mencionadas não podem ser relevadas. Só isso.

            É verdade que um dos requisitos para a relevação da multa por descumprimento de dever instrumental é corrigir a falta. Mas há exemplos vários de infrações que não têm como ser corrigidas. É o caso da infração concernente à omissão de se exigir Certidão Negativa de Débito para se permitir a prática de algum ato ou negócio jurídico (contratação com o Poder Público, alienação ou oneração de bem imóvel, registro de ato relativo à baixa de empresa, averbação em Registro de Imóveis). Se tais atos ou negócios jurídicos forem concretizados sem que se exigisse a apresentação da CND, haveria como corrigir a infração? É óbvio que não. E essas infrações não estão elencadas no §2º do art. 291 do RPS/1999. Mas nem por isso será possível corrigir as infrações correspondentes.

            Conclui-se, destarte, que o §2º do art. 291 do RPS/1999 não elenca hipóteses taxativas de interdição à relevação, mas somente exemplificativas.

            Por conseguinte, a infração de deixar de apresentar à Auditoria-Fiscal da Previdência Social livros ou documentos relacionados com as contribuições previdenciárias não é corrigida pela apresentação desses livros ou documentos apenas com a impugnação contra a autuação.

            Em conseqüência, esta infração não comporta a relevação da multa aplicada.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

COZER, Ricardo Araujo. Omissão em apresentar documentos à auditoria-fiscal da Previdência Social no curso da ação fiscal: impossibilidade de corrigir a infração e ser de ser beneficiado com a relevação da multa. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1167, 11 set. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8885. Acesso em: 18 maio 2024.