Análise do Orçamento 2021 acerca da “trindade” das contas públicas: teto de gastos, meta fiscal e regra de ouro

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O Orçamento federal de 2021 nasceu atrasado e com vários problemas e é considerado uma “peça de ficção”.

O Orçamento da União para 2021 (LOA 2021) foi aprovado pela Lei nº 14.144, de 22 de abril de 2021. Como de costume, a publicação se deu já no decorrer do exercício.

Tal lei estimou a receita da União para o exercício financeiro de 2021 no montante de R$ 4.325,4 bilhões e fixou a despesa em igual valor.

Na tabela abaixo, tem-se uma comparação dos valores, detalhados por orçamento, apresentados no PLOA, aprovados pelo Congresso no Autógrafo e sancionados na LOA após os vetos do Presidente da República:

O Projeto de Lei Orçamentária Anual (PL nº 28/2020) foi enviado pelo Executivo ao Congresso Nacional estimando receitas e fixando despesas no valor de R$ 4.292,0 bilhões, durante a tramitação no Congresso, sofreu emendas e passou a R$ 4.325,4 bi. Após vetos do Presidente da República, foi sancionado fixando R$ 4.305,7 bi de despesa.

Dos R$ 3.004,5 bilhões de despesas do Orçamento Fiscal (OF), R$ 1.603,5 bi será destinado ao refinanciamento da dívida.

Por meio da Mensagem Presidencial nº 156, de 22 de abril de 2021, o Presidente da República sancionou o PLOA, com veto parcial de R$ 19,8 bi, sendo 16,4 bi no OF e 3,4 bi no Orçamento da Seguridade Social (OSS). O veto incidiu sobre despesas classificadas como RP2 (despesas discricionárias), RP8 (despesas fixadas por emendas de comissão) e RP9 (despesas fixadas por emenda de relator-geral), conforme detalhado na tabela abaixo:

O veto foi necessário para adequar o orçamento ao teto de gastos, viabilizando a recomposição de dotações orçamentárias destinadas à cobertura de despesas obrigatórias que haviam sido reduzidas pelo CN, para abrir espaço às emendas parlamentares.

O Teto de Gastos, instituído pela Emenda Constitucional nº 95, de 2016 (EC nº 95/2016), incide apenas sobre determinadas despesas primárias do Orçamento Fiscal e da Seguridade Social. O limite para 2021 corresponde ao valor orçado, para essas despesas primárias, em 2020, corrigido pelo IPCA, ou seja, não se permite um aumento real de tais despesas. Para 2021, o Teto de Gastos é de R$ 1.485,9 bilhões, que corresponde ao R$ 1.455,0 de 2020 corrigido em 2,13%, variação do IPCA de julho de 2019 a junho de 2020.

Na tabela abaixo, tem-se as despesas primárias sujeitas ao Teto de Gastos detalhadas em discricionárias e obrigatórias:

Parte do ajuste, para adequar o Autógrafo do PLOA 2021 ao Teto de Gastos, foi feito por meio de veto presidencial incidente sobre despesas discricionárias, no valor de R$ 19,8 bilhões. O restante do ajuste, R$ 9,3 bi, ocorrerá mediante bloqueio de despesas discricionárias, as quais poderão posteriormente ser canceladas de forma a compensar o total restabelecimento das dotações de despesas obrigatórias que foram subestimadas no âmbito do Autógrafo. Os maiores bloqueios foram no ministério da Educação (R$ 2,7 bi), Economia (R$ 1,4 bi) e Defesa (R$ 1,3 bi).

Os vetos e bloqueios totalizam um ajuste, nas despesas primárias, no valor de R$ 29,1 bilhões. No entanto o Executivo encaminhou ao Congresso, no dia 22 de abril de 2021, projeto de lei de crédito suplementar no valor de R$ 19,8 bi para recompor despesas obrigatórias subestimadas pelo CN, portanto, na prática, os valores vetados serão recompostos.

Observa-se que menos de 10% das despesas primárias sujeitas ao teto são discricionárias, o que torna o orçamento completamente engessado, comprometendo a execução de políticas sociais pelo Governo.

Em relação à meta fiscal, a Lei nº 14.116, de 31 de dezembro de 2020, Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) fixou para a União a meta de déficit primário de R$ 247,1 bilhões. A LOA foi sancionada com um déficit primário de R$ 194,9 bi, sendo de R$ 1.302,1 bi a receita primária líquida e de R$ 1.497,1 bi a despesa primária.

No entanto, conforme bem ressalta a Secretaria do Tesouro Nacional (STN) no Relatório de Avaliação de Receitas e Despesas Primárias (RARDP), do 2º bimestre de 2021, não são consideradas na apuração da meta fiscal as despesas decorrentes do auxílio emergencial, até o limite de R$ 44 bilhões, e dos créditos extraordinários abertos em 2021 destinados às despesas com Ações e Serviços Públicos de Saúde identificados com a programação de enfrentamento à pandemia, ao Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe) e ao Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda.

Dessa forma, é permitido ao governo criar gastos relacionados à pandemia sem que os valores precisem entrar na apuração da meta fiscal, são despesas ditas extra meta fiscal.

Por fim, mas não menos importante, há o cumprimento da Regra de Ouro. Na próxima tabela, pode-se observar que, tanto no Autógrafo como na LOA, dados os Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social, as receitas de Operações de Crédito previstas excederam o montante de despesas de capital fixadas:

De acordo com o art. 163, inciso III da CF/ 88, que institui a regra de ouro, é vedada a realização de operações de créditos que excedam o montante das despesas de capital, ressalvadas as autorizadas mediante créditos suplementares ou especiais com finalidade precisa, aprovados por maioria absoluta pelo Congresso Nacional. Dessa forma, as despesas custeadas com esse excesso de operações de crédito dependem da aprovação de créditos adicionais pelo Congresso Nacional para serem executadas. Esse excesso corresponde a cerca de 30% das despesas primárias.

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Vale ressaltar que o art. 167-E, acrescido à Constituição Federal pela Emenda Constitucional nº 109 de 2021, dispensa o cumprimento da regra de ouro, durante o exercício financeiro em que for declarada calamidade pública de caráter nacional, o que possibilita aumentar despesas correntes com novas operações de créditos (aumento do endividamento).

Na tabela abaixo, pode-se observar o detalhamento por Grupo de Natureza de Despesa (GND) das despesas correntes com juros e de capital previstas:

Percebe-se que mais de 90% do total das despesas de capital previstas na LOA foram destinados à amortização da dívida e que apenas 4,9% das operações de crédito serão para investimentos e inversões financeiras. Em relação às despesas com juros previstas na LOA, essas correspondem ao triplo do somatório das despesas com investimentos e inversões financeiras. Já em relação ao total de despesas de capital, as despesas com juros representam 18,2%.

O Orçamento federal de 2021 nasceu atrasado e com vários problemas. Antes mesmo da sanção pelo Presidente, economistas e parlamentares já o chamavam de “peça de ficção”, “retorno das pedaladas fiscais”, “vergonhoso”, “inexequível”. Diante de tantas amarras, empecilhos e erros, a execução do orçamento se torna cada vez mais dificultosa.

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Sobre a autora
Larissa Gabriela de Abreu Toledo

Consultora da Câmara Legislativa do Distrito Federal. Ex-Auditora do Estado do Rio Grande do Sul.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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