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Do instituto da prescrição penal

Do instituto da prescrição penal

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1. ORIGEM HISTÓRICA

Constitui-se a prescrição penal um dos modos de extinção da punibilidade, prevista no Código Penal, art. 107, IV.

Origina-se do termo latino praescriptio derivada do verbo prescrever, significando um escrito posto antes. Já era conhecido no Direito Grego, mas só se tem notícia do instituto no Direito Romano, como mais antigo texto legal, a Lex Julia de Adulteriis, datada de 18 ª C. Para o Direito Romano os crimes de maior potencial ofensivo eram tidos por imprescritíveis, visto que a prescrição associava-se à idéia de perdão. Entretanto, a prescrição da condenação surgiu na França através do Código Penal de 1791, favorecido pela Revolução Francesa. Por volta dos séculos XVI e XVII a prescrição foi reconhecida pela Itália e pela Alemanha. Nos Códigos Penais modernos, a prescrição da ação é aceita quase sem exceção, inclusive pelo Direito Eclesiástico. A prescrição da condenação, porém, é ainda repelida por algumas legislações, como a da Inglaterra.

No Brasil a prescrição da ação foi regulada no Código de Processo Criminal de 1832 e leis posteriores, considerados prazos maiores para os crimes inafiançáveis e menores para os crimes afiançáveis, influenciando-se pela presença ou ausência do réu para sua fixação. Com tal disposição, o legislador a fundamentava na presunção da negligência do Poder Público no exercício de punir. Com o advento da Lei n.º 261, de 03 de dezembro de 1841 e do Regulamento n.º 120, de 31 de janeiro de 1842, maior severidade abateu-se sobre a prescrição estabelecendo-se prazo único de 20 anos, ainda permanecendo hipóteses de crimes imprescritíveis e o requisito da presença do delinqüente para o reconhecimento da prescrição. Já a prescrição da condenação somente foi instituída em 1890 pelo Dec. 774, que discriminava os prazos da prescrição com base no tempo da pena. Com os Códigos Penais de 1890 e 1940 consagrou-se as duas modalidades de prescrição, assim como no Código Penal vigente, de 1984.


2. CONCEITO

Nos dizeres de Damásio E. de Jesus a "prescrição é a perda do poder-dever de punir do Estado pelo não exercício da pretensão punitiva ou da pretensão executória durante certo tempo" (Prescrição Penal. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 1998), isto é, o Estado perde o direito de ver satisfeitos os dois objetos do processo.

A prescrição face à Legislação Penal tem como fundamentos o decurso do tempo, o desinteresse estatal em apurar fato ocorrido há anos ou punir o seu autor; a correção do condenado, decorrente do lapso temporal sem reiteração criminosa; e a negligência da autoridade, como castigo à sua inércia no exercício de sua função.


3. NATUREZA JURÍDICA

Questão importante refere-se à natureza jurídica da prescrição, objeto de grandes controvérsias na doutrina. Uns a consideram instituto de Direito Penal; outros, de Direito Processual Penal e há, ainda, os que a atribuem um caráter misto. A corrente dominante a considera como de Direito Penal, embora haja conseqüências imediatas de Direito Processual Penal. É considerada um direito do réu, direito de não ser julgado ou punido após o decurso do tempo previsto para se extinguir a punibilidade. Ressalta-se que este direito, o réu adquire por efeito da renúncia do Estado ao poder-dever de punir, que só a ela incumbe.

A prescrição penal recebe conotação diferenciada da prescrição civil, pois na penal, o Estado perde o direito de apurar e punir certa infração; na cível, perde o direito de ação apenas, subsistindo o direito material.


4. IMPRESCRITIBILIDADE

No ordenamento jurídico penal brasileiro, a prescrição é a regra. Entretanto, a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º, criou dois casos em que as pretensões punitiva e executória não são atingidas pela prescrição, são eles os previstos nos incisos XLII e XLIV, definidos pela Lei n.º 771/89 e a Lei de Segurança Nacional, respectivamente. Quanto ao momento de ocorrência da infração, estabeleceu a nova Carta Magna que, sendo instituto de natureza material, a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu.


5. ESPÉCIES

Prevê o art. 107, IV do Código Penal, duas espécies básicas de prescrição: a prescrição da pretensão punitiva (art. 109, CP) e a prescrição da pretensão executória (art. 110, caput, CP). Entretanto, as duas espécies de prescrição podem ocorrer de quatro formas dierentes, são elas: a prescrição da pretensão punitiva propriamente dita (art. 109, CP); a prescrição subseqüente/superveniente/intertemporal à sentença condenatória (art. 110, §1º c/c art. 109, CP) antes do trânsito em julgado da sentença final; a prescrição retroativa (art. 110, §§1º e 2º c/c art. 109, CP); e a prescrição da pretensão executória (art. 110, caput, CP), com trânsito em julgado da sentença final condenatória.

5.1 – PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO
PUNITIVA PROPRIAMENTE DITA

Constitui o lapso temporal da consumação do direito até a sentença final sem efetivo exercício do poder-dever de punir do Estado. Pode ser declarada em qualquer fase do Inquérito Policial ou da Ação Penal, seja de ofício (art. 61, caput, CPP) ou a requerimento das partes, em grau de Habeas Corpus, Apelação, Recurso em Sentido Estrito, Embargos de Declaração, Embargos Infringentes, Revisão e Agravo em Execução. É irrenunciável e uma vez esgotada a sua jurisdição o Juiz não pode mais reconhecê-la. Uma vez ocorrida a prescrição, não cabe exame de mérito, impedindo, portanto, a absolvição ou condenação do réu, tanto em primeira quanto em segunda instância.

Os prazos prescricionais são regulados pelas pena em abstrato cominada no tipo legal (art. 109, caput, CP), com desprezo da pena de multa, seja ela cumulativa ou alternativamente cominada, não se distinguindo entre as penas restritivas de direitos ou privativas de liberdade (art. 109, parágrafo único, CP). O prazo é computado incluindo-se o dia do começo, mesmo que fração do dia, durante o lapso previsto em lei de acordo com a pena abstrata até as 24 horas do dia anterior do cometimento do delito, do ano fixado em lei.

Considerando os crimes de competência do Juízo Singular a prescrição punitiva pode ocorrer entre a data da consumação do crime e do recebimento da denúncia ou queixa. A eventual instauração de inquérito policial ou oferecimento da denúncia, ocorrida a prescrição devem ser rejeitados (art. 432, II,CPP). Surge também entre a data do recebimento da denúncia ou queixa e a da publicação da sentença final, em ocorrendo a prescrição não há julgamento de mérito.

Em relação aos crimes de competência do Tribunal do Júri, os prazos prescricionais computam-se entre a data do fato e do recebimento da denúncia; entre a data do recebimento da denúncia e a da publicação da pronúncia; a data da pronúncia e sua confirmação; e entre a data da pronúncia ou sua confirmação e s sentença final. Havendo desclassificação, o prazo final será regulada pela pena máxima cominada à infração para qual foi desclassificada, se ocorrida a prescrição o Juiz poderá declará-la de ofício.

Quanto aos termos iniciais, em conformidade com o art. 111 do CP, iniciam-se no dia em que o crime se efetivou, para os crimes materiais comissivos e omissivos, nos crimes preterdolosos e nos crimes de resultado. Nos crimes permanentes, da data da cessação do comportamento delituoso. Nos crimes de mera conduta, inicia-se na data do comportamento. No crime habitual, da data do último ato delituoso. No crime continuado, da data da realização de cada crime, considerado individualmente; e no crime condicionado, da data em que se verificar a condição. No caso de tentativa, do dia em que cessou o comportamento delituoso, ou seja, do último ato executório.

Com relação à aplicação, as causas de aumento alteram o prazo prescricional. Incidindo causa de aumento de pena de quantidade variável considera-se a que mais agrava. Se de diminuição da pena a que menos diminui. Nos casos de tentativa a pena será reduzida de 1/3 (art. 14, parágrafo único, CP). Exceção se faz nos casos de concurso formal e do crime continuado (art. 70 e 71, CP), no sentido de não tornar mais gravosa a sanção do que a estabelecida no concurso material.

Existindo circunstâncias legais genéricas, sejam agravantes ou atenuantes (art. 61 e 62; art. 65, CP) não influem na fixação do prazo prescricional. Excetuam-se a menoridade relativa (18-21 anos) e amaioridade senil (maior de 70 anos), casos em que o prazo prescricional reduz-se pela metade (art. 115, CP), exigindo-se comprovação através do registro de nascimento, ainda que não haja contestação pela acusação.

Pelo disposto no art. 119 do Código Penal, tratando-se de concurso material (art. 69, CP), concurso formal (art. 70, CP) e crime continuado (art. 71, CP) cada delito tem seu prazo prescricional próprio, não se relacionando entre si. Havendo conflito aparente de normas, a prescrição da pretensão punitiva referente ao fato criminoso específico, principal e ao crime fim abrange a infração penal genérica, subsidiária e o delito meio.

Nos crimes complexos a prescrição da pretensão punitiva referente ao crime que funcionar como elemento típico de outro ou circunstância qualificadora, não se estende a estes, prevalecendo o prazo prescricional referente ao crime mais grave. Nos crimes conexos, há incomunicabilidade do prazo prescricional (art. 108, 2ª parte, CP). Se houver conexão material de crimes, objeto do mesmo processo, a interrupção da prescrição relativa a um deles estende-se aos demais. Se uma das infrações for contravenção, incide o previsto no art. 117, §1º, 2ª parte, do Código Penal. Quando a conexão qualificar um rime, a prescrição da infração que é pressuposto, elemento constitutivo ou circunstância agravante não se estende a este (art. 108, in fine, CP).

De acordo com o art. 114 do Código Penal, com redação dada pela Lei n.º 9.268/96, prescreve a pena de multa em dois anos, quando for a única aplicada, com privativa de liberdade se aplicada alternativamente e com a mais grave se aplicada cumulativamente.

Concernente às causas suspensivas o prazo prescricional não tem curso durante certo período até que cesse a causa que deu origem à suspensão da contagem, recomeçando a correr quando do seu término, isto é, aproveitando-se o prazo já decorrido anteriormente. As causas da suspensão estão previstas taxativamente no art. 116 do Código Penal. As questões prejudiciais ( art. 116, I, CP) sejam obrigatória ou facultativas, se a decisão sobre a existência da infração depender de solução de controvérsia, que o Juiz repute séria e fundada, ocorre a suspensão. O cumprimento da pena pelo agente no estrangeiro (art. 116, II, CP) suspende o prazo prescricional por não caber extradição. Contudo, se cumprir pena por outro motivo no Brasil, não há suspensão. Não obstante o art. 116 do Código Penal ser taxativo, a Constituição Federal de 1988 prevê a suspensão do prazo prescricional no art. 53, §1º, parte final e §2º; a Lei n.º 9.099/95 a institui nos caos em que ocorra a suspensão condicional do processo (art. 89, § 6º). A Lei n.º 9.271/96 alterou a redação do art. 366 do CPP estabelecendo a suspensão do prazo prescricional quando o réu for citado por edital e não comparecer e nem constituir advogado; nesta hipótese o tempo máximo de suspensão é o regulado pela pena prevista em abstrato, portanto, implementado este prazo, a suspensão cessa e o prazo prescricional é retomado, considerando-se o lapso anteriormente decorrido.

Em relação as causas interruptivas (art. 117, CP), o prazo pára temporariamente o seu curso até a cessação da causa que lhe deu origem, voltando a correr do início, ou seja, sem aproveitamento do já decorrido anteriormente. São elas: o recebimento da denúncia ou queixa (art. 117, I, CP); a data da publicação do despacho que a receber, sendo que eventual retificação ou ratificação não obsta a interrupção; a pronúncia (art. 117, II e III, CP), prevalecendo a data da publicação desta; a desclassificação para outro crime de competência do Júri (art. 408, §4º); a sentença condenatória recorrível (art. 117, IV, CP), ainda que parcialmente reformada pelo tribunal, se anulada não produz efeito interruptivo; e os embargos infringentes, que também interrompem o prazo prescricional quando interpostos contra acórdão absolutório. Em concurso de agentes, a causa interruptiva se comunica, exceto em caso de reincidência ou continuação do cumprimento da pena.

Com o advento da LEP, em seu art. 160, não há mais lugar à interrupção do prazo prescricional da pretensão punitiva, em que durante a apelação, encontrava-se o réu em período de prova (sursis).

5.2. PRESCRIÇÃO SUBSEQÜENTE À CONDENAÇÃO

Constitui forma de prescrição da pretensão punitiva e vem prevista no art. 109, §1º do CP, ocorrendo após a sentença condenatória e antes do trânsito em julgado para a acusação. Exceção se faz ao quantum prescricional, que se regula pela pena em concreto, atribuído à sentença e não mais pela pena abstrata prevista em lei.

Vale esclarecer que apesar de transitada em julgado para a acusação a sentença ainda não se tornou definitiva, pois ainda transitou em julgado para a defesa.

Pode ocorrer em quatro momentos diferentes: escoando-se o prazo prescricional sem a intimação do réu quanto a sentença condenatória; intimado, o réu apela, mas a decisão do tribunal é prolatada em tempo superior ao prazo prescricional; o tribunal, pouco antes de findar o prazo prescricional julga o recurso, entretanto o acórdão confirmatório da condenação não é unânime e os embargos contra ele opostos só vão a julgamento após transcorrido o prazo; ou ainda, o tribunal nega provimento à apelação do réu antes de transcorrer o prazo prescricional, mas é interposto recurso especial e/ou extraordinário e antes do julgamento de qualquer deles decorre o lapso prescricional.

Ocorre também quando improvido o recurso da acusação para aumento de pena ou se provido não importe em agravamento da pena ou ainda se agravada, este não influa no cômputo do prazo prescricional.

Sendo imposta a pena privativa de liberdade, regular-se-á a prescrição de acordo com os prazos assinalados nos incisos I a IV do art. 109 do CP, pela pena imposta em concreto fixada na sentença. Se for restritiva de direitos observar-se-á os mesmos prazos, entretanto, se for multa a pena unicamente cominada, não se aplica o §1º, do art. 110, do CP, incidindo o art. 109 c/c 114 e 117, IV do CP, o prazo prescricional sempre será de 02 (dois) anos e ocorrendo a interrupção pela sentença condenatória recorrível o biênio recomeçará a ser contado. Tais prazos sujeitam-se a redução pela menoridade relativa e maioridade senil (art. 115, CP), não sendo acrescidos por reincidência.

Em casos de concurso de crime continuado a prescrição regular-se-á pela pena imposta a cada um deles isoladamente.

Constitui termo inicial desta espécie prescricional da data em que a sentença for entregue em cartório pelo Juiz e o marco final ocorre com o trânsito em julgado para ambas as partes.

Se na sentença houver concessão do perdão judicial, não recorrendo a acusação, pode ocorrer a prescrição superveniente, computando-se o prazo a partir da publicação.

A prescrição da medida de segurança imposta ao semi-imputável considera-se regulada pela pena substituída. Se houver omissão da sentença em relação a imposição da pena a ser substituída caberá embargos de declaração, se por ventura, forem rejeitados ou não tiverem sido propostos cabe a apelação. Ao inimputável, em que a medida de segurança é a única sanção aplicada, os prazos prescricionais baseiam-se na pena mínima cominada em lei.

Se o tribunal não conhecer da revisão criminal, restabelecendo prazo para a apelação do réu, aplica-se o art. 110, §1º do CP, contando-se o prazo da data da publicação da sentença condenatória.

Absolvido o réu em primeiro grau e condenado no Tribunal, o prazo contar-se-á a partir da data do acórdão proferido em sessão, desde que não haja trânsito em julgado.

Havendo concurso formal pode ser aplicado o §1º do art. 110 ao acréscimo da pena, pois caso contrário seria gravoso que o concurso material. Entretanto, tal disposição não pode ser aplicada pelo Juiz de 1º grau, vez que a sua jurisdição exauriu-se com a prolatação da sentença.

5.3. PRESCRIÇÃO RETROATIVA

O instituto originou-se com a edição da Súmula 146 pelo STF em 1964. Nos moldes do Código Penal de 1984, é uma das espécies de prescrição punitiva. A prescrição da pretensão punitiva propriamente dita transcorre da data da consumação do crime até a sentença final; já a retroativa é aquela que ocorre quando a sentença condenatória transita em julgado para a acusação retroagindo à data da consumação do delito. Na propriamente dita, o prazo conta-se do cometimento do delito para frente; na retroativa, da sentença transitada em julgado para a acusação para trás, para o passado. Assim, a pena imposta serve apenas para marcar a quantidade justa pela qual será aferida a prescrição. Prolatada a sentença condenatória esta perderá seus efeitos se ocorrida a prescrição.

O prazo prescricional computa-se da data da publicação da sentença condenatória para trás, até a data do recebimento da denúncia ou queixa, ou entre esta data e a da consumação do crime. Portanto, se excedido o lapso prescricional entre tais marcos terá ocorrida a prescrição retroativa.

Se a pena imposta for privativa de liberdade ou restritiva de direitos serão observados os prazos previstos no art. 109, I a IV do CP. Na pena de multa, a prescrição opera-se como nos demais casos.

As causas de aumento e diminuição da pena, bem como as agravantes e atenuantes, já são consideradas na sentença condenatória, por isso não influem no prazo prescricional em si. No caso de concurso formal, considera-se a pena base imposta na sentença condenatória excluindo-se o acréscimo legal. No crime continuado, leva-se em conta cada uma das penas, se forem iguais, ou a mais grave, se diversas, desprezando-se o aumento. No concurso material cada infração tem seu prazo prescricional considerado isoladamente

A menoridade relativa ou a maioridade senil permitem a redução do prazo prescricional pela metade. A reincidência não aumenta o prazo prescricional visto que já foi considerada na sentença que a reconheceu.

A aplicação da prescrição retroativa pressupõe a existência de uma sentença condenatória irrecorrível para a acusação, ou ainda que se interposto o recurso entes seja improvido, ou se provido não altere o prazo prescricional. Equipara-se à sentença condenatória o acórdão condenatório prolatado pelo Tribunal quando o réu tiver sido absolvido em primeira instância. Não é necessário recurso do réu e nem a sua intimação da sentença condenatória para início da contagem do prazo prescricional. Trantando-se de sentença concessiva de perdão judicial também incide o princípio retroativo, regulado pelo mínimo abstrato da pena.

Não cabe ao Juiz de 1º grau reconhecer a prescrição retroativa, pois ao prolatar a sentença exaure sua jurisdição. O Juiz da execução também não é competente, cabendo-lhe apenas declarar a prescrição da pretensão executória. Assim, a prescrição retroativa pode ser reconhecida de ofício pelo Tribunal ou em grau de Habeas Corpus, Apelação e Revisão, também em Embargos de Declaração, Infringentes e Agravo de Execução. Quando a competência originária for do Tribunal nada impede que seja declarada a extinção da punibilidade, ainda que o réu seja condenado, não sendo obstáculo a interposição de recurso especial ou extraordinário sem efeito suspensivo.

São causas interruptivas da prescrição retroativa (art. 117, CP): a data da publicação da sentença condenatória, seja no momento da publicação da sentença condenatória ou na data do julgamento em sessão, já em 2ª instância; o prazo anterior ao recebimento da denúncia ou queixa, ou seu aditamento; a sentença absolutória com recurso da acusação; sentença condenatória anulada; e a comunicabilidade nos casos de concurso de agentes, salvo o caso da reincidência e o início ou continuação do cumprimento da pena.

5.4. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA

Com o trânsito em julgado da sentença condenatória o direito de punir de Estado se transforma em jus executionis. Pelo decurso do tempo o Estado perde este poder-dever ou seja, o poder de executar a sanção penal imposta. O dever de executar a sanção no prazo estabelecido é irrenunciável.

Nesta modalidade de prescrição, a condenação já se tornou definitiva para ambas as partes, ainda que um dos seus termos iniciais seja o trânsito em julgado da sentença condenatória para a acusação; o outro, a revogação do sursis ou o livramento condicional; e, finalmente, o dia em que se interrompe a execução da pena. Excepcionam-se os casos de superveniência de doença mental e/ou internação em hospital, casos em que o tempo da interrupção deve ser computado.

O prazo regula-se pela pena imposta na sentença transitada em julgado. Na pena imposta não se desconsideram eventuais causas de agravamento ou de aumento eventualmente reconhecidas, salvo os casos do art. 70 e 71 do Código Penal. Se houver substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, aquela é que comanda o lapso prescricional da pretensão executória.

Quanto à medida de segurança imposta ao semi-imputável (art. 26, parágrafo único e art. 98, CP) e ao inimputável não há dispositivo referente a prescrição executória previsto no ordenamento. Entretanto, por constituir sanção, aplica-se por analogia, os prazos contidos no art. 109 do CP, computados pela pena substituta aposta na sentença ou se não dosada, reger-se-á pelo mínimo abstrato previsto na lei (art. 109, CP).

No caso da evasão ou revogação do livramento condicional, a prescrição regula-se pelo tempo que ainda restar da pena. Inadmissível a aplicação do princípio da detração penal em termos de dedução do tempo da prisão provisória, incabível também no caso de concessão do perdão judicial.

Havendo reincidência, o prazo prescricional executório acresce-se em 1/3 (um terço). Esta aumento pressupõe que a sentença condenatória tenha reconhecido a reincidência. O tipo da pena não influi no reconhecimento da reincidência.

Nos concursos de crime e no continuado a prescrição executória opera da mesma forma que na prescrição punitiva. Concernente à multa, o art. 51 do CP, foi alterado pela Lei n.º 9.268/96 em que se tem que o valor da pena de multa deve ser inscrito como dívida ativa em favor da Fazenda Pública, de modo que não existe mais prescrição da pretensão executória no tocante a multa.

À prescrição executória também aplica-se o disposto quanto a menoridade relativa e a maioridade senil, reduzindo-se o prazo pela metade. Sendo circunstância de caráter pessoal é incomunicável no caso de concurso de agentes.

Suspende-se a prescrição durante o tempo em que o condenado estiver preso por outro motivo que não seja o cumprimento de pena no estrangeiro, como prisão preventiva, em flagrante, em decorrência de pronúncia ou sentença condenatória penal; excetuadas as prisões de natureza civil (art. 110, parágrafo único, CP).

As causas interruptivas também previstas no art. 117, V e VI do CP ocorrem quando do início ou continuação do cumprimento da pena e pela reincidência. Se o condenado vier a fugir, na data da fuga tem início novo prazo prescricional regulado pelo restante da pena (art. 112, II, 1ª parte e art. 113, CP). Recapturado o fugitivo, novamente se interrompe o prazo. Perde-se o efeito interruptivo no caso de anulação de certidão de trânsito em julgado da sentença condenatória, na data da prática do novo delito interrompe-se o prazo prescricional. O efeito interruptivo não fica condicionado ao trânsito em julgado da sentença condenatória do novo, mas sim ao reconhecimento deste. Se absolvido o réu desaparece a reincidência e, conseqüentemente, o efeito interruptivo incidente sobre o primeiro delito.

No concurso de pessoas comunicam-se as causas interruptivas da prescrição, exceto na reincidência e no início ou continuação do cumprimento da pena. Nos delitos conexos, quando objetos do mesmo processo há comunicação das causas interruptivas relativas a qualquer deles (art. 117, §1º, 2ª parte, CP).


6. EFEITOS

Na prescrição da pretensão punitiva, declarada a extinção da punibilidade o Juiz deverá ordenar o encerramento do processo e se houver sentença condenatória, ela deixa de existir. Da mesma forma não há falar-se em registro na folha de antecedentes criminais do réu e nem na certidão extraída dos Livros do juízo, salvo quando requisitados por juízo criminal.

A prescrição subseqüente gera os seguintes efeitos: irresponsabilidade do acusado pelo crime, a não inscrição do seu nome no rol dos culpados e nem a geração de futura reincidência. Não responde pelas custas processuais e o dano resultante do crime só lhe poderá ser cobrado pela via ordinária do Código de Processo Penal (art. 66 e 67, CPP).

Na prescrição retroativa extingue-se a própria pretensão de obter uma decisão à respeito do crime, implica irresponsabilidade do acusado, não marca seus antecedentes e nem gera futura reincidência. O réu não responde pelas custas do processo e os danos poderão ser cobrados no cível por via ordinária.

No tocante a prescrição da pretensão executória impede-se que execução das penas e da medida de segurança (art. 96, parágrafo único, CPP), subsistindo as conseqüências de ordem secundárias da sentença condenatória, como lançamento do nome do réu no rol dos culpados, pagamentos das custas e reincidência. A sentença condenatória pode ser executada no cível para reparação do dano (art. 63, CPP). Se houver pagamento de fiança, seu valor fica sujeito ao pagamento das custas e reparação do dano (art. 336, parágrafo único, CPP). Tratando-se de extradição, esta é inexeqüível.


7. LEGISLAÇÃO ESPECIAL

No delito de abuso de autoridade; crimes contra a segurança nacional, contravenções; delitos contra a economia popular; crimes eleitorais; crimes falimentares; crimes de imprensa e crimes militares, não havendo disposição específica, aplica-se, subsidiariamente, as normas previstas no Código Penal quanto à prescrição.


8. CONCLUSÃO

O instituto teve origem no ensejo de impor ao Estado um termo legal que limitasse o seu direito de punir, aos parâmetros da razão e convivência. A pena só é legítima quando traduz o sentimento médio da coletividade, assim, insistir em apenar o delito cuja repercussão social diminuiu pelo esquecimento criaria dentro do Direito Penal uma contradição de grande interesse entre seus fins teóricos e a sua respectiva efetivação.

Tem por escopo amenizar a situação do réu, objetivando livrá-lo da punibilidade pelo decurso do tempo, marcado pela inércia de punir ou demora do Estado em exercer tal poder-dever. Logo, a prescrição é um meio de viabilizar a justiça penal com a realidade fática e não um estímulo à impunidade ou criminalidade.

Com a evolução histórico-jurídica, a reforma de 1984 consubstanciou nos art. 109 e 110 do CP as espécies de prescrição (prescrição da pretensão punitiva e prescrição da pretensão executória), regidas por regras próprias, e igualmente conhecidas em outros países. Porém, possui o sistema brasileiro tipo prescricional próprio – a prescrição retroativa, que se originou em nossos tribunais (Súmula 146, STF)e após muitas críticas e debates encontra-se, atualmente, contida no ordenamento jurídico positivo.

Em suma, embora complexo, o instituto se faz necessário no ordenamento para não atribuir ao Estado um direito ilimitado, sendo inconcebível perpetuar uma relação jurídica ad eternum, salvo raríssimas exceções. Visa impedir eventuais incertezas e injustiças que venham a surgir em virtude da inércia estatal em cumprir com os direito e obrigações decorrentes de sua natureza. Assim, vencido o lapso temporal previsto em lei para a extinção da punibilidade pela prescrição, esta deve ser decretada ex officio ou a requerimento do interessado.


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Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

TOURINHO, Andréa Martins; DANTAS, Cristiane Müller. Do instituto da prescrição penal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 4, n. 34, 1 ago. 1999. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/965. Acesso em: 16 abr. 2024.