Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/9893
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

Apontamentos sobre o fenômeno jurídico do auto de infração de trânsito

Apontamentos sobre o fenômeno jurídico do auto de infração de trânsito

Publicado em . Elaborado em .

Sumário: Introdução. Mundo social (dos fatos) e mundo jurídico. Incidência e aplicação. Mundo jurídico e seus planos. Planos do mundo jurídico e elementos do suporte fático. Plano da existência. Plano da validade. Plano da eficácia. Distinções entre o suporte fático da infração de trânsito e o do auto de infração de trânsito. Infração de trânsito. Auto de infração de trânsito. Conclusão. Bibliografia.


INTRODUÇÃO

O Direito é meio de controle social, criado pelo homem para regular suas relações intersubjetivas. O homem percebe que não se basta em si, que é necessário abandonar o velho modo nômade de vida, onde o eu se sobrepujava ao nós, e se fixar num lugar. A partir daí o nós passou a sobrepor-se ao eu e nesse momento surge a necessidade de regramento de determinadas condutas, a fim de que se pudesse assegurar a própria sobrevivência do grupo.

Com o embrião social fecundado, nessa fase, surge o direito [01], pois, onde há o homem há a sociedade, onde há a sociedade há o direito, portanto, onde há o homem há o direito. Então, o Direito, como instrumento de adaptação social, revela-se fundamental, principalmente pela sua cogência, para a pacificação da sociedade.

Surgem, bem verdade, outros meios de controle social, como a política, a moral, a religião etc., mas, neste trabalho, apenas nos interessa o direito. Assim, pela inegável evolução e dimensão a que o Direito chegou, o homem sente a necessidade de pensá-lo. O povo romano marcou, com grafia perpetua, sua passagem na evolução do Direito, dando-lhe conteúdo até hoje discutido e aplicado.

Assim, nascem as mais variadas teorias explicativas desse fenômeno, às quais poderíamos dedicar tratados. Porém, como a natureza deste artigo não permite tamanha reverência, adotaremos a teoria que se aplicará no decorrer de toda exposição, a teoria do fato jurídico, cuja cientificidade e precisão devemos a Pontes de Miranda.

Para que possamos melhor entender a precisão científica emprestada à teoria do fato jurídico é necessário destacar quais as diferenças, primeiramente, entre o mundo fático e o jurídico e, posteriormente, entre o existir, o valer e o ser eficaz, como o próprio Pontes de Miranda esclarece no prefácio do seu Tratado de Direito Privado:

A obra obedece a programa rigorosamente científico: a distinção entre o mundo fático e o mundo jurídico, que é o do sistema jurídico, bem à frente, e concorre imensamente para clarear os assuntos e para a solução de problemas delicados que perturbavam a ciência européia; depois, a distinção entre o plano da existência, o plano da validade e o plano da eficácia, sem a qual em tantas confusões incorrem os juristas, baralhando ‘ser’, ‘valer’ e ‘ter efeito’, como se fossem equivalentes ‘ser’, ‘ser válido’, ou ‘ser eficaz’, ou ‘não ser’, ‘não ser válido’, ‘ser ineficaz’. (grifamos)

Antes, porém, de definirmos o que venha ser mundo jurídico ou mundo fático, importa que saibamos ser ambos formados por fatos; aquele por fatos jurídicos e esse por fatos sociais. "Fatos. Quando se fala de fatos alude-se a algo que ocorreu, ou ocorre, ou vai ocorrer." [02]. Portanto, os fatos são passados, presentes ou futuros e todos estão inseridos no mundo social, são sensíveis, perceptíveis, abstratos ou concretos, percebemo-los. Os seres humanos em si mesmos são fatos. O mundo mesmo, em que se vê acontecerem os fatos, é a soma de todos os fatos que ocorreram e o campo em que os fatos se vão dar. Por isso mesmo, só se vê o fato como novum no mundo. [03]

Porém, não basta ser fato, é necessário que esse fato, passado, presente ou futuro, concreto ou abstrato, seja relevante para o Direito. Destarte, percebemos que mesmo o mundo jurídico, distinto do mundo fático, encontra-se, necessariamente, nele inserido. Temos, portanto, no trato do direito, de discernir o mundo jurídico e o que, no mundo, não é mundo jurídico. [04]

Como já explicamos acima, o homem ao abandonar o velho modo de vida sentiu necessidade de regular determinados fatos, a fim de garantir a própria sobrevivência e, por conseguinte, alguns fatos ganharam relevância para o Direito, são diferençados, destacam-se dos outros fatos sociais e, por isso, comporão o mundo jurídico.

O fato componente do mundo jurídico é o fato social colorido pela regra jurídica. Assim, também, será necessário tratar desse instrumento intelectual que adjetiva um fato, para torná-lo jurídico.

Hoje, os mais diversos e preparados juristas, nacionais e internacionais, buscam conceituar o que é norma ou regra jurídica. Entretanto, por não caberem, neste trabalho, as altercações atuais que o tema exige, adotaremos evidentemente sem olvidar as contendas que envolvem o assunto, o conceito pontesiano [05], no qual "A regra jurídica é norma com que o homem, ao querer subordinar os fatos a certa ordem e a certa previsibilidade, procurou distribuir os bens da vida." [06].

Disso decorre que a norma jurídica possui, necessariamente, um suporte fático e um preceito, isto é, uma hipótese de incidência e um efeito, que não se confunde necessariamente com uma sanção. Concretizado o suporte fático, sobre ele incide a norma jurídica, fazendo com que o fato, sobre qual incidiu a norma, ingresse no mundo jurídico.

Logo, para que ocorra a passagem de fatos lato sensu para o mundo jurídico é necessário que uma norma tenha esse fato como seu suporte fático abstrato, tendo o fato se concretizado no mundo social, incide sobre ele a norma jurídica o colorindo e o diferenciando dos outros fatos.

Assim ocorre com a infração de trânsito, objeto central do auto de infração de trânsito, concretizado o seu suporte fático a norma incidirá, fazendo nascer o fato jurídico da infração de trânsito, que em nada tem a ver com o ato jurídico administrativo: auto de infração de trânsito.

É importante guardar essa distinção, porque, no julgamento do auto de infração de trânsito, serão investigados dos fatos jurídicos diversos: o auto de infração de trânsito e a própria infração.


MUNDO SOCIAL (DOS FATOS) E MUNDO JURÍDICO

Pontes de Miranda, no seu Tratado das Ações, tomo I, Capítulo I, conceitua os elementos que sempre reputou necessários, para uma boa compreensão do fenômeno jurídico:

1. Conceito de mundo fático e conceito de mundo jurídico. Os conceitos de que usa o jurista são conceitos de dois mundos diferentes: o mundo fático, em que se dão os fatos físicos e os fatos do mundo jurídico, quando tratados somente como fatos do mundo fático, e o mundo jurídico em que só se leva em conta o que nele entrou, colorido pela regra jurídica que incidiu. [07]

O mundo social, no qual também encontramos o mundo jurídico, é o plano da realidade fática, onde vemos, sentimos e palpamos as realidades de fato, concretas e abstratas, em suma, é a totalidade dos fatos. Pontes de Miranda, com a precisão que lhe é peculiar, conceitua: "O mundo não é mais do que o total de fatos e, se excluíssemos os fatos jurídicos, que tecem, de si mesmo, o mundo jurídico, o mundo não seria a totalidade dos fatos." [08]

Por conseguinte, se o mundo social engloba o mundo jurídico e esses se compõem de fatos, percebemos que os fatos movem os mundos, sejam por criarem novos fatos, sejam por serem fatos. Portanto, o fato é o elemento formador dos mundos, sem ele não se temos esses. Assim, o mundo social, conforme precisado acima, é o conjunto de fatos, inclusive jurídicos.

O mundo social é composto de fatos, incluindo nele o mundo jurídico. Então, como distinguir o que é pertencente ao mundo social e o que pertence ao mundo jurídico? Para responder a esses questionamentos, devemos ter em mente que só alguns fatos são relevantes para o direito, de modo que nem todos os acontecimentos, abstratos ou concretos, importam para o direito.

Assim, com mais facilidade visualizaremos o mundo jurídico, pois, no dizer pontesiano:

Os fatos do mundo ou interessam ao direito, ou não interessam. Se interessam, entram no subconjunto do mundo a que se chama mundo jurídico e se tornam fatos jurídicos, pela incidência das regras jurídicas, que assim os assinalam. Alguns entram duas ou mais vezes, de modo que a um fato do mundo correspondem dois ou mais fatos jurídicos. A razão disso está em que o fato do mundo continua lá, com a sua determinação no espaço e no tempo, a despeito da sua entrada ou das suas entradas no mundo jurídico: a morte de A abre a sucessão de A, dissolve a comunhão de bens entre A e B, dissolve a sociedade A & Companhia, exclui a A na lista de sócios do Jockey Club e de professor do Instituto de Biologia ou de membro do corpo diplomático. [09] (grifos aditados)

Dessa forma, vemos que o mundo jurídico é uma composição abstrata de fatos que se realizam no plano social que, se interessam ao direito, compõe o mundo jurídico, podendo, inclusive, entrar nesse mundo várias vezes, produzindo relações jurídicas diversas.

Assim, o mundo jurídico é uma abstração lógica na qual o direito se realiza, constrói-se e produz efeitos que interferem diretamente no comportamento social dos sujeitos, componentes do mundo social, é um fato abstrato preso à realidade social, da qual não pode se dissociar sem perder a sua finalidade conceptiva. Como bem leciona o professor alagoano, Adriano Soares da Costa [10]:

O Direito é processo de adaptação social. Por ele, e por intermédio dele, o ser humano regula condutas, permitindo a vida em sociedade, contendo a subjetividades em sua ipsiedade, em proveito para a alteridade social. Não visa ele suprimir o eu, mas tornar possível a polaridade do eu-tu, de modo que o Direito só cumpre a sua finalidade de transcender a subjetividade do eu para alcançar a intersubjetividade do nós, tornando possível a dimensão social do homem. Como processo de adaptação social, o Direito busca interferir na zona material das condutas humanas, por meio de sua coercibilidade, solidificando o tecido social e impedindo, o mais que possível, que nele surjam conflitos, que quebrem a paz social. O Direito, portanto, é fato social, e como tal há de ser analisado e estudado, como objeto do conhecimento. A perda dessa dimensão social do Direito, de sua teleologia, implica a perda dessa dimensão terrena do ser-jurídico, levando-o a ser concebido como mera arquitetura lógica, distante de sua concretude no mundo da vida, na intimidade das relações cotidianas. (grifamos)

Por conseqüente, o mundo social é aquele no qual os fatos, passados, presentes ou futuros, concretos ou abstratos, concretizam-se e mundo jurídico é aquele formado pelos fatos sociais relevantes para o direito, coloridos pela incidência da regra jurídica, capazes de vincular a conduta humana. Assim, resta irrefragável o ensinamento do mestre, também alagoano, Marcos Bernardes de Mello [11]:

Resulta evidente, assim, a diferença substancial que existe entre o fáctico, enquanto apenas fáctico, e o jurídico, porque somente este pode ter algum efeito vinculante da conduta humana. O mundo jurídico, está claro, se vale dos fatos da vida e, mais que isso, é constituído por eles próprios; resulta da atuação (incidência) da norma jurídica sobre os fatos, juridicizando-os, e não representa, por isso, uma decorrência natural dos fatos. Enquanto com os demais fatos seu agrupamento em classes tem por elemento referência dado que lhe é natural (a morte é fato biológico porque se refere à vida), os fatos jurídicos são pela vontade humana, que, através, das normas jurídicas, imputa caráter jurídico aos simples fatos da vida, integrantes naturais de outros mundos.


INCIDÊNCIA E APLICAÇÃO

Além dos conceitos de mundo fático e mundo jurídico, indispensáveis à compreensão do fenômeno jurídico, também é relicário compreendermos a diferença entre incidência e aplicação do Direito. Por isso Pontes de Miranda, ao tratar da matéria é claro e incisivo:

3. Incidência e aplicação. Das considerações acima temos de tirar: (a) que é falsa qualquer teoria que considere apenas provável ou suscetível de não ocorrer a incidência das regras jurídicas (o homem não organizou a vida social deixando margem à não-incidência, por que teria sido o ordenamento alógico, em sistema de regras jurídicas em que essas poderia não ser), e.g., as teorias que afirma que algumas regras jurídicas não se aplicam e, pois, não são (confusão entre incidência e aplicação); (b) que é essencial a todo estudo sério do direito considerar-se, em ordem, a) a elaboração da regra jurídica (fato político), b) a regra jurídica (fato criador do mundo jurídico), c) suporte fático (abstrato), a que ela se refere, d) a incidência quando o suporte fático (concreto) ocorre, e) o fato jurídico, que daí resulta, f) eficácia do fato jurídico, isto é, as relações jurídicas e mais efeitos dos fatos jurídicos. [12] (grifos aditados)

Vemos que a noção de incidência é fundamental. Porém, sua compreensão não se mostra simples, em que pese haver uma tendência natural de acharmos que esse conceito se prende a uma realidade mecânica, descurando maior estudo sobre o tema. Este fenômeno se processa num plano lógico do pensamento, plano que, se mal dimensionado, pode causar erros fatais.

Assim, para este trabalho, o importante é sabermos que a incidência se processa no plano dos pensamentos, consoante as precisas afirmações de Pontes de Miranda:

  • "O mundo jurídico está, pois, no pensamento do jurista e do povo." [13],

  • "A incidência da regra jurídica ocorre como fato que cria ou continua de criar o mundo jurídico; é fato dentro do mundo dos nossos pensamentos, - perceptível, porém em conseqüências que acontecem dentro do mundo total." [14],

  • A incidência da lei, pois que se passa no mundo dos pensamentos e nele tem de ser atendida, opera-se no lugar, tempo e outros ‘pontos’ do mundo em que tenha de ocorrer, segundo as regras jurídicas" [15] e

  • "A incidência das regras jurídicas nada tem com o seu atendimento: é fato do mundo dos pensamentos." [16]

Então, que mundo dos pensamentos é esse? O professor alagoano Adriano Soares da Costa [17] esclarece alguns pontos nodais: o primeiro é a desvinculação da psique individual com o mundo dos pensamentos, pois este é mais extenso que aquele; o segundo, decorrente desse primeiro, é a irrelevância do conhecer ou do querer do ser humano na sua individualidade para que ocorra a incidência; e o terceiro, o conhecimento ou prova da ocorrência do fato jurídico em nada tem haver com incidência.

Então, o mundo do pensamento é aquele plano universal, acessível a todos, desligado da psique individual, que é movimentado por fatos a todo instante, perceptíveis não só no imaginário comum da sociedade, mas também na própria concretude dos acontecimentos visíveis, sem vedação que essa concretude não seja visível.

A incidência, que ocorre no mundo dos pensamentos, qualifica os fatos sociais como jurídicos, possuindo como principais características a incondicionabilidade, infalibilidade e a inesgotabilidade, como bem assevera o mestre Pontes de Miranda:

  • "Não importa se a pessoa conhece, ou não conhece a regra jurídica: ela, por ser jurídica, incide com ou sem esse conhecimento" [18];

  • "A incidência das regras jurídicas não falha; o que falha é o atendimento a ela" [19]; e

  • "A incidência das regras jurídicas é sobre todos os casos que elas têm como atingíveis" [20].

Concretizado o suporte fático a norma jurídica, sem a menor possibilidade de falha ou qualquer condição, incide. Assim como, tantas quantas sejam as vezes que se concretize o seu suporte fático, inesgotavelmente, a norma incidirá, exceto, nesta última hipótese se se tratar de norma individual e concreta.

Portanto, já compreendemos que a incidência é algo totalmente desvinculado da atuação humana, pois ela se processa num plano onde o homem não possui nenhuma ingerência, porque apenas capta o que lá existe. Já a aplicação, que provém, diretamente, desse ato de captar o que se passou no mundo dos pensamentos, sofre a ingerência do homem, tal qual a luz que passa por um prisma, repartindo-se nas cores do arco-íris. Compreender esses conceitos é por demais importante para entender o julgamento do auto de infração de trânsito, pois, por várias vezes, o jurista irá se deparar com situações nas quais a confusão entre a aplicação e a incidência gerará erro fatal no julgamento do auto de infração de trânsito.

A aplicação é fruto da atividade humana, depende do homem e, por isso, está sujeita à falibilidade, assim como o daltônico nem sempre expressa com correção o fenômeno fotoluminescência que vê. O intérprete, o juiz e o operador do direito são os principais responsáveis por essa atividade, porque eles trazem para realidade fática aquela realidade abstrata, por conseguinte, essa passagem, essa tradução, às vezes, sofre alguma interferência, produzindo um resultado diverso do que aconteceu no mundo dos pensamentos.

Por isso que uma das características da aplicação é a falibilidade, motivo pelo qual Pontes de Miranda [21] afirmou:

A incidência das regras jurídicas não falha; o que falha é o atendimento a ela. Se se escreve, por exemplo, que, ‘se há infração da regra jurídica, a incidência da regra falha em realidade’, está-se a falar em acontecimento do plano do atendimento (aí dito da realidade), com os olhos fitos no plano das incidências que é o do mundo jurídico, o plano do pensamento.

E mais adiante arrematou:

A incidência das regras jurídicas é infalível; isto é, todos os suportes fáticos, suficientes, que se compuserem, são coloridos por ela, sem exceção. A vontade humana nada pode contra a incidência da regra jurídico, uma vez que ela se passa em plano do pensamento. Não se dá o mesmo com sua realização. A regra jurídica somente se realiza quando, além da coloração, que resulta da incidência, os fatos ficam efetivamente subordinados a ela. Aí, a vontade humana pode muito. [22]

Logo, é bastante clara a diferença entre a incidência e a aplicação do direito, fenômenos importantíssimos, mas bem diferentes. E a aplicação deve, para ser a mais perfeita possível, aproximar-se ao máximo da incidência.


MUNDO JURÍDICO E SEUS PLANOS

Vimos que o mundo jurídico é aquele composto de fatos jurídicos, fruto da incidência, que ocorre no mundo social, pois o plano do pensamento o compõe. Conhecida a formação do mundo jurídico, é necessário conhecer-lhe a estrutura, como funciona e qual conseqüência pode surgir do seu funcionamento.

O mundo jurídico se compõe de três planos: existência, validade e eficácia. Cada um desses planos tem um resultado próprio, trabalhando como filtros, para que, ao fim, possa haver uma relação jurídica. Destarte, o plano da existência filtra os fatos que não são jurídicos, ou seja, se não passar por ele não existem no mundo jurídico; o da validade, quando se trata de atos jurídicos lato sensu, investigando apenas os atos jurídicos existentes, verificando sua validade ou invalidade; e, por fim, o da eficácia, quando então, os fatos jurídicos lato sensu estão aptos a produzir a relação jurídica.


PLANOS DO MUNDO JURÍDICO E ELEMENTOS DO SUPORTE FÁTICO

O mundo jurídico compõe-se de fatos jurídicos, mas se divide em planos. O primeiro plano é o mais importante de todos, pois está ligado ao ser ou não ser jurídico. Nele se investiga se a norma incidiu ou não, se o(s) fato(s) apresentado(s) é/são suficiente(s) à incidência. O operador do direito, ao se deparar com os fatos que lhe são apresentados, terá que, invariavelmente, percorrer esse caminho, a fim de desvendar se os fatos apresentados são jurídicos ou não, em sendo jurídicos, se são, a depender da espécie dos fatos, válidos ou inválidos, e, ao final, se são eficazes ou não.

PLANO DA EXISTÊNCIA

Existir é ser real, é haver. Logo é sobre esse fato de ser e de haver que se ocupa o plano da existência. Nele o fato social, após a incidência, ingressa. Uma vez presente no mundo jurídico, em virtude da concreção dos elementos nucleares do suporte fático, o fato social passa a ser parte do mundo jurídico, e, por isso, gera conseqüência.

Existir um fato jurídico, ainda que ineficaz, possui relevância inafastável, pois para expurgá-lo do mundo jurídico necessária será a sua desjurisdicização, isto é, exigir-se-á que uma outra norma sobre ele incida para retirá-lo do mundo jurídico. Diferente daquele fato que nem sequer entrou no mundo jurídico. Este, não precisará ser desjurisdicizado, razão fundamental porque as ações declaratórias de inexistência jamais prescrevem.

Todos os fatos sobre qual incide a norma jurídica, necessariamente, passam por este plano da existência, tanto os fatos jurídicos stricto sensu, ato-fato jurídico, ato jurídico lato sensu, fato jurídico stricto sensu ilícito, ato-fato jurídico ilícito e ato jurídico lato sensu ilícito.

Há certa celeuma na doutrina sobre os fatos jurídicos lato sensu ilícitos, uma vez que para alguns, o ser ilícito o fato não o faz jurídico [23]. Tal entendimento não merece o menor acolhimento, pois é proveniente de uma visão deficiente e oblíquo do fenômeno da jurisdicização.

Vimos, que para existir é necessário estar no, ou passar pelo, plano da existência, sabemos que a existência é fundamental porque sem ela nem sequer podemos falar em fatos jurídicos. Ingressar no mundo jurídico, após a incidência da regra jurídica sobre o seu suporte fático, é irrefutavelmente mergulhar no plano da existência.

Assim como existem planos do mundo jurídico, no suporte fático há elementos, que são afetos àqueles planos. Sabemos já que o plano primeiro e fundamental é o plano da existência, ele é, dos planos, o nuclear, o principal. Logo, dentro do suporte fático haverá um elemento tão fundamental e principal quanto esse plano. E há! São os elementos nucleares: chamados de cerne e completante.

É importante enxergarmos a ligação existente entre os elementos do suporte fático e os planos do mundo jurídico. Devemos, já que conhecemos os elementos de existência de um fato jurídico, identificar quando existirá um auto de infração de trânsito.

O Código de Trânsito Brasileiro não trouxe nenhuma disposição sobre o tema, mas, por isso, é impossível de identificá-lo? Evidentemente que não. Porém, então, quais são os elementos nucleares do suporte fático do auto de infração de trânsito? Conforme melhor explicaramos no plano da validade, um ato jurídico para ser válido precisa existir antes, essa existência depende, naturalmente, da concreção de determinados elementos.

Assim, é indispensável, para que exista um auto de infração de trânsito, que haja: a) uma conduta, praticada por qualquer pessoa, que possa ser tipificada como infração [24]; b) a lavratura do auto de infração pela autoridade de trânsito ou por um agente da autoridade de trânsito; e c) a lavratura desse AIT deverá ter a forma escrita.

PLANO DA VALIDADE

Anteriormente anotamos que não são todos os fatos jurídicos lato sensu que têm passagem obrigatória por este plano. Apenas por ele passam aqueles fatos cuja vontade humana tenha relevância. Isto é, apenas os atos jurídicos lato sensu passam pelo plano da validade, conforme bem esclarece Marcos Bernardes de Mello [25]:

Nos fatos jurídicos em que a vontade não é elemento do suporte fático e nos fatos ilícitos não há como pretender possam ser inválidos. Quanto aos fatos jurídicos stricto sensu, que resultam da juridicização de fatos da natureza ou do animal, e aos atos-fatos, que são realidades físicas decorrentes da ação humana, até involuntária, seria ilógico considerá-los deficiente e punidos com a invalidade pelo direito. Um nascimento não pode ser nulo, como não pode ser nula a semeadura que gerou a plantação. Aqui as realidades fáticas impedem que se lhes negue validade.

Isso decorre de uma lógica natural, até mesmo porque o mundo jurídico é um mundo lógico. Não há como se perquirir válido ou inválido o nascimento com vida, há? Obviamente que não, ou o nascimento com vida existiu ou não. Diferentemente, de um negócio jurídico, diferente de uma sentença judicial ou dum auto de infração de trânsito, fatos nos quais o elemento volitivo (capacidade ou competência) é por demais importante.

Essa espécie de fato jurídico é bem mais complexa do que a até aqui analisada, porque, para se analisar a vontade emitida, importa que ela se revista de uma forma prescrita ou não defesa em lei, importa que os sujeitos possam emiti-la, consciente, livre e legitimamente, e importa que essa vontade recaia sobre um objeto ou um fim lícito e possível.

De bom alvitre lembrarmos que esses elementos complementam àqueles elementos nucleares, isto é, qualificam, adjetivam os elementos principais do suporte fático, daí serem chamados de complementares, por exemplo: [(autoridade de trânsito ou agente da autoridade de trânsito (nuclear))+(competente (complementar))].

Logo, utilizando-nos do que já foi esclarecido até o momento, para que exista um ato jurídico lato sensu, fundamentalmente, deverão estar presentes manifestação ou declaração de vontade, emitidas por sujeitos, através de uma forma, direcionada a um objeto ou fim. Vemos que os elementos referidos neste parágrafo não estão adjetivados, tal qual no parágrafo anterior.

Naquela realidade não falamos em vontade livre e consciente ou a existência de uma conduta ilícita de trânsito motivadora da autuação, não há, no plano da existência, preocupação se os sujeitos são capazes ou não; ou se é uma autoridade de trânsito ou um agente dessa autoridade competente (legítima), se a forma foi a prescrita em lei ou a não proibida; menos ainda, se o objeto ou o fim é lícito

Isso porque a manifestação livre e consciente da vontade, a capacidade dos sujeitos, o fim lícito e possível e a forma prescrita ou não defesa em lei, complementam aqueles elementos nucleares. É importante entendermos que, neste plano da validade, o que analisaremos são os elementos complementares, pois eles vão dar àqueles elementos nucleares uma complementação, que fará ser eficiente ou deficiente o suporte fático.

Para melhor esclarecermos esse fenômeno, socorremo-nos de um exemplo: o condutor A pratica uma conduta "x", o agente da autoridade de trânsito entende que essa conduta corresponde a uma infração prevista no Código. Assim, por imposição legal, art. 280, do CTB, ele lavrará o auto de infração de trânsito, porém, não fez constar no AIT a data e a hora, restringindo-se, apenas, a identificar o local.

Analisemos os elementos do exemplo acima. Primeiro, antes de investigarmos a validade do AIT, cumpre-nos saber se ele existe. Por isso, temos que identificar os elementos nucleares do suporte fático concreto.

Há uma conduta "x" possivelmente infratora de norma de trânsito, há a lavratura por um agente da autoridade de trânsito e, por fim, há uma forma escrita. Portanto, o auto de infração de trânsito existe.

Uma vez existente, passaremos para o plano da validade, que acabamos de estudar. Neste plano analisaremos se: a) a conduta "x" é ilícita, logo, uma infração; b) se o agente da autoridade de trânsito é competente, ou seja, se a infração se concretizou na sua circunscrição; e c) se a forma escrita é a legal, atendendo aos requisitos exigidos pelo art. 280, do CTB.

Como, no exemplo acima, só temos referência ao desatendimento do inciso II, do Art. 280, do CTB, pela não identificação da data e hora, temos um AIT inválido (irregular), pois a forma escrita é ilegal.

PLANO DA EFICÁCIA

Este plano é o último estágio por qual passa um fato jurídico, dele é que surgem os direitos, as pretensões, obrigações, as exceções etc. é o plano por excelência da formação das relações jurídicas. Uma vez ultrapassado este plano, concretas serão as relações jurídicas.

Há muito superamos a idéia de que existia relação jurídica entre homem e coisa, porque só podem ser sujeitos de direitos e obrigações as pessoas. Por isso é que sempre, inafastavelmente, todo fato jurídico terá o homem presente, direta ou indiretamente. Logo, temos que afastar a idéia de que o veículo é que seria multado, porque, tecnicamente, isso não é possível. A multa proveniente de uma infração de trânsito é uma espécie de obrigação propter rem, ou seja, é daquela que acompanha a coisa.

No nascer com vida, o homem está presente; no negócio jurídico; no auto de infração de trânsito etc. só há direito se houver uma pessoa para ser sujeito.

Essa afirmativa pode, claramente, levar os menos atentos a cometer erros, ou achar inócua a classificação das espécies de fatos jurídicos, pois se o homem está sempre presente, não existiriam fatos jurídicos, mas, tão-somente, atos jurídicos. Pensar assim seria cometer erro primário, inconcebível! O que faz um fato jurídico stricto sensu não ser um ato jurídico não é a presença do homem naquele fato, mas a relevância, para o direito, da sua vontade.

Vimos, no plano da validade, um exemplo de um auto de infração inválido, mas, suponhamos que, naquele exemplo, não houvesse nenhuma irregularidade, o AIT estivesse perfeito.

Ao chegar neste plano da eficácia o AIT teria que ser emitido pela autoridade de trânsito ou pelo seu agente, através da notificação de autuação. O leitor deve estar se perguntando: que emissão é essa? Não se falou nela até aqui, por que se a está estudando? A emissão é a publicidade do AIT, é a forma pela qual a Administração faz o condutor ou proprietário do veículo tomar ciência do AIT.

Realmente, não se mencionou, até agora, nada sobre a emissão, porque ela não faz parte do suporte fático do auto de infração de trânsito, mas, para a eficácia deste, integra-o. A emissão é um elemento integrativo do suporte fático do auto de infração de trânsito.

O plano da eficácia é o responsável pela criação das relações jurídicas. Assim como os outros planos, este também possui elementos, porém com uma diferença, um dos elementos não está no suporte fático, é um elemento estranho a ele, mas necessário, e esse elemento é chamado de integrativo, pois integra o suporte fático. O outro elemento é o complementar, aquele estudado no plano da validade, pois há determinadas ocasiões em que ele não gerará invalidade do ato, mas a sua ineficácia.

Demonstraremos isso. O auto de infração de trânsito possui, consoante o art. 280, do CTB, requisitos complementares, que devem estar presentes para que o ato jurídico seja válido. Entretanto, o inciso VI, do referido dispositivo, quando concretizado, tem dupla função, pois gera a validade do auto e vale como notificação da autuação, gerando a eficácia.

Ressaltemos, porém, que se não for possível a concreção do inciso acima citado, o agente ou a autoridade de trânsito devem expor o motivo, sob pena de invalidar o AIT.

Quando um infrator é flagrado pelo agente da autoridade de trânsito cometendo uma infração, este lavrará o auto de infração de trânsito, oportunidade na qual deverá exigir a assinatura do infrator, que valerá como sua notificação de autuação. Esse é um elemento complementar, mas a sua inexistência acarreta a invalidade do auto de infração de trânsito? A resposta é não, necessariamente, porque se o agente ou a autoridade de trânsito justificar o motivo pelo qual foi impossível colher a assinatura não haverá, inicialmente, vício! Mas, então, qual a conseqüência disso? Simplesmente o auto de infração de trânsito será ineficaz até a emissão da notificação de autuação, sendo ineficazes os registros decorrentes dessa autuação, assim como não se poderá cobrar do infrator o pagamento da multa ou lhe impor qualquer outra penalidade.

Veja que falamos em emissão. E onde é que, no art. 280, do CTB, encontra-se referência à emissão? Não há nenhuma referência à emissão nesse dispositivo, mas, no art. 281, parágrafo único, II, do CTB, a emissão se encontra prevista, por isso ela não faz parte do suporte fático do auto de infração de trânsito, sendo elemento meramente integrativo do suporte fático, pois que sem ele o auto de infração jamais produzirá a sua eficácia.

Assim, temmos dois elementos que, apesar de bem diferentes, possuem influência direta na formação da relação jurídica. Caso eles não se concretizem a Administração nunca poderá exigir o pagamento da multa, e nem, muito menos, impor a sanção administrativa compatível.

Com isso encerramos o mundo jurídico. Passaremos, agora, a investigar o suporte fático, já que temos um vislumbre do que seja ele.


DISTINÇÕES ENTRE O SUPORTE FÁTICO DA INFRAÇÃO DE TRÂNSITO E O DO AUTO DE INFRAÇÃO DE TRÂNSITO

INFRAÇÃO DE TRÂNSITO

A infração de trânsito é uma conduta, comissiva ou omissiva, praticada por qualquer pessoa, prevista, no Código de Trânsito Brasileiro, na legislação complementar e nas resoluções do CONTRAN [26] como infração.

Vemos que o suporte fático da infração de trânsito é bem diverso do suporte fático do auto de infração de trânsito. A infração é um ato ilícito e, por isso, não passa pelo plano da validade, possuindo apenas elementos nucleares, que, uma vez concretizados, fazem nascer o fato jurídico da infração de trânsito.

Uma vez existente o ato jurídico ilícito da infração trânsito, nascerá para autoridade de trânsito ou seu agente, o poder-dever de lavrar o auto de infração de trânsito.

Portanto, não se pode confundir o fato jurídico da infração com o fato jurídico da autuação, pois são dois atos jurídicos bem diferentes. Porém, o segundo necessitará da existência do primeiro.

AUTO DE INFRAÇÃO DE TRÂNSITO

O auto de infração de trânsito é ato jurídico pelo qual a Administração dá início ao processo administrativo de trânsito, com a finalidade de punir o condutor ou proprietário de um veículo, que tenha praticado uma conduta, comissiva ou omissiva, descrita como infração de trânsito.

Por essa razão o AIT possui requisitos de existência, validade e eficácia totalmente diversos dos da infração de trânsito. A existência da infração interfere diretamente na validade do AIT, pois necessária para a produção de auto de infração válido, mas com ele não se confunde jamais.


CONCLUSÃO

Diante de tudo o que foi exposto, podemos concluir que o fenômeno jurídico do fato jurídico auto de infração de trânsito, como fruto da incidência de normas jurídicas, entrada, passagem e saída do mundo jurídico, pode ser expressado graficamente da seguinte forma:

Temos, assim, a incidência da norma jurídica sobre o suporte fático (suposta infração + conhecimento da Administração), que faz nascer o ato jurídico do auto de infração de trânsito, ato este composto de vários elementos: nucleares, complementares e integrativos. Cada um desses elementos é afeto a um plano do mundo jurídico. Assim, ao final da passagem do mundo jurídico, com o julgamento do auto de infração de trânsito e, por via oblíqua, da própria infração, constituir-se-á a relação jurídica entre a Administração e o Administrado, cabendo àquela o direito de impor e exigir o cumprimento da sanção de trânsito e a este o dever de cumpri-la. Observamos, por lógico, que até o julgamento do auto de infração de trânsito não há, ainda, o direito de impor e exigir o cumprimento da sanção por parte da Administração, para que esse direito nasça e se torne exigível é preciso concluir o processo administrativo de trânsito e constituir a relação jurídica entre eles.


BIBLIOGRAFIA

Bandeira de Mello, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo, 15 ed., São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 2003.

Bernardes de Mello, Marcos. Teoria do Fato Jurídico – plano da existência, 12 ed., São Paulo: Saraiva, 2003.

____________. Teoria do Fato Jurídico – plano da validade, 4 ed., São Paulo: Saraiva, 2000.

____________. Teoria do Fato Jurídico – plano da eficácia 1ª parte., São Paulo: Saraiva, 2003.

Buarque de Holanda. Aurélio. Dicionário Aurélio Novo Dicionário da Língua Portuguesa, 2 ed., São Paulo: Nova Fronteira, 1998.

Carvalho Filho, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo, 11 ed., Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2004.

Costa, Adriano Soares da. Teoria da Incidência da Norma Tributária – crítica ao realismo lingüístico de Paulo de Barros Carvalho, : Belo Horizonte: Del Rey, 2003.

Di Pietro, Maria Sylvia Zanella, Direito Administrativo. 14 ed, São Paulo: Editora Atlas S. A., 2002.

Dutra de Araújo, Florivaldo. Motivação e controle do Ato Administrativo, Belo Horizonte: Livraria e Editora Del rey Ltda, 1992.

Ferraz Jr., Tércio Sampaio. Introdução ao Estudo do Direito, técnica, decisão, dominação., 4 ed., São Paulo: Editora Atlas S.A., 2003.

FERNANDES NETO, Benevides. Processo administrativo de trânsito: da autuação à cassação da CNH. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1341, 4 mar. 2007. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/9557/processo-administrativo-de-transito>. Acesso em: 20 mar. 2007.

Freitas, Juarez. Controle dos Atos Administrativos e os princípios fundamentais, São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 1997.

___________. Estudos de Direito Administrativo, 2 ed., São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 1997.

Gasparini, Diogenes. Direito Administrativo. 4. ed., São Paulo: Saraiva, 1995.

GOUVEIA, Alessandro Samartin de. Do julgamento do auto de infração de trânsito. Jus Vigilantibus, Vitória, 1º nov. 2004. Disponível em:. Acesso em: 20 mar. 2007.

___________. Da inconsistência e irregularidade do auto de infração de trânsito. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 62, fev. 2003. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/3704/da-inconsistencia-e-irregularidade-do-auto-de-infracao-de-transito>. Acesso em: 20 mar. 2007.

Meirelles, Hely Lopes, Direito Administrativo Brasileiro. 23 ed., 2ª Tiragem, São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 1998.

Mezzomo, Marcelo Colombelli. A defesa prévia no processo administrativo de trânsito: feições e limites. Jus Navigandi, Teresina, a. 7, n. 65, mai. 2003. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/4011/a-defesa-previa-no-processo-administrativo-de-transito>. Acesso em: 24 abr. 2004

Pasqualini, Alexandre. Hermenêutica e Sistema Jurídico – uma introdução à interpretação sistemática do Direito, Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999.

Pontes de Miranda, Francisco Cavalcante. Tratado de Direito Privado, Tomo I, Campinas: Bookseller, 1999.

______________. Tratado de Direito Privado, Tomo II, Campinas: Bookseller, 2000.

______________. Tratado de Direito Privado, Tomo III, Campinas: Bookseller, 2000.

______________. Tratado de Direito Privado, Tomo IV, Campinas: Bookseller, 2000.

______________. Tratado das Ações, Tomo I, Campinas: Bookseller, 1998.

______________. Tratado das Ações, Tomo II, Campinas: Bookseller, 1998.

______________. Comentários ao Código de Processo Civil, Tomo I, 5 ed., 3ª tiragem, Rio de Janeiro: Forense, 1999.

______________. Comentários ao Código de Processo Civil, Tomo II, 3 ed., 6ª tiragem, Rio de Janeiro: Forense, 1998.

______________. Comentários ao Código de Processo Civil, Tomo III, 4 ed., 2ª tiragem, Rio de Janeiro: Forense, 1998.

Petraglia, Mauricio. A ilegalidade das multas aplicadas em decorrência dos instrumentos de medição de velocidade de operação autônoma. In: Jus Navigandi, n. 54. [Internet] <https://jus.com.br/artigos/2660/a-ilegalidade-das-multas-aplicadas-em-decorrencia-dos-instrumentos-de-medicao-de-velocidade-de-operacao-autonoma> [ Capturado 20. Jun. 2002 ]

Reale, Miguel. Lições Preliminares de Direito, 27, ed., Saraiva: São Paulo, 2002.

Sarlet, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Diretos Fundamentais, 5 ed., Livraria do Advogado: Porto Alegre, 2005.

Vilanova, Lourival. Causalidade e Relação no Direito, 4 ed., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000.

Brasil. Constituição. Constituição Federal da República Federativa do Brasil de 1988.

Brasil. Lei 9.503/97. Código de Trânsito Brasileiro.


NOTAS

01 Não se tem como precisar o nascimento do direito, por isso, neste trabalho, colocaremos essa questão entre parênteses. Na verdade, o dado que admitimos por inicial é o fato de que, como bem anota Miguel Reale em suas Lições Preliminares de Direito, na solitária ilha de Robson Crusue, antes da chegado do índio Sexta Feira, não existia o Direito, isto porque, ele serve para regrar a minha conduta com o alter, como bem salienta Lorival Vilanova no prefácio da sua 4ª edição de sua obra Causalidade e Relação no Direito, in verbis: "E o ser humano, com sua internidade psicológica, sujeito a leis causais – nisso, também, é natureza -, transita para o plano do ser-pessoa, criando ou apropriando-se das objetivações de valor, que nesses suportes se estabilizam. Sem essa estabilização, o ingênito fluir da corrente psíquica, com sua infixidez, tornaria impossível o discurso humano na espécie superior da história.". Noutras palavras, a análise do direito só tem sentido quando investigada dentro de um sistema, composto não só do elemento eu, mas sim dos componentes eu, tu, eles, produzindo as relações intersubjetivas eu-tu, eu-eles ou tu-eles, nunca eu-eu ou tu-tu. Por isso, direito e sociedade, em que pese diferentes, são visceralemente ligados, um não sobrevive mais sem o outro, há entre eles uma relação de depedência, mas não de causalidade. Um não é causa do outro, são fenômenos diversos, mas totalmente dependentes.

02 Pontes de Miranda. Tratado de Direito Privado, Tomo I, p. 49.

03 Idem.

04 Ibidem.

05 Cumpre observar que, seguindo o entendimento do professor Adriano Soares da Costa, preferimos pontesiano a ponteano, pois como bem explica o professor referido, na sua obra teoria da incidência da norma tributária, crítica ao realismo lingüístico de Paulo de Barros Carvalho, nota de rodapé nº 29, p. 15, a expressão ponteana suprime a consoante ‘s’ do nome Pontes, passando a significar aquilo que pertence ao pensamento de Ponte, e como o que se quer significar é o pensamento pertencente a Pontes, preferimos pontesiano.

06 Idem.

07 Pontes de Miranda. Tratado das Ações, Tomo I, p. 21.

08 Pontes de Miranda, Francisco Cavalcante. Tratado de Direito Privado, Tomo I, p. 51.

09 Idem, p. 52.

10 Costa, Adriano Soares da. Teoria da Incidência da Norma Tributária – crítica ao realismo lingüístico de Paulo de Barros Carvalho, p. 2 e 3.

11 Bernardes de Mello, Marcos. Teoria do Fato Jurídico – plano da existência, p. 10.

12 Tratado de Direito Privado, Tomo I, p. 50.

13 Tratado das Ações, Tomo I, p. 21.

14 Tratado de Direito Privado, Tomo I, p. 53.

15 Idem, p. 62.

16 Idem, p. 63.

17 Ob. Cit.

18 Tratado de Direito Privado, Tomo I, p. 57

19 Idem, p. 58.

20 Ibidem.

21 Tratado de Direito Privado, Tomo I, p. 58.

22 Idem, p. 83.

23 Essa altercação perde sentido quando se questiona: se os fatos jurídicos lato sensu ilícitos não são jurídicos, como se explicar o nascimento de direito, para o lesado, e de obrigação, para o causador, decorrente de ato ilícito? Se não são jurídicos esses fatos, como explicar tal fenômeno? Simplesmente não há como explicar! O que se tem confundido é ser conforme ao direito ou contrário a direito, o que é completamente diferente do ser jurídico. Ser jurídico diz respeito a existir no mundo jurídico, a ter incidido sobre o suporte fático a norma jurídica, portanto, ser jurídico é ser relevante para o direito, independente se conforme ou contrário a direito.

24 Preferimos não denominar essa conduta como infração de trânsito, porque a conduta narrada no auto de infração de trânsito, algumas das vezes poderá não ser tipificada como infração de trânsito ou a tipificação contida no AIT, feita pela autoridade de trânsito ou agente da autoridade de trânsito, não tenha como suporte fático aquele fato narrado no auto de infração de trânsito, mas, nem por isso, o auto de infração de trânsito inexistirá, pelo contrário, existe, porém é inconsistente.

25 Teoria do Fato Jurídico – Plano da Existência, p. 98.

26 Apesar de o CTB fazer referência às resoluções do CONTRAN, como veículos introdutores de infrações de trânsito, desde já importa esclarecer que tal conduta legislativa é desprovida de compatibilidade com a Constituição Federal de 1988, pois fere o princípio da legalidade e, sobre tudo, fere o Poder Regulamentar constitucionalmente previsto no art. 84 da CF. As resoluções do CONTRAN são decretos regulamentares, que devem, exclusivamente regulamentar a lei nos limites estabelecidos por ela, sem criar direitos e obrigações, elas são meio de melhor aplicação da lei e não causa, em si mesmas, de aplicação de sanção. Por isso, apesar de estar previsto no CTB, a melhor interpretação é de considerar tal previsão como inconstitucional, de sorte que qualquer sanção imposta com fundamento, exclusivo, em Resolução do CONTRAN que introduza ilícito administrativo de trânsito será nula de pleno direito.


Autor

  • Alessandro Samartin de Gouveia

    Promotor de Justiça do Estado do Amazonas. Possui graduação em Direito pelo Centro de Estudos Superiores de Maceió (2004). Pós-graduado em nível de Especialização em Direito Processual pela ESAMC/ESMAL(2006). Formação complementar em política e gestão da saúde público para o MP - 2016 - pela ENSP/FIOCRUZ. Pós-graduando em prevenção e repressão à corrupção: aspectos teóricos e práticos, em nível de especialização (2017/2018), pela ESTÁCIO/CERS. Mestre em direito constitucional pela Universidade de Fortaleza - UNIFOR. Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Público, atuando principalmente nos seguintes temas: súmula vinculante, separação dos poderes, mandado de segurança, controle de constitucionalidade e auto de infração de trânsito. http://orcid.org/0000-0003-2127-4935

    Textos publicados pelo autor

    Fale com o autor


Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GOUVEIA, Alessandro Samartin de. Apontamentos sobre o fenômeno jurídico do auto de infração de trânsito. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1420, 22 maio 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/9893. Acesso em: 24 abr. 2024.