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Dispensa e inexigibilidade de licitação: uma visão geral

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22/11/2008 às 00:00

Resumo:


  • A licitação é um processo administrativo para seleção da proposta mais vantajosa para contratações públicas, não se limitando apenas ao melhor preço, mas também à qualidade e benefício econômico.

  • As normas gerais sobre licitação estão na Lei nº 8.666/93 e na Constituição Federal, e a União detém competência privativa para legislar sobre normas gerais de licitação, enquanto os Estados, Municípios e o Distrito Federal podem legislar sobre normas específicas, respeitando as normas gerais.

  • A licitação é regida por princípios gerais da Administração Pública como legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, além de princípios específicos do procedimento licitatório, como formalismo, competitividade, julgamento objetivo, vinculação ao instrumento convocatório, sigilo das propostas e isonomia.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

7. LICITAÇÃO INEXIGÍVEL (ART. 25, LEI nº 8.666/93)

A Lei nº 8.666/93 cuida ainda das hipóteses de impossibilidade jurídica de licitação em seu art. 25, o qual reúne situações descritas genericamente como de inviabilidade de competição, exemplificativamente arroladas em seus três incisos.

"Art. 25. É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial:

I - para aquisição de materiais, equipamentos, ou gêneros que só possam ser fornecidos por produtor, empresa ou representante comercial exclusivo, vedada a preferência de marca, devendo a comprovação de exclusividade ser feita através de atestado fornecido pelo órgão de registro do comércio do local em que se realizaria a licitação ou a obra ou o serviço, pelo Sindicato, Federação ou Confederação Patronal, ou, ainda, pelas entidades equivalentes;

II - para a contratação de serviços técnicos enumerados no art. 13. desta Lei, de natureza singular, com profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação;

III - para contratação de profissional de qualquer setor artístico, diretamente ou através de empresário exclusivo, desde que consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública.

§ 1o Considera-se de notória especialização o profissional ou empresa cujo conceito no campo de sua especialidade, decorrente de desempenho anterior, estudos, experiências, publicações, organização, aparelhamento, equipe técnica, ou de outros requisitos relacionados com suas atividades, permita inferir que o seu trabalho é essencial e indiscutivelmente o mais adequado à plena satisfação do objeto do contrato.

§ 2o Na hipótese deste artigo e em qualquer dos casos de dispensa, se comprovado superfaturamento, respondem solidariamente pelo dano causado à Fazenda Pública o fornecedor ou o prestador de serviços e o agente público responsável, sem prejuízo de outras sanções legais cabíveis."

Em tais circunstâncias, ocorre o que a doutrina e a própria Lei de Licitações denominou "inexigibilidade" de procedimento licitatório. Sempre que inexistir viabilidade de competição poderá efetivar-se a contratação direta, ainda que não se configurem as situações expressamente constantes do elenco do art. 25. acima referido. Acerca do tema, assim se manifestou o Tribunal de Contas do Estado do Paraná: "Os casos de inexigibilidade de licitação não se exaurem nas disposições legais, as quais consignam, apenas exemplificativamente, algumas situações" (Processo TC/PR 4707-02.00/93-5, publicado no informativo de Licitações e Contratos – ILC, nº 53, jul./98, Curitiba: Zênite, p. 649, grifei).

A primeira hipótese contemplada pelo artigo que trata da inexigibilidade de licitação diz respeito a "fornecedor exclusivo", situação que revela a ausência de alternativas para a Administração Pública realizar o procedimento licitatório. Assim ocorre, obviamente, porque se existe apenas um único produto em condições de bem atender às necessidades do Poder Público, não há qualquer sentido em realizar a licitação. Entretanto, é bom observar que a lei veda expressamente a preferência por marcas, devendo a Administração identificar o produto subjetivamente no instrumento convocatório.

Outra questão a ser suscitada é a dimensão territorial da exclusividade. Esta pode variar conforme a modalidade de licitação escolhida, isto é, se for concorrência, a exclusividade deverá ser em todo o território nacional; se for tomada de preços, deverá ser no registro cadastral mantido pela entidade; e se a modalidade eleita for o convite, a exclusividade deverá ser na praça em que se realizaria a licitação. Nesse sentido é a doutrina de José dos Santos Carvalho Filho, de clareza insofismável, conforme se vê:

"Se a licitação for do tipo convite , considerar-se-á a exclusividade na localidade da futura contratação; se for tomada de preços , levar-se-á em consideração a exclusividade no registro cadastral; e se for concorrência , exclusivo é o que for único no país" (Manual de Direito Administrativo, 17ª. ed., São Paulo: Lúmen Juris, 2007, p. 236, grifo do próprio autor).

Em relação às concorrências internacionais, é certo que o assunto não é pacífico e a decisão de contratar o fornecedor nacional único deverá ter em consideração o princípio da razoabilidade e a preocupação com os demais princípios fundamentais que regem toda a atividade administrativa. Dessa forma, parece claro que uma contratação de pequeno valor não poderá receber o mesmo tratamento reservado a um grande empreendimento, por exemplo. Com essa preocupação, Jorge Ulisses Jacoby Fernandes cita o seguinte parecer em seu livro (ob. cit.):

"[...] o que a justificativa de fls. 8-9 atesta é que a (...) não tem similar nacional, mas não demonstra a mesma certeza em relação ao mercado internacional. Poderia o equipamento, com as mesmas características, ser produzido ou comercializado por outra empresa fora do Brasil" (Parecer da Dra. Márcia Walquíria Batista dos Santos, publicado no Boletim de Licitações e Contratos – BLC nº 5/94, São Paulo: NDJ, p. 209).

A forma de comprovação da exclusividade foi estabelecida pela lei como sendo através de atestado que pode ser emitido por órgão de registro do comércio local, bem como sindicatos, federações, confederações e entidades equivalentes. A inviabilidade de competição poderá ser evidenciada, portanto, através de documentação emitida por instituição confiável e idônea como forma de controlar a existência de exclusividades de representantes. A expressão "entidades equivalentes" têm causado certa preocupação ao administrador público em razão da imprecisão do termo. Em princípio, estariam abrangidas por esta expressão genérica as associações que congreguem empresários de um mesmo ramo comercial. Nesse sentido, o TCU aceitou o atestado de exclusividade da ASSEPRO – Associação das Empresas Brasileiras de Software e Informática no Processo TC nº 004.415/98-1. Finalmente, a exclusividade também pode ser comprovada através de contrato de exclusividade de distribuição, representação, licenciamento etc. e consulta ao INPI – Instituto Nacional de Propriedade Industrial, que é a autarquia federal responsável pela averbação e registro dos contratos de transferência de tecnologia e da expedição de cartas-patente e registro de marcas. Embora tal solução não esteja expressamente contemplada na Lei de Licitações, essa laternativa têm sido bastante utilizada na prática, partindo-se da premissa de que a exclusividade do produtor é absoluta e a do representante comercial ou distribuidor é relativa.

O segundo caso mostrado pelo artigo 25 alude às hipóteses de contratações de serviços entendidos como técnicos especializados. Para que incida a inexigibilidade é necessário que o serviço possua natureza singular, isto é, seja visivelmente diferenciado em relação aos serviços da mesma natureza prestados por outros profissionais do ramo, e que seja prestado por profissional ou empresa de notória especialização. Nesse ponto, vale destacar a doutrina de Jorge Ulisses Jacoby Fernandes: "Singular é a característica do objeto que o individualiza, distingue dos demais. É a presença de um atributo incomum na espécie, diferenciador" (ob. cit., p. 588). Por outro lado, Marçal Justen Filho ressalta que a especialização diz respeito ao profissional a ser contratado: "A especialização consiste na titularidade objetiva de requisitos que distinguem o sujeito, atribuindo-lhe maior habilitação do que a normalmente existente no âmbito dos profissionais que exercem a atividade" (ob. cit., p. 281). Portanto, entende-se que a singularidade diz respeito ao serviço e a especialização é do profissional a ser contratado.

O art. 13. da mesma Lei enumera os serviços que considera como técnicos especializados, dentre os quais não se incluem os de publicidade: estudos técnicos, planejamentos e projetos básicos ou executivos; pareceres, perícias e avaliações em geral; assessorias ou consultorias técnicas e auditorias financeiras ou tributárias; fiscalização, supervisão ou gerenciamento de obras ou serviços; patrocínio ou defesa de causas judiciais ou administrativas; treinamento e aperfeiçoamento de pessoal; restauração de obras de arte e bens de valor histórico.

O Tribunal de Contas União tem determinado que somente se realiza a contratação direta, com base na notória especialização do profissional contratado, quando houver inviabilidade de competição, e desde que configurada, simultaneamente, a singularidade do objeto e a notoriedade na execução do serviço específico desejado. Nesse sentido: Decisão nº 103/98, rel. Min. Humberto Guimarães Souto, publicado no DOU de 30.03.98, Seção 1, p. 72-2.

Merece especial atenção a questão da contratação de serviços de advocacia. Inicialmente, vale lembrar que a atuação profissional da advocacia exige, além do notório saber técnico-jurídico, também o conhecimento das praxes administrativas da Instituição. Assim é que, como regra, a melhor solução é a contratação de advogados através de concurso público, hipótese em que o interesse público seria melhor atendido. Ademais, o concurso permitiria a avaliação do conhecimento técnico-científico dos candidatos e excluiria a contratação de pessoas destituídas de condições mínimas de desempenho na defesa jurídica do ente estatal. Todavia, a Administração poderá recorrer à contratação de profissionais alheios aos seus quadros em virtude da natureza singular de determinado serviço advocatício em causas ou litígios especializados. O que não pode haver é a terceirização indiscriminada dos serviços de advocacia por meio da contratação direta de escritórios de advocacia. Nesse sentido, leva-se em conta a posição do Tribunal de Contas da União consubstanciado em sua Súmula nº 39:

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"A dispensa de licitação para contratação de serviços com profissionais ou firmas de notória especialização, de acordo com alínea "d" do art. 126, §2º, do Decreto-lei 200, de 25.02.67, só tem lugar quando se trate de serviço inédito ou incomum, capaz de exigir, na seleção do executor de confiança, um grau de subjetividade, insuscetível de ser medido pelos critérios objetivos de qualificação inerentes ao processo de licitação."

Nesse sentido também é a doutrina de Rogério Ponzi Seligman:

"Os serviços jurídicos da Administração Pública, análise jurídica de seus atos e contratos e patrocínio ou defesa de causas judiciais ou administrativas, detêm caráter permanente. Somente se justificará a contratação dos serviços particulares de advocacia, nos moldes da Lei nº 8.666/93, quando da impossibilidade de utilização do corpo de procuradores do ente público, seja pela sua insuficiência ou incapacidade ou em virtude de situação singular.

Tal entendimento encontra ressonância nos julgados do Tribunal de Contas da União, a exemplo do voto do Min. Lincoln Magalhães da Rocha, no processo TC 575.395/92-3, que ressalta não ser impeditivo à contratação de advogado particular o fato de o ente público contar com quadro próprio de advogados, desde que a natureza e as características de singularidade e de complexidades desses serviços sejam de tal ordem que se evidencie que não poderão ser normalmente executados pelos profissionais de seus próprios quadros.

No mesmo rumo já assentou o Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina no pré-julgado nº 873, segundo o qual, quanto à contratação de advogado ou serviços jurídicos, mostra-se recomendável que haja o correspondente cargo efetivo no quadro de servidores do ente público, em face da natureza de atividade administrativa permanente e contínua, com provimento mediante concurso público, sendo cabível a contratação de profissional do ramo do direito, desde que devidamente justificada para atender específicos serviços (administrativo ou judicial) que não possam ser realizados pela assessoria jurídica dada a sua complexidade e especificidade. Em idêntico sentido veja-se também o pré-julgado nº 1232" (in "A Contratação de Serviços Jurídicos pelo Poder Público", disponível na internet em: https://www.mp.sc.gov.br/portal/site/portal/portal_impressao.asp?campo=3308&conteudo=fixo_detalhe, acesso em 7.11.2008).

Por fim, o aludido artigo fala ainda da contratação de "profissionais do setor artístico". Ora, tal hipótese demonstra uma absoluta inviabilidade de competição. Seria mesmo impossível haver comparação entre as performances artísticas de diversos profissionais do setor de forma a tornar viável a abertura de eventual procedimento licitatório. Como afirma Jorge Ulisses Jacoby Fernandes, "artista, nos termos da lei, é o profissional que cria, interpreta ou executa obra de caráter cultural de qualquer natureza, para efeito de exibição ou divulgação pública, através de meios de comunicação de massa ou em locais onde se realizam espetáculos de diversão pública" (ob. cit., p. 615). Portanto, dada a natureza da atividade artística não se afigura possível estabelecer certos parâmetros de comparação que detenham a característica da objetividade que exige o procedimento licitatório tradicional. Requisito inafastável estabelecido pela lei é que o artista a ser contratado seja "consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública". A respeito disso, Marçal Justen Filho alerta que tal medida "se destina a evitar contratações arbitrárias, em que uma autoridade pública petenda impor preferências totalmente pessoais na contratação de pessoas destituída de qualquer virtude. Exige-se que ou a crítca especializada ou a opinião pública reconheçam que o sujeito apresenta virtudes no desempenho de sua arte" (ob. cit., p. 284). Por fim, verifica-se que esse dispositivo apresenta certo limite discricionário, autorizando o administrador a optar pela escolha que melhor atenda ao interesse público em razão das próprias características da performance artística desejada

De maneira geral, portanto, a interpretação extraída do art. 25. da Lei de Licitações inegavelmente revela uma margem de discricionariedade conferida ao administrador para realizar determinadas contratações sem necessidade de procedimento licitatório. Na verdade, a inviabilidade de competição envolve a impossibilidade de obter a melhor proposta através de uma licitação. Mas isso não equivale a liberar o administrador a realizar qualquer escolha que lhe aprouver. Em seu discricionarismo, o administrador tem o dever de avaliar todas as alternativas disponíveis e escolher aquela que se afigurar como a que melhor atende ao interesse coletivo.

LICITAÇÃO INEXIGÍVEL (Art. 25. – Lei nº 8.666/93)

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Sobre o autor
Átila Da Rold Roesler

Procurador federal da Advocacia-Geral da União, especialista em Direito Processual Civil, autor do livro Execução Civil - Aspectos Destacados (Editora Juruá, 2007), ex-Delegado de Polí­cia Civil do Estado do Paraná.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROESLER, Átila Rold. Dispensa e inexigibilidade de licitação: uma visão geral. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1970, 22 nov. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11996. Acesso em: 22 dez. 2024.

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