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Informatização do Judiciário e o processo eletrônico

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31/12/2009 às 00:00
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"Este é um pequeno passo para um homem, mas um grande salto para a humanidade."

(Neil Armstrong, 1969).


RESUMO

O presente trabalho monográfico objetiva analisar as vantagens e desvantagens, que dizem respeito às inovações trazidas pela Lei nº 11.419/2006 e pela informatização do judiciário. Primeiramente, busca-se compreender o contexto atual das reformas processuais, que vêm sendo realizadas no Código de Processo Civil, visando atingir metas de celeridade e efetividade nos processos judiciais. O Pacto Republicano, firmado em dezembro de 2004 pelos representantes dos três poderes, é um marco na história dessas reformas, trazendo um ideal de combate à morosidade processual, à baixa eficácia das decisões judiciais e à dificuldade de acesso à justiça. Nessa conjuntura, aprovou-se a Lei nº 11.419/2006, que criou o processo judicial eletrônico no ordenamento brasileiro. Esta nova espécie de processo levantou questionamentos sobre a segurança jurídica, acesso à justiça e os princípios constitucionais. O presente trabalho pretende esclarecer as intenções e o procedimento da nova lei, demonstrando, ao final, que a inovação é benéfica, tanto aos jurisdicionados, quanto ao Poder Judiciário.

Palavras-chave: Lei nº 11.419/2006. Informatização. Acesso à justiça. Celeridade. Segurança jurídica. Processo Civil. Processo Judicial Eletrônico.


ABSTRACT

This end of course thesis has as its objective the study of advantages and disadvantages concerning the innovations created by the Federal Law 11.441/2007 and computerization of the Judiciary. At first, seek to understand context of procedural reforms that, have been carried out in the Code of Civil Procedure in order to achieve goals of speed and effectiveness in court proceedings. The Republican Pact, signed in December 2004 by representatives of the three powers, is a milestone in the history of those reforms, creating the ideal of fighting long procedure, the low effectiveness of judicial decisions and the difficulty of access to justice. At that moment, comes the Law 11.419/2006, which created a electronic court proceeding on Brazilian regulations. This new kind of court proceedings raised questions about whether legal certainty, access to justice and constitutionally guaranteed principle. This end of course thesis seeks to clarify the intent of the new law and its procedure, demonstrating, in the end, that this innovation is beneficial both to the people and the Judiciary.

Key-words: Law 11.419/2007. Computerization. Access to justice. Speed. Legal certainty. Civil procedure. Electronic court proceeding.


SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO. 2. A EVOLUÇÃO DO PROCESSO JUDICIAL. 2.1. O PROCESSO JUDICIAL. 2.2. ASPECTOS HISTÓRICOS DO DIREITO PROCESSUAL. 2.3. ACESSO À JUSTIÇA. 2.4. OS PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL E DA DURAÇÃO RAZOÁVEL DO PROCESSO. 2.5. A EC Nº 45/2004 E A REFORMA DO JUDICIÁRIO. 2.6. PACTOS REPUBLICANOS E A PROMESSA DE INFORMATIZAÇÃO. 3. A INFORMATIZAÇÃO E O PROCESSO ELETRÔNICO. 3.1. INFORMATIZAÇÃO E INTERNET NO MUNDO. 3.2. INFORMATIZAÇÃO E INTERNET NO BRASIL: EVOLUÇÃO LEGISLATIVA. 3.3. O PROCESSO ELETRÔNICO. 3.4. PRINCÍPIOS APLICADOS AO PROCESSO ELETRÔNICO. 3.4.1. Princípio da Igualdade. 3.4.2. Princípio do Devido Processo Legal. 3.4.3. Princípios do Contraditório e Ampla Defesa. 3.4.4. Princípio da Publicidade. 3.4.5. Princípio da Duração Razoável do Processo. 3.4.6. Acesso à Justiça. 3.4.7. Princípio da Oralidade. 3.4.8. Princípio da Imediação. 3.4.9. Princípio da Instrumentalidade das Formas. 3.4.10. Princípio da Economia Processual. 3.4.11. Princípio da Lealdade Processual e Boa-fé. 4. A LEI 11.419/2006, O CNJ E O FUTURO DOS TRIBUNAIS. 4.1. A LEI 11.419/2006. 4.1.1. Da Tramitação do Projeto de Lei n.º 5.828/2001. 4.1.2. Da Informatização do Processo Judicial. 4.1.3. Da Comunicação Eletrônica dos Atos Processuais. 4.1.4. Do Processo Eletrônico. 4.1.5. Dos Artigos Alterados do CPC. 4.2. ANÁLISE COMPARATIVA DA TRAMITAÇÃO PROCESSUAL. 4.2.1. Processo Tradicional. 4.2.2. Processo Eletrônico. 4.3. CNJ AS RESOLUÇÕES SOBRE INFORMATIZAÇÃO. 5. CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


1. INTRODUÇÃO

O ser humano sempre esteve em conflito, ou com o ambiente ou com seus semelhantes. Por conta disso, ao longo do tempo, diversas formas de solução destas contendas foram sendo criadas, testadas, perpetuadas ou descartadas.

Dentro das relações interpessoais existem desde os primórdios os conflitos de interesse. Estes que ocorrem quando duas ou mais pessoas convergem suas vontades para o mesmo bem tutelado pelo direito, surgindo pretensões resistidas de todos os lados (MARQUES, 1998, p.34).

No início tais litígios eram resolvidos pela força física que foi substituída, com o desenvolvimento do direito, pela jurisdição. Com o tempo houve a necessidade de racionalização dos meios de solução dos conflitos de interesse trocando a coação física por um método baseado na razão humana. O Estado nasce exatamente pela necessidade de composição racional dos conflitos dos indivíduos. (CLEMENTINO, 2009, p. 33)

Ao longo da História, diversos meios de solução dos litígios foram observados, contudo, dos vários métodos criados o que se mostrou mais eficaz foi o "processo judicial". Segundo Greco Filho (2006, p.6), o processo judicial surgiu com a proibição da justiça privada, o fortalecimento do interesse público, a criação de órgãos jurisdicionais e o aparecimento do poder político indispensável ao equilíbrio social.

O Estado exerce seu poder jurisdicional de resolução dos conflitos através do processo judicial. Neste "os juízes agem em substituição às partes, que não podem fazer justiça com as próprias mãos". Assim, a função estatal de jurisdição tem a finalidade pacificadora fazendo uma ligação entre a lei, o sistema processual e as partes que buscam a resolução da lide (CINTRA et al, 2007 p. 29-30).

O Processo é regido pelo Direito Processual que nasce como um complexo de normas e princípios que regem o exercício do conjunto formado pela jurisdição do estado-juiz, a ação e a defesa (CINTRA et al, 2007, p. 31). Observando um conceito mais simples, diz Alexandre Câmara (2008, p.5) que seria o ramo da ciência jurídica que estuda e regulamenta o exercício, pelo Estado, da função jurisdicional.

Poderiam se passar páginas e páginas deste trabalho científico discutindo sobre os conceitos de processo judicial, jurisdição e dos outros meios de resolução de conflitos, contudo este não é o objetivo principal do presente, que é discutir o processo eletrônico.

Desta forma, passadas estas definições introdutórias deve-se rumar para a evolução histórica do processo.

2.2. ASPECTOS HISTÓRICOS DO DIREITO PROCESSUAL

O processo, ao longo dos tempos, sofreu diversas modificações em busca da solução mais rápida, adequada e segura dos conflitos humanos. A própria humanidade alterou a sua forma de se relacionar, fato que influenciou todas as ciências e com o direito não seria diferente.

Nas últimas décadas a humanidade vem passando por transformações grandiosas na forma de se comunicar e interagir, e com o surgimento de novas tecnologias aparecem querelas nunca antes imaginadas. Obviamente, estas mutações têm reflexo nos meios de solução dos conflitos, principalmente no processo judicial que precisa se adaptar aos novos tempos.

Para entender o presente patamar do desenvolvimento do processo judicial moderno, sobretudo no processo civil, e vislumbrar onde este instrumento social pode chegar aos próximos anos, é preciso conhecer a história e as diversas mutações ocorridas ao longo do tempo nos métodos de resolução de conflitos.

A história do processo pode ser dividida em seis fases principais conforme ensina Arruda Alvim (2006, p. 44): a) processo civil romano (754 a.C. [01] a 568 d.C. [02]); b) processo civil romano-barbárico (568 d.C. a 1.100 d.C.); c) período de elaboração do processo comum (1.100 d.C. a 1.500 d.C.); d) período moderno (1.500 d.C. a 1868 d.C.); e) período contemporâneo (após 1868 d.C) e f) o período efetivamente contemporâneo (últimos 40 anos).

A evolução do processo não pode ser observada de forma estanque, pois existem interações temporais durante cada um dos períodos citados. Desta forma, não se pode precisar quais os anos que se iniciam ou terminam as referidas fases, ou seja, as datas são meramente estimativas.

O direito processual romano pode ser considerado como o alicerce do processo que hoje existe, principalmente, pelo alto grau de intelectualidade que este povo atingiu e a forma como idealizaram o Direito.

O direito processual romano pode ser dividido em três fases principais. A primeira delas é a chamada fase das legis actiones (754 a.C. até 149 a.C.) onde ocorre uma interação entre as ações do estado e a lei. Este período é marcado pela presença forte dos magistrados que concatenavam as funções administrativa, executiva e legislativa. (ALVIM, 2006. p.46)

Depois, veio o período do processo formulário (149 a.C até 209 d.C.) época da expansão do direito Romano por toda a península italiana. Por conta do crescimento, os romanos necessitaram alterar as estruturas dos magistrados que não tinham condições de cuidar da extensa área do império.

Assim surgiu o praetor peregrinus que se utilizava de uma base processual escrita (formulários) para aplicar as legis actiones nos recantos mais longínquos de Roma. Inicialmente, estas regras escritas eram aplicadas aos não romanos, contudo, os formulários [03] foram tão eficazes que acabaram sendo estendidos aos próprios romanos (ALVIM, 2006. p.47).

O último período processual do Império Romano é caracterizado pelo fortalecimento do poder do Estado-juiz e pela extraordinária cognitio, muito semelhante ao julgamento dos dias de hoje. O magistrado deixa de ter o monopólio do processo, passando a servir como mero distribuidor das querelas. Surge a figura do juiz como funcionário do estado que "exercia a função pública, a jurisdictio, destinada à realização do direito" (Alvim, 2006 p. 47).

Esta época também é assinalada pela criação de vários institutos que até hoje são usados em todo o mundo. Entre tais criações estão: petição inicial (libbellus conventionis), citação (inter locutio), resposta do réu (libbellus contradictionis), audiência (cognitiones), o princípio do contraditório e a teoria do ônus da prova.

A fase do processo romano-barbárico pode ser observada como período de divisão das regras processuais. As normas passaram a se revestir de características diferenciadas nos diversos feudos. Esta era pode ser subdividida em três subfases que são: Lombarda (568 a 774), Período franco (774 a 900) e a Feudal (900 a 1100).

A principal contribuição histórica foi a criação do sistema de provas legais, marcado pela graduação da importância de cada uma destas. Neste sistema a lei dizia previamente qual o nível de importância de cada tipo de prova, de forma a vincular o julgamento a esta gradação. O direito canônico também começa a influenciar as regras processuais formando o alicerce do que iria se chamar de processo comum.

O período de elaboração do processo comum é marcado pela interação de várias teorias. Convencionou-se, segundo Arruda Alvim (2006 p 49), dividir tal época nos períodos: dos glosadores, dos pós-glosadores e da jurisprudência culta. De uma forma geral o processo comum se caracterizava por ser escrito, complicado, demorado, com o depoimento como prova principal e não público.

Primeiro, surgem as universidades que influenciam o direito processual, sobretudo a Escola de Bolonha, adaptando as leis aos novos tempos. Em um segundo momento o direito processual passa a ser mais pragmático e por conta disso se espalha pela Europa. O renascimento também contribuiu para a "globalização" das normas processuais (CLEMENTINO, 2009, p43).

Em 1848 é criado o primeiro Código de Processo Civil na França, e apesar de não ter o mesmo rigor técnico do Código Civil Napoleônico pode ser considerado como um marco histórico. Principalmente, por ser um exemplo que foi copiado em diversas outras nações pelo mundo.

A península Ibérica por milhares de anos sofreu a influencia dos Impérios Romano e Árabe. Em Portugal, apenas no século XII, com a expulsão dos árabes e a criação do condado Portucalense (1139) é que se iniciam as discussões sobre o direito processual nesta região.

O período inicial da independência portuguesa é marcado pelo "Forum juditium", pelas Cartas forais e principalmente pelo Código canônico que exercia grande influência naquela sociedade convivendo lado a lado com as regras do processo leigo (ALVIM, 2006 p.52).

O desenvolvimento processual português ocorre apenas com a criação das ordenações Afonsinas, Manuelinas e Filipinas. Esta última teve maior destaque no estudo do direito processual, ela foi baixada por Don Felipe, II da Espanha e I de Portugal. Afirma Arruda Alvim (2006, p.52):

As ordenações Filipinas já apresentavam uma estrutura bastante moderna, se comparado com que havia antes. A parte processual (o livro terceiro) dividia-se da seguinte forma: 1.ª) "fase postulatória", que se encontra nos códigos modernos; 2.ª) "fase instrutória", destinada a prova; 3.ª) "fase decisória", destinada a decisão; 4.ª) "fase executória", destinada ao processo de execução.

O Brasil por vários anos esteve completamente submetido às leis portuguesas e com a independência política de 1822, continuou a usar as normas da metrópole. Mesmo com a criação da Constituição Nacional as leis infraconstitucionais portuguesas permaneceram inalteradas e vigentes na colônia.

O primeiro diploma eminentemente brasileiro sobre processo foi o Regulamento 737 no ano de 1850 e ficou conhecido como o Código de Processual do Comércio (CLEMENTINO, 2009, p. 47). Neste momento a jurisdição comercial e a cível ainda eram separadas:

Em 1871, o Governo Imperial encarregou o conselho de Ribas de consolidar as Ordenações e as Leis extravagantes, que, posteriormente à Independência, foram sendo promulgadas pelo governo, vindo, por uma resolução imperial de 1876, a ser adotada, como lei processual, a Consolidação Ribas. (ALVIM, 2006, p.53).

Com o Decreto n.º 763 de 1890 passou-se a aplicar o regulamento 737 também ao processo civil em todo o território nacional enquanto cada estado não fizesse seu código de Processo Civil próprio (ALVIM, 2006, p.54). Tal medida atrelada à Constituição Republicana de 1891 libertou o Brasil definitivamente das amarras do processo português, revogando as Ordenações Filipinas.

A primeira Constituição a prever a determinação da criação de um código processual único foi a de 1934, tal obrigação foi ratificada na Carta Magna de 1937. Após a confecção de diversos projetos, em 1939, foi promulgado o primeiro Código de Processo Civil Brasileiro.

No Governo de Jânio Quadros foi elaborado pelo Professor Alfredo Buzaid o anteprojeto do novo Código Processual (1964). Este texto foi enviado para o Congresso Nacional em 1972 e após passar por votações nas duas casas foi sancionada em 11 de janeiro de 1973 a Lei nº 5.869 que até hoje é o diploma processual civil do Brasil, apesar das suas diversas alterações.

Como se observou desta pequena retrospectiva histórica o Direito Processual veio se adaptando para abarcar os anseios da sociedade. Segundo Arruda Alvim (2006 p.45), mais especificamente nos últimos 40 anos [04] a ciência do Processo Civil no Brasil e no mundo vem perdendo o dogmatismo arraigado que existia na segunda metade do século XIX.

Paulatinamente, a dogmática vem sendo substituída pela universalização da idéia de distribuição da justiça. "Por isso, pode-se dizer que a urgência, as ações coletivas, os procedimentos sumários, encontram-se na pauta das preocupações de todos os processualistas, governos, juízes e advogados, o que é reflexo direto de tais carências" (ALVIM, 2006, p. 45)

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Principalmente depois do fim da Segunda Guerra Mundial são tomados novos rumos na ciência jurídica. Um exemplo claro são os estudos sobre o acesso à justiça que passam a ser um dos principais temas nas discussões a respeito do processo judicial. Esta teoria muda completamente o enfoque e as prioridades do Direito Processual e do Judiciário.

2.3. ACESSO À JUSTIÇA

No estudo dos fenômenos jurídicos deve-se perceber a relação entre o Direito e a Sociedade. É importante vislumbrar esta interação para entender como as leis e normas interferem na vida das pessoas, em seus atos e posturas.

Da análise dos conceitos de direito e sociedade percebe-se que aquele funciona como verdadeiro ordenador desta, harmonizando as relações sociais intersubjetivas. O Direito tem função de coordenação dos interesses que se manifestam na vida social, exercendo o controle, organizando as cooperações entre as pessoas e corrigindo os conflitos que surgem com os membros da sociedade (CINTRA et al, 2007, p.25).

O Estado é responsável pela pacificação dos conflitos sociais e exerce tal função através da jurisdição. Em busca destes objetivos pacificadores o Estado cria o sistema processual, surgem leis, normas, órgãos jurisdicionais que maximizam o poder estatal de resolver as contendas. É através deste sistema que as partes apresentam suas pretensões, os conflitos são dirimidos e o Estado impõe sua decisão.

Este sistema de resolução de conflitos está materializado nas normas de Direito Processual. Estas regras servem primordialmente para "fazer do processo um meio efetivo para a realização da justiça" (CINTRA et al, 2007, p.43). As leis processuais e o sistema de organização do judiciário são muito importantes para a promoção do acesso da sociedade à Justiça.

Nos últimos anos tem crescido a necessidade da tomada de medidas eficazes para que a população em geral tenha acesso à justiça ou de uma forma mais ampla a uma ordem jurídica justa (CINTRA et al, 2007, p.44). Neste sentido, não se quer apenas a mera distribuição do processo no judiciário, e sim, que a demanda seja admitida e processada adequadamente, fazendo cessar os obstáculos à Justiça.

O acesso à justiça nos séculos XVIII e XIX era visto como um direito natural afeto a todos os indivíduos. Por ser natural, não necessitava da intervenção estatal para ser gozado. O sistema laissez-faire impedia que o estado interviesse na sociedade para que a população tivesse acesso à justiça (CAPPELLETTI, 2002, p. 9), isto é, existia uma garantia meramente formal e não efetiva ao direito natural de justiça.

O campo jurídico da época se pautava puramente na exegese, o judiciário apenas declarava o direito. Contudo, com o aumento da população mundial os problemas deixaram de ser individuais passando a atingir toda a sociedade, e esta forma de justiça já não podia gerir os conflitos que estavam surgindo.

Para ajudar na solução dos problemas sociais e atender adequadamente os clientes do serviço jurisdicional começa-se a observar as teorias a respeito do acesso à justiça. Este movimento origina-se "da ruptura da crença tradicional na confiabilidade dos institutos e inspirando-se no desejo de tornar efetivo – e não meramente simbólico – os direitos do cidadão comum, exigindo reformas de mais amplo alcance e uma nova criatividade" (CAPPELLETTI, 2002, p. 8).

Os estudiosos dividem em três ondas as medidas que visam promover o desenvolvimento do acesso à justiça. Segundo Mauro Cappelletti (2002, passim), a primeira onda pretendia garantir assistência judiciária gratuita para os pobres, a segunda, maior representatividade na defesa dos interesses difusos e a última, dá um novo enfoque ao acesso à justiça modificando o foco para o cliente do serviço da jurisdição, o cidadão.

A primeira onda veio para alargar o alcance da tutela jurisdicional acabando com um dos maiores obstáculos até então existentes, o custo do processo judicial. Não se pode falar em universalização do acesso se as pessoas hipossuficientes não tenham direito a ver suas demandas processadas pelo judiciário.

Na maior parte das sociedades modernas o auxílio de um advogado é essencial para defender as partes ou até mesmo decifrar as leis cada vez mais complexas. Some-se ao pagamento dos causídicos a necessidade do adimplemento das taxas judiciárias e das diligências processuais, como por exemplo, as perícias técnicas. Assim, ficará claro que a maior parte da população mundial não tem condição de patrocinar a defesa dos seus próprios direitos (CAPPELLETTI, 2002, p. 32).

Por conta disso, surgem inicialmente na Alemanha ainda na primeira metade do século passado, as teorias a respeito da assistência judiciária gratuita (CAPPELLETTI, 2002, p. 33). Tal garantia nasceu para eliminar as dificuldades econômicas que impediam ou desanimavam as pessoas a litigar ou de oferecer a defesa adequada (CINTRA et al, 2007, p.40).

No Brasil a assistência judiciária gratuita foi consagrada primeiramente na Lei nº 1.050/60 e elevada à categoria de direito fundamental no art. 5º, LXXIV da Constituição Federal 1988. Esta garantia abarca tanto a assistência gratuita de advogado como a isenção das custas e emolumentos judiciais, fatos que facilitam que os indivíduos carentes possam litigar no judiciário.

Contudo, além dos problemas dos mais pobres, outros graves empecilhos à justiça surgem a partir da segunda metade do século passado. Diante da globalização, do aumento das populações, do fortalecimento do capitalismo de consumo e o surgimento de graves problemas ambientais as demandas deixam de orbitar unicamente no campo individual. Surgem contendas coletivas, direitos supra-individuais, que no sistema até então vigente não podiam ser resolvidas no judiciário.

A segunda onda aparece como um movimento de reformas que busca alterar as noções mais antigas sobre a função dos tribunais. Até a década de 1970, o "processo era visto apenas como um assunto entre duas partes, que se destinava à solução de uma controvérsia entre essas mesmas partes a respeito de seus próprios interesses individuais." (CAPPELLETTI, 2002, p. 50).

O Direito Processual Civil tradicional não comportava a defesa dos direitos difusos. Observe-se o art. 6º do CPC [05] que proíbe o pleito de direito alheio em nome próprio. Como seria possível defender-se de problemas que atingiam toda uma categoria se a lei não concedia legitimidade para isso. É para resolver tal questão que nasce a segunda onda.

Não é escopo do presente trabalho se alongar nas teorias criadas para a defesa dos interesses coletivos. Porém, convém vislumbrar que elas modificaram a perspectiva da legitimidade processual para permitir que determinados órgãos especiais agissem na defesa de direitos coletivos, como é o caso do Ministério Público na defesa do meio ambiente, por exemplo.

Por fim, a terceira onda vem consolidar as conquistas e também levar este enfoque de acesso à justiça a uma área maior da ciência jurídica para abranger diversos outros setores. "Seu método não consiste em abandonar as técnicas das duas primeiras ondas de reformas, mas tratá-las apenas como algumas de uma série de possibilidades para melhorar o acesso." (CAPPELLETTI, 2002, p. 68).

Vislumbra-se que o judiciário deve se adaptar à demanda que a ele é apresentada, levando em consideração o bem jurídico em disputa, o valor econômico e social do mesmo, bem como, quem são os sujeitos que litigam. Para tanto é fundamental que o judiciário passe por reformas. No magistério de Cappelletti (2002, p. 71), algumas mudanças devem ser realizadas como:

[...] alterações nas formas de procedimento, mudanças na estrutura dos tribunais ou a criação de novos tribunais, o uso de pessoas leigas ou paraprofissionais, tanto como juízes quanto como defensores, modificações no direito substantivo destinadas a evitar litígios ou facilitar sua solução e a utilização de mecanismos privados ou informais de solução dos litígios.

O que se está pretendendo é promover mudanças em toda a estrutura processual e física do judiciário em busca da efetivação do direito a justiça. E nos dias atuais não se pode falar em acesso de uma forma lato senso sem observar as novas tecnologias e principalmente a informática.

O processo não pode se modernizar apenas nas leis ou nas atitudes dos seus operadores é preciso materializar de forma física e palpável o seu desenvolvimento. No mundo globalizado e dinâmico as novas tecnologias das informações são essenciais. Por isso, o processo eletrônico veio para ficar e contribuir com o acesso de todos a uma ordem jurídica justa.

A informatização do judiciário contribui de forma profícua para que todas as ondas de desenvolvimento do acesso à justiça se efetivem. Uma vez que, surge a facilitação da admissão de demandas propostas por pessoas necessitadas que não precisam de advogado para ingressar, por exemplo, com ações nos Juizados Especiais, locais onde existem funcionários que colocam a termo eletronicamente o pedido do indivíduo.

Ademais, a digitalização melhora a comunicação de atos em âmbito nacional e a defesa de interesses supra-individuais, v.g.. valorizando o cliente do poder jurisdicional entre outras coisas, com maior publicidade dos atos processuais, que agora estão disponíveis na rede mundial de computadores, maior celeridade na medida em que os atos de cartório deixam de tomar o tempo das varas, menor valor das custas ou impostos uma vez que o processo eletrônico é mais barato e, principalmente, celeridade da resolução do conflito.

Tais alterações são positivas, porém, existem modificações que podem, a médio e a longo prazo, causar prejuízos a sociedade. Não se pode deixar a razão de lado e achar que o processo virtual é a solução de todos os problemas da Justiça. Nem mesmo, pensar que este procedimento está imune a falhas.

Por conta disso, não se pode fugir dos princípios que regem o ordenamento jurídico e mais especificamente do Direito Processual Civil. Eles existem para manter o equilíbrio do sistema como verdadeiras escoras.

A respeito deste tema é fundamental observar o princípio do Devido Processo Legal, verdadeiro norteador do Direito processual como se verá a seguir.

2.4. OS PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL E DA DURAÇÃO RAZOÁVEL DO PROCESSO

O Direito Processual Civil brasileiro vem sofrendo um processo de modificação e amadurecimento nos últimos anos, como já dito acima. Seguindo uma tendência mundial, o Brasil está promovendo alterações relevantes na sistemática processual, tanto na seara constitucional quanto na infraconstitucional.

Neste processo de mudança as incertezas e dificuldades de adaptação surgem inevitavelmente. Desta forma, com o intuito de preservar as instituições já consolidadas os doutrinadores tentam redefinir e fortalecer o Princípio do Devido Processo Legal.

Este princípio tem origem na expressão inglesa due process of Law e teve sua primeira previsão na Carta Magna de João Sem Terras em 1215 (DIDIER, 2009, p. 29). Depois do Reino Unido, tal conceito se espalhou por toda Europa e hoje é um dos principais princípios do Direito Processual.

Para Nery Jr. (1999), o Devido Processo Legal funciona como princípio base do Direito Processual e é a partir dele que todos os outros se sustentam. Apresenta-se como conjunto de garantias que asseguram que as partes exerçam suas faculdades e poderes processuais e são indispensáveis ao correto exercício da jurisdição.

Desse modo, o Devido Processo Legal vai além da simples ordenação de atos através de um procedimento, uma vez que se relacionam com as garantias do contraditório e da ampla defesa necessárias para que as partes sustentem suas razões e se promova o acesso à Justiça (CINTRA et al, 2007, p.82-84). Para isso, é preciso que no processo "[...] as partes tenham oportunidade de participar em um dialogo com o juiz (contraditório), que este seja adequadamente participativo na busca de elementos para a sua própria instrução." (CINTRA et al, 2007, p.41).

A Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), que adquiriu eficácia internacional em 18 de julho de 1978, é um dos principais diplomas em defesa do citado princípio. O Brasil é signatário da convenção, que foi incorporada ao ordenamento brasileiro com a edição do Decreto n.º 678, de 6 de novembro de 1992. O art. 8º, 1, deste diploma afirma:

Toda pessoa terá o direito de ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou Tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou na determinação de seus direitos e obrigações de caráter civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza. [sem grifos no original]

Duas expressões deste dispositivo são importantes para o presente trabalho científico: "as devidas garantias" e "dentro de um prazo razoável". Observa-se que no dispositivo em análise já há relação entre as garantias defendidas pelo ordenamento e o prazo da análise judiciária.

A primeira expressão traz efetividade ao princípio do Devido Processo Legal uma vez que direciona ao objetivo principal que é a proteção das garantias no processo. A segunda é muito importante para se entender as alterações que vêm ocorrendo no Processo Civil brasileiro. E são estes pilares que sustentam que processo corra sem dilações indevidas e impõem que as decisões judiciais sejam prolatadas em tempo razoável (DIDIER, 2009, p. 54).

Diretamente relacionado ao princípio do Devido Processo Legal está o da Duração Razoável do Processo. E estes, ao lado da publicidade, da economia processual, da instrumentalidade das formas, e da igualdade são os princípios motivadores do desenvolvimento do processo eletrônico na seara civil.

O princípio da celeridade processual ou da tempestividade da tutela jurisdicional, como já informado, foi normatizado no ordenamento brasileiro com a recepção do Pacto de São José da Costa Rica. No entanto, com a edição da EC nº45 o art. 5º, LXXVIII, da Constituição Federal passou a abarcá-lo como garantia constitucional, com o seguinte texto: "a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação".

Nos dias de hoje, cada vez mais, doutrinadores, operadores e partes exigem a celeridade do julgamento das demandas. Contudo, poucos observam que o processo judicial tem que desenrolar de forma adequada de acordo com o Devido processo. Não se pode levantar a bandeira da celeridade cegamente.

Tem que se perceber que o processo deve durar tempo suficiente para fazer justiça resolvendo o conflito de modo a provocar o menor dano possível às partes. Obviamente existem processos que demoram e precisam demorar, porém o que se deve combater é demora patológica. Também não se pode conceber que a tutela judicial seja dada de forma imediata, ou extremamente rápida, sob pena de ferir a segurança jurídica (CÂMARA, 2008, p. 57)

Muito pertinente é a comparação feita pelo mestre Alexandre Câmara (2008, p. 58), que relaciona

[...] o processo a um automóvel trafegando por uma estrada. Automóveis excessivamente lentos são tremendamente perigosos, podendo causar acidentes. Mas tão perigosos quanto eles são os automóveis que trafegam em velocidade excessivamente alta. Muitas vezes, os acidentes por estes causados são ainda mais graves. O processo excessivamente lento é incapaz de promover justiça, pois justiça que tarda falha. De outro lado o processo excessivamente rápido gera insegurança, sendo quase impossível que produza resultados justos.

Assim, para se averiguar o tempo necessário para o seguro desenrolar do processo deve-se vislumbrar três critérios básicos: "a) a complexidade do assunto; b) o comportamento dos litigantes; c) a atuação do órgão jurisdicional" (CÂMARA, 2008, p. 93).

O Princípio da celeridade está relacionado com vários institutos do direito, desde a possibilidade de concessão de tutela antecipada, passando pela responsabilização do juiz que retarda a prática de atos até as condenações em litigância de má-fé. Tendo com escopo banir dilações indevidas que retardam o processo.

Porém, o princípio em comento só realizará seu objetivo passando a ter aplicação efetiva no direito brasileiro na medida em que a legislação contiver mecanismos processuais capazes de propiciá-lo. E a Emenda Constitucional nº 45, conhecida como reforma do judiciário, foi fundamental para se iniciar o processo de renovação legislativa.

A reforma constitucional trouxe alterações dos procedimentos judiciais, com o intuito da promoção da celeridade, como também para informatização do judiciário, por que marca o início do incentivo efetivo do aumento do uso de novas tecnologias no processo judicial.

2.5. A EC Nº 45/2004 E A REFORMA DO JUDICIÁRIO

A reforma do judiciário proposta pela Emenda Constitucional nº 45 está intimamente relacionada à busca de um novo padrão do serviço jurisdicional. Ela faz parte de um grupo de medidas conjuntas dos três Poderes de Estado (Executivo, Legislativo e Judiciário) para a promoção da Justiça.

A EC nº 45 foi promulgada em 08 de dezembro de 2004. Após tramitar no Congresso Nacional por quase treze anos, ela alterou vinte e cinco artigos da Constituição Federal e acrescentou-lhe quatro novos artigos. Desta forma, convém apresentar as modificações mais importantes promovidas.

O §3º do artigo 5º da Constituição Federal foi uma das principais alterações realizadas. Segundo o novo dispositivo os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.

A emenda também criou um novo órgão integrante do Poder Judiciário brasileiro o Conselho Nacional de Justiça [06] (art.92, I-A, CF [07]). O conselho tem a função de controlar a atuação administrativa e financeira do judiciário e zelar pelo cumprimento dos deveres funcionais dos servidores deste poder, inclusive dos magistrados, passando a ser curador do Estatuto da Magistratura.

Desde a sua criação o CNJ tem tido papel essencial no processo de reforma administrativa de todo o judiciário. Varias modificações já foram realizadas neste sentido como a unificação das tabelas dos assuntos processuais, criação de metas de julgamento de processos antigos, fomento da conciliação, etc. Ademais, no campo da informatização do judiciário, como se verá na análise das resoluções do conselho no último capítulo, tem realizado grandes mudanças.

Alem disso, convém informar que no âmbito do Ministério Público foi criado o Conselho Nacional do Ministério Público (art.102, I, "r", CF).

Os critérios de ingresso na carreira da magistratura também foram modificados. Passou-se a exigir de acordo com o artigo 93, I da CF a realização de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil [08], além da efetiva atividade jurídica por no mínimo de três anos. As referidas regras também se aplicam aos concursos para o Ministério Público (art. 129, §3º, CF).

Os critérios para promoção de magistrados foram redefinidos para obrigar a criação de parâmetros objetivos para a promoção por merecimento (art.93, II, "c" da CF). Quanto à promoção por antigüidade, exigiu a emenda voto fundamentado e quorum qualificado de dois terços dos membros do Tribunal para recusar a promoção do magistrado decano, sendo-lhe assegurada ampla defesa (art.93, II, "b" da CF).

Por fim, o legislador na busca de uma harmonização constitucional vedou a promoção do juiz que mantiver autos em seu poder além do prazo legal, não podendo devolvê-los ao cartório sem o devido despacho ou decisão. A alínea "e" do art. 93, II, que trata da referida vedação, foi acrescentada em observância ao princípio da razoável duração do processo (art. 5º, LXXVIII, CF), também inserido no texto constitucional por esta mesma emenda.

Nos Tribunais com mais de vinte e cinco membros criou-se a possibilidade de ser instituído um órgão especial para o exercício das atribuições do tribunal pleno, formado por no mínimo onze e no máximo vinte e cinco membros (artigo 93, XI). Este órgão deverá facilitar a tomada de algumas decisões antes exclusivas do pleno do tribunal.

A nova redação do artigo 93, XII, CF vedou a concessão de férias coletivas aos desembargadores e juízes. Algo bastante relevante para a prestação adequada do serviço jurisdicional que deve passar a processar e julgar um número maior de processos por ano.

Além disso, surge a obrigação de distribuição automática de processos tanto no poder judiciário quanto no Ministério Público (art. 93, XV e 129 §5º, CF), problema que causava grandes transtornos. Tal medida pode ser mais bem efetivada, nos dias de hoje, por conta dos meios de informatização que aceleram os serviços dos cartórios das Varas.

Outra inovação extremamente importante para promoção do acesso à justiça foi a determinação de que o número de juízes fosse proporcional à efetiva demanda e à respectiva população (art. 93, XIII). Isso é essencial para a efetivação da razoável duração do processo na medida em que eliminará um déficit histórico do judiciário brasileiro, que sempre esteve aquém na proporção habitantes juízes.

A reforma constitucional em análise também permitiu que os atos ordenatórios do processo, aqueles atos de mero expediente, sem caráter decisório, poderiam ser realizados pelos serventuários da justiça através de delegação do magistrado. A medida prevista no artigo 93, XIV da Carta Magna contribui de forma profícua para a diminuição do tempo dos processos.

O artigo 102, §3º, CF inovou ao trazer para o nosso ordenamento o dispositivo da repercussão geral das questões constitucionais como requisito para recebimento do Recurso Extraordinário no Supremo Tribunal Federal. O intuito do referido requisito é diminuir a quantidade de processos na corte constitucional, de modo que seja dada maior importância às demandas relevantes.

A Súmula Vinculante também foi uma inovação trazida pela EC nº 45, com o desígnio claro de diminuir o número de processos e acelerar a resolução de determinadas questões em todo o judiciário. Surge um poderoso instrumento de uniformização jurisprudencial, evitando uma enxurrada de recursos repetidos, reduzindo sensivelmente a duração dos processos.

O artigo 103-A da Constituição da República, diz que depois de reiteradas decisões sobre matéria constitucional, pode, o Supremo Tribunal Federal, aprovar súmula que vinculará os demais órgãos do Poder Judiciário à administração pública direta e indireta e nas esferas federal, estadual e municipal.

Por fim, outro tema diretamente relacionado ao acesso à justiça são as alterações dos artigos 107 §§ 2º e 3º, 115 §§ 1º e 2º e 125 §§ 6º e 7º, CF que autorizaram a criação da Justiça Itinerante e das Câmaras regionais. Estas alterações têm o escopo de aumentar a abrangência da tutela jurisdicional através da descentralização da jurisdição.

Como se viu as recentes reformas processuais têm sido predominantemente focadas no sentido de priorizar a simplificação de procedimentos, de eliminar atos considerados desnecessários, de conceder maior liberdade para o juiz, de dificultar a interposição de recursos, tudo em prol da celeridade processual e do maior acesso a uma ordem jurídica justa.

A reforma constitucional vem atrelada a modificações infraconstitucionais que buscam conferir concretude ao disposto no artigo 5º, LXXVIII, da CF/88, o direito fundamental à razoável duração do processo.

2.6. PACTOS REPUBLICANOS E A PROMESSA DE INFORMATIZAÇÃO

A Emenda Constitucional nº 45 como já foi dito faz parte de uma iniciativa conjunta dos três poderes para extirpar a morosidade dos processos judiciais e a baixa eficácia de suas decisões. Esta união dos poderes em busca de um judiciário mais célere e eficiente é coroada com a assinatura, no dia 15 de dezembro de 2004, do Pacto de Estado em favor de um Judiciário mais rápido e republicano, também chamado de I Pacto Republicano.

Nesta data o Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, o Presidente do Senado Federal, José Sarney, o Presidente da Câmara dos Deputados, João Paulo Cunha, e o Presidente do Supremo Tribunal Federal, Nélson Jobim, se comprometeram a realizar medidas conjuntas para minimizar os problemas do judiciário que retardam o desenvolvimento nacional.

O texto do pacto afirma que nos últimos dez anos um gigantesco esforço foi despendido, produziram-se dezenas de documentos [09] sobre a crise do Judiciário brasileiro, acompanhados de notáveis propostas visando ao seu aprimoramento. Aduz também que o Legislativo e o Executivo já tinham se mostrado preocupados com a situação tanto é que realizaram medidas preventivas. O primeiro com a aprovação da EC nº45 e tramitação mais célere dos projetos de lei afins e o segundo criou a Secretaria de Reforma do Judiciário no âmbito do Ministério da Justiça.

No acordo republicano onze compromissos foram apresentados a respeito de diversos temas que foram divididos da seguinte forma: implementação da reforma constitucional do Judiciário; reforma do sistema recursal e dos procedimentos; defensoria pública e acesso à justiça; juizados especiais e justiça itinerante; execução fiscal; precatórios; graves violações contra direitos humanos; informatização; produção de dados e indicadores estatísticos; coerência entre atuação administrativa e as orientações jurisprudenciais já pacificadas; e incentivo à aplicação das penas alternativas.

O ponto oito do I pacto republicano é o que apresenta maior importância para o presente trabalho científico, uma vez que trata especificamente a respeito das medidas relativas à informatização. Diz o texto:

8. INFORMATIZAÇÃO

Uma vez mais a Justiça Eleitoral pôde realizar eleições seguras e rápidas, em decorrência da exitosa experiência das urnas eletrônicas. Trata-se de projeto que só foi adiante por força da ação articulada dos três Poderes do Estado. Este bem-sucedido modelo deve ser estendido para que outras experiências – como os processos eletrônicos ("virtuais") na Justiça Federal – sejam aprofundadas.

Serão apresentadas, pelo Judiciário, metas de expansão de tais iniciativas, para que as fontes de financiamento sejam viabilizadas pelos três Poderes.

Serão incentivados os convênios de cooperação, para que informações entre órgãos públicos sejam repassadas por meios eletrônicos, a exemplo do que já acontece entre o Judiciário e o Banco Central do Brasil. As ações nessa direção se desenvolverão prioritariamente no campo da segurança pública e da Justiça criminal.

Finalmente, será examinada a possibilidade de os terminais de auto-atendimento dos bancos públicos [10] prestarem alguns serviços de interesse do Judiciário, mormente informações aos cidadãos.

No plano legislativo, serão incluídos na agenda parlamentar os projetos de lei que visam regular e incentivar os procedimentos eletrônicos no âmbito judicial, a exemplo do PLC no 71/2002 (com os aperfeiçoamentos que se fizerem necessários).

Com relação à Justiça Eleitoral, é fato notório que a cada eleição esta promove novas medidas para a melhoria do sufrágio, contribuindo para a segurança e a celeridade do processo, fato que deve servir de espelho. Observe-se, por exemplo, o uso da tecnologia biométrica [11] que será testada em algumas cidades na eleição de 2010, quando os eleitores serão identificados pela impressão digital, não mais pela assinatura e pela foto, fortalecendo a segurança e conseqüentemente a própria democracia.

Quanto aos Juizados Especiais, já é uma realidade em todo país o uso de programas eletrônicos de distribuição e tramitação de processos. O CNJ, como será tratado especificamente no último capítulo, firmou como meta a informatização de parcela significativa das unidades do judiciário.

O Conselho da Justiça Federal também anunciou [12] acordo com o STJ e a Caixa Econômica para implementação dos processos eletrônicos em todas as varas Federais até o ano 2010.

O PLC nº 71/2002 se transformou na Lei 11419/2006 que trás as regras de informatização do processo judicial e normatizou diversos pontos importantes para consolidação do processo eletrônico inclusive modificando o Código de Processo Civil. Esta lei será analisada de forma aprofundada nos próximos capítulo desta monografia.

No dia 13 de abril de 2009 foi assinado pelo Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, pelo Presidente do Senado, José Sarney e pelo Presidente da Câmara dos Deputados, Michel Temer o novo pacto republicano. Este foi intitulado de II Pacto Republicano de Estado por um sistema de justiça mais acessível, ágil e efetivo.

Diante do sucesso do primeiro acordo, os poderes de Estado resolveram apresentar novo pacto para reafirmar, fortalecer e ampliar as medidas de proteção dos direitos humanos, da efetividade da prestação jurisdicional e do acesso universal à Justiça. O texto do referido documento apresenta os seguintes compromissos:

a) Criar um Comitê Interinstitucional de Gestão do presente PACTO REPUBLICANO DE ESTADO POR UM SISTEMA DE JUSTIÇA MAIS ACESSÍVEL, ÁGIL E EFETIVO, com representantes indicados por cada signatário, tendo como objetivo desenvolver e acompanhar as ações pactuadas;

b) Conferir prioridade às proposições legislativas relacionadas aos temas indicados no Anexo deste Pacto, dentre as quais se destacam a continuidade da Reforma Constitucional do Poder Judiciário e os temas relacionados à concretização dos direitos fundamentais, à democratização do acesso à Justiça, inclusive mediante o fortalecimento das Defensorias Públicas, à efetividade da prestação jurisdicional e ao aperfeiçoamento dos serviços públicos prestados à sociedade;

c) Incrementar medidas tendentes a assegurar maior efetividade ao reconhecimento dos direitos, em especial a concessão e revisão de benefícios previdenciários e assistenciais;

d) Fortalecer a mediação e a conciliação, estimulando a resolução de conflitos por meios autocompositivos, voltados a maior pacificação social e menor judicialização;

e) Ampliar a edição de súmulas administrativas e a constituição de Câmaras de Conciliação;

f) Celebrar termos de cooperação entre os Poderes com o objetivo de intensificar ações de mutirão para monitoramento da execução penal e das prisões provisórias, fortalecendo a assistência jurídica aos presos e familiares e promovendo ações de capacitação e reinserção social;

g) Incentivar a aplicação de penas alternativas;

h) Integrar ações de proteção às crianças e adolescentes vítimas ou em situação de risco e promover medidas de aprimoramento do Sistema de Justiça em que se insere o menor em conflito com a lei;

i) Aperfeiçoar a assistência e o Programa de Proteção à Vítima e à Testemunha;

j) Estruturar e apoiar as ações dos órgãos de controle interno e ouvidorias, no âmbito das instituições do Sistema de Justiça, com o objetivo de promover maior transparência e estimular a participação social;

k) Melhorar a qualidade dos serviços prestados à sociedade, possibilitando maior acesso e agilidade, mediante a informatização e desenvolvimento de programas de qualificação dos agentes e servidores do Sistema de Justiça;

l) Fortalecer o exercício do direito fundamental à ampla defesa e da advocacia;

m) Viabilizar os recursos orçamentários necessários à implantação dos programas e ações previstos neste PACTO;

Novamente na convenção firmada pelo Legislativo, Executivo e Judiciário vislumbra-se o compromisso da informatização (alínea "k"). Este passa a ser um dos maiores trunfos na tentativa de trazer maior acesso à justiça e principalmente celeridade aos processos tramitando no judiciário.

As autoridades brasileiras perceberam que a modernização do judiciário não pode se pautar unicamente na mudança das leis. Deve-se também perquirir na alteração da postura dos operadores e administradores do judiciário, na mudança estrutural com o uso de novas técnicas e tecnologias de resolução de conflito.

Nasce uma nova fase do desenvolvimento do processo judicial. O Direito processual atravessou as eras, desde o sistema puramente oral onde nem mesmo existiam leis escritas, passou pela fase documental, onde os atos processuais passaram a ser transcritos para o papel, até chegar ao presente estado onde o papel é dispensável, o computador é ferramenta de trabalho dos atores do judiciário. O processo deixa de ser restrito a um cartório, a uma vara, a um tribunal, podendo ser acessado de todos os cantos do mundo, através da internet.

Sendo assim, diante de tantas modificações, convém analisar de forma mais profunda os temas que permeiam o processo eletrônico, para depois observar as expectativas que este trás para as próximas eras.

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Sobre o autor
Rafael Costa Fortes

Advogado. Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Sergipe.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FORTES, Rafael Costa. Informatização do Judiciário e o processo eletrônico. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2374, 31 dez. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14101. Acesso em: 22 dez. 2024.

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