Processo - nº 075.05.001737-8
Classe - AÇÃO COM VALOR INFERIOR A 40 SALÁRIOS-MÍNIMOS (cognominada de ´Ação de Rescisão de Contrato c/c. Tutela Antecipada – Ressarcimento de Valores em Dobro e Danos Morais´)
Autor - JÚLIO CÉSAR INÁCIO
Ré - GRUPO DE COMUNICAÇÃO TRÊS S/A.
Vistos etc.
Nos Juizados Especiais Cíveis, o processo orientar- se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade (art. 2º, da Lei nº 9.099, de 26.09.1995), razão pela qual foi o relatório dispensado (parte final do art. 38, da mesma Lei).
Deste modo, passo, de imediato, à fundamentação.
Cuida-se de AÇÃO COM VALOR INFERIOR A 40 SALÁRIOS-MÍNIMOS, cognominada de ´Ação de Rescisão de Contrato c/c. Tutela Antecipada – Ressarcimento de Valores em Dobro e Danos Morais´, onde JÚLIO CÉSAR INÁCIO alega que em 25.11.2003, teria pactuado com o GRUPO DE COMUNICAÇÃO TRÊS S/A. contrato de assinatura de 52 (cinqüenta e duas) edições da revista `ISTO É´, e 26 (vinte e seis) edições da revista `ISTO É GENTE´, ajustando o pagamento do valor convencionado através do lançamento, em sua fatura de cartão de crédito, de 06 (seis) parcelas iguais, mensais e consecutivas, no valor individual de R$ 58,00 (cinqüenta e oito reais), sendo que, embora esgotado o prazo contratual ajustado, a ré teria procedido à unilateral renovação do contrato de assinatura, lançando novos débitos na sua fatura de cartão de crédito, motivo pelo qual, malcontente com a resistência encontrada para pôr fim à relação contratual, pugna pela concessão da tutela jurisdicional, a fim de que seja declarado rescindido o `Contrato de Assinatura nº 4884033´, com a condenação da ré à restituição, em dobro, do valor indevidamente percebido, além do pagamento de indenização por alegado dano moral que aduz ter sido vítima (fls. 02/09).
Na contestação, o GRUPO DE COMUNICAÇÃO TRÊS S/A. avultou que "os lançamentos no cartão de crédito do autor foram sim autorizados" (fl. 37), visto que, "após o término da assinatura, a Ré propôs ao Autor a renovação da mesma, o que foi aceito, passando então a ser descontado do cartão antes indicado, os valores referentes à renovação" (fl. 38), destacando que "caso o autor não desejasse renovar a mesma, bastaria ter entrado em contato com a Ré, o que não fez" (fl. 38), motivo pelo qual, destacando também ter sido vítima da fraude ( ! ? ), avultou a inexistência dos pressupostos da responsabilidade civil, refutando o alegado dano moral, sob o argumento de que JÚLIO CÉSAR INÁCIO não teria logrado êxito em demonstrar qualquer lesão à sua personalidade, pugnando pelo integral inacolhimento do pleito contido na inicial, subsidiariamente conclamando a fixação módica de eventual `quantum´ indenizatório (fls. 36/48).
Em manifestação (réplica), JÚLIO CÉSAR refutou os argumentos manejados pela demandada, pugnando pelo acolhimento de sua pretensão (fls. 51/53), posteriormente requerendo a decretação de sua revelia, porquanto além de não ter sido acostado aos autos o necessário instrumento de mandato procuratório, tampouco teria sido juntada Carta de Preposto, indicando ANDIARA ZABOT como representante do GRUPO DE COMUNICAÇÃO TRÊS S/A. na audiência de conciliação (fls. 55/56).
Após tal argüição, foram encartados, tanto o instrumento de mandato procuratório objurgado, bem como a respectiva Carta de Preposto (fls. 61 e 62), o que torna inviável a aplicação do disposto no art. 20, da Lei nº 9.099/95.
Não havendo preliminares argüidas, passo, de imediato, à análise da contenda, destacando, todavia, que constituem fatos incontroversos a pactuação, em 25.11.2003, do ´Contrato de Assinatura nº 4884033´, segundo o qual JÚLIO CÉSAR INÁCIO autorizou o lançamento, em sua fatura de cartão de crédito, de 06 (seis) parcelas iguais, mensais e consecutivas, no valor individual de R$ 58,00 (cinqüenta e oito reais), ao passo que o GRUPO DE COMUNICAÇÃO TRÊS S/A. assumiu a obrigação de envio de 52 (cinqüenta e duas) edições da revista `ISTO É´, e 26 (vinte e seis) edições da revista `ISTO É GENTE´.
Portanto, circunscreve-se a controvérsia na licitude do posterior lançamento a débito, de valores relativos à renovação da assinatura das referidas publicações, além da possibilidade de eventual repetição em dobro do valor despendido pelo autor para tal custeio, além da existência de eventual dano moral e respectiva fixação do `quantum´ indenizatório.
JÚLIO CÉSAR alega que não renovou a assinatura das revistas `ISTO É´ e `ISTO É GENTE´, ao passo que o GRUPO DE COMUNICAÇÃO TRÊS S/A. garantiu que "os lançamentos no cartão de crédito do autor foram sim autorizados" (fl. 37), visto que, "após o término da assinatura, a Ré propôs ao Autor a renovação da mesma, o que foi aceito, passando então a ser descontado do cartão antes indicado, os valores referentes à renovação" (fl. 38), destacando que "caso o autor não desejasse renovar a mesma, bastaria ter entrado em contato com a Ré, o que não fez" (fl. 38).
Na sistemática do CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, o ônus da prova, preconizado no seu art. 333, inc. I, estabelece que incumbe ao autor provar fato constitutivo do seu direito.
No momento em que o autor invoca seu direito subjetivo de ação – pugnando pelo provimento jurisdicional estatal – traz para o processo um ônus, ou seja, uma carga, um fardo, que é de provar aquilo que está postulando na peça inicial para que seja acolhida sua pretensão, sob pena de não o fazendo, sofrer as conseqüências processuais decorrentes da sua omissão, que seria a sentença de improcedência.
Inobstante, a partir do momento em que o réu é citado e passa a sustentar existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor (art. 333, inc. II, do CPC), este ônus processual, ou seja, esta carga ou peso da verdade que o autor levou consigo ao postular o provimento jurisdicional, deixa de ser sua e passa a ser do réu.
Nesta esteira de raciocínio, o professor Ouvídio Baptista da Silva, citando Moacyr Amaral dos Santos, muito bem leciona a respeito, que "o autor só poderá dar consistência objetiva à sua pretensão em juízo fazendo afirmações sobre a existência de fatos e a pertinência deles a uma relação jurídica. Enquanto ele afirma, deve naturalmente provar as afirmações que faz. Assim também o réu se, ao defender-se, tiver necessidade de fazer afirmações em sentido contrário. O réu poderá, certamente, limitar-se a negar os fatos afirmados pelo autor e esperar que este tente demonstrar a sua veracidade. Se o réu limitar-se a simples negativa, sem afirmar a existência de outros fatos incompatíveis com aqueles firmados pelo autor, nenhum ônus da prova lhe gravará; se, todavia, também ele afirmar fatos tendentes a invalidar os fatos afirmados pelo autor, caber-lhe-á o ônus de provar os fatos afirmados" (´in´ Teoria geral do processo civil. OuVÍDIO Baptista e Fábio Luiz Gomes. Editora RT. 1997. p. 295), e, ainda, "Incumbe ao autor a prova do fato constitutivo do seu direito e ao réu o ônus da exceção. Conforme orienta a doutrina processual, quando o réu excepciona o juízo nasce para ele o ´ônus probandi´, como se o autor fosse réu: ´in exceptione actor est´" (Apelação Cível nº 35.453, de Criciúma).
Tenho para mim, s. m. j., ser este o caso sob análise e julgamento no presente feito, ou seja: ocorreu a inversão do ´onus probandi´, porquanto JÚLIO CÉSAR INÁCIO alegou fato constitutivo de seu direito, em decorrência de não ter pactuado a renovação do contrato de assinatura, muito menos autorizando o débito das parcelas respectivas em sua fatura de cartão de crédito, ao passo que a demandada, à seu turno, afirmou que "os lançamentos no cartão de crédito do autor foram sim autorizados" (fl. 37), visto que, "após o término da assinatura, a Ré propôs ao Autor a renovação da mesma, o que foi aceito, passando então a ser descontado do cartão antes indicado, os valores referentes à renovação" (fl. 38), destacando que "caso o autor não desejasse renovar a mesma, bastaria ter entrado em contato com a Ré, o que não fez" (fl. 38).
Contudo, após detidamente compulsar a prova encartada, não vislumbro a consistência de tal assertiva, visto que, além de inexistir qualquer documento firmado pelo autor, anuindo com a prorrogação da relação contratual, assumindo o custo financeiro inerente, o GRUPO DE COMUNICAÇÕES TRÊS S/A. sequer produziu prova testemunhal do alegado.
Diante de tal fato – a teor do disposto no art. 333, inc. II, do CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL – concluo que não houve, por parte de JÚLIO CÉSAR INÁCIO, outorga de anuência à dilação da relação contratual, de modo que o lançamento de valores em sua fatura de cartão de crédito revela-se inadequado e abusivo.
O art. 6º, inc. IV, do CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, acerca da matéria, estabelece que `são direitos básicos do consumidor: [...] IV - a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços´.
Não há dúvida que constitui método comercial desleal, a renovação automática e arbitrária de contrato de assinatura de publicações impressas, com o lançamento unilateral de débito em fatura de cartão de crédito de consumidor desavisado.
Sobre o assunto, o art. 46, da Lei nº 8.078/90, determina que `os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e alcance´.
Por não ter manifestado prévia anuência, a renovação automática do contrato de fls. 11/11 vº não deve obrigar a JÚLIO CÉSAR INÁCIO, revelando-se imperiosa a condenação do GRUPO DE COMUNICAÇÃO TRÊS S/A., a restituir o valor indevidamente adimplido pelo autor, via faturas mensais do cartão de crédito OUROCARD VISA.
Nem se alegue o fato de que JÚLIO CÉSAR teria sido beneficiado pelo efetivo recebimento das publicações, porquanto o parágrafo único do art. 39, do CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR determina que `os serviços prestados e os produtos remetidos ou entregues ao consumidor, na hipótese prevista no inciso III, equiparam-se às amostras grátis, inexistindo obrigação de pagamento´.
Constatada a ilicitude contratual, bem como a efetiva obrigação de restituir, passo à análise da incidência do contido no parágrafo único do art. 42, do CDC, segundo o qual `o consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por igual valor ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.´
Sobre a matéria, colhe-se da jurisprudência dos Tribunais pátrios que "verificado o pagamento em excesso, impõe-se a restituição da diferença a maior, calculada em dobro, de acordo com o parágrafo único do art. 42 do CDC. Não configura dano moral indenizável o mero descumprimento do contrato, cujas conseqüências não foram além de simples aborrecimento. Recurso parcialmente provido" (TJRJ - AC 52/2000 - 5ª C.Cív. - Rel. Des. Carlos Raymundo Cardoso - Julgado em 14.03.2000), por fim, "há relação de consumo no fornecimento de água por entidade concessionária desse serviço público a empresa que comercializa com pescados. 2. A empresa utiliza o produto como consumidora final. 3. Conceituação de relação de consumo assentada pelo art. 2º, do Código de Defesa do Consumidor. 4. Tarifas cobradas a mais. Devolução em dobro. Aplicação do art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor. 5. Recurso provido." (SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - RESP 263229 - SP - 1ª T. - Rel. Min. José Delgado - DJU 09.04.2001 - p. 332).
Com absoluta precisão, CLÁUDIA LIMA MARQUES leciona que "tratando-se, portanto, de contrato entre consumidor e fornecedor, duas hipóteses podem ser pensadas. Se ocorre a cobrança de quantia indevida, o fornecedor não fica só obrigado a restituir o que cobrou em demais, como seria normal através da aplicação do art. 964 do Código Civil, como também fica obrigado legalmente a restituir o dobro, corrigido monetariamente, para evitar qualquer danos ao consumidor e, em última análise, para evitar a negligência no cálculo do valor a ser cobrado do consumidor. A restituição em dobro serve, assim, como uma espécie de multa, de sanção legal. Mas pode ser ilidida se o fornecedor provar que o engano foi justificável. O ônus da prova cabe ao fornecedor e esta será uma prova muito difícil, pois no sistema do CDC o fornecedor deve, como profissional, dominar todos os tipos de erros prováveis em sua atividade, erros de cálculo, impressão do valor errado por computador, troca do nome nas correspondências etc. [...] Estes pequenos erros de cobrança só podem ser combatidos com maior eficiência e só haverá a maior diligência e perícia exigida dos fornecedores pelo CDC, se a jurisprudência entender o art. 42 como uma sanção exemplar (exemplary damages), que – certo – beneficia um, mas que leva a mudança prática no mercado" (MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor: o novo regime das relações contratuais. 4. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 1051-1052).
Para ANTÔNIO HERMAN DE VASCONCELLOS E BENJAMIM, "a pena do art. 42, parágrafo único, rege-se por dois limites objetivos. Em primeiro lugar, sua aplicação só é possível nos casos de cobrança extrajudicial. Em segundo lugar, a cobrança tem que por origem uma dívida de consumo. Sem que estejam preenchidos esses dois requisitos, aplica-se o sistema geral do Código Civil. [...]. Observe-se que, no sistema do Código Civil, a sanção só tem lugar quando a cobrança é judicial, ou seja, pune-se aquele que movimenta a máquina do Judiciário injustificadamente. Não é esse o caso do Código de Defesa do Consumidor. Usa-se aqui o verbo cobrar, enquanto o Código Civil refere-se a demandar. Por conseguinte, a sanção, no caso da lei especial, aplica-se sempre que o fornecedor (direta ou indiretamente) cobrar e receber, extrajudicialmente, quantia indevida. O Código de Defesa do Consumidor enxerga o problema em estágio anterior àquele do Código Civil. Por isso mesmo, impõe requisito inexistente neste. Note-se que, diversamente do que sucede com o regime civil, há necessidade de que o consumidor tenha, efetivamente, pago indevidamente. Não basta a simples cobrança. No art. 1531, é suficiente a simples demanda" (BENJAMIM, Antônio Herman de Vasconcelos. In: GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código brasileiro do consumidor comentado pelos autores do anteprojeto. 6 ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, p. 336).
Prossegue o doutrinador destacando que "no Código Civil, só a má-fé permite a aplicação da sanção. Na legislação especial, tanto a má-fé, como a culpa (imprudência, negligência e imperícia) dão ensejo à punição. O engano é justificável exatamente quando não decorre de dolo ou de culpa. É aquele que, não obstante todas as cautelas razoáveis exercidas pelo fornecedor-credor, manifesta-se. A prova da justificabilidade do engano, na medida em que é matéria de defesa, compete ao fornecedor. O consumidor, ao cobrar o que pagou a mais e o valor da sanção, prova apenas que o seu pagamento foi indevido e teve por base uma cobrança desacertada do credor" (BENJAMIM, Antônio Herman de Vasconcelos. op. cit., p. 337).
A respeito, sobejam julgados de nosso TRIBUNAL DE JUSTIÇA, destacando-se, por seu brilho, o seguinte excerto: "Repetição de indébito. Cobrança indevida. Engano injustificado. Devolução em dobro. Inteligência do art. 42 do Código de Defesa do Consumidor. Dano moral. Pressupostos demonstrados. Quantum da verba reparatória. Critérios de fixação. Definição pelo juiz. Margem de discricionaridade. Ausência de normas jurídicas particulares. Recurso às regras de experiência comum. Inteligência do art. 335 do Código de Processo Civil. Honorários advocatícios. Valor do pedido constante da inicial meramente estimativo. Sucumbência parcial inexistente. A cobrança indevida de valores, no regime do Código de Defesa do Consumidor, permite a repetição dos valores em dobro (art. 42, parágrafo único, do CDC). O art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, embora exclua a responsabilidade objetiva predominante nesse Estatuto, por aceitar o engano justificável, não exclui a responsabilidade subjetiva. A locução "salvo engano justificado", do art. 42, parágrafo único, ´in fine´, torna a excludente de culpa matéria de defesa. Não realizada por quem cobrou indevidamente, a culpa se presume." (Apelação Cível nº 99.014 591-3, de São José. Rel. Des. Pedro Manoel Abreu, julgado em 01.11.2001).
Destarte, considerando o ilícito contratual deliberadamente perpetrado pelo GRUPO DE COMUNICAÇÃO TRÊS S/A., especialmente a coerção a que JÚLIO CÉSAR INÁCIO foi exposto, concluo pela inarredável incidência do disposto no parágrafo único do art. 42, do CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, impondo à demandada a responsabilidade pela restituição, em dobro, do valor de R$ 414,60 (quatrocentos e quatorze reais e sessenta centavos), indevidamente lançados para pagamento nas faturas de cartão de crédito de titularidade do autor.
Por fim, relativamente ao prelafado dano moral, há que se destacar que o artigo 186, do CÓDIGO CIVIL, estatui que `aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito´.
O ordenamento jurídico exige, como requisitos da responsabilidade civil, o implemento da culpabilidade do agente (ilicitude do ato), o dano decorrente do ato e o nexo de causalidade entre a atitude do agente e o prejuízo suportado pelo lesado.
Sobre a matéria, leciona o magnânimo RUI STOCO que "entende-se, pois, que os atos ilícitos, ou seja, praticados com desvio de conduta - em que o agente se afasta do comportamento médio ´bonus pater familias´ - devem submeter o lesante à satisfação do dano causado a outrem. [...] Assim sendo, para que haja ato ilícito, necessária se faz a conjugação dos seguintes fatores: a existência de uma ação; a violação da ordem jurídica; a imputabilidade; a pretensão na esfera de outrem. Desse modo, deve haver um comportamento do agente, positivo (ação) ou negativo (omissão), que, desrespeitando a ordem jurídica, cause prejuízo a outrem, pela ofensa a bem ou a direito deste. Esse comportamento (comissivo ou omissivo) deve ser imputável à consciência do agente, por dolo (intenção) ou culpa (negligência, imprudência, ou imperícia), contrariando, seja um dever geral do ordenamento jurídico (delito civil), seja uma obrigação em concreto (inexecução da obrigação ou do contrato). Prossegue o doutrinador referindo que "o elemento primário de todo ilícito é uma conduta humana e voluntária no mundo exterior. Esse ilícito, como atentando a um bem juridicamente protegido, interessa à ordem normativa do Direito justamente porque produz um dano. Não há responsabilidade sem um resultado danoso" (STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. RT, 2001. p. 93-97).
Já MARIA HELENA DINIZ ensina que "a responsabilidade civil não pode existir sem a relação de causalidade entre o dano e a ação que o provocou. O vínculo entre o prejuízo e a ação designa-se ´nexo causal´, de modo que o fato lesivo deverá ser oriundo da ação, diretamente ou como sua conseqüência previsível. Tal nexo representa, portanto, uma relação necessária entre o evento danoso e a ação que o produziu, de tal sorte que esta é considerada como sua causa. Todavia, não será necessário que o dano resulte apenas imediatamente do fato que o produziu. Bastará que se verifique que o dano não ocorreria se o fato não tivesse acontecido. Este poderá não ser a causa imediata, mas, se for condição para a produção do dano, o agente responderá pela conseqüência." (DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. 8. ed. São Paulo: Saraiva. v. 7. p. 76).
O longânime CARLOS ALBERTO BITTAR ministra que "a teoria da responsabilidade civil relaciona-se à liberdade e à racionalidade humanas, que impõe à pessoa o dever de assumir os ônus correspondentes a fatos a ela referentes. Nesse sentido, a responsabilidade é o corolário da faculdade de escolha e de iniciativa que a pessoa possui no mundo fático, submetendo-a, ou o respectivo patrimônio, aos resultados de suas ações, que, quando contrários à ordem jurídica, geram-lhe no campo civil, a obrigação de ressarcir o dano, ao atingir componentes pessoais, morais ou patrimoniais da esfera jurídica de outrem" (BITTAR, Carlos Alberto. Responsabilidade civil: teoria e prática. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p. 02).
Quanto à aplicação da teoria subjetiva da responsabilidade civil ao caso sob julgamento, colhe-se dos ensinamentos de MARIA HELENA DINIZ que há necessidade de "a) Existência de uma ação, comissiva ou omissiva, qualificada juridicamente, isto é, que se apresenta como um ato ilícito ou lícito, pois ao lado da culpa, como fundamento da responsabilidade, temos o risco. A regra básica é a que a obrigação de indenizar, pela prática de atos ilícitos, advém da culpa [...] b) Ocorrência de um dano moral ou patrimonial causado à vítima por ato comissivo ou omissivo do agente ou de terceiro por quem o imputado responde, ou por um, fato de animal ou coisa a ele vinculada. Não pode haver responsabilidade civil sem dano [...] c) Nexo de causalidade entre o dano e a ação (fato gerador da responsabilidade), pois a responsabilidade civil não poderá existir sem o vínculo entre a ação e o dano)" (DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 1997. v. 7. p. 35-36).
Nada há nos autos a embasar o pleito contido na inicial, relativamente ao alegado dano moral, de modo que a ´quaestio´, neste tocante, merece solução na aplicação da teoria do ônus da prova.
O reconhecimento do dano moral e sua reparação pecuniária objetivam a convivência respeitosa e valorização da dignidade humana, sendo repreensível o extremismo em sua aplicação, o que banaliza a conquista, levando-a ao descrédito.
Nas diversas alçadas jurisdicionais, reiterado tem sido o entendimento de que ocorrência rotineira de dissabores em atividades profissionais, pactos contratuais, ou mesmo desentendimentos, resultando em melindre, contrariedade ou pequenas mágoas, não devem ser albergados sob o pleito de reparação pecuniária pelo dano moral.
Assevera o Desembargador Sérgio Cavalieri Filho, da 2ª Câmara Cível do TJRJ, no julgamento da Ap. 7.928/95, que "mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral, porquanto, além de fazerem parte da normalidade do nosso dia-a-dia, no trabalho, no trânsito, entre os amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo. Se assim não se entender, acabaremos por banalizar o dano moral, ensejando ações judiciais em busca de indenizações pelos mais triviais aborrecimentos".
Da jurisprudência da 4ª TURMA DE RECURSOS, colhe-se que "o conceito de dano moral envolve ofensa à honra, ao nome, à integridade, aliada à dor e ao sofrimento profundo, os quais devem estar suficientemente demonstrados para sua caracterização. Nele não se enquadra um simples aborrecimento, mormente tendo em vista o ingresso em juízo de inúmeras demandas onde se busca nada mais do que a tarifagem de convívio social. Nega-se, pois, provimento ao recurso de apelação e, nos termos da segunda parte do artigo 55, da Lei nº 9.099/95, arca o vencido com as despesas processuais e honorários advocatícios, estes arbitrados em 20 % sobre o valor da demanda" (Apelação Cível nº 3.148 da comarca de Tubarão. Apelante: CLÁUDIO SCARPETA BORGES. Apelado: COMPLEXO TURÍSTICO E RECREATIVO ÁGUAS DE PALMAS SC LTDA. Relatora: Juíza GABRIELA GORINI MARTIGNAGO CORAL. Julgado em 07.07.2005).
Assim, por entender não existir causa ou justo motivo para o aludido dever de indenizar, concluo pela procedência apenas parcial do pleito.
De avultar – como realçado em diversas oportunidades pela 4ª TURMA DE RECURSOS – que "o Juiz não pode e não deve, em hipótese alguma, comportar-se como um autômato, um simples aplicador da estática e fria norma jurídica ao caso concreto, como já se pensou no século passado. O Magistrado é um hermeneuta da norma, o imparcial mediador entre os litigantes, que, para alcançar o seu desiderato, necessita usar de todos os métodos fornecidos pela dogmática da interpretação, considerar sempre os fins sociais a que a lei se destina e as exigências do bem comum (aliás, trata-se de princípio geral insculpido no art. 5º da LICC), além de ter conscientização do papel da ideologia no preenchimento das lacunas do Direito, na busca incessante da justa composição do conflito." (Joel Dias Figueiras Júnior)" (Apelação Cível nº 2.025, de Tubarão).
POSTO ISTO, considerando, ainda, o mais que dos autos consta – especialmente os princípios gerais de Direito aplicáveis à espécie – com arrimo em o disposto nos arts. 2º, 5º e 6º, da Lei nº 9.099/95, art. 333, incs. I e II, do CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, e, ainda, arts. 2º, 3º, 6º, inc. IV, 39, inc. III, 42 e 46, da Lei nº 8.078/90, arts. 472 e 482, do CÓDIGO CIVIL, julgo parcialmente procedente o pedido, (1) declarando formalmente rescindido o Contrato de Assinatura nº 4884033, via de consequência (2) condenando o GRUPO DE COMUNICAÇÕES TRÊS S/A., a restituir a JÚLIO CÉSAR INÁCIO, em dobro, o valor de R$ 414,60 (quatrocentos e quatorze reais e sessenta centavos), monetariamente corrigido a contar do ajuizamento da ação (06.03.2005 – fl. 01), acrescido dos juros legais desde a citação (07.07.2005 – fl. 33).
Sem custas (art. 55, ´caput´, da Lei nº 9.099/95).
Publique-se.
Registre-se.
Intimem-se.
Tubarão, 27 de abril de 2007.