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Dependentes dos segurados do RGPS: alterações da Lei nº 12.470/2011

30/09/2011 às 11:02
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A Lei nº 12.470/2011, além de estipular alíquotas diferenciadas de contribuição para determinadas categorias de segurados, acrescentou pessoas que podem ser consideradas como dependentes dos segurados do RGPS.

A Lei nº 12.470/2011, que entrou em vigor no dia 01/09/2011, além de estipular alíquotas diferenciadas de contribuição para determinadas categorias de segurados, modificou artigos da Lei nº 8.213/91.

Entre eles, acrescentou pessoas que podem ser consideradas como dependentes dos segurados do RGPS.

Relembra-se que são beneficiários do Regime Geral da Previdência Social os segurados e os dependentes (art. 10 da Lei nº 8.213/91, e art. 8º do Decreto nº 3.048/99), ou seja, as pessoas naturais que têm direito a uma prestação ou a um serviço da Previdência Social.

O art. 16 da Lei nº 8.213/91 (e o art. 16 do Regulamento) divide os dependentes dos segurados em três classes distintas: a) cônjuge, companheiro(a) e filho(a) não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 anos ou inválido (dependentes preferenciais); b) os pais; c) e o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 anos ou inválido.

Essa divisão assemelha-se à ordem de vocação hereditária existente no direito civil (art. 1.829, CC), na qual a existência de dependente de uma das classes afasta os dependentes das classes seguintes (ou mais remotas) do direito ao benefício previdenciário (art. 16, § 1º, da Lei nº 8.213/91).

A Lei nº 12.470/2011 adicionou, como dependentes: à primeira classe, o filho com deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente; e à terceira classe, o irmão com deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente.

Assim, o dispositivo passa a ter a seguinte redação:

"Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:

I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente;

II - os pais;

III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente; (...)".

Em consequência, também foi mudado o art. 77, § 2º, II e III, no tocante à extinção de cotas do benefício de pensão por morte:

"§ 2º A parte individual da pensão extingue-se:

(...)

II - para o filho, a pessoa a ele equiparada ou o irmão, de ambos os sexos, pela emancipação ou ao completar 21 (vinte e um) anos de idade, salvo se for inválido ou com deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente;

III - para o pensionista inválido pela cessação da invalidez e para o pensionista com deficiência intelectual ou mental, pelo levantamento da interdição".

O principal objetivo de incluir, ao lado dos filhos e irmãos inválidos, aqueles portadores de deficiência intelectual ou mental que causar incapacidade (absoluta ou relativa), foi o de adequar à lei infraconstitucional à Convenção de Nova Iorque sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.

Extrai-se do relatório do Projeto de Lei e Conversão nº 19/2011:

"Nesse sentido, o PLV acrescentou importantes e válidas alterações legais na seguridade social para atualizar o conceito de pessoa com deficiência. Incluiu-se a noção constante na Convenção dos Direitos das Pessoas com Deficiência e seu protocolo facultativo (ratificada pelo Brasil com equivalência à emenda constitucional, nos termos do § 3º, do art. 5º, da Constituição Federal, por meio do Decreto Legislativo nº 186, de 9 de julho de 2008, e promulgada pelo Decreto nº 6.949, de 25 de agosto de 2009), de deficiência intelectual e mental. Em consequência, o texto final aprovado na Câmara traz a inclusão dessa modalidade de deficiência, entre aquelas amparadas, nos instrumentos legais que regem a Previdência e a Assistência Social. Assim, eles poderão ser dependentes previdenciários ou receber Benefícios da Prestação Continuada da Assistência Social, conforme a Lei nº 8.742, de 1993, Lei Orgânica da Assistência Social" [01].

Relembra-se que o mencionado tratado internacional foi internalizado no Brasil com sua promulgação por meio do Decreto nº 6.949/2009, após a autorização para ratificação (no plano internacional) pelo Congresso Nacional por meio do Decreto Legislativo nº 186/2008. Esse decreto legislativo foi o primeiro a seguir o procedimento previsto no § 3º do art. 5º da Constituição, que prevê que os tratados internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por 3/5 dos votos dos respectivos membros, equivalem às Emendas Constitucionais.

Portanto, a inobservância da Convenção de Nova Iorque importa em violação de norma com status constitucional.

O Artigo 1 da Convenção dispõe que "pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas".

Essa definição destaca dois aspectos principais: o biológico (impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial) e o sociológico (interação dos impedimentos biológicos com barreiras, e a obstrução da participação plena e efetiva do deficiente na sociedade, em igualdades de condições com as demais pessoas).

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Até a alteração, a Lei nº 8.213/91 listava como dependentes os filhos e irmãos inválidos. Essa expressão não faz referência à incapacidade civil, mas sim à incapacidade laborativa que os impeça de assegurar a própria subsistência, comprovada por meio de exame médico-pericial.

Ou seja, apesar de não ser exigida a incapacidade civil (rol limitado de situações), havia uma restrição para a comprovação de invalidez, que pressupõe uma incapacidade permanente para o autossustento.

A Lei nº 12.470/2011 pretendeu ampliar esse rol de dependentes, para incluir filhos e irmãos que, mesmo sendo maiores de 21 anos, preencherem dois requisitos: a) sejam portadores de deficiência intelectual ou mental que os tornem absoluta ou relativamente incapazes; b) e que essa incapacidade tenha sido declarada por decisão judicial.

Entretanto, apesar da intenção, muito pouco se acrescentou.

Em primeiro lugar, em nenhum dos 50 artigos da Convenção de Nova Iorque sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência é utilizada a expressão "incapacidade", absoluta ou relativa.

Em segundo lugar, a Lei nº 8.213/91 já fazia uso do amplo conceito de "inválido", que, conforme destacado, compreende qualquer forma de deficiência que cause incapacidade para o autossustento, e não se restringe às hipóteses civis.

Porém, com o pretexto de adequar o tratado internacional às normas internas de Previdência Social, a Lei nº 12.470/2011 não utilizou conceito de direito internacional, tampouco de direito previdenciário, mas sim de direito civil!

As noções de incapacidade relativa e absoluta estão previstas nos arts. 3º e 4º do Código Civil:

"Art. 3º. São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil:

I - os menores de dezesseis anos;

II - os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos;

III - os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade".

"Art. 4º. São incapazes, relativamente a certos atos, ou à maneira de os exercer:

I - os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos;

II - os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência mental, tenham o discernimento reduzido;

III - os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo;

IV - os pródigos.

Parágrafo único. A capacidade dos índios será regulada por legislação especial".

Já o procedimento para essa declaração judicial (de interdição e curatela) é especificado pelos arts. 1.767/1.783 do Código Civil.

Consequentemente, além desse conceito civil de incapaz ser mais limitado do que aquele de inválido para fins previdenciários, acrescentou-se o requisito formal da declaração judicial prévia, que não é (necessariamente) exigida para a comprovação da invalidez.

A nova redação legal causará o seguinte problema: a interdição civil será obrigatória para a comprovação da dependência, ou apenas um meio de prova para a demonstração da invalidez? Por exemplo, o deficiente mental que for considerado inválido para o direito previdenciário deverá ser interditado civilmente para ser considerado dependente do segurado do RGPS? E o pródigo, e o viciado em tóxico? Em outras palavras, basta para o dependente comprovar que é (previdenciariamente) inválido, ou, caso se enquadre no art. 3º ou 4º do Código Civil, somente terá seu direito reconhecido se for interditado por decisão judicial?

Ainda, a questão deverá reacender a discussão sobre a comprovação dessa dependência.

Em relação ao filho e irmão inválidos, prevalece o entendimento de que, mesmo que a invalidez ocorra após a emancipação ou aos 21 anos de idade, a dependência econômica é presumida, considerando o disposto no § 4º do art. 16, que também não faz qualquer diferenciação acerca do momento em que surgir a invalidez, havendo controvérsia somente sobre a natureza da presunção (absoluta ou relativa) [02].

Esse raciocínio poderá ser utilizado para pessoas civilmente incapazes, que não residirem com os pais ou os irmãos? Por exemplo, uma pessoa civilmente incapaz que esteja sob a curatela de um irmão pode ser considerada como dependente previdenciária de outro irmão, ou de sua mãe?

Por fim, reitera-se, a péssima técnica legislativa utilizada na modificação legal não observou as expressões utilizadas para diferenciar as incapacidades justificadoras dos benefícios previdenciários de aposentadoria por invalidez, auxílio-doença e auxílio-acidente (total/parcial e permanente/temporária). Ao adotar as expressões "absolutamente incapaz" e "relativamente incapaz" (do direito civil), pouco acrescentou ao rol do art. 16 da Lei nº 8.213/91, não conferiu a pretendida adequação à Convenção de Nova Iorque sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, e gerou o problema (não esclarecido pela lei) da necessidade – ou não – de demonstração da dependência econômica.


Notas

  1. Disponível em: <http://legis.senado.gov.br/mate-pdf/94172.pdf>. Acesso em 24 set. 2011.
  2. Sobre o assunto: CARDOSO, Oscar Valente. Considerações sobre a qualidade de dependente do filho inválido. Revista de Previdência Social. São Paulo, nº 334, pp. 696-698, set. 2008.
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Sobre o autor
Oscar Valente Cardoso

Professor, Doutor em Direito, Diretor Geral da Escola da Magistratura Federal do Rio Grande do Sul, Coordenador do Comitê Gestor de Proteção de Dados do TRF da 4a Região, Palestrante, Autor de Livros e Artigos, e Juiz Federal

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CARDOSO, Oscar Valente. Dependentes dos segurados do RGPS: alterações da Lei nº 12.470/2011. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 3012, 30 set. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20088. Acesso em: 18 dez. 2024.

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