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A aplicação subsidiária da legislação comum na execução trabalhista, a jornada sobre a execução no processo do trabalho e o anteprojeto do TST que altera a execução trabalhista

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11/10/2011 às 15:34
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O processo trabalhista, cuja simplicidade e celeridade em diversos aspectos influenciaram o processo comum, carece de buscar nele, agora, regras para uma maior efetividade e rapidez, ainda quando temos regras expressas na CLT versando sobre a matéria, razão maior da controvérsia doutrinária e jurisprudencial de nossos dias em matéria de aplicação subsidiária.

1. Introdução. 2. A CLT, o direito individual do trabalho, o direito coletivo do trabalho e o direito processual do trabalho – disciplina incompleta e anacrônica. 3. A lacuna da CLT e a compatibilidade do processo comum com os princípios do processo do trabalho como requisitos da aplicação da legislação processual comum na execução trabalhista. 4. Hipóteses conhecidas e incontroversas da aplicação subsidiária por vazio ontológico e axiológico da CLT. 5. A interpretação do princípio da subsidiariedade na Jornada Nacional sobre a Execução no Processo do Trabalho. 6. A alteração proposta pelo Tribunal Superior do Trabalho em matéria de aplicação subsidiária do processo comum no processo do trabalho. 7. Conclusões. 8. Referências.


1. Introdução

Problema dos mais instigantes da atualidade em matéria de processo do trabalho é o relativo à aplicação supletiva das regras do processo comum nas lacunas da Consolidação das Leis – CLT – e da legislação processual trabalhista complementar.

É que não obstante a aplicação supletiva de normas processuais por omissão da legislação específica seja prevista expressamente em duas regras da CLT, arts. 769 e 889, a doutrina e a jurisprudência não se entendem quanto às disposições do processo comum que podem ser trazidas ao processo do trabalho, sobretudo em vista da discussão em torno da existência ou não de lacunas e da compatibilidade das regras que devem ser trazidas, conforme as diretrizes de integração fixadas nos art. 769 e 889 da CLT.

Assim, neste trabalho, somos animados pelo problema da aplicação subsidiária da legislação comum no processo do trabalho, mas especificamente na execução trabalhista, tendo em vista que essa atividade jurisdicional específica (atividade executiva) é vista hoje como o "calcanhar de Aquiles" da Justiça Especial, o que demanda uma série de indagações em torno das normas aplicáveis para a sua efetividade em tempo razoável.

Refletimos, inicialmente, sobre as possíveis razões da lacuna da legislação específica quanto às normas que tornem a execução uma atividade mais efetiva e de duração em tempo razoável.

Abordamos, na sequência, a questão das lacunas possíveis numa legislação processual. Enfrentamos, nesse ponto, as discussões em torno das lacunas normativas, axiológicas e ontológicas.

No ponto seguinte, analisamos a compatibilidade da regra do processo comum com a execução trabalhista como requisito legislativo e lógico a que venhamos aplicar a legislação comum no processo do trabalho e na execução trabalhista.

No contexto de nosso trabalho, então, tem lugar a análise das interpretações que foram tiradas na Jornada Nacional sobre Execução no Processo do Trabalho, ocorrida em novembro de 2010, por iniciativa da associação Nacional dos Magistrados do Trabalho – ANAMATRA -, Associação dos Magistrados do Trabalho da 23ª Região - AMATRA 23 –- e do Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região e, ainda, a proposta de alteração da CLT apresentada pelo Tribunal Superior do Trabalho ao Congresso Nacional, que considera a possibilidade de aplicação subsidiária das regras do processo comum na execução do processo do trabalho.


2. A CLT, o direito individual do trabalho, o direito coletivo do trabalho e o direito processual do trabalho – disciplina incompleta e anacrônica

Os que atuam no Direito e no Processo do Trabalho convivem com a particularidade de terem num único diploma legislativo regras que versam sobre o Direito Individual do Trabalho, em torno do Direito Coletivo e também sobre o Direito Processual do Trabalho. Em pouco mais de 900 artigos, a CLT disciplina essas três expressões distintas do direito material e processual trabalhista e não chega a alarmar a circunstância de que o faça de modo lacunoso.

De fato, a CLT não disciplina a contento qualquer das expressões do direito que mencionamos acima e não o faz apenas por razões históricas, mas também decorrentes do desenvolvimento científico, econômico e tecnológico e tendo em vista mais a pulverização, a ampliação e as características atuais das relações sociais em geral e as trabalhistas em particular.

Note-se, quanto ao direito processual, por exemplo, que experimentamos em torno dele um grande desenvolvimento científico desde a década de 1970, inclusive de conotações ideológicas, que não foram consideradas atentamente pelo legislador brasileiro para fins de adequação do direito processual trabalhista à ciência, sobretudo no campo do direito processual do trabalho.

O regime das intervenções de terceiro, do litisconsórcio e, o mais importante, das ações coletivas em regime de substituição processual no processo do trabalho, jamais recebeu do legislador brasileiro a menor das atenções, o que produziu, sem sombra de dúvidas, um atraso científico no processo do trabalho em se considerando o processo comum, mais sentido no presente em face das alterações que foram promovidas na execução do processo civil.

O atraso científico do processo do trabalho, acarretado pela falta de atualização da legislação, ademais, paralisou consideravelmente os operadores do direito e do processo especial. As interpretações restritivas que tivemos inicialmente em torno da substituição processual no processo do trabalho e que culminaram com a Súmula 310 do TST, hoje cancelada, por exemplo, são justificadas, parcialmente, por esse atraso que não permitia que atuássemos com segurança em torno dos novos fenômenos do direito e do processo.

No campo do desenvolvimento econômico e tecnológico, que desencadearam significativa demanda por justiça efetiva e em tempo razoável, estivemos mais a reboque dos acontecimentos do que em exercício de visão estratégica. Fomos reativos, enfim.

As alterações pontuais do sistema recursal e a introdução do procedimento sumaríssimo no processo do trabalho, esse numa tentativa de resgate da audiência única, são exemplos de uma atuação reativa, quando o clamor por Justiça nas relações de trabalho estava comprometendo a própria subsistência da Justiça do Trabalho.

É preciso anotar, nesse ponto, que o recurso digitalizado, o seu processamento eletrônico e a alteração promovida no nosso Agravo de Instrumento, sobretudo com a exigência de depósito recursal para o seu manejo, não serão suficientes a que tenhamos uma duração razoável do processo no Tribunal Superior do Trabalho. Não é sensato e humano que os ministros da maior corte de Justiça do Trabalho do nosso país sejam submetidos à recepção anual de cerca de 120 mil processos.

Urge, assim, que efetivemos mecanismo de trancamento dos recursos nas esferas regionais, como acontece, na atualidade, com a exigência do pressuposto da repercussão geral, no recurso extraordinário, e com o julgamento dos recursos repetitivos, no recurso especial.

Pois bem. As lacunas e omissões da CLT e da legislação processual complementar e esse relativo imobilismo do legislador brasileiro fez com que tivéssemos agravada a controvérsia sobre a aplicação subsidiária do processo comum no processo do trabalho. Enquanto a sociedade exige maior presença da Justiça, um processo efetivo e em tempo razoável e o legislador do processo civil promove alterações no Código de Processo Civil visando adaptá-lo às novas circunstâncias, quase não temos alterações no processo regulado pela CLT.

E, nesse quadro, é valiosa a observação de Antonio Umberto de Souza Júnior:

Porém, a relação complexa entre os ordenamentos processuais comum e trabalhista deixa nas mãos dos intérpretes e aplicadores um dilema crucial para a vitalidade da execução no âmbito da Justiça Laboral: ocupar ou pressionar, por todos os meios idôneos possíveis, as trincheiras do Parlamento em busca da efetividade perdida no processo do trabalho ou, por meio de uma ação transformadora constitucionalmente justificada, incorporar desde já ao processo do trabalho todas as inovações do CPC capazes de produzir soluções mais satisfatórias para a aceleração da prestação jurisdicional no momento sublime de sua concretização – que é a execução.

Constatamos, então, atônitos, que o nosso processo, cuja simplicidade e celeridade em diversos aspectos influenciaram o processo comum carece de buscar nele, agora, regras para uma maior efetividade e rapidez, ainda quando temos normas expressas na CLT versando sobre a matéria, razão maior da controvérsia doutrinária e jurisprudencial de nossos dias em matéria de aplicação subsidiária.

Vejamos, por exemplo, a controvérsia em torno da aplicação da multa do art. 475-J do CPC no processo do trabalho, bem representada pelo aresto a seguir transcrito, uma das questões de maior debate quanto à aplicação das regras do CPC na execução trabalhista:

MULTA DO ART. 475-J DO CPC. INCOMPATIBILIDADE COM O PROCESSO DO TRABALHO. REGRA PRÓPRIA

 COM PRAZO REDUZIDO. MEDIDA COERCITIVA NO PROCESSO TRABALHO DIFERENCIADA DO PROCESSO CIVIL. O art. 475-J do CPC determina que o devedor que, no prazo de quinze dias, não tiver efetuado o pagamento da dívida, tenha acrescido multa de 10% sobre o valor da execução e, a requerimento do credor, mandado de penhora e avaliação. A decisão que determina a incidência de multa do art. 475-J do CPC, em processo trabalhista, viola o art. 889 da CLT, na medida em que a aplicação do processo civil, subsidiariamente, apenas é possível quando houver omissão da CLT, seguindo, primeiramente, a linha traçada pela Lei de Execução fiscal, para apenas após fazer incidir o CPC. Ainda assim, deve ser compatível a regra contida no processo civil com a norma trabalhista, nos termos do art. 769 da CLT, o que não ocorre no caso de cominação de multa no prazo de quinze dias, quando o art. 880 da CLT determina a execução em 48 horas, sob pena de penhora, não de multa. Recurso de revista conhecido e provido, no tema, para afastar a multa do art. 475-J do CPC. Recurso de revista conhecido e provido. Recurso de revista conhecido e provido.  Processo: RR - 962/2006-111-03-00.8 Data de Julgamento: 10/06/2009, Relator Ministro: Aloysio Corrêa da Veiga, 6ª Turma, Data de Divulgação: DEJT 19/06/2009.

3. A lacuna da CLT e a compatibilidade do processo comum com os princípios do processo do trabalho como requisitos da aplicação da legislação processual comum na execução trabalhista

A regra que estatue a aplicação subsidiária da legislação do processo comum no processo do trabalho, arts. 769 da CLT, impõe a necessidade de que tenhamos lacunas ou omissões na legislação especial como condição à aplicação das regras do processo comum. Noutras palavras, só é possível aplicar a legislação comum na jurisdição trabalhista se houver lacuna ou omissão na CLT e na legislação complementar específica.

O que devemos entender, destarte, por lacunas e omissões da legislação processual trabalhista? Oportuna, nesse ponto, então, a lição de Karl Engisch:

As lacunas são deficiências do Direito positivo (do Direito legislado ou do Direito consuetudinário), apreensíveis como faltas ou falhas de conteúdo de regulamentação jurídica para determinadas situações de facto em que é de esperar essa regulamentação e em que tais falhas postulam e admitem a sua remoção através duma decisão judicial jurídico-integradora.

Com base na definição de Karl Engisch, pois, haverá lacuna toda vez que a CLT não preveja regra sobre a matéria. O jurista alemão, por sua vez, destaca, em sua definição, a integração do sistema por meio da atuação judicial, o que nós encontramos, por exemplo, na previsão do art. 126 do CPC.

Tratando especificamente das lacunas ou omissões da CLT e tendo em vista a definição de Engisch, podemos dizer que há lacuna ou omissão, por exemplo, no sistema recursal da CLT, quanto aos requisitos da legitimidade e do interesse para o manejo dos recursos. Temos omissão, também, quanto ao trato, como já ressaltamos, da intervenção de terceiros no processo do trabalho. São tantas as lacunas e omissões, porém, que nem convém tentar relacioná-las... Falamos, aqui, então, de omissão ou lacuna legislativa.

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Porém, corrente de interpretação que tem ganhado força assevera que a lacuna que autoriza a aplicação supletiva do processo comum não é apenas a lacuna normativa, mas também as chamadas lacunas axiológicas e as ontológicas.

Vejamos a lição de Bobbio sobre a lacuna axiológica, por ele chamada de ideológica:

Mas existe um outro sentido de lacuna, mais óbvio, quero dizer, menos controverso, que merece uma breve explanação. Também se entende por "lacuna" a ausência não de uma solução, seja ela qual for, mas de uma solução satisfatória, ou, em outras palavras, não a ausência de uma norma, mas a ausência de uma norma justa, ou seja, daquela norma que gostaríamos que existisse, mas não existe. Como essas lacunas derivam não da consideração do ordenamento jurídico como ele é, mas do confronto entre o ordenamento jurídico como ele é e como deveria ser, foram chamadas "ideológicas", para distingui-las daquelas que fossem eventualmente encontradas no ordenamento jurídico como é, e que podem ser chamadas de "reais".

Note-se que a regra ideal de que trata Bobbio, não encontrada no sistema, é a mesma regra ideal que, no nosso caso, não encontramos no sistema do processo do trabalho, mas que podemos encontramos no sistema do processo comum.

Assim, a lacuna axiológica considera o valor da regra existente no sistema específico em confronto com a regra do processo comum a ser utilizada em substituição. Segundo essa interpretação, pois, a regra do processo comum pode ser aplicada em substituição da existente na CLT, por exemplo, se ela contiver um valor social que se sobreponha ao valor da regra específica.

É o caso, em nossa opinião, da previsão celetista de julgamento da exceção de suspeição ou de impedimento pelo próprio órgão cuja parcialidade a parte suscita. Nessa hipótese, parece ser evidente que a regra da CLT deve ser substituída pelas regras do CPC, que se sobrepõem do ponto de vista ético.

A lacuna ontológica, por sua vez, é aquela configurada pela falta de contemporaneidade da regra existente. Há uma regra disciplinando a questão no processo do trabalho, mas ela não é adequada em vista dos avanços históricos. É uma regra que envelheceu, que precisa ser substituída por uma regra mais nova, encontrada, no caso, no processo comum. Exemplo desse tipo de lacuna nós encontrávamos no art. 830 da CLT, alterado recentemente, que desconsiderava a existência dos modernos meios de reprodução de documentos.

O ensino de Karl Engisch é por demais esclarecedor quanto a esse tipo de lacuna:

Como também se diz, não há apenas "lacunas primárias", lacunas de antemão inerentes a uma regulamentação legal, mas ainda lacunas secundárias, quer dizer, lacunas que só supervenientemente se manifestam, porque, entretanto, as circunstâncias se modificaram. Isto vale, de resto, não só para a modificação das valorações, mas também pelo que toca à alteração das circunstâncias de fato relativas ao objeto da regulamentação: As regulamentações Jurídicas não raro se tornam posteriormente lacunosas pelo fato de, em razão de fenômenos econômicos inteiramente novos (pense-se na inflação) ou de progressos técnicos (aviação, filmes, discos, rádio, televisão, cirurgia do cérebro, inseminação artificial), surgirem questões jurídicas às quais a regulamentação anterior não dá qualquer resposta satisfatória.

A existência, na atualidade, dessa distinção entre lacunas normativas ou legislativas e lacunas ontológicas e axiológicas coloca os estudiosos e intérpretes do processo do trabalho em dois grupos: o que considera, restritivamente, a "omissão" prevista nas regras celetistas como condição de aplicação de regras do processo comum para lacuna apenas legislativa e o que considera que as lacunas passíveis de preenchimento também são as axiológicas e as ontológicas.

De nossa parte, ressaltamos a necessidade, como valor de todos os tempos, de que os conflitos sejam resolvidos pelo Poder com efetividade e em tempo razoável, razão pela qual somos favoráveis à aplicação das regras do processo comum no processo do trabalho e execução trabalhista, não apenas na hipótese de lacuna normativa, mas também nas lacunas ontológicas e axiológicas. Aliás, como vamos revelar no capítulo seguinte, essa aplicação tem sido muito comum e por parte de todos os juristas, sem exceção, e alguns sequer notam a sua ocorrência.

Anote-se, por oportuno, em abono ao nosso argumento, que relativamente à execução trabalhista a regra do art. 889 da CLT remete o intérprete à aplicação subsidiária da Lei de Execução Fiscal, atualmente a Lei n. 6.830/80, exceto no que diz respeito à ordem de preferência dos bens à penhora, no que prevalece a regra do art. 655 do CPC.

Essa remessa à Lei da Execução Fiscal tem justificativa no trato mais vantajoso que a lei dá ao credor, colocando-o em situação de prevalência sobre o devedor, o que evidencia, assim, a preocupação do legislador celetista em nos remeter a um conjunto de regras que possa dar maior efetividade e celeridade à atividade jurisdicional executiva trabalhista.

Sem deixarmos de atentar para a circunstância de que temos imposto ao jurisdicionado, também em matéria de execução trabalhista, uma situação de instabilidade que precisa ser urgentemente corrigida, o que deve ser feito por meio da alteração da legislação processual celetista, somos favoráveis à imediata aplicação, em matéria de processo, do princípio do in dúbio pro efetividade, conforme a proposta de Schiavi, ou seja, da prevalência da regra do processo comum sobre a regra específica do processo do trabalho se dessa aplicação resultar um processo efetivo.

Relativamente à questão da compatibilidade, observamos que não se trata de critério objetivo, o que é aspecto que dificulta a atuação concreta da regra. A essência do que é ou não compatível é juízo subjetivo, variável e, destarte, controverso.

Interpretamos que, de qualquer modo, a compatibilidade da regra do processo comum a ser trazida ao processo do trabalho deve ser aferida à luz dos princípios do Processo do Trabalho, em vista da função estruturadora que os princípios exercem em todos os sistemas de conhecimento.

Assim, uma norma do processo comum pode ser aplicada no Processo do Trabalho se for compatível com os princípios desse processo, do que dá noção a OJ n. 310 da SDI do TST, que considera o princípio da sumariedade dos ritos, que é uma consequência da oralidade praticada no processo do trabalho, para dizer da inaplicabilidade do art. 191 do CPC no nosso processo:

OJ-SDI1-310 LITISCONSORTES. PROCURADORES DISTINTOS. PRAZO EM DOBRO. ART. 191 DO CPC. INAPLICÁVEL AO PROCESSO DO TRABALHO (DJ 11.08.2003).


4. Hipóteses conhecidas e incontroversas da aplicação subsidiária por vazio ontológico e axiológico da CLT

Neste capítulo nos ocupamos da demonstração de três aplicações comuns do preenchimento dos vazios axiológicos ou ontológicos do sistema do processo do trabalho pela aplicação de regras do processo comum, não obstante a existência de regras versando sobre o tema no processo do trabalho.

Vejamos, em primeiro lugar, a regra do art. 897-A da CLT que versa sobre os Embargos de Declaração:

Caberão embargos de declaração da sentença ou acórdão, no prazo de cinco dias, devendo seu julgamento ocorrer na primeira audiência ou sessão subseqüente a sua apresentação, registrado na certidão, admitido efeito modificativo da decisão nos casos de omissão e contradição no julgado e manifesto equívoco no exame dos pressupostos extrínsecos do recurso. 

A norma em questão trata dos Embargos de Declaração no processo do trabalho. Note-se que não há na regra em comento nenhuma alusão ao cabimento dos Embargos de Declaração em vista da obscuridade da decisão. As hipóteses previstas são omissão, contradição e manifesto equívoco no exame de pressupostos extrínsecos do recurso.

A interpretação da regra do art. 769 da CLT, restringindo o requisito da existência de lacuna na CLT ao aspecto do vazio normativo, acabaria por determinar que o defeito da obscuridade não pudesse ser objeto de correção pela via dos ED, o que seria um absurdo.

Entretanto, todos nós aplicamos a disposição do art. 535 do CPC, sem que haja omissão na CLT sobre as hipóteses de cabimento dos Embargos de Declaração na CLT, e muitos sem sequer se darem conta do teor da regra do art. 897-A, porque constatamos na norma do art. 897-A um vazio axiológico a ser preenchido pela previsão do CPC.

Por outro lado, ainda em matéria de Embargos de Declaração, outro aspecto que nos chama atenção é o de que a previsão de multa pelo uso protelatório do recurso consta apenas no CPC. Novamente aqui, a interpretação do que seja omissão no art. 769 da CLT, se restrito ao vazio normativo, não permitiria o uso do Parágrafo único do art. 538 do CPC no nosso processo.

Destaquemos, nesse ponto, o cabimento do Reexame Necessário no processo do trabalho. A regra que deveria ser observada por nós, não fosse a constatação de um vazio ontológico nela, seria a do Decreto n. 779/1969, que não estabelece qualquer requisito para o duplo grau necessário ou recurso de ofício, senão a sucumbência da Fazenda Pública.

Não obstante, abandonando a norma específica do processo do trabalho, conforme podemos ver na Súmula 303 do c. TST, aplicamos a disposição do art. 475 do CPC, que restringe o duplo grau necessário, entre outras coisas, a que a sucumbência da Fazenda Pública tenha sido superior a 60 salários mínimos.

A aplicação da regra do CPC, chancelada pela Súmula 303 do TST, não obstante a existência de norma específica no processo do trabalho, Decreto n. 779/69, é em vista de um vazio ontológico que pretendemos corrigir e que Francisco Antonio de Oliveira justifica com base no princípio da razoabilidade.

O terceiro exemplo, dentre outros possíveis, de como superamos na prática a questão da existência de regra do processo do trabalho para aplicar norma de melhor conteúdo do processo comum é o concernente aos julgamentos das exceções de impedimento e de suspeição apresentadas nas Varas do Trabalho.

A regra do art. 13 da Consolidação dos Provimentos da Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho nos diz que nesses casos o juiz do trabalho que não admita o impedimento ou suspeição deve remeter os autos ao Tribunal para decisão da exceção, observando as disposições dos arts. 313 e 314 do CPC. Ressalte-se, porém, que temos previsão na CLT, art. 802, que disciplina de modo específico a questão afirmando que o julgamento da exceção será pelo próprio juiz cujo impedimento ou suspeição se levante.

Nesse ponto, abandonamos a regra da CLT em razão de seu evidente vazio axiológico e ontológico.

Como podemos perceber, a aplicação de regra do processo comum no processo do trabalho, apesar da existência de normatização específica na legislação própria, é mais comum do que imaginamos de início e sempre ocorre tendo em vista o desejo de praticarmos um processo mais racional, efetivo e que contemple o jurisdicionado com uma prestação jurisdicional em tempo razoável.

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Sobre o autor
Marcílio Florêncio Mota

juiz do Trabalho em Paulista (PE), professor de Direito Processual Civil da Faculdade Maurício de Nassau, mestrando em Direito

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MOTA, Marcílio Florêncio. A aplicação subsidiária da legislação comum na execução trabalhista, a jornada sobre a execução no processo do trabalho e o anteprojeto do TST que altera a execução trabalhista. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 3023, 11 out. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20187. Acesso em: 23 dez. 2024.

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