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A impunidade dos sociocidas como direito de sétima geração

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13/10/2011 às 10:58
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5.Da sétima geração de direitos:

Aqui apresentamos a sociedade jurídica brasileira um moderno direito de sétima geração ou sétima maravilha do mundo: Direito a Impunidade.

Do ponto de vista léxico, impunidade significa aquilo que não foi punido, que escapou ao castigo.

Segundo conceito Wikipediano, do ponto de vista subjetivo, a impunidade consiste na sensação compartilhada entre os membros de uma sociedade no sentido de que a punição de infratores é rara e/ou insuficiente. Disso deriva uma cultura marcada pela ausência de punição ou pela displicência na aplicação de penas. Nessa "definição", podem ser incluídos casos que não se enquadram no aspecto técnico acima descrito:

- Lentidão excessiva no julgamento, que oferece ao suspeito mais liberdade do que "mereceria";

- Penas mais brandas do que as esperadas pela sociedade ou parte dela.

Pode-se afirmar que o incremento da impunidade em nosso meio é multicausal. Algumas causas merecem citação: escassez na matemática logística do sistema de defesa e controle social, parcos recursos humanos, a morosidade na prestação de justiça efetiva, a fragilidade legislativa, o grande rol de benefícios processuais aos acusados em geral, como liberdade provisória, transação penal, conciliação penal, sursis, suspensão processual, livramento processual, saída temporária, delação premiada, detração penal, remição penal, inclusive pelo estudo, Lei 12.433/2011, indulto, anistia, perdão judicial, prisão como extrema ratio da ultima ratio, tudo isso em detrimento social, a ausência de espirito comunitário de grande parte dos agentes públicos e o comportamento extremista de pseudo-operadores do direito levam a concretização do direito a IMPUNIDADE.

Nos dias atuais o delinquente tem certeza que em praticando qualquer lesão social o seu direito a imunidade será assegurado, com todos os recursos a ele inerentes. A prisão requer tempo para conclusão do processo. O cidadão em conflito com a lei possui uma indústria de liberdade provisória a seu favor, agora com maior incidência em função da vigência das chamadas medidas cautelares introduzidas pela Lei 12.403/11, um modelo previsto no artigo 197 do Código de Portugal, e que alguém pensou um dia que serviria para o Brasil. E quando aparece alguém para quebrar o sistema ou rede de impunidade, ele é expurgado a todo custo e assazmente criticado nos corredores da injustiça.

Em Minas Gerais, o festejado sociólogo Luís Flávio Sapori ensina com maestria:

"No caso brasileiro, um dos eixos centrais de uma política de segurança pública deve ser a redução dos níveis de impunidade que vigoram em nossa sociedade. A tarefa a ser empreendida não passa prioritariamente pela acentuação do rigor da punição aos criminosos e sim pela acentuação da certeza desta punição. Não precisamos de penas mais severas ou mesmo da ampliação do leque dos crimes hediondos. Nosso objetivo deve ser o incremento das chances de um indivíduo, que tenha cometido ato criminoso, ser identificado, detido, processado e sentenciado, e uma vez condenado, ser efetivamente inserido no sistema prisional".

Ensina Beccaria, em sua Obra dos Delitos e das Penas, que um dos maiores travões aos delitos não é a crueldade das penas, mas a sua infalibilidade... A certeza de um castigo, mesmo moderado, causará sempre impressão mais intensa que o temor de outro mais severo, aliado à esperança de impunidade.

E continua o Mestre: A finalidade das penas não é atormentar e afligir um ser sensível... O seu é apenas impedir que o réu cause novos danos aos seus concidadãos e dissuadir os outros de fazer o mesmo.


6.Da conclusão:

Por derradeiro pode-se afirmar que a indústria da impunidade tem trazido desassossego à sociedade brasileira, fazendo crescer a criminalidade em todos os lugares. Como bem definido nas exposições de motivo da Lei 7.960/89: "O clima de pânico que se estabelece em nossas cidades, a certeza da impunidade que campeia célere na consciência de nosso povo, formando novos criminosos exigem medidas firmes e decididas".

Sigo minha trajetória angustiante, mas movido pela fé inabalável, como rocha que não se quebra fácil, acreditando piamente que a causa maior da impunidade no Brasil reside na falta de consciência profissional e ausência de espírito comunitário de grande parte dos operadores do direito, pois é possível localizar na mesma legislação dois fundamentais contrapostos:

1.Um argumento, artigo 93, IX, CF/88, para conceder liberdades provisórias a delinquentes perigosos, ás vezes levado pela enfermidade crônica da falta de compromisso social, aqui alegando uma sorte de princípios em favor do delinquente, como ofensa do devido processo legal, princípio da dignidade da pessoa humana, princípio da individualização da pena, a questão da co-culpabilidade social, princípio da plena felicidade, igualdade formal e material, presunção de culpabilidade, obediência a Tratados e Convenções Internacionais ratificados, como Regras de Tóquio, Pacto de São José da Costa Rica, Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, e quejando;

2.E outro para negar a concessão de liberdade provisória a perigosos sociocidas em situações problemáticas, como ensinava o Professor Louk Husmann, cujo argumento principal é a utilização da técnica de colisão excludente ou colisão com redução unilateral, quando houver conflito de direitos fundamentais fazendo sempre a opção pela proteção da sociedade e supremacia do interesse público, a força normativa da Constituição para proteção da maioria, e finalmente pela proibição da proteção deficiente e do retrocesso social, pois a impunidade tolerada sempre conduz ao caminho da cumplicidade. Precisamos viver numa sociedade onde não se reina impunidade.

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Sobre o autor
Jeferson Botelho Pereira

Jeferson Botelho Pereira. Ex-Secretário Adjunto de Justiça e Segurança Pública de MG, de 03/02/2021 a 23/11/2022. É Delegado Geral de Polícia Civil em Minas Gerais, aposentado. Ex-Superintendente de Investigações e Polícia Judiciária de Minas Gerais, no período de 19 de setembro de 2011 a 10 de fevereiro de 2015. Ex-Chefe do 2º Departamento de Polícia Civil de Minas Gerais, Ex-Delegado Regional de Governador Valadares, Ex-Delegado da Divisão de Tóxicos e Entorpecentes e Repressão a Homicídios em Teófilo Otoni/MG, Graduado em Direito pela Fundação Educacional Nordeste Mineiro - FENORD - Teófilo Otoni/MG, em 1991995. Professor de Direito Penal, Processo Penal, Teoria Geral do Processo, Instituições de Direito Público e Privado, Legislação Especial, Direito Penal Avançado, Professor da Academia de Polícia Civil de Minas Gerais, Professor do Curso de Pós-Graduação de Direito Penal e Processo Penal da Faculdade Estácio de Sá, Pós-Graduado em Direito Penal e Processo Penal pela FADIVALE em Governador Valadares/MG, Prof. do Curso de Pós-Graduação em Ciências Criminais e Segurança Pública, Faculdades Unificadas Doctum, Campus Teófilo Otoni, Professor do curso de Pós-Graduação da FADIVALE/MG, Professor da Universidade Presidente Antônio Carlos - UNIPAC-Teófilo Otoni. Especialização em Combate à corrupção, crime organizado e Antiterrorismo pela Vniversidad DSalamanca, Espanha, 40ª curso de Especialização em Direito. Mestrando em Ciências das Religiões pela Faculdade Unida de Vitória/ES. Participação no 1º Estado Social, neoliberalismo e desenvolvimento social e econômico, Vniversidad DSalamanca, 19/01/2017, Espanha, 2017. Participação no 2º Taller Desenvolvimento social numa sociedade de Risco e as novas Ameaças aos Direitos Fundamentais, 24/01/2017, Vniversidad DSalamanca, Espanha, 2017. Participação no 3º Taller A solução de conflitos no âmbito do Direito Privado, 26/01/2017, Vniversidad DSalamanca, Espanha, 2017. Jornada Internacional Comjib-VSAL EL espaço jurídico ibero-americano: Oportunidades e Desafios Compartidos. Participação no Seminário A relação entre União Europeia e América Latina, em 23 de janeiro de 2017. Apresentação em Taller Avanco Social numa Sociedade de Risco e a proteção dos direitos fundamentais, celebrado em 24 de janeiro de 2017. Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad Del Museo Social Argentino, Buenos Aires – Argentina, autor do Livro Tráfico e Uso Ilícitos de Drogas: Atividade sindical complexa e ameaça transnacional, Editora JHMIZUNO, Participação no Livro: Lei nº 12.403/2011 na Prática - Alterações da Novel legislação e os Delegados de Polícia, Participação no Livro Comentários ao Projeto do Novo Código Penal PLS nº 236/2012, Editora Impetus, Participação no Livro Atividade Policial, 6ª Edição, Autor Rogério Greco, Coautor do Livro Manual de Processo Penal, 2015, 1ª Edição Editora D´Plácido, Autor do Livro Elementos do Direito Penal, 1ª edição, Editora D´Plácido, Belo Horizonte, 2016. Coautor do Livro RELEITURA DE CASOS CÉLEBRES. Julgamento complexo no Brasil. Editora Conhecimento - Belo Horizonte. Ano 2020. Autor do Livro VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. 2022. Editora Mizuno, São Paulo. articulista em Revistas Jurídicas, Professor em Cursos preparatórios para Concurso Público, palestrante em Seminários e Congressos. É advogado criminalista em Minas Gerais. OAB/MG. Condecorações: Medalha da Inconfidência Mineira em Ouro Preto em 2013, Conferida pelo Governo do Estado, Medalha de Mérito Legislativo da Assembléia Legislativa de Minas Gerais, 2013, Medalha Santos Drumont, Conferida pelo Governo do Estado de Minas Gerais, em 2013, Medalha Circuito das Águas, em 2014, Conferida Conselho da Medalha de São Lourenço/MG. Medalha Garimpeiro do ano de 2013, em Teófilo Otoni, Medalha Sesquicentenária em Teófilo Otoni. Medalha Imperador Dom Pedro II, do Corpo de Bombeiros, 29/08/2014, Medalha Gilberto Porto, Grau Ouro, pela Academia de Polícia Civil em Belo Horizonte - 2015, Medalha do Mérito Estudantil da UETO - União Estudantil de Teófilo Otoni, junho/2016, Título de Cidadão Honorário de Governador Valadares/MG, em 2012, Contagem/MG em 2013 e Belo Horizonte/MG, em 2013.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PEREIRA, Jeferson Botelho. A impunidade dos sociocidas como direito de sétima geração. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 3025, 13 out. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20204. Acesso em: 25 abr. 2024.

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