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Autonomia partidária, comissões provisórias e as convenções para escolhas dos pré-candidatos

31/08/2012 às 15:46
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O Sistema de Gerenciamento de Informações Partidárias – SGIP contém um pequeno lapso. Devido à liberdade que têm de controlar suas questões internas, os partidos podem alterar como bem entenderem suas informações. A Justiça Eleitoral não verifica sua veracidade; apenas confere se foram realizadas por quem tinha permissão. Se a alteração é ilegal, pouco importa.

Ao que parece, o problema do momento para a Justiça Eleitoral é quanto a regularidade das Convenções Municipais, das quais depende a escolha dos candidatos para o pleito de 2012. Neste exato momento em que escrevo, existem vários processos no Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba aguardando a decisão da corte sobre o assunto. Tal decisão pode influenciar diretamente várias candidaturas, deferindo ou indeferindo a participação de candidatos ou alterando o tempo de propaganda na TV para cada coligação.

Para elucidar bem o caso e para garantir o entendimento do caro e-leitor, é necessário uma breve explicação. As Comissões Provisórias são representações do partido em âmbito municipal. Cabe a essas Comissões, de forma democrática e seguindo as regras do Estatuto do Partido, promover as Convenções Partidárias onde serão escolhidos os seus  pré-candidatos.

No âmbito municipal, via de regra, o responsável por realizar as convenções é o Diretório Municipal. Ocorre que, em muitos municípios, esse diretório não existe. Nesses casos, o que existe é uma Comissão Provisória. Essa comissão provisória faz as vezes do Diretório, e, tecnicamente em nada se diferencia quanto às prerrogativas para atuar no micro-processo eleitoral.

Devido aos constantes problemas quanto ao controle dos integrantes e delegados dos órgãos de direção partidária, o TSE, por meio da instrução normativa 03/2008, estabeleceu o uso do Sistema de Gerenciamento de Informações partidárias - SGIP.

Instituído para atender os fins do art. 10 da Lei 9.096/95, e regulamentado pela Res. TSE 23.093/2009, o SGIP passou a ser de uso obrigatório pela Justiça Eleitoral a partir de 2009, sendo composto por três módulos:

I – Módulo Interno – SGIPin): de uso exclusivo da Justiça Eleitoral.

II – Módulo Consulta Web (SGIPweb): disponível na Internet e na Intranet do TSE – Possibilita o acesso aos dados inseridos no Módulo Interno e permite a emissão de certidões com certificação ou autenticação digital.

III – Módulo Externo (SGIPex): de uso da Justiça Eleitoral e dos partidos políticos – Permite aos representantes das agremiações partidárias enviar à Justiça Eleitoral, pela Internet, os dados de constituição e alterações dos órgãos de direção partidários, em qualquer âmbito, bem como fazer o credenciamento e descredenciamento de delegados (nacionais e estaduais) perante a Justiça Eleitoral.

Após criar o sistema, foram também criados nomes de usuário e senhas pelo TSE para cada representante do partido. Em seguida foram eles capacitados para que pudessem operá-lo.

Providenciada a parte administrativa de uso e concessão de acesso ao sistema, o controle da composição dos partidos passou a ser realizado de forma totalmente eletrônica. Para melhor compreensão, basta entender que todas as informações do Diretório Nacional, Regional, Municipal e das Comissões Provisórias passou a ser controlado pelo SGIP, e o funcionamento é simples.

Os partidos, respeitado o âmbito a que pertencem e, de posse de sua senha, alimentam o sistema com as informações partidárias. Informações do Presidente, Vice-presidente, Tesoureiro, vogais e demais membros que compõem o órgão partidário são digitadas no módulo SGIPex, incluindo o início e o fim da vigência daquela comissão e de seus respectivos representantes, muito embora, infelizmente, o sistema permita que Comissão Provisória seja anotada com um fim de vigência indeterminado.

Após cadastrada, a informação deve ser oficializada. Para isso, o responsável partidário que alimentou o sistema, precisará imprimir um recibo das alterações. Esse recibo é autenticado pelo sistema com um código de segurança e deve ser assinado pelo Presidente do Partido ou da comissão naquela circunscrição.

Após a impressão e assinatura do recibo com as alterações da composição partidária, tal documento deve ser encaminhado ao Tribunal Regional Eleitoral. Embora a resolução 23.093/2009 insista na necessidade de se enviar tal recibo para o Juiz Eleitoral da Zona correspondente, na prática, ele também pode ser enviado diretamente ao Tribunal.

O Tribunal, ao receber tal documento, oficializa o ato por meio de protocolo. Em seguida, o recibo contendo as informações é enviado ao Presidente do Tribunal que, verificando a legitimidade do pedido, sem realizar qualquer juízo de valor, em respeito à autonomia partidária, manda oficializar as modificações requeridas. A partir deste momento, as alterações passam a ser oficiais e podem ser requeridas por meio de certidão eletrônica no módulo WEB do SGIP.

O funcionamento do sistema é primoroso. A não ser por um pequeno lapso. Devido à ampla liberdade que têm para controlar suas questões internas, fruto das garantias oferecidas pelo art. 17 da Constituição Federal, podem, os partidos políticos, alterar como bem entenderem essas informações partidárias. A Justiça Eleitoral não faz qualquer verificação da veracidade de tais informações. Apenas confere a autenticidade. Ou seja, apenas verifica se as alterações foram realizadas por quem tinha permissão. Se a alteração é legal, ou não, pouco importa.

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Cito a questão da legalidade, pois, por ser excessivamente ampla a liberdade de os partidos manutenirem suas informações, vez por outra, ocorrem excessos.

Tomemos como exemplo o notório caso de um partido em João Pessoa. O partido X.

O presidente do partido comunicou aos seus filiados que no dia 30 de junho de 2012 ocorreria a convenção para escolha de candidatos decisão sobre a possibilidade de coligações. Tudo transcorria com naturalidade. A convenção ocorreu, os correligionários votaram e decidiram que o partido X deveria se coligar com o partido Y, oferecendo o candidato ao cargo de Vice-prefeito da coligação.

A efêmera normalidade se esvaiu, pois, determinada ala do partido, ao tomar conhecimento das intenções de o partido X coligar-se ao partido Y, tramou uma jogada de mestre. Acessaram o sistema SGIPEX no dia 29 de junho, às 21 horas e, em seguida inativaram o presidente, vice-presidente e tesoureiro da Comissão Provisória à frente da convenção. Feito isso, no dia seguinte, tratou de realizar, também, uma convenção para estabelecer coligação com o partido W.

Cumpridas as exigências legais de escolha de pré-candidatos por meio de convenção, apresentaram, no dia 5 de julho, o requerimento de registro das candidaturas, também chamado de DRAP - Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários.

A ala 1 do partido X coligara-se com o partido Y. A ala 2 do partido X, coligara-se com o partido W.

Munidos de documentos e certidões, estabelecia-se, naquele momento, o conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida, carinhosamente chamada de lide.  

A ala 1 do partido X juntara certidões, comprovando que, no dia da convenção, o presidente da Comissão Provisória e, portanto, responsável pela convenção, era o Sr. João. Provou tudo por meio de certidões tiradas do módulo Web do SGIP.

A ala 2 do partido X fez o mesmo. Provou, juntando certidões do SGIP, que no dia da Convenção o presidente do partido era o Sr. Zé.

A essas alturas, juízes, promotores, advogados e demais servidores da justiça eleitoral não compreendiam mais a quem favorecia a razão. “Como pode a Justiça Eleitoral oferecer certidões contraditórias?”, perguntou a promotora.

- Impossível... Encaminhe cópia dos autos à Polícia Federal. Há alguma fraude - posicionou-se o juiz.

O fato é que o Sistema de Gerenciamento de Informações partidárias permite, inclusive, que sejam feitas alterações retroativas quanto ao prazo de vigência do mandato do presidente das comissões e demais membros. Portanto, ambas as certidões eram válidas e verdadeiras.

Se ambas eram verdadeiras, qual ala do partido teria razão?

Simples! Basta verificar o que diz o art. 2º da Res. TSE .23.373/2011, in verbis:

Art. 2º  Poderá participar das eleições o partido político que, até 7 de outubro de 2011, tenha registrado seu estatuto no Tribunal Superior Eleitoral e tenha, até a data da convenção, órgão de direção constituído no Município, DEVIDAMENTE ANOTADO no Tribunal Regional Eleitoral competente (Lei nº 9.504/97, art. 4º, e Lei nº 9.096/95, art. 10, parágrafo único, II).

Basta lembrar que, ainda que o partido tenha ampla liberdade de realizar as alterações no sistema, elas precisam ser validadas pela Justiça Eleitoral. Ao validar as alterações, o Presidente do Tribunal determina que elas sejam oficializadas, propagando seus efeitos a partir do exato momento em que foram protocolizadas junto ao Tribunal.

Para a solução do caso, bastou verificar que a única Comissão Provisória validamente anotada junto ao Tribunal, no momento da realização da convenção, era aquela cujo o Sr. João era presidente. A Convenção realizada pela Ala 2 do partido, era ilegítima, pois, embora houvesse sido modificada, só seria anotada 2 dias após a convenção, a partir de quando expediria certidões informando o conflito de datas e de presidentes.

Explicado o funcionamento do sistema, concluiu singelamente o relator:

“Voto pelo desprovimento do recurso para validar a coligação entre o partido X e Y, tudo como diz a lei, em harmonia com o parecer Ministerial.

É como voto, senhor Presidente,

Publique-se,

Registre-se,

Intimem-se.”

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Sobre o autor
Alexandre Basílio

Servidor Público Federal. Assessor da Procuradoria Regional Eleitoral da Paraíba. Professor do Curso de Formação de Oficiais da Policia Militar Paraíbana.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BASÍLIO, Alexandre. Autonomia partidária, comissões provisórias e as convenções para escolhas dos pré-candidatos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3348, 31 ago. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22531. Acesso em: 27 nov. 2024.

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