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Princípios do Processo Penal

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01/11/2001 às 01:00
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7. Conclusão

Se alguma utilidade tem este rápido panorama, é a de revelar a importância do estudo dos princípios constitucionais e dos princípios gerais do processo penal. Sem o exame e o conhecimento dessas diretrizes e postulados, não pode a Justiça Criminal funcionar a contento, nem estarão os juldadores, os membros do Ministério Público e os defensores habilitados a promover o bom direito.

Os princípios não se esgotam no rol analisado. Outros existem como o da fundamentação, o do acesso universal à Justiça, o da duração razoável do processo, o direito à ação civil indenizatória contra o Estado, inclusive por erro judicial — neste caso na forma do art. 5º, inciso LXXV, da Constituição Federal e dos arts. 9º, §5º e 14, §6º, do Pacto de Nova Iorque —; o direito à informação processual, consoante o art. 5º, LXII, LXIII e LXIV, da Constituição Federal e o art. 7º, §4º, do Pacto de São José da Costa Rica, entre outros.

Um direito constitucional processual está assinalado na Carta Republicana de 1988. Nela, além dos princípios estritamente processuais, há outros, igualmente importantes, que devem servir de orientação ao jurista e ao aplicador do Direito. Afinal, este não é somente a norma positiva. Certamente, como alguém já disse, mais grave do que ofender uma norma é violar um princípio, pois aquela é o corpo material, ao passo que este é o espírito, que o anima.

"A letra mata; o espírito vivifica".


NOTAS

1.O Código de Processo Penal, introduzido pelo Decreto-lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941, completará meio século de sanção em outubro de 2001 e cinqüenta anos de vigência em 1º de janeiro de 2002.

2.Segundo Aurélio Buarque de Holanda, a palavra reação, de onde deriva o adjetivo reacionário, significa a "oposição conservadora que tende a impedir qualquer inovação no campo das atividades humanas" ou o "sistema político extremamente conservador, contrário às idéias que envolvem importantes transformações político-sociais".

3.Em alguns países dessa ordem é crime ter acesso à Internet, expressar opinião, ou, para a mulher, sair às ruas com maquiagem ou com o rosto descoberto. A Folha de São Paulo, edição de 19 de julho de 2001, noticia que no Egito é crime ser homossexual (página A-12): "Justiça do Egito julga 52 homens por comportamento homossexual". A justiça egípcia imputa aos acusados citados na reportagem o delito de "imoralidade sexual", estando sujeitos "a até cinco anos de prisão".

4.Como se pode entender como harmônica uma sociedade, como a norte-americana, que tem dois milhões de pessoas encarceradas?! Tal número, ao contrário de demonstrar a eficiência do sistema penal dos EUA ou a atuação incansável da Justiça criminal naquele país, serve para provar a falência de um modelo comunitário e o fracasso do próprio Estado em integrar os seus cidadãos.

5.Vide, a propósito, o artigo do promotor de Justiça de São Paulo, Ricardo Antonio Andreucci, sob o título "O direito penal máximo", na edição 35, ano IV, da Revista da APMP, pp. 48/49.

6.Costumo dizer que nenhum delinqüente consulta o "cardápio penal" antes de cometer crimes. A gravidade da pena, o agravamento das já existentes ou a tipificação de novas condutas têm escasso valor intimidativo. Em regra, quem quer cometer um crime, comete-o. Mesmo quando há previsão de sanção capital ou de penas cruéis, como a amputação de membros, como se dá em regimes islâmicos. E, ainda assim, por lá, como aqui, a criminalidade subsiste e prolifera.

7.Na forma do art. 10, §3º, do Pacto de Nova Iorque, "O regime penitenciário consistirá num tratamento cujo objetivo principal seja a reforma e a reabilitação moral dos prisioneiros".

8.Quiçá um dia, nos séculos do porvir, isso seja possível.

9.A expressão é deplorável porque sugere que há categorias "especiais" de cidadãos: os "incomuns".

10.A Declaração Francesa de 1789 especifica (art. 5º) que "A lei não proíbe senão as ações nocivas à sociedade".

11."Nenhuma pena passará da pessoa do condenado" (art. 5º, XLV, CF).

12.Mirabete (Processo penal, pp. 122/123) ensina que esse princípio, que "consiste no fato de ser a ação penal limitada à pessoa ou às pessoas responsáveis pela infração, não atingindo desse modo, seus familiares ou estranhos", não é acatado nas legislações que prevêem a reparação civil ex delicto.

13.Pelo art. 14, §3º, ´d´, do Pacto de Nova Iorque, toda pessoa acusada de um delito tem direito de ser julgada "sem dilações indevidas", garantia esta que efetivamente determina a limitação do prazo da prisão preventiva. O mesmo direito decorre do art. 8º, §5º, do Pacto de São José.

14.Convenção Americana sobre Direitos Humanos, assinada na capital costa-riquenha em 22 de novembro de 1969 e introduzida na legislação brasileira pelo Decreto n. 678, de 6 de novembro de 1992.

15.Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, assinado em Nova Iorque em 16 de dezembro de 1966 e introduzido no Brasil pelo Decreto n. 592, de 6 de julho de 1992.

16.Pacto de São José da Costa Rica.

17.A tortura já foi ela mesmo um procedimento processual, destinado a arrancar confissões de acusados ou informações de testemunhas. Chegaram a existir manuais de tortura, especialmente na época da Inquisição, em que eram ensinadas aos inquisidores as regras necessárias para o procedimento, no processo, sem levar o torturado à morte.

18.Conforme o art. 10, §2º, do Pacto de Nova Iorque sobre Direitos Civis e Políticos.

19.É inviável a tipificação criminal de condutas por meio de medidas provisórias. Questiona-se se o Estado também estaria proibido de veicular regras processuais por meio de medidas provisórias.

20.Fenômeno dessa ordem se deu quando da alteração do art. 366 do Código de Processo Penal pela Lei n. 9.271/96, que determinou que nos processos em que se desse citação editalícia e o réu não comparecesse ou não constituísse advogado, ficariam suspensos o curso da ação (instituto processual) e o curso do prazo prescricional (instituto penal).

21.Consta da Declaração da ONU, de 1948, que "Toda pessoa tem direito, em plena igualdade, a uma justa e pública audiência por parte de um tribunal independente e imparcial, para decidir de seus direitos e deveres ou do fundamento de qualquer acusação criminal que lhe seja feita" (art. X). Dessa regra decorre a obrigatoriedade da fundamentação da pretensão punitiva estatal veiculada em denúncia do Ministério Público.

22.A garantia da publicidade está também no art. 14, §1º, do Pacto de Nova Iorque.

23.Due process of law.

24.Princípio da publicidade, que também está no art. X da mesma Declaração.

25.Direito à ampla defesa.

26.DUDH – Declaração Universal dos Direitos Humanos, da Organização das Nações Unidas.

27.Embora seja um direito do acusado não confessar, é interessante notar que na linguagem usual e nas abordagens da imprensa a expressão "réu confesso" tem uma carga semântica bastante negativa. É como se o objetivo fosse dizer: esse sujeito cometeu um crime e ainda confessa... Ocorre que na realidade da prática forense o réu confesso tem pena menor do que aquele que não confessa.

28.As dez primeiras emendas à Constituição norte-americana têm o nome de Bill of Rigths e foram aprovadas em 15 de dezembro de 1791.

29.Somente a confissão legítima e cabal pode descrever, próximo da absoluta realidade e na sua quase inteireza, os elementos objetivos do crime e o quadro subjetivo que motivou o agente.

30.Art. 1º, inciso I, alínea ´a´: "Constitui crime de tortura constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa".

31.Direito a um julgamento célere.

32.Direito a um julgamento público.

33.Direito a julgamento por um júri imparcial.

34.Regra lex loci, com definição de competência pelo lugar da infração.

35.Princípios da legalidade e anterioridade.

36.Direito à informação processual, pressuposto do direito à ampla defesa.

37.Proteção contra acusações temerárias ou infundadas e o correspondente direito a acusação fundamentada em causa legal.

38.Direito ao contraditório e à inquirição das testemunhas da acusação.

39.Direito de arrolar testemunhas da defesa e fazê-las comparecer.

40.Direito à defesa técnica por advogado.

41.Como determina o art. 8º, §1º, do Pacto de São José da Costa Rica.

42.Artigo 9º, §2º, do Pacto de Nova Iorque: "Qualquer pessoa, ao ser presa, deverá ser informada das razões da prisão e notificada, sem demora, das acusações formuladas contra ela".

43.Art. 14, §3º, ´b´, do Pacto de Nova Iorque e art. 8º, §2º, ´c´, do Pacto de São José.

44.Vide o art. 8º, §2º, ´b´, do Pacto de São José.

45.São direitos de toda pessoa os de "ser assistido gratuitamente por tradutor ou intérprete, se não compreender ou não falar o idioma do juízo ou tribunal" (art. 8º, §2º, ´a´, do Pacto de São José) e de "ser informado, sem demora, numa língua que compreenda e de forma minuciosa, da natureza e dos motivos da acusação contra ela formulada" (art. 14, §3º, ´a´, do Pacto de Nova Iorque). Esta regra abrange o direito à acusação fundamentada ou a proibição de acusação temerária e tardia.

46.Vide o art. 14, §3º, ´f´, do Pacto de Nova Iorque.

47.Consta do art. 14, §3º, ´e´, do Pacto de Nova Iorque, e do art. 8º, §2º, ´f´, do Pacto de São José.

48.Art. 14, §3º, ´b´, segunda parte, do Pacto de Nova Iorque.

49.Conforme o art. 14, §1º, do Pacto de Nova Iorque.

50.Estaria aí um obstáculo ao interrogatório on line? Estar "virtualmente" presente equivale a estar presente?

51.Não são incomuns os pedidos do Ministério Público, no tribunal do júri, para dissolução do conselho de sentença, por falta de defesa, quando o advogado do réu utiliza apenas alguns minutos do tempo de defesa ou quando na prática não sustenta tese favorável ao acusado.

52.A regra consta também do art. 2º da Lei n. 8.906/94 — Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil.

53.A regra é repetida no art. 8º, §2º, alínea ´h´, do Pacto de São José da Costa Rica.

54.GOMES, Luiz Flávio; BIANCHINI, Alice. Crimes de responsabilidade fiscal: Lei 10.028/2000. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001

55."A confissão do acusado só é válida se feita sem coação de nenhuma natureza" (art. 8º, §3º, do Pacto de São José).

56.O inverso, todavia, é causa de nulidade. Não se pode substituir o rito ordinário pelo sumário, nem este pelo sumariíssimo.

57.Exemplo: ação penal por crime de lesões corporais contra marido que espanque sua esposa ou companheira. Se o casal voltar a conviver pacificamente, a ação penal promovida pelo Ministério Público será, sem dúvida, nociva à salubridade da relação conjugal. Então, o que fazer, diante dos princípios da obrigatoriedade e indispobinibilidade da ação penal?

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58.Para uma análise mais aprofundada, ver o nosso artigo "Suspensão condicional do processo: direito subjetivo do acusado?" em www.direitocriminal.com.br

59.Vide também o art. III da Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948: "Todo homem tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal" e o art. 9º, §1º, do Pacto de Nova Iorque.

60.A lei determina inabilitação por cinco anos, mas a Constituição Federal especifica que tal inabilitação deve-se dar pelo prazo de oito anos, o que de fato aconteceu com o ex-presidente Fernando Collor de Melo.

61.Dispositivo introduzido pela Lei n. 10.028/2000.

62.Op. cit., p. 25.

63.Como se vê, a indisponibilidade é relativa, pois só se dará quando o Ministério Público interpuser o recurso. Neste caso, não poderá dele desistir. Mas se não o interpuser, nada ocorrerá. Nesta hipótese, não estaria ocorrendo desistência da ação penal, ou, pelo menos, considerando o princípio ne reformation in pejus, não estaria havendo, com a não apresentação do recurso, desistência da continuidade da persecução criminal na instância superior?

64.O art. 8º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, dispõe que "A lei deve estabelecer penas estrita e evidentemente necessárias (...)". Já o art. 9º quanto aos acusados diz que "todo rigor desnecessário à guarda da sua pessoa deverá ser severamente reprimido pela lei".

65.A serem estabelecidas em lei.

66.Vide o art. 9, §3º, do Pacto de Nova Iorque: "Qualquer pessoa presa ou encarcerada em virtude de infração penal deverá ser conduzida, sem demora, à presença do juiz ou de outra autoridade habilitada por lei a exercer funções judiciais e terá o direito de ser julgada em prazo razoável ou de ser posta em liberdade". Desse direito internacional da pessoa humana deriva a proibição da prisão preventiva como sucedâneo da sentença condenatória (condenação antecipada). A partir do mesmo artigo também se pode defender a proibição do interrogatório on line, já que a acusado tem direito a avistar-se pessoalmente com o juiz ou o direito de ser levado à sua presença.


Bibliografia

ARAS, Vladimir. Suspensão condicional do processo: direito subjetivo público do acusado?, www.direitocriminal.com.br, 1998.

CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. São Paulo: Saraiva, 5ª ed., 2000.

CHOUKE, Fauzi Hassan. Garantias constitucionais na investigação criminal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1995.

GOMES, Luiz Flávio; BIANCHINI, Alice. Crimes de responsabilidade fiscal: Lei n. 10028/2000. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001.

MIRABETE, Júlio Fabbrini. Processo penal. São Paulo: Atlas, 10ª ed., 2000.

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Sobre o autor
Vladimir Aras

Professor Assistente de Processo Penal da UFBA. Mestre em Direito Público (UFPE). Professor da Escola Superior do Ministério Público da União (ESMPU). Procurador da República na Bahia (MPF). Membro Fundador do Instituto Baiano de Direito Processual Penal (IBADPP).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ARAS, Vladimir. Princípios do Processo Penal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 6, n. 52, 1 nov. 2001. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2416. Acesso em: 19 mar. 2024.

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