I - CRIMES PRATICADOS POR FUNCIONÁRIOS PÚBLICOS CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
Preliminarmente, é preciso compreender-se o significado da expressão administração pública. Administração é vocábulo equivoco e abrange não só o Poder Executivo como também a complexa máquina estatal, o aparelho, através do qual o Estado pode realizar seus fins, ou, como define Cretella Júnior, é a atividade desenvolvida pelo Estado, através de atos excutórios concretos, para a consecução direta, ininterrupta e imediata dos interesses públicos.
As funções do Estado se harmonizam, não estão separados por fossos intransponíveis, esotéricos, como genialmente descreve Montesquieu, porque a função administrativa é exercida não só pelo Poder Executivo, na sua atividade própria, mas também pelos Poderes Legislativo e Judiciário. Trata-se na verdade de vasos comunicantes. O Estado realiza suas atividades, através de pessoas físicas.
Segundo Antonio Pagliaro e Paulo José da Costa, a expressão administração pública, no direito penal, tem significado diverso e não necessariamente coincidente com o do direito constitucional e do direito administrativo.
No direito penal, o conceito de administração é bastante amplo, de modo a abranger toda a atividade funcional do Estado, inclusive a de governo.
O Código Penal, no artigo 327, conceitua funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública, inclusive em entidade paraestatal. Observe-se que a pena é aumentada da terça parte, se os autores dos crimes previstos neste capítulo Código Penal forem detentores de cargo em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgãos da administração direta, em sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação instituída pelo poder público.
O Capítulo I trata dos crimes praticados por funcionário público contra a Administração em geral.
O artigo 312 do Código Penal cataloga o peculato, como sendo o crime de apropriação por parte do funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, publico ou privado de que tenha a posse em razão do cargo, ou desviá-lo em proveito próprio ou alheio. Comete também o crime o funcionário público, conquanto não tendo a posse, subtrai-o ou concorre para que seja subtraído próprio ou alheio, valendo-se da facilidade que lhe proporciona o cargo.
Não se trata de crime de apropriação indébita, dada a diferença estrutural que existe entre um e outro crime, graças à qualidade do sujeito ativo, do título da posse que deve estar relacionado com o cargo ou serviço e a pluralidade de condutas, nesse tipo penal.
O sujeito ativo será sempre o funcionário público. Esta qualidade comunica-se aos co-autores, daí por que os demais autores poderão ser não funcionários públicos.
A apropriação ou o desvio, ou seja, dispor da coisa alheia como se sua fosse ou dar à coisa destinação diversa daquela em razão do que lhe foi entregue ou confiada.
A jurisprudência tem enfrentado situações interessantes, caracterizando como peculato a apropriação de objetos destinados a presos, praticado por carcereiro, em razão do cargo. Também o desvio de bem público, por longo tempo em proveito próprio, porque não há de falar em furo de uso.
O peculato culposo, não previsto pelo direito europeu, exceto o direito espanhol, constitui-se na modalidade não intencional. O anteprojeto transforma esse dispositivo em facilitação culposa, ao propor que pratica esse crime o funcionário que facilitar culposamente a prática de qualquer dos crimes previstos no caput do artigo.
O artigo 313 prevê o crime de apropriação de dinheiro ou qualquer utilidade, praticado por quem, no exercício do cargo, recebeu por erro de outrem. Na verdade, trata-se, segundo alguns autores, de verdadeiro peculato – estelionato O dolo é posterior, pois o crime não se consuma no momento do recebimento, quando dele se apropria, dispondo da coisa que se dele fosse. A tentativa é perfeitamente possível, como por exemplo, o agente do correio é pilhado, no momento em que está violando o envelope, recebido para efetuar o registro.
Assim, se o réu embolsa quantia recebida de particulares por erro destes, não em razão, mas apenas no exercício do cargo, comete, segundo orientação da jurisprudência, o crime previsto no artigo 313. Assim, também comete este delito o escrivão de Cartório de Notas, ao receber dinheiro para pagamento da sisa, na lavratura da escritura, e apropria-se do numerário, deixando de praticar referidos atos.
No artigo 314, o crime concretiza-se pelo extravio de livro oficial ou qualquer documento, de que o funcionário tem a guarda, sonegação ou inutilização, total ou parcial, se o fato não constituir crime mais grave. Trata-se assim de crime subsidiário ou suplementar.
Chefe de turmas julgadoras de delegacia tributária que ordena a um funcionário que consuma com as folhas do julgamento com voto em sentido contrário ao de suas pretensões, comete esse crime, segundo noticia a jurisprudência.
No artigo 315, há que se considerar um fato delituoso que não era considerado pelo direito anterior, ou seja, dar às verbas ou rendas públicas aplicação diversa da estabelecida em lei.
O criminalista Paulo José da Costa entende que, sendo comum essa conduta, na administração pública, poucos são os que pretendem que este delito subsista, visto que não existe para o Estado qualquer dano patrimonial. O funcionário deverá ter ao seu dispor fundos públicos, sendo sujeito passivo a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e as autarquias.
Entretanto, a Constituição veda expressamente a transposição, o remanejamento ou a transferência de recursos de uma categoria de programação para outra ou de um órgão para outro, sem prévia autorização legal(artigo 167, VI). Não se trata, pois, de conduta inexpressiva.
A orientação pretoriana tem destacado que o administrador público municipal (obviamente se aplica a qualquer administrador público) se deve ater às destinações das verbas previstas na lei orçamentária, devidamente tituladas e eodificadas, visto que a objetividade jurídica do delito de aplicação indevida de verbas não é só boa versação do patrimônio público, bem como o acatamento aos plano administrativos a que se devem jungir os governantes. Todavia, já ficou decido que a norma do artigo 315 do Código não pune irregularidades administrativas, mas o comportamento do administrador que desvia numerário de meta especificada em lei, requisito que não se materializa nos casos em que o orçamento da pessoa jurídica de direito público não é aprovado por lei, mas por decreto do Executivo.
Pelo artigo 316, a concussão materializa-se, quando o funcionário exige para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagens indevidas. É um dos crimes mais graves contra a Administração Pública. É, na lição da doutrina, a violência praticada contra os súditos, para satisfação de interesse particular, ou uma forma de extorsão praticada por funcionário público, de sorte que alguns países o configuram como extorsão agravada. Assemelha-se à concussão, entretanto naquele há bilateralidade na conduta. Exige o funcionário, impondo, solicitando com autoridade, em razão da função que desempenha ou vier a desempenhar.
Destarte, já decidiu o Poder Judiciário que comete o crime que lesa o serviço público federal quem, contratado pela Previdência Social, para prestar atendimento hospitalar ou labotarial, exige dos segurados pagamento adicional. O responsável pelo convênio incide no crime de concussão se exigir dos segurados pagamento adicional pelos serviços a que se obrigou. Este crime é formal e concretiza-se com a simples exigência, independentemente de qualquer resultado, sendo irrelevante se recebeu ou não qualquer pagamento.
Já o parágrafo único trata do excesso de exação, que se corporifica, quando o funcionário exige imposto, taxa ou emolumento que sabe indevido, ou quando devido, emprega na cobrança meio vexatório ou gravoso, que a lei não autoriza. Esse crime é agravado, se o funcionário desvia em proveito próprio.
A jurisprudência tem assinalado que a legislação penal não prevê a cobrança excessiva de custas judiciais como fato penalmente punível.
A corrupção passiva materializa-se, segundo dispõe o artigo 317, ao solicitar o funcionário público ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem.
O crime é agravado, se houver retardamento ou omissão na prática de qualquer ato de ofício ou se o pratica com infração de dever funcional. Não obstante, também pratica o crime o funcionário que deixar de praticar ou retardar ato de ofício, com infração do dever funcional, cedendo a pedido ou influência de outrem.
A jurisprudência tem-se pronunciado, no sentido de que se excluem da incriminação pequenas doações ocasionais, recebidas por funcionários, em razão de suas funções. Em tais casos, confirma o Poder Judiciário, não há de sua parte consciência de aceitar retribuição por um ato funcional, que é elementar do dolo no delito, nem haveria vontade de corromper.
Distinguem-se ainda os crimes de facilitação de contrabando ou descaminho, previsto no artigo 318, a prevaricação, no artigo 319. Este crime perfaz-se com o retardamento ou a omissão indevida, na prática de ato ou ofício, ou fazê-lo, contra disposição de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal.
Já a condescendência criminosa também é uma forma de prevaricação, menos grave, e consiste no fato de deixar o funcionário de responsabilizar subordinado que cometeu infração no exercício do cargo ou, quando lhe falece competência, não levar o fato à autoridade competente.
O abandono de função, a advocacia administrativa, a violência arbitrária, a violação de sigilo funcional, e o exercício funcional ilegalmente antecipado ou prolongado também constituem crimes contra a Administração.
Não se olvide a violação de proposta de concorrência, prevista atualmente pela Lei 8666, de 1993, que, no artigo 94, assim conceitua este crime: devassar o sigilo de proposta apresentada em procedimento licitatório ou proporcionar a terceiro o ensejo de devassá-lo.
O ilustre Professor Vicente Grecco, ao comentar os crimes previstos na Lei de Licitações e Contratos Administrativos, deplora com muita razão o descalabro do legislador, com relação à técnica legislativa, que deixa muito a desejar.
Realmente, a conceituação é defeituosa, cheia de lacunas e imprecisa, o que leva, na prática, a tornar-se mais um lei que nasce morta.
II - A IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
A Lei 8429, de 2 de junho de 1992, e a legislação complementar, têm em vista a defesa do patrimônio público e dos direitos constitucionais do administrado.
Qualquer agente público poderá vir ser o sujeito ativo.
A fonte direta encontra sua sede, na Constituição Federal, sobressaindo-se os artigos 15, inciso V, e 37, § 4º.
A Lei Maior (art. 85, V) define os crimes de responsabilidade do Presidente da República e considera delito o ato daquela autoridade que atentar contra a probidade na administração.
O tema é de tal relevância, que o constituinte veda a cassação de direitos políticos, mas autoriza a perda ou a suspensão de direitos políticos, no caso de improbidade administrativa, nos termos do § 4º do citado artigo 37.
A administração pública direta, indireta de qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, eficiência, moralidade, publicidade e todos os demais previstos na Constituição, advertindo o § 4º que os atos de improbidade administrativa importarão na suspensão dos direitos políticos, perda da função pública, indisponibilidade dos bens e o ressarcimento do erário público, sem prejuízo da ação penal cabível.
A determinação da Carta Maior não deixa margem a qualquer dúvida, quanto à sua aplicação, ficando as autoridades competentes munidas de imenso instrumental jurídico.
A improbidade não é coisa nova nem de nossos tempos, visto que esta existe, desde que o homem povoa a Terra. Não obstante, a sociedade sempre procurou amenizar essa mácula, combinando instrumentos legais, na área administrativa e na área penal, nem sempre com o êxito desejado.
A doutrina tem pinçado falhas, na Lei 8429, como apregoa Marcelo Figueiredo; entretanto, não há lei perfeita, como produto de cultura que é, devendo o operador do direito aplicá-lo, da melhor forma, desbastando-o com o cinzel da sabedoria. Para Toshio Mukai, esta lei é totalmente inconstitucional.
O artigo 1º demonstra, à saciedade, a elasticidade desse diploma legal, de sorte que qualquer ato de improbidade praticado por agente público, servidor ou não, contra a administração direta, indireta ou fundacional de qualquer das esferas de poder, inclusive dos Territórios, está sujeita à sua incidência.
Improbidade é desonestidade e relaciona-se com a conduta do administrador e pode ser praticada não apenas pelo agente público, lato sensu, senão também por quem não é servidor e infringe a moralidade pública..
A Constituição não mais se refere à administração fundacional, mercê da Emenda 19, de 1998. Isto porque a fundação está compreendida na Administração indireta e despicienda é sua menção. E a administração pública é bastante ampla, compreendendo, para os efeitos desta lei, também a empresa incorporada ao patrimônio público e a entidade, para cuja criação ou custeio o Tesouro haja concorrido ou concorra com mais de 50% do patrimônio ou da receita anual.
O artigo 2º fornece o conceito de agente, sendo todo aquele que, exercendo, mesmo que transitoriamente, ou sem remuneração, por eleição, contratação, designação ou qualquer outra forma de vínculo, mandato, cargo ou função nas empresas indicadas no artigo 1º. Enfim, sua abrangência é a mais ampla possível e compreende todas as esferas de poder. Mas também o é todo aquele que, não sendo agente, concorra ou induza para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie, sob qualquer forma direta ou indireta.
A lei é precisa e determina, em cumprimento aos cânones constitucionais, o zelo pelos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade. Contudo, essa relação não é exaustiva.
A probidade administrativa abarca o princípio da moralidade e ocorre, quando se praticam atos que ensejam enriquecimento ilícito, causam prejuízo ao erário ou atentam contra os princípios da administração, definidos no artigo 37, § 4°, da CF, entre os quais está incluída a moralidade, ao lado da legalidade, da impessoalidade e da publicidade, além de outros que, mesmo não apontados, explicitamente, no referido preceito, acham-se distribuídos por toda a Constituição. E, também, aplicam-se à condução dos negócios públicos.
O ato de imoralidade, na opinião da melhor doutrina, afronta a honestidade, a boa fé, o respeito à igualdade, as normas de conduta aceitas pelos administrados, o dever de lealdade, a dignidade humana e outros postulados éticos e morais.
Já a improbidade traduz a má qualidade de uma administração, pela prática de atos que implicam em enriquecimento ilícito do agente ou em prejuízo ao erário ou, ainda, em violação aos princípios que orientam a administração pública.
Vale dizer todo ato contrário à moralidade administrativa é ato que corresponde à improbidade, mas nem todo ato de improbidade administrativa compreende a violação da moralidade administrativa.
E, mais, desde que se comprove a ocorrência da lesão ao patrimônio público, por ação ou omissão dolosa ou culposa do agente ou do terceiro, dar-se-á o total ressarcimento do dano. Nada escapa.
O agente ou terceiro beneficiário dos bens ou de valores acrescidos ao patrimônio, que deu origem ao enriquecimento ilícito, ficará sujeito à perda desses bens.
Sem embargo da grita geral contra a lei, esta com precisão matemática fornece o conceito de improbidade administrativa, qual seja auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades já mencionadas, elencando a lei mis doze incisos, o que demonstra o cuidado do legislador.
Esse diploma legal também traz o entendimento do ato que causa lesão ao erário, distinguindo daqueles que atentam contra os princípios da Administração Pública.
A Lei 8429/92 refere três espécies de atos ímprobos na administração:
a) atos que importam em enriquecimento ilícito.
b) atos que produzem prejuízo ao erário.
c) atos que atentam contra os princípios da administração pública.
A primeira espécie de atos de improbidade administrativa compreende os seguintes:
I) auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função ou emprego, ou atividades nas entidades mencionadas no art. 1º desta Lei;
II) receber, para si ou para outrem, dinheiro, bem móvel ou imóvel, ou qualquer outra vantagem econômica, direta ou indireta, a título de comissão, percentagem, gratificação ou presente de quem tenha interesse, direto ou indireto, que possa ser atingido ou amparado por ação ou omissão decorrente das atribuições do agente público;
III) perceber vantagem econômica, direta ou indireta, para facilitar a aquisição, permuta ou locação de bem móvel ou imóvel, ou a contratação de serviços pelas entidades referidas no art. 1º por preço superior ao valor de mercado;
IV) utilizar, em obra ou serviço particular, veículo, máquinas, equipamentos ou material de qualquer natureza, de propriedade ou à disposição de qualquer das entidades mencionadas no art. 1º desta Lei, bem como o trabalho de servidores públicos, empregados ou terceiros contratados por essas entidades;
V) receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indireta, para tolerar a exploração ou a prática de jogos de azar, de lenocínio, de narcotráfico, de contrabando, de usura ou de qualquer atividade ilícita, ou aceitar promessas de tal vantagem;
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VI) receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indireta, para fazer declaração falsa sobre medição ou avaliação em obras públicas ou qualquer outro serviço, ou sobre quantidade, peso, medida, qualidade ou característica de mercadorias ou bens fornecidos a qualquer das entidades mencionadas no art. 1º desta Lei;
VII) adquirir, para si ou para outrem, no exercício de mandato, cargo, emprego ou função pública, bens de qualquer natureza cujo valor seja desproporcional à evolução do patrimônio ou à renda do agente público;
VIII) aceitar emprego, comissão ou exercer atividade de consultoria ou assessoramento para pessoa física ou jurídica que tenha interesse suscetível de ser atingido ou amparado por ação ou omissão decorrente das atribuições do agente público, durante a atividade.
IX) perceber vantagem econômica para intermediar a liberação ou aplicação de verba pública de qualquer natureza.
X) receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indiretamente, para omitir ato de ofício, providência ou declaração a que esteja obrigado.
Xl) incorporar, por qualquer forma, ao seu patrimônio, bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1 desta Lei.
XII) usar, em proveito próprio, bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º desta Lei.
A segunda espécie de atos de improbidade é a das que causam prejuízo ao erário, v.g.:
1) facilitar ou concorrer por qualquer forma para a incorporação ao patrimônio particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, rendas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º desta Lei.
2) permitir ou concorrer para que pessoa física ou jurídica privada utilize bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º desta Lei.
3) doar a pessoa física ou jurídica, bem como ao ente despersonalizado, ainda que de fins educativos ou assistenciais, bens, rendas, verbas ou valores do patrimônio de qualquer das entidades mencionadas no art. 1º desta Lei, sem observância das formalidades legais e regulamentares aplicáveis à espécie.
4) permitir ou facilitar a alienação, permuta ou locação de bens integrantes do patrimônio de qualquer das entidades referidas no art. 1º desta Lei, ou ainda a prestação de serviços por parte delas, por preço inferior ao de mercado.
5) permitir ou facilitar a aquisição, permuta ou locação de bem ou serviço por preço superior ao de mercado.
6) realizar operação financeira sem observância das normas legais e regulamentares ou aceitar garantias insuficientes ou inidôneas.
7) conceder benefício administrativo ou fiscal sem a observância das formalidades legais ou regulamentares aplicáveis à espécie.
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8) frustrar a licitude do processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente.
9) ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento.
10) agir negligentemente na arrecadação de tributo ou renda, bem como no que diz respeito à conservação do patrimônio público.
11) liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular.
12) permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente.
13) permitir que se utilize, em obra ou serviço particular, veículos, máquinas, equipamentos ou material de qualquer natureza, de propriedade ou à disposição de qualquer das entidades mencionadas no art. 1º desta Lei, bem como o trabalho de servidor público, empregados ou terceiros contratados por essas entidades.
E a última espécie de atos de improbidade administrativa refere-se aos que atentam contra os princípios da administração pública, violando os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições, destacando-se os que seguem:
a) praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência.
b) retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício.
c) revelar fato ou circunstância de que tem ciência em razão das atribuições e que deve permanecer em segredo.
d) negar publicidade aos atos oficiais.
e) frustrar a licitude de concurso público.
f) deixar de prestar contas quando obrigado a fazê-lo.
g) revelar ou permitir que chegue ao conhecimento de terceiro, antes da respectiva divulgação oficial, teor de medida política ou econômica capaz de afetar o preço da mercadoria, bem ou serviço.
A lei não 8.429/92 não define crimes. Os atos tipificados nos arts. 9°, 10 e 11 não constituem crimes no âmbito da referida lei. Muitas dos comportamentos ali descritos são de natureza criminal, definidos, em outras leis, como por exemplo, o Código Penal, o Decreto-lei 201, a Lei n° 8.666/93 etc.
A sanção cominada na lei sob estudo é de natureza política ou civil, independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na legislação própria.
Os atos de improbidade administrativa que importam em enriquecimento ilícito estão sujeitos às seguintes cominações:
perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio;
ressarcimento integral do dano, quando houver;
perda da função pública;
suspensão dos direitos políticos de oito a dez anos;
pagamento de multa civil de até três vezes o valor do acréscimo patrimonial;
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proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos.
Na ocorrência da prática de atos de improbidade que causem prejuízo ao erário, as sanções são:
ressarcimento integral do dano, se houver;
perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se concorrer esta circunstância;
perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de cinco a oito anos;
pagamento de multa civil de até duas vezes o valor do dano;
proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditício, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos.
Por fim, a prática de atos de improbidade, que atentam contra a moralidade e demais princípios da administração, acarreta como sanção o (a):
ressarcimento integral do dano;
perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos;
pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente;
proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefício ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos.
Como tenho afirmado, as penas previstas neste diploma legal são muito graves e não excluem as sanções penais, civis e administrativas.
Toshio Mukai novamente vê nesta lei inconstitucionalidade, na acumulação das penas, quais sejam a suspensão dos direitos políticos e a perda da função pública.
O procedimento administrativo e o processo judicial estão regulados no capítulo V.
A lei confere a qualquer um o direito de representar à autoridade competente, para a instauração de investigação com o objetivo de apurar a prática de ato de improbidade. A representação deverá ser escrita ou reduzida a tremo, formal. Se não preencher os pressupostos da lei, será rejeitada, mas isso não impede a atuação do Ministério Público.
Se houver indícios de enriquecimento ilícito, a comissão deverá representar ao Ministério Público ou à Procuradoria do órgão, para que requeira a decretação do seqüestro dos bens do agente ou do terceiro que haja enriquecido ilicitamente ou causado dano ao patrimônio público.
Um dispositivo de alta relevância é o que diz respeito à proibição de transação, acordo ou conciliação, nas ações previstas na lei, ou seja, na ação ordinária principal que será proposta pelo Ministério Público ou pela pessoa jurídica interessada, nos trinta dias da efetivação da cautelar.
Um dispositivo de alta significação diz respeito à catalogação como crime a representação por ato de improbidade contra terceiro ou agente público, quando o autor da denúncia o sabe inocente.
O procedimento administrativo e o processo judicial devem ser sucessivos objetivando a apuração de atos de improbidade e a aplicação das sanções contra os respectivos agentes.
O procedimento administrativo servirá de base para o processo judicial visando à aplicação das sanções, como a perda do cargo e suspensão dos direitos políticos, de competência privativa do Poder Judiciário.
A Lei 8.429/92 permite a qualquer pessoa representar à autoridade administrativa competente para que seja instaurada investigação destinada a apurar a prática de ato de improbidade. A comissão designada para apurar a prática do ato de improbidade dará conhecimento de sua instauração ao Ministério Público e ao Tribunal de Contas, que poderão designar representantes para acompanharem o referido procedimento administrativo .
A comissão poderá solicitar ao Ministério Público ou à Procuradoria do órgão o seqüestro dos bens do agente ou de terceiro enriquecido ilicitamente ou que haja causado dano ao erário.
Os processos de prestação de contas dos agentes públicos, de competência do Tribunal de Contas, alicerçarão os procedimentos administrativos a que se refere a lei 8.429/92. Compete a esses Tribunais a apreciação da legalidade das despesas; verificar a ocorrência de prejuízos aos erários, a violação à moralidade administrativa; o desvio de recursos, em favor dos agentes ou de terceiros; a realização de aquisições ou alienações viciosas de bens; o favorecimento de terceiros em detrimento do patrimônio público; a omissão ou negligência do agente público; as infrações aos princípios da legalidade, da legitimidade, da economicidade; enfim, encetar a investigação que, ao final, se revele capaz de certificar a probidade ou improbidade do agente público. notadamente examinando a evolução de seu patrimônio, de acordo com a competência outorgada pela Lei nº 8.730/93. Citem-se ainda as investigações feitas no âmbito dos Tribunais de Contas acompanhadas pelo Ministério Público que atua junto àquelas Cortes(arts. 73, § 2°, I e 130), de conformidade ainda com a Lei 8.429/92.
Eis que a Lei 8.429/92 apresenta-se como valioso e preciso instrumento para assegurar-se a probidade administrativa, resguardando-se, assim, a incolumidade do patrimônio público e o respeito aos princípios da sã administração, com o ressarcimento do erário, a punição dos culpados e seu afastamento temporário das lides político - partidárias.
Com relação à prescrição, há que se acrescentar que o prazo para ajuizamento das ações sancionatórias é regulada pela Lei 8.429/92, de sorte que as citadas ações podem ser propostas até cinco anos após o término do exercício de mandato, cargo em comissão ou função de confiança.
Na hipótese do exercício de cargo efetivo ou emprego, devem as ações ser propostas dentro do prazo prescricional previsto na lei específica para faltas disciplinares puníveis com demissão a bem do serviço público.
O Supremo Tribunal Federal, em acórdão relatado pelo Ministro Célio Borja, decidiu que a existência nos autos de decisões do Tribunal de Contas do Estado, que opinaram pela rejeição das contas, versando sobra irregularidades que caracterizam malversação de dinheiro público e improbidade, ainda não submetidos à apreciação do Judiciário, permite manter a decisão que declarou a inexigibilidade.
Já o Superior Tribunal de Justiça, pela palavra do Ministro Pedro Accioli, decretou que, demonstrada a improbidade administrativa do ordenador de despesa, pelo Tribunal de Contas, é aplicável o § 5º do artigo 15 da Carta Maior, reconhecendo-se a inelegibilidade do candidato.
O Tribunal de Justiça de São Paulo reconheceu que a Lei 8429 não exige que a improbidade administrativa advenha de sentença transitada em julgado para o Ministério Público propor a ação ordinária de perda de ação.
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