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Evolução histórica do instituto da nacionalidade

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05/01/2005 às 00:00
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"É um truísmo afirmar que o homem é um animal social. Com efeito, tem sido esta a sua situação em todos os tempos, a de viver em sociedade. Quer nos parecer que nunca será possível identificar uma razão específica para a formação da sociedade. Ela se confunde com o próprio evoluir do homem, perdendo-se portanto, mas origens da própria espécie humana. [1]"


I-Introdução

Independentemente do local ou qualquer outro fator, todo relacionamento social encontra seus fundamentos nas razões de afinidade entre as pessoas. Um grupo de amigos, uma sociedade de bairro, uma associação de classe, sempre acaba se unindo pelos interesses que têm em comum e pelos objetivos que almejam, e sobre todos paira o maior instinto da raça humana: a preservação.

Na formação de um Estado o processo não é muito diverso; normalmente a sua aparição resulta da união de um povo reunido em um território delimitado, sob o governo de um representante a quem é delegada a função de comandá-lo, administra-lo e atender aos interesses reivindicados.

"Não surpreende, naturalmente, a variedade histórica das formas por que o Estado aparece, em correlação com as causas locais do acontecimento [2]".

Celso Bastos observa que dos elementos que compõem o Estado, o que aparentemente mais tem caracterizada a sua condição integradora é o território, no entanto observa ser muito mais fácil compreender o território como mera condição de existência. Ao contrário, afirma o autor: "seria dizer, na situação atual das coisas, o homem é um ser preso a terra, e, para que uma determinada ordem jurídica possa ser exclusiva num determinado espaço, ela tem necessariamente de dispor de uma parcela do globo terrestre" nessa linha de raciocínio prossegue em seguida observando que eliminar o território seria eliminar o próprio Estado, o que não é verdade [3].

Aliás, em geral, sempre foi possível visualizar graficamente a identidade de um Estado: bastava um mapa e uma bandeira do território soberano. As leis, os costumes e tradições, o povo, tudo era representado por estes símbolos.

Já com relação ao povo, a regra não é a mesma, pois de fato todo Estado é a organização soberana de um povo. Eliminar um povo e substituí-lo por outro seria o mesmo que destruir um Estado e constituir um outro.

Durante o processo de ocupação do planeta, as comunidades que habitavam um território acabaram criando fortes laços de afeição com a terra e com os ascendentes que há tempos lá viviam. Essas ligações levaram a doutrina a identificar a figura da nação e o fenômeno do patriotismo. Conseqüentemente, destas relações surge a figura do povo, conjunto de pessoas que mantém um vínculo político com um determinado Estado.

"No plano da antropologia histórica, revelam-se processos mais importantes, a conquista, a migração, a aglutinação por laços de sangue ou por laços econômicos, a evolução social pura e simples para organizações cada vez mais complexas" [4].

Nesse diapasão, do conceito de povo decorreu o instituto da nacionalidade.


II-) Estado, nação, pátria e país, povo e população.

Apesar de abarcar características de patriotismo, o conceito de povo não se confunde com o conceito de nação, que envolve pessoas unidas por sentimentos históricos e culturais, com passado, presente e futuro, a preservação das tradições.

Assim leciona Sampaio Dória, "Em seu conceito mais geral, povo é sinônimo de nação, e só não se confunde porque o povo se fragmenta e a nação é indivisível" [5]Para o autor, nação é primeiro o conjunto de homens que derivam de uma origem comum, com a mesma raça, a mesma língua, certa fé predominante, as mesmas tradições, o mesmo destino histórico, não importando suportar o jugo de governo estrangeiro durante certa época, podendo até mesmo ser partilhado as vezes.

Há grande dificuldade em distinguir povo de nação, uma vez que o Estado Moderno de tipo europeu emergiu na história como Estado Nacional, tendo sido a nação o instituto a lhe conferir unidade e coesão [6].

A nação é a base para um Estado sólido. Essa clássica afirmação levou a doutrina a confeccionar um dos conceitos de Estado como nação politicamente organizada. "Os Estados formados pela força, pela sujeição de nações diferentes, cedo ou tarde se esfacelam ou desaparecem" [7]

Tudo isso demonstra que a estruturação do Estado se deu com base nos valores das nações, tanto assim que, ao se organizarem, vários Estados oficializaram em suas Constituições elementos pertencentes à nação.

No princípio a raça, a crença, bem como a língua, eram utilizadas para identificar um Estado, sendo que até hoje, alguns Estados adotam uma religião oficial. No Brasil, à época do Império, a religião oficial era a católica.

Diversos Estados não consideravam determinadas raças como integrantes pelo fato de possuírem tradições e costumes diversos. "Durante longos séculos, o estrangeiro foi considerado como o inimigo e não raro se lhe recusava qualquer direito" [8].

O Estado Democrático de Direito, dotado de liberdade de crença e de pensamento, e igualdade de raças, veio separar oficialmente a figura do Estado da figura da nação.

Na Constituição brasileira o único resquício aparente de um elemento ligado à nação é a adoção do português como idioma oficial da República Federativa do Brasil (artigo 13 caput), no entanto, em momento algum se proíbe a utilização de outra língua no país, respeitando-se assim a forma de expressão, o que leva a crer que se trata de um dispositivo neutro.

Nação, por sua vez distingue-se de pátria: "terra dos pais [9]" que expressa sentimento cívico, um amor a terra natal. Entre nação e pátria existe coincidência no essencial, todavia, a nação é um conceito cultural acompanhado de vivências dominantes afetivas; a pátria pertence toda ela ao domínio da afetividade. [10]

Na Constituição brasileira o termo pátria pode ser encontrado a título de exemplo no artigo 142 que se refere as forças armadas como instituição de defesa da pátria, entretanto, o próprio título ao qual pertence o dispositivo é denominado "Da Defesa do Estado e das Instituições Democráticas".

Acredita-se que o constituinte tenha se utilizado do termo pátria como uma maneira de impulso, de incentivo ao integrante das forças armadas que estaria defendendo a terra que ama, a terra de seus pais.

Ainda no que diz respeito à pátria, se crê que os símbolos, mencionados no parágrafo 1º do artigo 13 da Constituição Federal, a bandeira, o hino, as armas e o selo nacionais foi uma forma que o constituinte encontrou de positivar o significado desse instituto.

Entretanto, cabe ressalvar que o termo lá utilizado (República Federativa do Brasil) é a denominação do Estado, sendo a pátria, o Brasil.

Por sua vez, o termo população também se relaciona com o tema nacionalidade, outrossim, diverge do conceito de nação e de povo, por abranger todas as pessoas que definitivamente habitam um determinado território, sejam elas nacionais ou estrangeiras. "Do conceito de povo distingue-se claramente o de população. O Povo corresponde a um conceito jurídico e político, a população a um conceito demográfico e econômico. O primeiro é uma unidade de ordem, a segunda a simples soma de uma multiplicidade de homens atomisticamente considerados." [11] No mesmo sentido leciona Livio Paladin [12][13].


III-) Nacionalidade: Origem, espécies e características

Conforme já colocado, o instituto da nacionalidade originou-se do conceito de povo, cabendo lembrar que ambos se resumem a grupos de pessoas unidas por afinidade, visando sobretudo preservar-se.

Para Manoel Gonçalves Ferreira Filho a nacionalidade compreende o status do indivíduo em face do Estado, podendo ele ser nacional ou estrangeiro. [14]

"O nacional é o sujeito natural do estado. O conjunto de nacionais é que constitui o povo sem o qual não pode haver Estado. De acordo com o direito internacional público o nacional está preso ao Estado por um vínculo que o acompanha em suas deslocações no espaço, inclusive no território de outros Estados."

Sob o seu aspecto jurídico a nacionalidade designa o laço que une o indivíduo a um Estado determinado. A teoria da nacionalidade é, portanto, aquela que tem por objeto indicar o Estado de que depende cada um. [15]

É possível citar as famílias, as tribos e as ordens como as raízes do instituto da nacionalidade, sempre traçando objetivos comuns, unidos por um vínculo, esses grupos procuraram não se misturar uns com os outros visando a perpetuação. As famílias e os grupos étnicos valorizavam mais a hereditariedade, os integrantes de um tronco comum correspondiam aos sentido dos nacionais, enquanto os demais seriam os estrangeiros.

O movimento dos nômades e expansão dos povos ocasionou o choque de raças e grupos de diversas origens, que por um motivo ou outro se encontraram e fixaram-se em um território anteriormente desocupado, o que possibilitou a todos estabelecerem um vínculo com a nova terra, que passa a ser visto como o único ponto em comum entre todos.

Há três sistemas para a determinação da nacionalidade. Sendo ela estabelecida pela atribuição aos pais e avós (ius sanguinis) ou pelo lugar de nascimento da pessoa (ius soli), ou por um sistema eclético, sem preferência absoluta a nenhum dos anteriores.

O primeiro sistema é o mais antigo e foi adotado pelos gregos e romanos. Esses estados assim como a raça ariana, viam no Estado um prolongamento e um agrupamento das famílias. Entre os gregos a família era o fundamento da fratria, ao passo que constituía a base da tribo. A Cidade Estado ou Polis grega consistia num aglomerado de tribos. Todos que tinham sangue de Atenas ou Esparta eram considerados atenienses e espartanos, dominadores, raças conquistadoras, senhoras do mundo.

O mesmo ocorreu durante o a Roma Antiga, filho de romano, romano era, independentemente do local de nascimento.

Durante a idade média, o surgimento dos feudos, fez com que as pessoas que ali nascessem adquirissem automaticamente a nacionalidade do local. Na idade moderna o ius sanguinis recupera prestígio uma vez que os novos Estados que surgiram constituíram-se com base em nações que se formavam fruto da unificação de pequenos reinos, especialmente por influências do jusnaturalismo.

Assim sendo, em um primeiro momento, o vínculo estabelecido entre os indivíduos e o grupo ao qual pertenceriam se dava apenas com o nascimento, com base em dois critérios: o do sangue (ius sanguinis) e o do solo (ius soli). O primeiro condicionando a nacionalidade do indivíduo a de seus genitores, o segundo ao território onde se deu o nascimento.

Inicialmente a vontade do indivíduo era irrelevante para que se estabelecesse a sua nacionalidade. Ele pertenceria ao mesmo grupo de seus pais, ou ao grupo que habitava o local onde nasceu.

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Apesar de até hoje o Estado ditar as normas sobre nacionalidade, a expansão do mundo obrigou determinadas comunidades flexibilizarem suas regras conforme melhor lhes conviesse.

Tal afirmação pode ser comprovada principalmente pelo fato da maioria dos países de emigração terem adotado o critério do ius sanguinis como regra para estabelecer quem seriam os seus nacionais.

Afinal, muitos de lá partiram rumo a um novo país em busca de vida nova, e o Estado de origem, no intuito de preservá-los como seus, assim como aos descendentes, traçou regra no sentido de que todos os filhos de seus nacionais seriam também nacionais, independente de terem nascidos ou não em seu território.

Ao contrário, os Estados de imigração, para onde se dirigiram aqueles que buscavam melhores condições de vida, firmaram critério diverso. Na intenção de acolher e estabelecer vínculo sólido e definitivo com indivíduos que colaboravam com o seu crescimento, esses Estados, fruto das antigas colônia, estabeleceram o ius solis como critério para regulamentar a nacionalidade dos seus. Todos aqueles que nascessem em seu território seriam considerados nacionais, independentemente de sua origen.

Esse fato ensejou a possibilidade de muitos poderem se apresentar como polipádridas, e deu origem ao sistema eclético da nacionalidade, no qual os critérios do ius soli e do ius sanguinis convivem harmonicamente.

Grande parte dos Estados que se organizaram ou reorganizaram entre o fim século XVIII e início do século XX adotaram esse sistema. Os descendentes de um imigrante italiano que se radicou no Brasil são exemplos disso, embora nascidos no Brasil são italianos perante a legislação do país de seu ancestral que adota o ius sanguinis, e brasileiros pois aqui se adota o ius solis. [16]

Aqueles que não estabelecem nenhum vínculo com nenhum Estado passaram a ser considerados apátridas ou heimatlos.

Definida a formação de grupos nacionais oriundos do critério "ius sanguinis", bem como o estabelecimento quase que definitivo do mapa terrestre, viu-se praticamente esgotada a possibilidade de surgirem novos grupos. O movimento de expansão dos povos foi substituído pelo de circulação, o que levou ao surgimento de uma nova modalidade de nacionalidade, diversa daquela adquirida com o nascimento.

Trata-se da nacionalidade secundária ou adquirida que passa a levar em conta a vontade do indivíduo (estrangeiro ou apátrida) perante o Estado com o qual deseja estabelecer um vínculo, podendo este acolhe-lo ou rejeitá-lo.

Expressa-se de duas maneiras: pode ser tácita quando a não manifestação do indivíduo implicar em naturalização [17]; ou expressa quando a manifestação de vontade do indivíduo é determinante para o início do processo de naturalização. Nesse caso é necessário que ele se manifeste abertamente afirmando seu interesse em manter ou não vínculo com determinado Estado que teoricamente pode aceitá-lo.

Fala-se também no critério do ius labor, que vincula a nacionalidade ao trabalho, ou mais especificamente ao Estado a quem o indivíduo presta trabalho. Apesar de lógico, esse fator não ser resume a um critério originário e independente como o ius soli e o ius sanguinis.. Originariamente era discriminatório, pois obrigava a aquisição de uma nacionalidade ou implicava na perda de outra.

A Constituição Imperial de 1824, por exemplo, previa em seu artigo 7º que perderia os direitos de cidadão o brasileiro que sem licença do Imperador aceitasse emprego, ou pensão, de qualquer Governo Estrangeiro. Atualmente, analisando-se alguns dispositivos, percebe-se que a Carta de 1988 ainda considera o trabalho um critério. Os nascidos no exterior filhos de pais brasileiros que estiverem a serviço do país, por exemplo, poderão ser considerados brasileiros. No entanto, outro dispositivo do mesmo diploma, garante a nacionalidade brasileira ao cidadão que por motivo de trabalho foi obrigado a adquirir a nacionalidade de outro país.


IV-) O perfil da nacionalidade na atualidade. Integração do estrangeiro e humanização. Influências econômicas e preservação cultural.

Conforme exposto, nota-se que ao longo do tempo o instituto da nacionalidade sofreu influências dos fenômenos da preservação das origens e da proteção do território conquistado.

Atualmente, com a aceleração do fenômeno da internacionalização, o instituto veio sofrer novas mutações.

Dois fatores se destacam como os principais a exercerem essa influência: a valorização do indivíduo independentemente de sua origem, e o preenchimento das necessidades do mercado de trabalho mundial aliado à exploração da economia global.

Não é de hoje que a economia colabora com a mudança das regras da nacionalização e integração do estrangeiro. Analisando-se bem, não foi à toa que a Constituição de 1891 trouxe no seu bojo a regra da nacionalização tácita, afinal o Brasil necessitava de um povo que se estabelecesse definitivamente a fim de desenvolver economicamente um país que acabara de ser formado.

Durante muito tempo, o isolamento geográfico e o fechamento das fronteiras foram valorizados. Recebia tratamento privilegiado aquele que possuísse vínculo com o Estado onde vivia. O povo e o país se desenvolviam sem grandes influências dos demais Estados, por isso cada país tratava os nacionais e estrangeiros da forma que melhor julgava adequada.

No entanto, com a revolução tecnológica e o desenvolvimento econômico, vários países tiveram seus mercados de trabalho alterados repentinamente, ou com excesso, ou com falta de mão de obra, o que ensejou um aumento na movimentação de pessoas que procuravam adequar-se aos espaços e a funções que surgiam.

Paralelamente, a valorização do individuo como ser humano, independente de suas origens, fez com que os países flexibilizassem suas regras quanto à nacionalidade aproximando cada vez mais o nacional do estrangeiro.

"A identidade da natureza humana acabou por ser reconhecida e, mercê do estoicismo e do cristianismo especialmente, aos estrangeiros se foram reconhecendo direitos a ponto de se equipararem eles aos próprios nacionais, salvo participação no governo" [18].

No Brasil, a adoção da dignidade da pessoa humana como princípio fundamental solidificou a idéia que naturalmente não deve haver distinção entre nacional ou estrangeiro. Os objetivos firmados pelo constituinte no artigo 3º da Constituição reforçam a tese. Ao afirmar que deseja construir uma sociedade livre, justa e solidária e promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação, revela ele, a sua intenção de tratar a nacionalidade apenas como um fenômeno jurídico que implica na relação entre indivíduo e Estado.

A Constituição brasileira prevê expressamente no caput do artigo 5 º: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes

Em que pese a expressão "residentes no país", são destinatários os brasileiros e estrangeiros residentes no país e de passagem em razão da afirmação "Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza"

Outrossim, apesar de ressalvar a expressão "nos termos seguintes" as desigualdades estabelecidas dizem respeito apenas a função de comando e controle do Estado, jamais se referindo a diferenças que violem a condição de pessoa humana.

Ademais, mesmo no que tange a estas diferenças, houve muita aproximação entre os nacionais e os estrangeiros, bem como entre os natos e os naturalizados, o que pode ser notado com uma breve comparação entre a atual Constituição brasileira e as anteriores. A Carta atual reservou como privativos de brasileiros natos uma quantidade bem menor de cargos que as anteriores.

Os princípios que regem as relações internacionais do Brasil com outros países, dispostos no artigo 4º da Constituição Federal de 1988, também apontam no sentido de uma maior união entre os povos. O inciso II estabelece a prevalência dos direitos humanos como uma dessas regras, e o inciso IX a cooperação entre os povos para o progresso da humanidade como outra. Outrossim, o parágrafo único do mesmo dispositivo reza que a República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações, entretanto o disposto no inciso III deixa claro que tal integração deverá ser natural uma vez que a autodeterminação dos povos é também taxada como princípio inerente as relações internacionais.

A Emenda Constitucional nº 11, de 30/04/96 que possibilitou às universidades públicas e às instituições de pesquisa científica e tecnológica admitirem professores, técnicos e cientistas estrangeiros, na forma da lei, pode ser citada como um exemplo dessa flexibilização em virtude de um mercado deficitário à época.

Já a Emenda 36 de 28/05/2002 que permitiu aos estrangeiros a participação em empresas de telecomunicação antes reservadas aos brasileiros natos pode ser citada como exemplo de influência da exploração do mercado mundial no instituto da nacionalidade. O mesmo ocorreu com a Emenda Constitucional 42 de 19/12/2003 que possibilitou aos estrangeiros atuarem no mercado de previdência privada, inclusive na gestão do sistema.

Destaca-se no momento um novo modelo de nacionalidade que parece surgir como conseqüência da formação dos blocos econômicos: a supra nacionalidade.

No entanto é curioso observar que quando da formação do Estado Federativo norte americano, processo semelhante ocorreu. A Constituição americana de 1797 não aludia expressamente o problema da cidadania e foi somente através da décima quarta emenda de 1866 que se adotou a aquisição da nacionalidade pelo nascimento ou pela naturalização. Esta mesma emenda, admitiu a dupla cidadania a da União e a do Estado Membro em que residisse o cidadão. Essa dupla cidadania também foi aceita pela Suíça, na Constituição de 1874 e pela Alemanha em 1929 na Carta de Weimar [19].

A Constituição européia trás no seu bojo a figura da supra nacionalidade. O individuo além de possuir a nacionalidade do seu país de origem será também considerado europeu. Parece tratar-se de um artifício que tem por finalidade aproximar povos de diferentes origens, muitas vezes grandes inimigos no passado.

É necessário aguardar a reação do povo europeu para saber se o instituto irá ou não se consolidar, e a partir daí, afirmar, se a integração econômica é suficientemente forte para ocasionar a fusão de diversas culturas centenárias.

Não obstante as influências dos fenômenos da humanização e da integração e exploração econômica, diversas culturas, no instinto de preservar suas tradições, parecem resistir à fusão de nações por motivos não racionais, valorizando mais o sentimento ligado a origem comum.

Observando as regras da Constituição brasileira que dispõem sobre a aquisição da nacionalidade secundária, nota-se uma exigência menor aos países de língua portuguesa: apenas residência por um ano ininterrupto e idoneidade moral. Pelo mesmo motivo o parágrafo 1º do artigo 12 confere aos portugueses com residência permanente no País, se houver reciprocidade em favor de brasileiros, a atribuição dos direitos inerentes ao brasileiro, salvo os casos previstos na Constituição.

Tais dispositivos consistem na valorização de um critério ligado às tradições, utilizado pelo constituinte ao positivar as regras que tratam da nacionalidade.

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Sobre o autor
Caio Marco Berardo

assistente Jurídico e mediador Judicial do TJ/SP, professor de Direito Constitucional do Curso FMB, especialista em Direito Publico pela ESMP/SP

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BERARDO, Caio Marco. Evolução histórica do instituto da nacionalidade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 547, 5 jan. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6152. Acesso em: 28 mar. 2024.

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