É entendimento sumulado no Supremo Tribunal Federal (597) que "Não cabem embargos infringentes de acórdão que, em mandado de segurança, decidiu, por maioria de votos, a apelação." E no Superior Tribunal de Justiça (169) que "São inadmissíveis embargos infringentes no processo de mandado de segurança."
Com esse entendimento, é muito difícil conseguir argumentar algo em sentido contrário pois são estes Tribunais que decidem em última instância matérias constitucionais e causas relativas a Lei Federal, respectivamente. E, apesar de não existir súmula vinculante, tanto é mais fácil para os Magistrados quanto para os demais juristas, seguirem tal posicionamento deixando de analisar seu fundamento.
Cumpre a nós, operadores do direito, tentar mudar o posicionamento, não só dos Juízes singulares e Tribunais de Justiça, mais também o entendimento sumulado nas últimas Cortes.
Não restam dúvidas de que o Mandado de Segurança possui Legislação Especial na qual traça o seu procedimento mas, se interpretarmos a Lei conforme a finalidade social a que se destina, chegaremos a conclusão de que as normas de Processo Civil servem para desobstruirem a quantidade de recursos existentes nos Tribunais, muitos deles protelatórios. Assim, sempre que possível, devemos utilizar o Código de Processo Civil nos procedimentos em que existam legislação específica, com o objetivo de combater a morosidade processual. Pensar de outra forma é admitir que a Lei não serviu ao fim proposto.
De mais a mais, não há no Código de Processo Civil nem na legislação específica do Mandado de Segurança preceito vedando o cabimento de Embargos Infringentes contra aresto não unânime prolatado em julgamento de apelação interposta em processo de segurança.
Assim, entendo que é possível a utilização do CPC nos procedimentos regidos por leis especiais e, com o mesmo pensar, o doutrinador José Horácio Cintra Gonçalves Pereira, em sua obra (Aspectos Polêmicos e Atuais do Mandado de Segurança, Editora Revista dos Tribunais, 2002, XVIII-Mandado de Segurança: Recursos. Embargos Infringentes, págs. 453/454) assim leciona, in verbis:
São embargáveis os acórdãos proferidos nos julgamentos das apelações ou ações rescisórias, quando não haja unanimidade na votação.
Pois bem, prevalecendo, como regra, a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil aos procedimentos regidos por leis especiais, é fora de dúvidas o cabimento desses embargos contra acórdãos proferidos em tais demandas, no julgamento não unânime da apelação, porquanto, a toda evidência, inexiste distinção entre apelação em mandado de segurança e outras ações.
Mas adiante, o mesmo autor, combate o entendimento dos Tribunais Superiores a respeito da inadmissibilidade dos Embargos Infringentes no Mandado de Segurança, afirmando que é necessário o esgotamento das vias ordinários, literris:
Aliás, esse entendimento dos Tribunais Superiores se contrapõe à necessidade de esgotamento das vias recursais ordinárias para cabimento dos recursos extraordinário e especial.
No mesmo sentido, Vicente Greco Filho, em seu livro (Direito Processual Civil Brasileiro, 2º Volume, Editora Saraiva,2000, p. 321/322), senão vejamos:
Em sentido oposto, a jurisprudência não considera possíveis os embargos infringentes em mandado de segurança, por falta de previsão na legislação específica. Não aceitamos, porém, tal posição porque o Código de Processo Civil se aplica subsidiariamente à legislação especial e não distingue entre apelação em mandado de segurança e outras ações. No sistema do Código anterior havia diferença porque no mandado de segurança não era cabível a apelação, mas sim o agravo de petição que não ensejava, em seguida, os embargos.
Em seguida, também afirma que é necessário o esgotamento das vias ordinárias:
Finalmente, é preciso consignar que, se houver voto divergente e no que for divergente, a interposição dos embargos é indispensável para que se possa, posteriormente, interpor o recurso extraordinário, que exige sejam esgotadas as vias recursais ordinárias.
Diferente não é o entendimento de Celso Agrícola Barbi, em sua obra (Do Mandado de Segurança, 8ª Edição, Editora Forense, 1998, p. 524.) quando argumenta que os Embargos Infringentes são compatíveis com o writ, senão veja-se:
Os embargos infringentes não são recurso com característica incompatíveis com o procedimento do mandado de segurança.
E, logo depois, conclui que o Código de Processo Civil deve aplicar-se ao procedimento especiail:
Pelo contrário, parece mais adequado entender que o sistema do Código, como geral que é, deve aplicar-se aos procedimentos regidos em leis especiais, salvo naquilo em que essas leis dispuserem em contrário ou em que as normas do código não se coadunam cm as peculiaridades do procedimento regido por aquelas leis.
Corroborando com esses doutrinadores, ARRUDA ALVIM (Análise, In Revista de Processo, vol. 3, p. 194) assim nos ensina:
Se o recurso que cabe, em mandado de segurança, é o de apelação, não há que se cogitar da natureza do tipo ou da finalidade do mandado de segurança, para não se usarem os embargos infringentes. Em sendo o recurso de apelação, e havendo um voto vencido, ipso facto, há admitir a utilização dos embargos infringentes, no âmbito e na medida daquele voto vencido, isto é, há de se aplicar, sem dúvida alguma, a lei que admite o recurso de embargos infringentes ao mandado de segurança."
Desde o Simpósio de Direito Processual Civil, realizado em Curitiba em outubro de 1975, chegou-se à seguinte conclusão: ‘XLIII: Cabem embargos infringentes do acórdão, não unânime, que julga apelação em processo de mandado de segurança’(RT 482/270).
O Professor NELSON NERY JUNIOR, em seu famoso (Código de Processo Civil Comentado, Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 919), também entende que os Tribunais Superiores devem revisar suas súmulas:
São cabíveis Embargos Infringentes em acórdão não unânime, proferido em apelação nos processos de mandado de segurança, desde que o acórdão seja de reforma da sentença sobre questões de fundo. Aplica-se o CPC subsidiariamente nas ações regidas por leis especiais, como é o caso da LF e da LMS. Este entendimento é absolutamente preponderante na doutrina, de modo que entendemos ser momento de os tribunais superiores revisarem sua súmulas restritivas dos EI em mandado de segurança."
BERNARDO PIMENTEL SOUZA, na sua obra (Introdução aos Recursos Cíveis e à Ação Rescisória, p. 335/336), ratifica tudo o que está sendo exposto:
Em síntese, são cabíveis embargos infringentes contra acórdão proferido por maioria de votos em julgamento de apelação em mandado de segurança.
Aliás, o próprio Superior Tribunal de Justiça entendia que a parte deveria, antes de interpor o Especial, opor Embargos Infringentes, no caso de Apelação em Mandado de Segurança:
PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. DECISÃO POR MAIORIA. RECURSO ESPECIAL. ESGOTAMENTO DE INSTANCIA. IMPOSSIBILIDADE. SUM. 281/STF.
- HAVENDO DECISÃO POR MAIORIA NO JULGAMENTO DE APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA, DEVERIA A PARTE, ANTES DE INTERPOR RECURSO ESPECIAL, ESGOTAR OS RECURSOS ORDINARIOS CABIVEIS NA INSTANCIA DE ORIGEM - "IN CASU", OS EMBARGOS INFRINGENTES. - APLICAÇÃO DA SUM. 281/STF.
- RECURSO NÃO CONHECIDO.
(STJ, REsp 131608, Rel. Min. Felix Fischer).Cumpre também esclarecer que após a reforma do Código de Processo Civil, no que pertine aos recursos, o Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal ainda não decidiram a respeito do tema, qual seja, a necessidade ou não da oposição dos Embargos Infringentes quando a decisão for não unânime em Apelação proveniente de Mandado de Segurança. Assim, essa é a hora desses Tribunais Superiores revisarem estas súmulas (STF 597 e STJ 169) e se adequarem ao posicionamento da doutrina predominante.
Assim, concluo que se aplica o Código de Processo Civil subsidiariamente a legislação especial do Mandado de Segurança, que os Embargos Infringentes são, totalmente, compatíveis com omandamus, que é necessário o esgotamento das vias ordinária na instância de origem para posteriormente ser possível interpor Recursos Especial e Extraordinário e que o STJ e o STF, após a reforma recursal, ainda não se pronunciaram a respeito desse assunto, devendo agora entrarem em sintonia com a doutrina brasileira..