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Considerações sobre os títulos executivos

28/05/2005 às 00:00
Leia nesta página:

1. Generalidades.

Para DINAMARCO, título executivo "é um ato ou fato jurídico indicado em lei como portador do efeito de tornar adequada a tutela executiva em relação ao preciso direito a que se refere" (in "Instituições de Direito Processual Civil", IV, 1ª. Edição, SP: Malheiros Editores, 2004, p. 191). Segundo CARNELUTTI, o título é o documento que o credor deve apresentar ao órgão judicial para obter a execução, semelhante ao "bilhete de passagem" que o viajante apresenta na "estação do trem". E realmente essa é a idéia do art. 583 do CPC: "Toda execução tem por base título executivo judicial ou extrajudicial". Portanto, sem título executivo não há execução (nulla executio sine titulo). Tanto é assim que a lei manda o exeqüente instruir a petição inicial executiva com o título executivo (art. 614, I, CPC). Poderia se dizer que o título executivo é a base do processo de execução. Diz-se que os títulos executivos têm eficácia porque traduzem a probabilidade da existência do crédito. Como explica DINAMARCO, "sem essa probabilidade, não seria prudente expor o patrimônio de uma pessoa aos rigores de uma execução forçada" (p. 193).

Títulos executivos são aqueles que estão previamente definidos em lei. Esse é o chamado princípio da tipicidade legal do título executivo. Significa que cabe exclusivamente ao legislador conferir o caráter de título executivo a determinados documentos ou fatos. Eles são numerus clausus. Não podem as partes convencionar a esse respeito através de cláusulas que conduzam à execução forçada. Essa regra encontra fundamento na gravidade dos atos executivos, onde praticamente não há espaço para o contraditório. Portanto, as partes não podem pretender conferir a qualidade de título executivo a outros atos que não os estabelecidos pela lei.

Os títulos executivos dividem-se em judiciais ou extrajudiciais. Trata-se de uma divisão entre atos estatais e afirmação feita pelo próprio devedor. Basicamente, não haverá diferença entre a execução por títulos judiciais ou extrajudiciais. A eficácia executiva é idêntica para todos os títulos. Entretanto, como alerta JOSÉ MIGUEL GARCIA MEDINA, "a conseqüência mais notória da distinção reside no grau de limitação das matérias suscetíveis de serem argüidas nos embargos, em se tratando de execução fundada em título judicial ou extrajudicial" (in "Execução Civil – teoria geral e aspectos fundamentais", 2ª. Edição, SP: Editora RT, 2004, p.220). As matérias suscetíveis de defesa do devedor na hipótese de execução baseada em título executivo judicial estão elencadas nos art. 741, ao passo que na execução baseada em título extrajudicial a amplitude é bem mais ampla, conforme estabelece o art. 745.

De outro lado, nota-se que a petição inicial da execução por título judicial pode ser bastante simplificada e se dispensa a exibição do título, porque tudo se faz nos mesmos autos e não há por que fazer tantas exigências. Nesse sentido dispõe o art. 614, I, nesses termos:

"Art. 614. Cumpre ao credor, ao requerer a execução, pedir a citação do devedor e instriuir a petição inicial:

I – com o título executivo, salvo se ela se fundar em sentença (art. 584);"

Indaga-se se o título executivo precisa ser exibido em seu instrumento original ou se a mera cópia seria o suficiente para promover a execução. A problemática ganha contornos maiores na execução por título extrajudicial, pois a execução promovida por cópia poderia sujeitar o devedor a mais de uma execução, já que esses títulos são facilmente transferidos por endosso. Entretanto, a regra aplicável é pela exigência da apresentação do documento original do título executivo, salvo em situações determinadas em que isso não seja possível e que a utilização de cópia não ofereça perigos ao executado. A jurisprudência cita casos assim, como a aceitação de fotocópia de cheque quando o documento original se acha apensado ao inquérito policial para apurar crime de estelionato, ou quando a nota promissória está retida no cartório de protestos, por exemplo.

Diz o artigo 586 que "a execução para cobrança de crédito fundar-se-á sempre em título líquido, certo e exigível". Portanto, estabelece alguns requisitos substanciais do título executivo. Como explica DINAMARCO, é preciso que "o título represente uma obrigação perfeitamente identificada em seus elementos (certeza) e suficientemente quantificada (liquidez)" (p. 208). Com relação à exigibilidade, já vimos que esta se relaciona diretamente com o inadimplemento da obrigação. A lei processual estabelece o procedimento de "liquidação de sentença" para resolver acerca da liquidez e certeza dos títulos executivos judiciais. Entretanto, a falta desses requisitos nos títulos extrajudiciais é mais grave, desqualificando-os da eficácia abstrata. Assim já se decidiu:

"Titulo executivo extrajudicial, previsto no artigo 585, II, do CPC

(...) Os requisitos da liquidez, certeza e exigibilidade devem estar ínsitos no título. A apuração de fatos, a atribuição de responsabilidade, a exegese de cláusulas contratuais tornam necessários o processo de conhecimento, e descaracterizam o documento como título executivo" (Resp 1080-RJ, RSTJ 8/371).

Entretanto, há situações em que a liquidez é suprida por documentos posteriores ou por meras declarações do obrigado. É o caso de contrato de seguro de vida ou de acidentes pessoais, p. ex., onde o valor a indenizar estará sujeito a perícia médica.


2. Títulos executivos judiciais (art. 584).

Títulos executivos judiciais são formados com a participação de órgão do Poder Judiciário, traduzindo-se em ato estatal. Entretanto, há que se observar que o CPC não andou bem na discriminação dos títulos executivos, não observando esse critério básico para distinguir entre as duas espécies de títulos executivos. Assim, temos a sentença arbitral no rol dos títulos judiciais, quando é sabido que ela é emanada do órgão de fora do Poder Judiciário. Por outro lado, temos como títulos extrajudiciais o crédito por custas, emolumentos e honorários assim considerados os que forem aprovados por decisão judicial. Mas, nesse último caso, como afirmou Alcides Mendonça Lima, "há mero controle e não provimento do juiz, condenando a parte a pagar". A despeito dessa problemática, alguns autores costumam falar em títulos mistos. Teori Albino ZAVASCKI, por exemplo, afirma que são títulos mistos "aqueles em que a norma jurídica individualizada tem seus elementos integrativos representados por documentação em parte de origem extrajudicial e em parte já com certificado judicial" (in "Comentários ao Código de Processo Civil", Volume 8, SP: Editora RT, 2000, p. 188). Entretanto, de acordo com a divisão do CPC, são títulos executivos judiciais os estampados no art. 584, in verbis:

"Art. 584. São títulos executivos judiciais:

I – a sentença condenatória proferida no processo civil;

De acordo com o art. 162, §1.º, do CPC, sentença é o provimento decisório pelo qual o juiz extingue o processo. Em uníssono, a doutrina afirma que a sentença condenatória proferida no processo civil é o título executivo por excelência (Nesse sentido: ZAVASCKI, ARAKEN DE ASSIS, JOSÉ MEDINA, WAMBIER, DINAMARCO, THEODORO JUNIOR, entre outros). Após todo o processo de conhecimento não há espaços para questionamentos acerca do mérito da causa e a norma jurídica a ser executada está completa. Entretanto, há hipóteses em que falte liquidez à sentença condenatória, razão pela será necessário prévio processo de liquidação de sentença. Note-se que apesar da lei não se referir, entende-se que as sentenças declaratórias e constitutivas também comportam eficácia condenatória e podem ser executadas, pois veiculam condenação do vencido ao pagamento das custas judiciais e dos honorários do advogado do vencedor. E, como observa WAMBIER, "relativamente a tais verbas de sucumbência, aquelas sentenças funcionam como título executivo" (in "Curso Avançado de Processo Civil", Volume 2, 7ª. Edição, SP: Editora RT, 2005, p. 54).

Importante observar que após a reforma do CPC, apenas as obrigações de pagamento de valor por quantia certa ainda são objeto da execução tradicional. Quando a obrigação for de fazer, não fazer ou de entrega de coisa, a sentença de procedência será executada num incidente do processo de conhecimento, ou seja, terá eficácia mandamental e executiva lato sensu nos moldes dos arts. 461 e 461-A. Nesses casos, portanto, não será considerada título executivo judicial.

II – a sentença penal condenatória transitada em julgado;

A sentença penal vale como título executivo em eventual indenização pelos danos causados pelo crime a ser buscada no juízo cível. Assim, não será necessário novo processo, bastando a liquidação do valor devido. A eficácia executiva da sentença penal condenatória se dá em favor da vítima e de seus herdeiros e em face do condenado e do seu espólio ou de seus herdeiros, se for o caso, não alcançando o terceiro que, embora possa ter responsabilidade pelos atos praticados pelo criminoso, não tem responsabilidade penal e, por isso mesmo, não foi parte na respectiva ação penal. Seria a situação do pai em relação aos danos causados pelo filho, do empregador pelo empregado, etc. Temos que contra este terceiro será necessário ajuizar ação de conhecimento nas vias ordinárias normais. Importante salientar também que nessa seara não existe espaço para execução provisória, uma vez que a sentença penal deve estar transitada em julgado. Por outro lado, não se impede o ajuizamento da demanda executória a revisibilidade pro reo a qualquer tempo da sentença criminal nos termos do art. 622 do CPP.

Com relação à comunicabilidade das instâncias penal e civil, cumpre esclarecer, em síntese, que a absolvição no crime, por ausência de culpa, não veda a ACTIO CIVILIS EX DELICTO. O que se obsta é que se debata no juízo cível, para efeito de responsabilidade civil, sobre a existência do fato e sua autoria, quando tais questões tiverem sido decididas no juízo criminal.

III – a sentença homologatória de conciliação ou de transação, ainda que verse sobre matéria não posta em juízo;

A intenção do legislador foi a de incentivar as formas amigáveis de composição dos litígios. A nova redação do dispositivo foi dada pela Lei 10.358, de 27/12/2001. Essas sentenças não contêm julgamento acerca do mérito da demanda, mas atribui eficácia aos atos negociais realizados pelas partes. É importante observar que essas sentenças homologatórias só terão eficácia executiva desde que resulte para uma das partes um dever de realizar uma prestação. Excluem-se àquelas que impliquem somente em renúncia ao direito. A reforma aumentou o alcance desse dispositivo ao afirmar que a transação homologada é título executivo ainda quando verse sobre pretensão não posta em juízo. Segundo DINAMARCO, essa alteração é positiva, pois "abre horizontes para uma amplitude maior dos resultados do processo" (p. 237). De acordo com o art. 57 da Lei 9.099/95, os acordos extrajudiciais de qualquer natureza ou valor, ainda que realizados fora de qualquer processo, são suscetíveis de serem homologados pelo juiz competente e possuem eficácia de títulos executivos judiciais.

IV – a sentença estrangeira, homologada pelo Supremo Tribunal Federal;

Desde que compatível com o ordenamento jurídico brasileiro e não atentando contra os bons costumes e a soberania nacional, a sentença estrangeira é passível de ser executada no Brasil. A homologação dessas sentenças era tarefa do STF de acordo com o previsto no art. 102, inc. I, letra h, até o advento da Emenda Constitucional 45/2004. Após a chamada "Reforma do Judiciário", essa tarefa ficou a cargo do STJ na nova redação conferida ao art. 105, inc. I, letra i, da Carta Magna. A competência para a execução das sentenças estrangeiras homologadas é dos juízes federais de primeiro grau (art. 109, X, CF).

V – o formal e a certidão de partilha;

Trata da transferência de bens em virtude de sucessão causa mortis. A partilha de bens, em inventário ou arrolamento, se homologa por sentença, daí a razão de estar entre os títulos executivos judiciais. É representada pelo formal ou certidão. De acordo com o parágrafo único do art. 584, a força executiva só tem eficácia em relação ao inventariante, aos herdeiros e aos sucessores a título universal ou singular. Portanto, se tais bens estiverem em poder de terceiro, toca ao herdeiro propor ação reivindicatória (processo de conhecimento).

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VI – a sentença arbitral".

A arbitragem foi instituída pela Lei 9.307/96 e consiste no procedimento em conflitos que versem sobre direitos disponíveis sejam resolvidos por terceiros particulares escolhidos de comum acordo pelos contratantes. Também de acordo com o art. 31 da Lei da Arbitragem, a sentença arbitral será título executivo quando contiver eficácia condenatória. Entretanto, o conteúdo da sentença arbitral é vulnerável à analise do Poder Judiciário sobre os aspectos da sua regularidade.

Outros dispositivos legais esparsos também podem criar títulos executivos judiciais. A doutrina cita como exemplo a decisão no procedimento monitório que concede o mandado de cumprimento caso não haja embargos ou se estes forem rejeitados. Além disso, DINAMARCO cita as sentenças proferidas no processo no qual tenha ocorrido a denunciação da lide quando acolherem a pretensão deduzida pela parte em face do litisdenunciado. Por fim, o Professor JOSÉ ANTONIO DE MACEDO MALTA acrescenta a decisão que concede "alimentos provisórios nas ações especiais de alimentos, as que homologam acordo de reparação de dano produzido por menor e a sentença proferida em cautelar de alimentos provisionais".


3. Títulos executivos extrajudiciais (art. 585).

O título extrajudicial prescinde de prévia ação condenatória. Conforme afirmou PONTES DE MIRANDA, ele "não tem antecedência, mas antecipa-se à sentença de cognição" (Comentários, v. 9/219). O eminente ARAKEN DE ASSIS nos remete à origem histórica dessa espécie de título executivo, ensinando que "foi apenas na Idade Média, em decorrência inevitável do florescimento das modernas relações mercantis, que a necessidade de oferecer determinadas categorias de créditos uma tutela rápida e mais fácil estimulou a equiparação dos títulos criados pelos particulares, na feição primitiva de instrumenta guarentigiata" (in "Manual do Processo de Execução", 5ª. Edição, SP: Editora RT, 1998, p. 128). Ficamos com o conceito de DINAMARCO, para quem títulos executivos extrajudiciais "são os atos da vida privada aos quais a lei processual agrega tal eficácia e assim também são as inscrições de dívida ativa" (p. 248). Note-se que o título extrajudicial prescinde de prévio processo de conhecimento. Em razão disso, o grau de eficácia desse tipo de título diminui consideravelmente na medida em que se amplia a matéria de defesa permitida ao devedor através de embargos (art. 745). O rol dos títulos executivos extrajudiciais está no art. 585 do CPC, conforme se vê a seguir:

"Art. 585. São títulos executivos extrajudiciais:

I – a letra de câmbio, a nota promissória, a duplicata, a debênture e o cheque;

Inicialmente, o primeiro inciso do art. 585 trata dos títulos cambiais ou de crédito. Os títulos de crédito são instrumentos criados para facilitar a circulação de riquezas. Como diz ARAKEN DE ASSIS, "larga é a casuística em torno dos pressupostos de exeqüibilidade, legitimidade passiva, competência, ônus da prova e profundidade da cognição nos embargos" (p.138). No que se refere às letras de câmbio e notas promissórias, vigora o estampado na Lei Uniforme de Genebra promulgada pelo Decreto 57.663, de 24/01/1966. Já o cheque é regido pela Lei 7.357, de 02/09/1985. A duplicata é regulada pela Lei 5.474/68. Na omissão da lei especial, aplicam-se as disposições gerais dos arts. 887 a 926 do Novo Código Civil (2002).

Os títulos cambiais são dotados de características próprias que os diferenciam dos demais títulos extrajudiciais. Entre essas características destacam-se a literalidade, o formalismo, a autonomia, a abstração e a circulação. Diz-se que os títulos de crédito são literais porque vale somente o que nele está escrito, não sendo lícito alegar circunstância não escrita. Além disso, uma conseqüência da literalidade é que somente o credor designado no título é que está legitimado a promover a execução e poderá fazê-lo apenas em face dos que se obrigaram no próprio título. A característica do formalismo dos títulos de crédito significa que no seu contexto devem constar os dados obrigatórios previstos em lei, como denominação, identificação das partes, época e lugar do pagamento, valor devido, etc. A autonomia é a desvinculação da causa do título em relação a todos os coobrigados. Já a abstração significa que o próprio título é desvinculado da causa da obrigação. Por isso é que se diz que os títulos de crédito bastam-se a si mesmos, não dependendo de qualquer outro documento para completá-los. Toda a teoria dos títulos de crédito foi constituída em função da circulação como modo de facilitar a realização de negócios.

Importante tratarmos de alguns conceitos iniciais antes de analisar as peculiaridades desses títulos executivos extrajudiciais. 1) Letra de câmbio: é uma ordem de pagamento em que alguém chamado sacador (credor) se dirige a outrem denominado sacado (devedor) para pagar a terceiro (beneficiário da ordem). Em outros termos, é a ordem dirigida ao devedor para que pague a dívida em favor de terceiro. 2) Nota promissória: é promessa de pagamento emitida pelo próprio devedor em favor do credor. 3) Cheque: é uma ordem de pagamento à vista em favor do credor emitido por uma pessoa (devedor) contra uma instituição bancária. O cheque e a nota promissória independem de protesto. O protesto será necessário apenas para tornar a promissória exigível frente a endossadores e respectivos avalistas. 4) Debênture: é título de crédito emitido por sociedade anônima a fim de obter empréstimos junto ao público, expandindo seu capital. Gozam de privilégio geral em caso de falência. Cada debênture é título executivo pelo valor que indica, dando oportunidade para a execução por quantia certa. 5) Duplicata: trata-se de título de crédito emitido em favor do vendedor ou prestador de serviço contra o adquirente da mercadoria ou do serviço. A duplicata é circulável via endosso. O endosso é uma forma de transmissão dos títulos de crédito. O proprietário do título faz o endosso lançando sua assinatura no verso do documento. A duplicata precisa ser aceita pelo sacado para ter força executiva. O aceite é o reconhecimento da validade da ordem, mediante a assinatura do sacado, que passa então a ser o aceitante. Se não for aceita, deve estar protestada e acompanhada do comprovante de entrega da mercadoria. O protesto é a apresentação pública do título ao devedor, para o aceite ou para o pagamento. A apresentação é o ato de submeter uma ordem de pagamento ao reconhecimento do sacado. Pode significar também o ato de exigir o pagamento. A duplicata não terá força executiva se houver a recusa do aceite pelos meios e nas condições legais.

A prescrição da letra de câmbio, da nota promissória e da duplicata ocorre em três anos da data do vencimento. O cheque prescreve em seis meses após o termo do prazo de apresentação que é de 30 dias quando pagável na mesma praça e de 60 dias quando emitida numa praça para ser pago em outra. Ocorrendo a prescrição, o crédito cambiário deixa de existir.

É possível penhorar um título de crédito? A resposta é positiva, na medida em que se trata da penhora de um valor do qual o devedor é titular e como parte de seu patrimônio está vinculado ao cumprimento da obrigação devida (art. 591). Vejamos o que diz o art. 672, in verbis:

"Art. 672. A penhora de crédito, representado por letra de câmbio, nota promissória, duplicata, cheque ou outros títulos, far-se-á pela apreensão do documento, este já ou não em poder do devedor."

Por fim, insta lembrar que se faltar algum requisito essencial aos títulos de crédito não é permitido ao credor a via executória em face da característica da literalidade e do formalismo dos títulos cambiais, mas desde já se abre o caminho da tutela monitória (arts. 1.102 e ss.), valendo-se da cártula como documento que autoriza essa via diferenciada.

II – a escritura pública ou outro documento público assinado pelo devedor; o documento particular assinado pelo devedor e por duas testemunhas; o instrumento de transação referendado pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública ou pelos advogados dos transatores;

A reforma ampliou sensivelmente o alcance desse inciso II de forma a abranger várias espécies de documentos. Na realidade, pela redação atual desse dispositivo, podemos considerar como títulos executivos extrajudiciais todos os atos jurídicos documentados por escrito, desde que presentes os requisitos da liquidez e da certeza, conforme se verá. O primeiro seria a escritura pública ou outro documento público assinado pelo devedor. Importante conceituarmos o que seriam "documentos públicos". Para DINAMARCO, "são documentos públicos os escritos materialmente realizados por órgãos estatais, como o escrivão, o tabelião e funcionários públicos em geral" (p. 272). O dispositivo não impõe a presença de testemunhas, sendo necessária apenas a aposição da assinatura do devedor.

O documento particular assinado pelo devedor e por duas testemunhas também tem força executiva. Na realidade, trata-se do ato praticado pelo devedor assumindo uma obrigação e a promessa de cumpri-la. Entretanto, o CPC condicionou a eficácia executiva de tais documentos à assinatura de duas testemunhas. A esse respeito, ARAKEN DE ASSIS colaciona jurisprudência no sentido de que "em julgado da 3ª. Câm. Cív. do TARS, estatuiu-se que rubrica não é assinatura, nem ‘avalista’ substitui testemunha" (p. 141). Teori Albino ZAVASCKI ainda revela que a chamada assinatura a rogo não é assinatura do devedor e sim de terceiro e, portanto, não vale para os fins desse dispositivo (p. 227). Por outro lado, têm-se entendido de que não se exige o reconhecimento das firmas.

O inciso II ainda trata da executividade doinstrumento de transação referendado pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública ou pelos advogados dos transatores. São os chamados atos referendados em que estão incluídos todos os atos pelos quais os litigantes se compõem para a solução de uma situação conflituosa. A participação do Ministério Público, da Defensoria Pública e dos advogados se justificam na medida em que são idôneos para orientar e fiscalizar que as partes não assumam compromissos além do razoável e do que serão capazes de cumprir.

III – os contratos de hipoteca, de penhor, de anticrese e de caução, bem como seguro de vida e de acidentes pessoais que resulte morte ou incapacidade;

Para DINAMARCO, esse inciso III é um "aglomerado heterogêneo de negócios jurídicos", afinal, em um só dispositivo, o legislador enumerou oito figuras de títulos executivos. Os contratos de caução ou de garantia previstos nesse dispositivo configuram o ajuste que visa dar ao credor uma segurança de pagamento. Desdobram-se em duas classes: os de garantia real e os de garantia pessoal. Hipoteca, penhor e anticrese são direitos reais de garantia sobre coisas alheias previstos no Código Civil. São meios do credor da obrigação assegurar a responsabilidade patrimonial de certos bens do devedor. A hipoteca tem como garantia um bem imóvel; no penhor se dá em garantia um objeto móvel mediante a efetiva entrega ao credor; e a anticrese consiste na entrega ao credor um imóvel para que este perceba os frutos e rendimentos dele provenientes para compensação da dívida. Note-se que a hipoteca, o penhor e anticrese não impedem a penhora do bem por outro credor que não o com garantia real. Entretanto, esse credor quirografário tem o ônus de intimar o credor preferencial sob pena de ineficácia da penhora. Como visto, a caução também é uma forma de garantia do credor. A forma mais comum de caução é a fiança. A fiança acaba por gerar um vínculo obrigacional entre o fiador e o credor do afiançado. O instituto da fiança pertence ao direito privado e é no Código Civil que reside sua disciplina.

Por fim, o inciso III deixa claro que os contratos de seguro também dão ensejo à execução forçada, sejam eles de vida ou de acidentes pessoais. Nesses casos, a liquidez desses títulos extrajudiciais pode ficar condicionada a documentos ou declarações posteriores à celebração do contrato, como a certidão de óbito ou o atestado médico.

IV – o crédito decorrente de foro, laudêmio, aluguel ou renda de imóvel, bem como encargo de condomínio, desde que comprovado por contrato escrito;

Para ARAKEN DE ASSIS, esse inciso contempla as chamadas "rendas imobiliárias" e o "encargo de condomínio" (p. 144). O foro é a verba anualmente paga pelo enfiteuta ao proprietário como prestação pelo domínio útil do imóvel na enfiteuse da lei civil. Entretanto, o Novo Código Civil proibiu expressamente a figura da enfiteuse (art. 2.038, caput). O laudêmio também dizia respeito à enfiteuse e tratava da indenização a ser paga ao proprietário toda vez que o domínio útil for transferido por venda ou dação em pagamento. Aluguel e renda são os frutos periódicos do imóvel que o proprietário recebe em função do uso da coisa locada ou arrendada. As palavras "aluguel" e "renda" se equivalem, sendo que a primeira se refere aos imóveis urbanos e a segunda ao imóvel rural. Embora a locação tenha forma livre, a lei processual limita a eficácia executiva ao contrato celebrado por escrito. Já não foi assim outrora. No CPC de 1939 o contrato de locação verbal tinha força executiva.

Por fim, as despesas de condomínio também encontram sua força executiva no largo espectro da lei processual civil brasileira desde estejam devidamente documentados pelo síndico. De acordo com a lei do inquilinato, despesas de condomínio são aquelas necessárias à administração das áreas comuns, manutenção de elevadores, equipamentos em geral, etc. (art. 23, §1.º). A documentação necessária a conferir força executiva seria a prova da investidura do síndico, o orçamento geral, relação das unidades autônomas bem como o valor de cada quota, balancete mensal e apresentação da convenção de condomínio. Entretanto, há clara orientação jurisprudencial no sentido de que as despesas de condomínio só autorizam o ingresso na via executiva quando o condômino locador pretender reaver do locatário aquilo que pagou. Em outras situações, como quando o síndico cobra do condômino, deve seguir o rito sumário do processo comum de conhecimento previsto no art. 275, III, b, do CPC.

V – o crédito de serventuário de justiça, de perito, de intérprete, ou de tradutor, quando as custas, emolumentos ou honorários forem aprovados por decisão judicial;

Trata dos créditos dos auxiliares da justiça aprovados por decisão judicial. Entretanto, como alerta WAMBIER, essa decisão "é dada incidentalmente no curso do processo em que esses auxiliares da justiça trabalharam: não é provimento resultante de discussão em contraditório, nem necessariamente homologatório do consenso entre os envolvidos" (p. 62). Auxiliares da justiça são os serventuários, como o escrivão, os oficiais de justiça, o contador, o avaliador, o distribuidor, o porteiro, bem como o perito, intérprete e tradutor. O devedor das custas será a parte vencida no processo. Os valores a cobrar serão somente aqueles que já não foram adiantados no curso do processo.

VI – a certidão de dívida ativa da Fazenda Pública da União, Estado, Distrito Federal, Território e Município, correspondente aos créditos inscritos na forma da lei;

De acordo com Teori Albino ZAVASCKI, "considera-se dívida ativa da Fazenda Pública qualquer valor cuja cobrança seja atribuída, por lei, à União, aos Estados, ao Distrito Federal, aos Municípios ou às suas autarquias, independentemente de se tratar de dívida tributária ou não" (p. 234). Essa definição está no art. 2.º da Lei 6.830/80 que trata do procedimento de execução fiscal.

VII – todos os demais títulos, a que, por disposição expressa, a lei atribuir força executiva."

O inciso VII fecha o estudo dos títulos executivos extrajudiciais remetendo à legislação extravagante. Entretanto, resta reafirmado o princípio da tipicidade dos títulos executivos, conforme visto no início. Há dezenas de títulos executivos previstos em leis esparsas, conforme citado por WAMBIER (p. 62/63): "as cédulas de crédito rural (Dec.-lei 167/67, art. 41), industrial (Dec.-lei 413/69, art. 10) e comercial (Lei 6.840/80 c/c o Dec.-lei 413/69); os créditos dos órgãos de controle de exercício de profissão (Lei 6.206/75, art. 2.º); a decisão que fixa ou arbitra e o contrato que estipula honorários advocatícios (Lei 8.906/94, art. 24); as decisões do TCU que resultem na imputação de débito ou multa (CF, art. 71, §3.º; o instrumento de contrato garantido por alienação fiduciária (Dec.-lei 911/69, art. 5.º); cédula de crédito bancário (MP 2.160-25/2001, art. 3.º) etc". Ainda poderíamos citar o prêmio de seguro (Dec.-lei 73/66, art. 73); as decisões do CADE (Lei 8.884/94, art. 60); os adiantamentos em contrato de câmbio (Lei 4.728/65, art. 75), entre outros.

Entretanto, importante destacar que a jurisprudência não tem considerado como título executivo o contrato de cheque especial acompanhado pelos extratos da conta-corrente sob o fundamento de que falta liquidez a esse crédito, uma vez que no momento da formalização do negócio não há débito algum a ser reconhecido pelo correntista. Tal entendimento já está consolidado no STJ na Súmula 233, in verbis: "O contrato de abertura de crédito, ainda que acompanhado de extrato de conta-corrente, não é título executivo". Como alerta DINAMARCO, "os valores unilateralmente lançados pelo banco não são suficientes para expressar a probabilidade de existência do crédito, que é o fundamento geral da instituição de títulos executivos pela lei" (p. 315). Entretanto, a Medida Provisória 2.160-25, de 23/08/2001, criou a chamada "Cédula de Crédito Bancário", título executivo extrajudicial que consiste em "dívida em dinheiro, líquida, certa e exigível, seja pela soma nela indicada, seja pelo saldo devedor demonstrado em planilha de cálculo, ou nos extratos da conta-corrente". Portanto, tal débito agora possui expressa previsão normativa como sendo título executivo extrajudicial.

O CPC reconhece a total validade do título executivo extrajudicial, oriundo de país estrangeiro, ao qual empresta força executiva, nesses termos:

"Art. 585.

§2.º. Não dependem de homologação pelo STF, para serem executados, os títulos executivos extrajudiciais, oriundos de país estrangeiro. O título, para ter eficácia executiva, há de satisfazer aos requisitos de formação exigidos pela lei do lugar de sua celebração e indicar o Brasil como o lugar de cumprimento da obrigação".

Entretanto, o entendimento jurisprudencial dominante afirma que o título há de ser devidamente traduzido para a língua portuguesa, convertendo-se o valor da moeda estrangeira para a nossa no ato da propositura da ação, posto que é nulo o título que estipula o pagamento em moeda que não a nacional (Resp. 4819-RJ, RSTJ 27/313).


Bibliografia utilizada

ASSIS, Araken. Manual do Processo de Execução, 5ª. Edição, SP: Editora RT, 1998.

DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil, IV, 1ª. Edição, SP: Malheiros Editores, 2004.

MEDINA, José Miguel Garcia. Execução Civil – teoria geral e aspectos fundamentais, 2ª. Edição, SP: Editora RT, 2004.

NERY JUNIOR, Nelson. Princípios do Processo Civil na Constituição Federal, 6ª ed., São Paulo: Editora RT, 2000.

WAMBIER, Luiz Rodrigues e outros. Curso Avançado de Processo Civil, Volume 2, 7ª. Edição, SP: Editora RT, 2005.

WAMBIER, Teresa Arruda Alvim e outros. Processo de Execução – Série Processo de Execução e Assuntos Afins - v. 2, 1ª. Edição, SP: Editora RT, 2001.

ZAVASCKI, Teori Albino. Comentários ao Código de Processo Civil, Volume 8, SP: Editora RT, 2000.

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Sobre o autor
Átila Da Rold Roesler

Procurador federal da Advocacia-Geral da União, especialista em Direito Processual Civil, autor do livro Execução Civil - Aspectos Destacados (Editora Juruá, 2007), ex-Delegado de Polí­cia Civil do Estado do Paraná.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROESLER, Átila Rold. Considerações sobre os títulos executivos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 692, 28 mai. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6788. Acesso em: 18 dez. 2024.

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