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Direito Constitucional aplicado à profissão:

direitos fundamentais como base da ordem normativa de condutas profissionais e dos códigos de ética empresarial

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21/06/2005 às 00:00
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Este texto versa sobre a utilização do Direito Constitucional, principalmente no tocante aos Direitos Fundamentais, no contexto empresarial e a relação da ordem jurídica com a deontologia profissional.

Sumário: 1. Conceito de Constituição. 2. Importância da Constituição Federal de 1988 para o profissional. 3. Direitos Fundamentais ou Direitos Humanos? 4. As quatro gerações de Direitos Humanos. 5. Direitos Fundamentais. 6. Direitos Individuais. 7. Direitos Coletivos. 8. Direitos Sociais. 9. Direitos da Nacionalidade. 10. Direitos Fundamentais aplicados à profissão. 11. Introdução à deontologia profissional. 12. Conceito e Função de Código de Ética. 13. Bases para um Código de Ética.


INTRODUÇÃO

Este texto versa de maneira sucinta sobre a utilização do Direito Constitucional, principalmente no tocante aos Direitos Fundamentais, no contexto empresarial e a relação da ordem jurídica com a deontologia profissional. Não pretendemos versar profundamente sobre um assunto extremamente vasto e complexo, mas tão-somente apresentar os principais conceitos e tentar, de certa forma, associá-los ao cotidiano profissional empresarial. Em função de tal intento, não temos ímpetos de inovar doutrinariamente com relação ao tema proposto, apenas introduzir os temas e, porventura, despertar a curiosidade para uma leitura e pesquisa mais profundas a respeito. Para fins didáticos, este texto foi dividido em dois capítulos.

Em "I – Os Direitos Fundamentais e o Cotidiano Profissional", introduziremos o conceito de ordem jurídica e de norma fundamental, que deve ser seguida em todas as instâncias deontológicas, sejam a partir de atos legais ou infra-legais, resguardando e implementando os Direitos Fundamentais, também objeto deste capítulo.

Em "II – Deontologia Profissional e Códigos de Ética", tentaremos conectar os princípios constitucionais e os dispositivos legais como diretrizes para a elaboração de normas de conduta para as empresas, além de expor um arcabouço teórico sobre o assunto.


CAPÍTULO I – OS DIREITOS FUNDAMENTAIS E O COTIDIANO PROFISSIONAL

1.Conceito de Constituição

O Direito Constitucional é um ramo do Direito Público. Porém, distingue-se dos demais ramos do Direito Público, por ser um Direito Público fundamental, segundo José Afonso da Silva, por "referir-se diretamente à organização e funcionamento do Estado, à articulação dos elementos primários do mesmo e ao estabelecimento das bases da estrutura política." [01] Numa conceituação mais aclarada: "Podemos defini-lo como o ramo do Direito Público que expõe, interpreta e sistematiza os princípios e normas fundamentais do Estado." [02] Portanto, o objeto de estudo do Direito Constitucional "é constituído pelas normas fundamentais da organização do Estado, forma de governo, modo de aquisição e exercício do poder, estabelecimento dos seus órgãos, limites de sua atuação, direitos fundamentais do homem e respectivas garantias e regras básicas da ordem econômica e social". [03]

Obviamente, como o próprio nome diz, a principal norma do Direito Constitucional é a Constituição. A Constituição é a norma fundamental que funda e organiza o Estado. Ou seja:

"A constituição do Estado, considerada sua Lei fundamental, seria, então, a organização dos seus elementos essenciais: um sistema de normas jurídicas, escritas ou costumeiras, que regula a forma do Estado, a forma de seu governo, o modo de aquisição e o exercício do poder, o estabelecimento de seus órgãos, os limites de sua ação, os direitos fundamentais do homem e as respectivas garantias. Em síntese, a constituição é o conjunto de normas que organiza os elementos constitutivos do Estado." (SILVA, 2001, p. 38)

A Constituição Federal de 1988 [04] é a norma fundamental do Direito Positivo Brasileiro. Por normalizar a democracia e restabelecer o Estado Social e Democrático de Direito, a CF/88 é diferente das constituições antecedentes. A CF/88 é organizada em nove títulos:

"(1) dos princípios fundamentais; (2) dos direitos e garantias fundamentais, segundo uma perspectiva moderna e abrangente dos direitos individuais e coletivos, dos direitos sociais dos trabalhadores, da nacionalidade, dos direitos políticos e dos partidos políticos; (3) da organização do Estado, em que estrutura a federação com seus componentes; (4) da organização dos poderes: Poder Legislativo, Poder Executivo e Poder Judiciário, com a manutenção do sistema presidencialista, seguindo-se um capítulo sobre as funções essenciais à Justiça, com Ministério Público, Advocacia Pública (da União e dos Estados), advocacia privada e defensoria pública; (5) da defesa do Estado e das instituições democráticas, com mecanismos dos Estado de Defesa, Estado de Sítio e da segurança pública; (6) da tributação e do orçamento; (7) da ordem econômica e financeira; (8) da ordem social; (9) das disposições gerais. Finalmente, o Ato das Disposições Transitórias." (SILVA, 2001, p. 89-90)

2.Importância da Constituição Federal de 1988 para o Profissional

No intuito de seguir as ordens da coordenação e a ementa deste curso, enfocaremos os aspectos da CF/88 relacionados aos direitos e garantias fundamentais (Título II – Dos Direitos e das Garantias Fundamentais, CF/88). Alguns podem se perguntar: "O que a Constituição tem a ver com o meu cotidiano profissional?" Tem tudo a ver. A CF/88 é a norma fundamental e suprema do Estado Brasileiro. Portanto, todas as leis e atos infra-legais lhe devem subordinação. Muito se diz sobre constitucionalidade ou inconstitucionalidade de determinadas medidas. Pois bem, algo é constitucional se estiver segundo a Constituição. É inconstitucional, se apresentar dispositivo contrário à Constituição. Assim, o é com as Leis, com os atos infra-legais (decretos, portarias e demais atos administrativos, entre outros) e com as normas de conduta impostas pelas empresas aos seus funcionários.

O empregador tem poderes para disciplinar e gerir a empresa e as relações desta com os empregados. Porém, esses poderes são limitados. E não podem, de maneira alguma, contrariar dispositivos contidos na Constituição e na legislação [05], seja ela administrativa, trabalhista, financeira, tributária, penal, internacional, civil, comercial, ambiental, entre outras. Quer dizer, mesmo sendo uma pessoa de direito privado, a empresa não pode fazer o que quiser no seu âmbito interno, devendo, inclusive, respeitar e implementar os Direitos Fundamentais, naquilo que lhe couber, segundo a Constituição e as Leis. A liberdade, in casu, é para agir segundo o que ordenam e o que permitem as Leis e a Constituição, esta a norma fundamental que confere validade e norteia toda uma ordem jurídica nacional.

A seguir, explicaremos melhor os Direitos Fundamentais e a sua fundamentação constitucional.

3.Direitos Fundamentais ou Direitos Humanos?

Os Direitos do ser humano, por mais fundamentais que sejam, são Direitos Históricos, segundo o cientista político e jurista italiano Norberto Bobbio. [06] Devido à ampliação dos Direitos Fundamentais, no decorrer da história, não é tarefa simples desenvolver um conceito. De acordo com José Afonso da Silva, há várias expressões que, muitas vezes são utilizadas como sinônimos de Direitos Fundamentais, como: "direitos naturais, direitos humanos, direitos do homem, direitos individuais, direitos públicos subjetivos, liberdades fundamentais, liberdades públicas e direitos fundamentais do homem." [07]São esses direitos, garantidos constitucionalmente (alguns deles com regulamentação infra-constitucional – via Leis, decretos, portarias, regimentos, resoluções, entre outros atos normativos, tratados internacionais, entre outros), os que mais devem ser levados em conta no cotidiano empresarial. Atenção. O mero atendimento a esses direitos não exime a empresa, considerada como o conjunto de empregadores e empregados, de cumprir as outras obrigações e deveres decorrentes da ordem jurídica nacional.

Numa interpretação de José Afonso da Silva, podemos dizer que Direitos Humanos é a expressão utilizada, com relação aos Direitos Fundamentais, no plano internacional (documentos internacionais, principalmente). Mas que raios são os Direitos Humanos? Não é redundante dizer Direitos Humanos, visto que todos os direitos são relativos aos homens e mulheres? Afinal, só o homem pode ser titular de direitos e deveres. Mas, conforme alguns autores, já se delineia um certo tipo de direito especial de proteção aos animais. [08]

4. As quatro gerações de Direitos Humanos

Antes de falarmos especificamente de Direitos Fundamentais, falemos dos ditos Direitos Humanos, que são divididos em quatro gerações:

4.1. Direitos Humanos de Primeira Geração

Os Direitos Humanos de Primeira Geração são ligados, principalmente, à Revolução Americana e à Revolução Francesa. Referem-se basicamente ao direito de liberdade (de ir e vir, de religião, de ideologia, entre outros), direito de igualdade, direito à vida e direito à segurança. Outros conflitos importantes, nessa perspectiva, foram os conflitos de religião. Bobbio explica:

"A inversão de perspectiva, que a partir de então se torna irreversível, é provocada no início da era moderna, principalmente pelas guerras de religião, através das quais se vai afirmando o direito de resistência à opressão, o qual pressupõe um direito ainda mais substancial e originário, o direito do indivíduo a não ser oprimido, ou seja, a gozar de algumas liberdades fundamentais: fundamentais porque naturais e naturais porque cabem ao homem enquanto tal e não dependem do beneplácito do soberano (entre as quais, em primeiro lugar, a liberdade religiosa). (...) a liberdade religiosa é um efeito das guerras de religião; as liberdades civis, da luta dos parlamentos contra os soberanos absolutos" (BOBBIO, 1992, p. 4-5, grifos nossos)

A luta contra a opressão do poder traz explicitamente a noção de que o indivíduo é inviolável em sua dignidade. Isso foi se consolidando e se disseminando mundialmente, até que essas idéias foram sistematizadas na "Declaração Universal dos Direitos Humanos". Dispõe sobre a liberdade num âmbito negativo, ou seja, de não interferência da autoridade estatal sobre o indivíduo. Segundo alguns juristas como o professor Fernando Fernandes da Silva, doutor em Direito Internacional pela Universidade de São Paulo (USP), há direitos que são derivados dos Direitos Humanos de Primeira Geração, como: o direito de formar grupos (ou associar-se ou reunir-se), direito ao voto, direito de participação política e direito de propriedade privada. Os Direitos Humanos de Primeira Geração teriam equivalência aos Direitos Fundamentais insertos na CF/88 nos dispositivos referentes aos Direitos e Garantias Individuais e Coletivos.

4.2. Direitos Humanos de Segunda Geração

Os Direitos Humanos de Segunda Geração, também conhecidos como Direitos Sociais, tiveram origem no final do Século XIX e começo do Século XX. Podemos dizer que o principal motivo foi a Revolução Industrial, levando o capitalismo a um nível de desenvolvimento jamais visto outrora. Nessa época, houve igualmente grande crescimento da classe trabalhadora, pois, como era de se esperar, os proprietários dos meios de produção eram a minoria, a burguesia, se utilizarmos uma acepção marxista. Naquela época, não havia restrição de idade para a atividade laboral, nem um limite legal para a jornada diária de trabalho. A partir do Século XX, os Estados Nacionais passaram a interferir nas relações sociais, regulamentando as questões trabalhistas. Antes, os empregadores e os empregados eram livres para estipularem os termos da atividade laboral. Porém, o trabalhador sempre saía em desvantagem, pois o empregador possuía maior poder de "convencimento". A luta novamente se fez presente:

"(...) a liberdade política e as liberdades sociais, do nascimento, crescimento e amadurecimento do movimento dos trabalhadores assalariados, dos camponeses com pouca ou nenhuma terra, dos pobres que exigem dos poderes públicos não só o reconhecimento da liberdade pessoal e das liberdades negativas, mas também proteção do trabalho contra o desemprego, os primeiros rudimentos de instrução contra o analfabetismo, depois a assistência para a invalidez e a velhice, todas elas carecimentos que os ricos proprietários podiam satisfazer por si mesmos." (BOBBIO, 1992, p. 5-6, grifo nosso)

Daí, a idéia de Estado Social e Democrático de Direito. Por social, entende-se o Estado que intervêm de forma positiva (ou liberdade num âmbito positivo) em prol das pessoas, principalmente as de menor poder aquisitivo. Neste rol de direitos, além dos direitos trabalhistas, podemos também incluir o direito à saúde e o direito à educação, por exemplo. Os Direitos Humanos de Segunda Geração não possuem um equivalente à Declaração Universal dos Direitos do Homem (dos Direitos Humanos de Primeira Geração), no plano internacional. Há, porém, organismos como a Organização Internacional do Trabalho (OIT) que tem a pretensão de elaborar normas e uniformizar a legislação trabalhista, em termos globais. No CF/88, os Direitos Humanos de Segunda Geração, estão insertos em sua maioria na parte que diz respeito aos Direitos Sociais.

4.3. Direitos Humanos de Terceira Geração

Dentre os Direitos Humanos de Terceira Geração, "o mais importante deles é o reivindicado pelos movimentos ecológicos: o direito de viver num ambiente não poluído" [09]. Um exemplo de norma internacional correspondente é o Protocolo de Quioto. Na CF/88, os Direitos Humanos de Terceira Geração estão presentes nos dispositivos referentes ao Meio Ambiente. José Afonso da Silva, por sua vez, entende que o Meio Ambiente está incluído no rol dos Direitos Sociais, com será visto posteriormente.

4.4. Direitos Humanos de Quarta Geração

Os avanços no campo científico e tecnológica e a sua relação com a "vida" são principal objeto dos Direitos Humanos de Quarta Geração. Nas palavras de Bobbio, "referentes aos efeitos cada vez mais traumáticos da pesquisa biológica, que permitirá manipulações do patrimônio genético de cada indivíduo". O jurista ainda lança uma pergunta no ar: "Quais são os limites dessa possível (e cada vez mais certa no futuro) manipulação?" [10]

5. Direitos Fundamentais

Na doutrina de José Afonso da Silva, Direitos Fundamentais são "situações jurídicas, objetivas e subjetivas, definidas no direito positivo, em prol da dignidade, igualdade e liberdade da pessoa humana" [11]. Ou melhor dizendo: "São direitos constitucionais na medida em que se inserem no texto de uma constituição ou mesmo constem de simples declaração solenemente estabelecida pelo poder constituinte. São direitos que nascem e se fundamentam, portanto, da soberania popular." [12] Eis algumas características dos Direitos Fundamentais:

"(1) Historicidade. São históricos como qualquer direito. Nascem, modificam-se e desaparecem. (...);

(2) Inalienabilidade. São direitos intransferíveis, inegociáveis, porque não são de conteúdo econômico patrimonial. Se a ordem constitucional os confere a todos, deles não se pode desfazer, porque são indisponíveis;

(3) Imprescritibilidade. (...) Vale dizer, nunca deixam de ser exigíveis. Pois prescrição é um instituto jurídico que somente atinge, coarctando, a exigibilidade dos direitos de caráter patrimonial, não a exigibilidade dos direitos personalíssimos, ainda que não individualistas, como é o caso. (...);

(4) Irrenunciabilidade. Não se renunciam direitos fundamentais. Alguns deles podem até não ser exercidos, pode-se deixar de exercê-los, mas não se admite que sejam renunciados." (SILVA, 2000, p. 185, grifos nossos)

A CF/88 classifica dos Direitos Fundamentais [13] em cinco grupos:

5.1. Direitos Individuais

Direitos Individuais

(art. 5.º, CF/88) – "direitos fundamentais do homem-indivíduo, que são aqueles que reconhecem autonomia aos particulares, garantindo iniciativa e independência aos indivíduos diante dos demais membros da sociedade política e do próprio Estado"; [14]

5.2. Direitos Coletivos

Direitos Coletivos

(art. 5.º, CF/88) – "direitos fundamentais do homem-membro de uma coletividade, que a Constituição adotou como direitos-coletivos"; [15]

5.3. Direitos Sociais

Direitos Sociais

(art. 6.º e 193 e ss, CF/88) – "direitos fundamentais do homem-social, que constituem os direitos assegurados ao homem em suas relações sociais e culturais"; [16]

5.4. Direito à Nacionalidade

Direitos à Nacionalidade

(art. 12, CF/88) – "são direitos fundamentais do homem-nacional, que são os que têm por conteúdo e objeto a definição de nacionalidade e suas faculdades"; [17]

5.5. Direitos Políticos

Direitos Políticos

(arts. 14 a 17, CF/88) – "direitos fundamentais do homem-cidadão, que são os direitos políticos, chamados também direitos democráticos ou direitos de participação política"; [18]

Todas essas categorias de Direitos Fundamentais compõem um todo harmônico e não contraditório entre si, que se influenciam reciprocamente. Afinal, esses direitos, segundo José Afonso da Silva, estão contaminados de dimensão social:

"Com isso, transita-se de uma democracia de conteúdo basicamente político-formal para uma democracia de conteúdo social, se não de tendência socializante. Quanto mais precisos e eficazes se tornem os direitos econômicos, sociais e culturais, mais se inclina do liberalismo para o socialismo. Transforma-se a pauta de valores: o liberalismo exalta a liberdade individual, formalmente reconhecida, mas, em verdade auferida por um pequeno grupo dominante; o socialismo realça a igualdade material de todos como a única base sólida em que o efetivo e geral gozo dos direitos individuais de liberdade encontra respaldo seguro. A antítese inicial entre direitos individuais e direitos sociais tende a resolver-se numa síntese de autêntica garantia para a democracia, na medida em que os últimos forem enriquecendo-se de conteúdo e eficácia." (SILVA, 2001, p. 188, grifos nossos)

Para fins deste curso, não versaremos sobre todos os Direitos Fundamentais, por problemas óbvios de pouco tempo para demasiado conteúdo. Então, descartamos de plano do conteúdo programático os "Direitos Políticos" da nossa agenda acadêmica, para nos fixarmos nos tópicos mais importantes dos Direitos Fundamentais e sua correlação com a deontologia profissional e os Códigos de Ética Empresarial.

6. Direitos Individuais

Recapitulando. Os Direitos Individuais são os "Direitos Fundamentais do homem-indivíduo, que são aqueles que reconhecem a autonomia aos particulares, garantindo a iniciativa e independência aos indivíduos diante dos demais membros da sociedade política e do próprio Estado." [19] Quem são seus destinatários? O artigo 5.º, "caput", da CF/88, diz: "Todos são iguais perante a Lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Brasil a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança, à propriedade (...)"

Esses direitos arrolados no artigo 5.º são assegurados tanto para pessoas físicas quanto pessoas jurídicas. O mesmo se dá para os brasileiros, é claro, e os estrangeiros residentes no Brasil. Contudo, isso não significa que os estrangeiros não residentes não tenham seus direitos amparados. José Afonso da Silva explica: "Isso não quer dizer que os estrangeiros não residentes, quando regularmente se encontrem no território nacional, possam sofrer o arbítrio, e não disponham de qualquer meio, incluindo os jurisdicionais, para tutelar situações subjetivas. Para protegê-los, há outras normas legais, traduzidas em legislação especial, que definem os direitos e a condição jurídica do estrangeiro não residente, que tenha ingressado regularmente no território brasileiro." [20]

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O festejado constitucionalista distingue três grupos de Direitos Individuais: "(1) Direitos Individuais expressos, aqueles explicitamente enunciados nos incisos do art. 5.º; (2) Direitos Individuais implícitos, aqueles que estão subtendidos nas regras de garantia, como o direito à identidade pessoal, certos desdobramentos do direito à vida, o direito à atuação geral (art. 5.º, II); (3) Direitos individuais decorrentes do regime e de tratados internacionais subscritos pelo Brasil, aqueles que não são nem explícita nem implicitamente numerados, mas provêm ou podem vir e provir do regime adotado, como o Direito de Resistência, entre outros de difícil caracterização a priori" [21]

Os Direitos Individuais podem ser desdobrados em cinco grandes grupos:

6.1. Direito à Vida

Direito à Vida

– "A vida humana, que é o objeto de estudo do direito assegurando no art. 5.º, caput, integra-se de elementos materiais (físicos e psíquicos) e imateriais (espirituais). A vida é intimidade conosco mesmo, saber-se e dar-se conta de si mesmo, um assistir a si mesmo e um tomar posição de si mesmo. Por isso é que ela constitui a fonte primária de todos os outros bens jurídicos." [22] Por sua vez o Direito à Vida tem suas variantes:

6.1.1. Direito à Existência – "Direito de estar vivo, de lutar pelo viver, de defender a própria existência". [23]

6.1.2. Direito à Integridade Física – "Agredir o corpo humano é um modo de agredir a vida, pois esta se realiza nele. A integridade físico-corporal constitui, por isso, um bem vital e revela um direito fundamental do indivíduo." [24] Neste caso, a CF/88 explicitou algumas proibições como a vedação à pena de morte (art. 5.º, XLVII, "a", CF/88), à comercialização de órgãos, tecidos e substâncias humanas (art. 199, § 4.º, CF/88), à tortura ou tratamento desumano ou degradante (art. 5.º, III).

6.1.3. Direito à Integridade Moral – "A vida humana não é apenas um conjunto de elementos materiais. Integram-na, outrossim, valores imateriais, como os morais. A Constituição empresta muita importância à moral como valor ético-social da pessoa e da família, que se impõe ao respeito dos meios de comunicação social (art. 221, IV, CF/88). Ela, mais que as outras, realçou o valor da moral individual, tornando-a mesmo um bem indenizável (art. 5.º V e X, CF/88). A moral individual sintetiza a honra da pessoa, o bom nome, a boa fama, a reputação que integram a vida humana como dimensão material." [25]

6.2 Direito à Intimidade

Direito à Intimidade

– O artigo 5.º, X, da CF/88, dispõe que "são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação". "Essa violação, em algumas hipóteses, já constitui ilícito penal. Além disso, a Constituição foi explícita em assegurar, ao lesado, direito à indenização por dano material ou moral decorrente da violação da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas, em suma do direito à privacidade." [26] Temos, então, dois elementos distintos: a intimidade "esfera secreta da vida do indivíduo na qual este tem o poder legal de evitar os demais" [27] e a vida privada "a vida interior, que se debruça sobre a mesma pessoa, sobre os membros de sua família, sobre seus amigos". [28]

6.2.1. Com relação à intimidade, podemos dizer que esse direito protege a inviolabilidade do domicílio (art. 5.º, XI), o sigilo de correspondência (art. 5.º XII, CF/88) e o segredo profissional.

6.2.2. Já com relação à vida privada, a Constituição visa proteger o segredo da vida privada e a liberdade da vida privada. "O segredo da vida privada é condição de expansão da personalidade." [29] Nesse sentido também são invioláveis, por força do artigo 5.º, X, da CF/88, a honra ("conjunto de qualidades que caracterizam a dignidade da pessoa, o respeito dos concidadãos, o bom nome, a reputação" [30]) e a imagem ("tutela do aspecto físico, como é perceptível visivelmente" [31]) das pessoas.

6.3. Direito de Igualdade

Direito de Igualdade

– Todos são iguais perante a Lei (isonomia formal). Trata-se de uma igualdade de equiparação de todos com relação a atribuição de direitos e deveres. Às vezes, contudo, é necessário tratar desigualmente os desiguais, para não incorrer em injustiça. Nesse aspecto, a igualdade é chamada de isonomia material.

6.3.1. Igualdade entre homens e mulheres – Diz o artigo 5.º, I, da CF/88, "homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição". Qualquer ato, ou disposição, em contrário ofende a Constituição. Contudo, há de se ponderar que, às vezes, há tratamento diferenciado à mulher em virtude da sua condição física (aposentadoria cinco anos antes do limite imposto aos homens) e progenitora (licença-maternidade, etc).

6.3.2. Igualdade da Justiça – "(1) interdição ao juiz de fazer distinção entre situações iguais, ao aplicar a Lei; (2) como interdição ao legislador de editar leis que possibilitem o tratamento desigual a situações iguais ou tratamento igual a situações desiguais por parte da Justiça." [32]

6.3.3. Igualdade tributária – "Relaciona-se com a justiça distributiva em matéria fiscal. Diz respeito à repartição do ônus fiscal do modo mais justo possível. Fora disso, a igualdade será puramente formal. (...) A gradação, segundo a capacidade econômica e personalização do imposto, permite agrupar os contribuintes em classes sociais, e, dentro de cada uma, que constituem situações equivalentes, atua o princípio da igualdade." [33]

6.3.4. Igualdade perante a Lei Penal – "(...) A mesma Lei Penal e seus sistemas de sanções há de se aplicar a todos quantos pratiquem o fato típico nela definido como crime." [34]

6.3.5. Igualdade sem distinção de qualquer natureza – A CF/88 está a "promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Proíbe-se também diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor, estado civil ou posse de deficiência (art. 7.º, XXX e XXXI, CF/88)" [35].

6.3.6. Igualdade sem distinção de sexo e de orientação sexual.

6.3.7. Igualdade sem distinção de origem, cor e raça – O tópico por si só é auto-evidente. Explicitemos brevemente alguns conceitos. "O racismo indica teorias e comportamentos destinados a realizar e justificar a supremacia de uma raça. O preconceito e a discriminação são conseqüências dessa teoria. A cor só não era elemento bastante, porque dirigida à cor negra. Nem raça, nem cor abrangem certas formas de discriminações de nordestinos e de pessoas de origem social humilde." [36]

6.3.8. Igualdade sem distinção de idade.

6.3.9. Igualdade sem distinção de trabalho – Liberdade de exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão (art. 5.º, XIII, CF/88) e vedação da distinção entre trabalho manual, técnico e intelectual ou entre os profissionais respectivos (art. 7.º, XXXII, CF/88).

6.3.10. Igualdade sem distinção de credo religioso (art. 5.º VI, CF/88).

6.3.11. Igualdade sem distinção de convicções filosóficas ou políticas.

6.4. Direito de Liberdade

Direito de Liberdade

– "O Conceito de liberdade humana deve ser expresso no sentido de um poder de atuação do homem em busca de sua realização pessoal. (...) liberdade consiste na possibilidade de coordenação consciente dos meios necessários à realização da felicidade pessoal." [37] De acordo com a doutrina de José Afonso da Silva, a CF/88 contempla cinco grandes grupos de liberdades, a saber:

6.4.1. Liberdade da Pessoa Física – Trata-se da primeira forma de liberdade, "é a possibilidade jurídica que se reconhece a todas as pessoas de serem senhoras de sua própria vontade e de se locomoverem desembaraçadamente dentro do território nacional". [38] Aqui, temos duas variantes, a liberdade de locomoção e a liberdade de circulação.

6.4.1.1 Liberdade de Locomoção (art. 5.º, XV, CF/88) – Explicita duas situações, em casos de normalidade: "uma é a liberdade de locomoção no território nacional; a outra é a liberdade de a pessoa entrar no território nacional, nele permanecer e dele sair com seus bens." [39]

6.4.1.2. Liberdade de Circulação – "Direito à circulação é manifestação característica da liberdade de locomoção: direito de ir, vir, ficar, parar, estacionar. O Direito de Circulação (ou Liberdade de Circulação) consiste na faculdade de deslocar-se de um ponto a outro através de uma via pública ou afetada ao uso público." [40]

6.4.2. Liberdade de Pensamento – "Trata-se da liberdade de conteúdo intelectual e supõe o contato do indivíduo com seus semelhantes, pela qual o homem tenda, por exemplo, a participar a outros suas crenças, seus conhecimentos, sua concepção do mundo, suas opiniões políticas ou religiosas, seus trabalhos científicos. (...) Nesses, termos, ela se caracteriza como exteriorização do pensamento no seu sentido mais abrangente." [41] Podem ser:

6.4.2.1. Liberdade de Opinião – "Trata-se da liberdade de o indivíduo adotar a atitude intelectual de sua escolha: quer um pensamento íntimo, quer seja a tomada de posição pública; liberdade de pensar e dizer o que se crê verdadeiro." [42] Um dos seus aspectos externos é a liberdade de manifestação do pensamento, assim como o direito de não se manifestar.

6.4.2.2. Liberdade de Religiosa – Abrange três formas de expressão: a-) liberdade de crença (art. 5.º, VI, CF/88), b-) liberdade de culto (art 5.º, VI, CF/88) e c-) liberdade de organização religiosa.

6.4.2.3. Liberdade de Informação e Comunicação – "A liberdade de comunicação consiste num conjunto de direitos, formas, processos e veículos, que possibilitam a coordenação desembaraçada da criação, expressão e difusão do pensamento e da informação (art. 5.º, IV, V, IX, XII e XIV, c/c art. 220 a 224, CF/88)." [43] Por sua vez, a liberdade de informação é a liberdade de informar e de ser informado: "a liberdade de informação compreende a procura, o acesso, o recebimento e a difusão de informações ou idéias, por qualquer meio, e sem dependência de censura, respondendo cada qual pelos abusos que cometer." [44] Nessa categoria, se enquadra a liberdade de informação jornalística, por exemplo.

6.4.2.4. Liberdade de Expressão Intelectual, Artística e Científica – Essas liberdades estão previstas e asseguradas pelo artigo 5.º, IX, da CF/88. Gozam de ampla liberdade, desde que não contrariem a Lei, e não passem por cima da questão pertinente aos Direitos Autorais e de Propriedade Intelectual, por exemplo.

6.4.2.5. Liberdade de Expressão Cultural – Presentes principalmente nos artigos 215 e 216 da CF/88. "Aí, se manifesta a mais aberta liberdade cultural, sem censura, sem limites: uma vivência plena dos valores do espírito humano em sua projeção criativa, em sua produção de objetos que revelem o sentido dessas projeções da vida do ser humano." [45]

6.4.2.6. Liberdade de Transmissão e Recepção do Conhecimento – Verificar o artigo 206, II e III, da CF/88. "Trata-se do reconhecimento de liberdade de uma classe de especialistas na comunicação do conhecimento, que são os professores. (...) se dirige a qualquer exercente de função de magistério, a professores de qualquer grau, dando-se liberdade de ensinar, e mais ainda porque também abrange a outra face da transmissão do conhecimento, o outro lado da liberdade de ensinar ou seja, a liberdade de aprender, assim, como a liberdade de pesquisar (modo de aquisição do conhecimento)." [46]

6.4.3. Liberdade de Expressão Coletiva – De reunião e associação. De certa forma, esses direitos são auto-evidentes, o que nos permite citá-los somente "an passand", já que os veremos no tópico seguinte "7. Direitos Coletivos".

6.4.4. Liberdade de Ação Profissional – "O dispositivo confere liberdade de escolha de trabalho, de ofício e de profissão, de acordo com as propensões de cada pessoa e na medida em que a sorte e o esforço próprio possam romper as barreiras que se antepõem à maioria do povo. Confere, igualmente, a liberdade para de exercer o que fora escolhido, no sentido apenas de que o Poder Público não pode constranger a escolher e a exercer outro." [47]

6.5. Direito de Propriedade

Direito de Propriedade

– O artigo 5.º, XXII, da CF/88, diz que "é garantido o direito de propriedade", e que a "propriedade atenderá a sua função social" (art. 5.º, XIII, CF/88). O Direito de Propriedade, portanto, não é absoluto, pois, quando necessário, há de se ceder ao interesse público. Exemplos típicos são a desapropriação de propriedades que não cumprem sua função social (art. 182, § 4.º, e 184, CF/88). Há vários tipos de propriedade:

6.5.1. Propriedade Pública – "É a que tem como titular entidades de Direito Público: União, Estados, Distrito Federal e Municípios." [48]

6.5.2. Propriedades Especiais – A propriedade de recursos minerais (art. 176, CF/88), a propriedade urbana e a propriedade rural (art. 182. § 2.º, e 184, CF/88) e a propriedade de empresa jornalística e de radiodifusão sonora e de sons e imagens (art. 222, CF/88) não estão dispostas no título referentes aos Direitos Fundamentais da Magna Carta, sendo inclusos, respectivamente, nos tópicos concernentes à ordem econômica e à comunicação social.

6.5.3. Propriedade Autoral – "O art. 5.º, XXVII, que assegura o Direito Autoral, contém duas normas bem distintas. A primeira e principal confere aos autores o direito exclusivo de utilizar, publicar e reproduzir suas obras, sem especificar (...), mas, compreendido em conexão com o disposto no inciso IX do mesmo artigo, conclui-se que são obras literárias, artísticas, científicas e de comunicação. Enfim, aí se asseguram os Direitos do Autor de obra intelectual e cultural, reconhecendo-lhe, vitaliciamente, o chamado direito de propriedade intelectual, que compreende Direitos Morais e Patrimoniais. A segunda norma declara que esse direito é transmissível aos herdeiros pelo tempo que a Lei fixar. (...) São Direitos Morais do Autor: (a) o de reivindicar, a qualquer tempo, a paternidade da obra; (b) o de ter seu nome, pseudônimo ou sinal convencional indicado ou anunciado, como sendo o do autor, na utilização de sua obra; (c) o de conservá-la inédita; (d) o de assegurar-lhe a integridade, opondo-se a quaisquer modificações, ou à prática de atos que, de qualquer forma, possam prejudicá-la, ou atingi-lo, antes ou depois de utilizada; (f) o de retirá-la de circulação, ou de lhe suspender qualquer forma de utilização já autorizada, quando a circulação ou utilização implicarem afronta à sua reputação e imagem; (g) o de ter acesso a exemplar único e raro da obra, quando se encontre legitimamente em pode de outrem, para o fim de, por meio de processo fotográfico ou assemelhado, ou audiovisual, preservar sua memória, de forma que cause o menor inconveniente possível a seu detentor, que em todo caso, será indenizado de qualquer dano ou prejuízo que lhe seja causa. (...) Os Direitos Patrimoniais do Autor compreendem as faculdades de utilizar, fruir e dispor de sua obra, bem como de autorizar sua utilização ou fruição por terceiros no todo ou em parte. Esses direitos são alienáveis por ele ou por seus sucessores. O Direito Hereditário de Propriedade Intelectual cabe aos herdeiros, descendentes, cônjuges e colaterais, de acordo com ordem de vocação hereditária estabelecida na lei civil, mas também se defere aos herdeiros testamentários." [49]

6.5.4. Propriedade de Inventos, de Marcas e Indústrias e de Nome de Empresas [50] – O artigo 5.º, XXIX, da CF/88, dispõe: "a Lei assegurará aos autores de inventos industriais privilégio temporário para sua utilização, bem como proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos, tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País."

6.5.5. Propriedade Bem de Família – Prevista no Código Civil: "Art. 1.711. Podem os cônjuges, ou a entidade familiar, mediante escritura pública ou testamento, destinar parte de seu patrimônio para instituir bem de família, desde que não ultrapasse um terço do patrimônio líquido existente ao tempo da instituição, mantidas as regras sobre a impenhorabilidade do imóvel residencial estabelecida em lei especial. Art. 1.715. O bem de família é isento de execução por dívidas posteriores à sua instituição, salvo as que provierem de tributos relativos ao prédio, ou de despesas de condomínio"

7. Direitos Coletivos

O constitucionalista José Afonso da Silva destaca os Direitos Coletivos como os que dizem respeito às "liberdades de expressão coletiva, como as de reunião e de associação". [51] Muitos desses Direitos Coletivos, ou de expressão coletiva, foram inseridos no capítulo "Direitos e deveres individuais e coletivos", da CF/88, outros, como os "direitos de organização sindical e de greve foram incluídos no capítulo dos direitos sociais". [52] A respeito do meio ambiente, identidade histórica e cultural, há dispositivos pertinentes no título da Ordem Social, da CF/88. Eis alguns tipos de Direitos Coletivos:

7.1. Direito à Informação

Direito à Informação

– "No capítulo da Comunicação (arts. 220 a 224, CF/88), preordena a liberdade de informar completada com a liberdade de manifestação do pensamento (art. 5.º, IV). No mesmo art. 5.º, XIV e XXXIII, já temos a dimensão coletiva do Direito à Informação. O primeiro declara assegurado a todos o acesso à informação. (...) Outro dispositivo trata de direito à informação mais específico, quando estatui que todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de interesse particular, coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da Lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado." [53]

7.2. Direito de Representação Coletiva

Direito de Representação Coletiva

– "(...) a Constituição já previu casos de representação coletiva de interesses coletivos ou mesmo individuais integrados numa coletividade. É assim que se estabelece que as entidades associativas, quando expressamente autorizadas (certamente em seus estatutos), têm legitimidade para representar seus filiados em juízo ou fora dele (art. 5.º, XXI, CF/88), legitimidade essa também reconhecida aos sindicatos em termos até mais amplos e precisos, in verbis: ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas (art. 8.º, III)." [54]

7.3. Direito de Participação

Direito de Participação

– De um lado há a participação direta dos cidadãos no processo político e decisório (art. 14. I, e II, art, 29, XIII, e 61, §2.º, CF/88), de outro do de participação orgânica, expressa muitas vezes como participação corporativa (arts. 10 e 11, CF/88) e não corporativa – direito de participação da comunidade -, "especialmente de trabalhadores, empresários e aposentados, na gestão da seguridade social (art. 194, VII, CF/88), como a participação da comunidade nas ações e serviços públicos de saúde (art. 198, III, CF/88)." [55]

7.4. Direito dos Consumidores

Direito dos Consumidores

– O artigo 5.º, XXXII, CF/88, dispõe: "o Estado proverá, na forma da Lei, a defesa do Consumidor". Por sua vez, o artigo 170, V, inclui a defesa do consumidor à condição de princípio da Ordem Econômica. [56] As principais normas sobre esse assunto estão na Lei n.º 8.078/90, o Código de Defesa do Consumidor.

7.5. Liberdade de Reunião

Liberdade de Reunião

– Basta ler o artigo 5.º, XVI, CF/88: "todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, exigível prévio aviso à autoridade e desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local." Além dos agrupamentos momentâneos visando um objetivo comum, o conceito de reunião incluem também as passeatas e as manifestações nos logradouros públicos.

7.6. Liberdade de Associação

Liberdade de Associação

– Tem fundamento no artigo 5.º, inciso XVII a XXI, que segundo José Afonso da Silva, "se estatui que é plena a liberdade de associação para fins pacíficos, vedada a de caráter paramilitar, que a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independe de autorização, vedada a interferência estatal em seu funcionamento, que as associações só poderão ser compulsoriamente dissolvidas ou ter suas atividades suspensas por decisão judicial, exigindo-se no primeiro caso, o trânsito em julgado, que ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado, e que as entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm a legitimidade para representar seus filiados em juízo e fora dele (...)" [57]

8. Direitos Sociais

Enquanto os Direitos Individuais, e de certa forma os Direitos Coletivos, ambos da CF/88, correspondem aos Direitos Humanos de Primeira Geração, podemos associar os Direitos Sociais da CF/88 com os Direitos Humanos de Segunda Geração. Aqueles eram primordialmente ligados à um sentido de prestação negativa do Estado, ou seja de não interferência da autoridade com relação ao indivíduo. Já os Direitos Sociais "são prestações positivas proporcionadas pelo Estado direta ou indiretamente, enunciadas em normas constitucionais, que possibilitam melhores condições de vida aos mais fracos, direitos que tendem a realizar a igualização de situações sociais desiguais". [58]

Ora, pois. Se os Direitos Individuais e Coletivos são vistos sob o prisma da liberdade, principalmente, os Direitos Sociais são declarados e concebidos sob o prisma da igualdade. De acordo com José Afonso da Silva, a CF/88, do artigo 6.º ao 11, enumerou os Direitos Sociais em seis classes: a-) Direitos Sociais Relativos ao Trabalhador; b-) Direitos Sociais Relativos à Seguridade (englobando Direitos à Saúde, à Previdência e Assistência Social); c-) Direitos Sociais Relativos à Educação e à Cultura; d-) Direitos Sociais Relativos à Moradia; e-) Direitos Sociais Relativos à Família, Criança, Adolescente e Idoso; f-) Direitos Sociais Relativos ao Meio Ambiente. [59]

José Afonso da Silva diz que os Direitos Sociais também podem ser classificados em dois grandes grupos: a-) Direitos Sociais do Homem Produtor; b-) Direitos Sociais do Homem Consumidor:

"Entram na categoria de Direitos Sociais do Homem Produtor os seguintes: a liberdade de instituição sindical (instrumento de ação coletiva), o direito de greve, o direito de o trabalhador determinar as condições de seu trabalho (contrato coletivo de trabalho), o direito de cooperar na gestão da empresa (co-gestão ou autogestão) e o direito de obter um emprego. São os previstos nos arts. 7.º e 11.

Na categoria dos Direitos Sociais do Homem Consumidor entram: os direitos à saúde, à segurança social (segurança material), ao desenvolvimento intelectual, o igual acesso das crianças e adultos à instrução, à formação profissional e à cultura e garantia ao desenvolvimento da família, que são, como se nota, os indicados no art. 6.º e desenvolvidos no título da Ordem Social." (SILVA, 2001, p. 290)

8.1 Direitos Sociais do Homem Produtor

Encararemos os Direitos Sociais Relativos aos Trabalhadores [60] como Direitos Sociais do Homem Produtor. Neste ponto, José Afonso da Silva, divide esses direitos em duas ordens. Uma está enumerada no artigo 7.º, da CF/88, e versa sobre os direitos dos trabalhadores em suas relações individuais de trabalho. A segunda tem fundamento constitucional dos artigos 9º a 11, que contemplam os direitos coletivos dos trabalhadores.

8.1.1 Direitos dos Trabalhadores

Como este texto não é um tratado de Direito do Trabalho, nem tem tal pretensão, resolvemos simplesmente expor os dispositivos constitucionais, para fins de conhecimento, pois suas finalidades, em muitos casos, são auto-evidentes. Abrangem direitos sobre as condições de trabalho, direitos relativos aos salários (salário mínimo, art. 7.º, IV, CF/88; adicional noturno, art. 7.º, IX, CF/88; 13.º salário, entre outros) direitos relativos ao repouso e à inatividade do trabalhador (art. 7.º, XV, XVII, XIX e XXIV, CF/88), proteção dos trabalhadores (vide Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS, por exemplo, art. 10, I, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, da CF/88; seguro desemprego, art. 239, CF/88), direitos relativos aos dependentes do trabalhador e participação nos lucros e co-gestão. A maioria dos Direitos dos Trabalhadores, urbanos e rurais, está elencada nos incisos do artigo 7.º da CF/88:

"I - relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos;

II - seguro-desemprego, em caso de desemprego involuntário;

III - fundo de garantia do tempo de serviço;

IV - salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim;

V - piso salarial proporcional à extensão e à complexidade do trabalho;

VI - irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo;

VII - garantia de salário, nunca inferior ao mínimo, para os que percebem remuneração variável;

VIII - décimo terceiro salário com base na remuneração integral ou no valor da aposentadoria;

IX – remuneração do trabalho noturno superior à do diurno;

X - proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa;

XI – participação nos lucros, ou resultados, desvinculada da remuneração, e, excepcionalmente, participação na gestão da empresa, conforme definido em lei;

XII - salário-família pago em razão do dependente do trabalhador de baixa renda nos termos da lei;

XIII - duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho;

XIV - jornada de seis horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação coletiva;

XV - repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos;

XVI - remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em cinqüenta por cento à do normal;

XVII - gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal;

XVIII - licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias;

XIX - licença-paternidade, nos termos fixados em lei;

XX - proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei;

XXI - aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias, nos termos da lei;

XXII - redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança;

XXIII - adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei;

XXIV - aposentadoria;

XXV - assistência gratuita aos filhos e dependentes desde o nascimento até seis anos de idade em creches e pré-escolas;

XXVI - reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho;

XXVII - proteção em face da automação, na forma da lei;

XXVIII - seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa;

XXIX - ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho;

XXX - proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil;

XXXI - proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência;

XXXII - proibição de distinção entre trabalho manual, técnico e intelectual ou entre os profissionais respectivos;

XXXIII - proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos;

XXXIV - igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador avulso." [61]

Observemos que também se estendem aos trabalhadores domésticos (art. 7.º, parágrafo único, os seguintes direitos: "IV – salário mínimo; VI - irredutibilidade de salário; XV – décimo-terceiro salário; XV – repouso semanal remunerado; XVII – férias anuais remuneradas; XVIII – licença-gestante; XIX – licença-paternidade; XXI – aviso prévio; e XXIV – aposentadoria e integração à previdência social." [62]

8.1.2. Direitos Coletivos dos Trabalhadores

Os Direitos Coletivos dos Trabalhadores são "liberdade de associação profissional ou sindical, direito de greve, direito de substituição processual, direito de participação laboral e direito de representação na empresa". [63] A CF/88 prevê dois tipos de associação, a profissional e a sindical. A associação profissional, em regra, tem atuação na defesa dos interesses profissionais dos seus membros, além de estudos relacionados à categoria. Já o sindicato é, em tese, o defensor dos direitos coletivos ou individuais da categoria, seja em instâncias administrativas ou judiciais. Este tem papel fundamental nas negociações coletivas de trabalho [64] e recebe contribuições. Seus representantes são eleitos.

Com relação à liberdade sindical, isso significa que o sindicato tem: liberdade de fundação, liberdade de adesão, liberdade de atuação e liberdade de filiação. Notemos que os aposentados tem direito ao voto nos sindicatos, assim como de serem votados também. O sindicato não precisa de autorização do Estado para ser fundado, porém, deve, como pessoa jurídica, seguir todos os processos pertinentes para o registro dos seus estatutos na repartição competente. O artigo 149 da CF/88 dispõe sobre uma Contribuição Social (ou Contribuição Sindical), que é compulsória e tem fins tributários. Já a Contribuição Confederativa [65] (art. 8.º, CF/88) não tem características tributárias, e seu valor é decidido pela categoria, em Assembléia Geral.

No Brasil, pode-se dizer que existe unicidade sindical (só se permite um sindicato por categoria, numa base territorial – um Município) e pluralidade de bases sindicais (várias sedes).

Outro Direito Coletivo dos Trabalhadores é o Direito de Greve, que pode ser de ordem reivindicativa, de solidariedade, política, ou de protesto. Tem fundamento constitucional no artigo 9.º da CF/88. Verificamos, igualmente, que o Direito de Greve não é total, pois deve também contemplar os interesses e necessidades prementes da sociedade, como versam os §§. 1.º e 2.º da CF/88.

Se, numa ponta, o Direito de Greve é garantido aos trabalhadores, os empregadores não podem fazer algo semelhantes, pois o "lockout" é proibido pela CF/88 e pela Legislação Trabalhista.

8.2. Direitos Sociais do Homem Consumidor

O constitucionalista José Afonso da Silva divide os Direitos Sociais do Homem como Consumidor nas seguintes categorias: a-) Direitos Sociais Relativos à Seguridade (Direito à Saúde, Direito à Previdência Social, Direito À Assistência Social); b-) Direitos Sociais Relativos à Educação e Cultura; c-) Direitos Sociais Relativos à Moradia; d-) Direito Ambiental (Direito ao Lazer e Direito ao Meio Ambiente); e-) Direitos Sociais da Criança e dos Idosos (incluindo proteção à maternidade, à infância e aos idosos).

8.2.1 Direitos Sociais Relativos à Seguridade

"A Constituição acolheu uma concepção de seguridade social, cujos objetivos e princípios se aproximam bastante daqueles fundamentos, ao defini-la como um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência, e à assistência social (art. 194, CF/88), ao estabelecer seus objetivos (art. 194, parágrafo único, CF/88) e o sistema de seu financiamento (art. 195, CF/88) (...)." [66]

8.2.1.1. Direito à Saúde

A CF/88 "declara ser a saúde direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação, serviços e ações que são de relevância pública (arts. 196 e 197, CF/88)". [67]

8.2.1.2. Direito à Previdência Social

"Previdência Social é um conjunto de direitos relativos à seguridade social. (...) funda-se no princípio do seguro social, de sorte que os benefícios e serviços se destinam a cobrir eventos de doença, invalidez, morte, velhice e reclusão, apenas do segurado e dos seus dependentes." [68]

Para José Afonso da Silva, o regime de Previdência Social da CF/88 oferece dois tipos de prestações: "(1) os benefícios, que são prestações pecuniárias, consistentes: (a) na aposentadoria, por invalidez (não incluída no § 7.º do art. 201, mas sugerida no inciso I do mesmo artigo), por velhice, por tempo de serviço, especial e proporcional (art. 221, §§ 7.º e 8.º, CF/88); (b) nos auxílios por doença, maternidade, reclusão e funeral (art. 201, I a III); (c) no seguro-desemprego (art. 7., II, art. 201, IV, e art. 239, CF/88); na pensão por morte do segurado (art. 201, V, CF/88); (2) os serviços, que são prestações assistenciais: médica, farmacêutica, odontológica, hospitalar, social e de reeducação ou readaptação funcional." [69]

8.2.1.3. Direito à Assistência Social

Se o Direito à Previdência Social exigia prestações, fundadas no princípio do seguro social, o Direito à Assistência Social tem caráter universalizante. Explica José Afonso da Silva: "será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição (art. 203, CF/88)". [70] Ela é destinada aos "desvalidos em geral".

8.2.2. Direitos Sociais Relativos à Educação e à Cultura

Como não poderia deixar de ser, a CF/88 dotou a cultura, no sentido amplo, de especial importância (alguns dos dispositivos a respeito são o art. 5.º, IX; art. 23, III a V; art. 24, VII a IX, art. 30, IX, e art. 205 a 217). Embora a educação e a cultura sejam consideradas Direitos Sociais, o constituinte incluiu-a na CF/88 no capítulo da "Ordem Social". Para José Afonso da Silva, o artigo 205, da CF/88, contém três objetivos da educação: "a) pleno desenvolvimento da pessoa; b) preparo da pessoa para o exercício da cidadania; c) qualificação da pessoa para o trabalho". [71]

Contudo, para que o Direito de Ensino se realize, a CF/88 conta com certos princípios contidos no artigo 206: "universalidade (ensino para todos), igualdade, liberdade, pluralismo, gratuidade do ensino público, valorização dos respectivos profissionais, gestão democrática da escola e padrão de qualidade (...)." [72] O artigo 6.º, da CF/88. alçou a educação ao status de Direito Social. Combinado com o artigo 205, explicado acima, tem a seguinte mensagem: "todos têm o direito à educação e o Estado tem o dever de prestá-la, assim como a família." [73]

Com relação aos Direitos à Cultura, os mesmos não foram inseridos no artigo 6.º, da CF/88. Estão arrolados no artigo 215, da CF/88: "O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais." De novo, o princípio da universalidade entra em cena. Ou seja, Direitos Culturais para todos. Para José Afonso da Silva, os Direitos Culturais são:

"(a) direito de criação cultural, compreendidas as criações científicas, artísticas e tecnológicas; (b) direito de acesso às fontes da cultura nacional; (c) direito de difusão da cultura; (d) liberdade de formas de expressão cultural; (e) liberdade de manifestações culturais; (f) direito-dever estatal de formação do patrimônio cultural brasileiro e de proteção dos bens de cultura, que, assim, ficam sujeitos a um regime jurídico especial, como forma de propriedade de interesse público." (SILVA, 2001, p. 216)

8.2.3. Direitos Sociais Relativos à Moradia

Na CF/88, o Direito à Moradia está consignado no artigo 6.º e artigo 23, IX. Possui duas faces. Uma negativa; outra, positiva. "A primeira significa que o cidadão não pode ser privado de uma moradia nem impedido de conseguir uma, no que importa à abstenção do Estado e de terceiros. A segunda, que é a nota principal do Direito à Moradia, como dos demais Direitos Sociais, consiste no direito de obter uma moradia digna e adequada, revelando-se como um direito positivo de caráter prestacional, porque legitima a pretensão do seu titular à realização do direito por via de ação positiva do Estado." [74]

8.2.4. Direito Ambiental

O doutrinador José Afonso da Silva amalgama o Direito ao Meio Ambiente propriamente dito, o Direito ao Lazer (previstos no artigo 6.º, da CF/88) e o Direito à Recreação, sob a alcunha de Direito Ambiental. Discorramos brevemente sobre cada caso. "Lazer é a entrega à ociosidade repousante. Recreação é a entrega ao divertimento, ao esporte, ao brinquedo. Ambos se destinam a refazer as forças depois da labuta diária e semanal." [75]

Com relação ao Direito ao Meio Ambiente, o artigo 225 é explícito: "todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações."

8.2.5. Direitos Sociais da Criança e do Idoso

Embora a proteção à maternidade e à infância estejam previstos no artigo 6.º, da CF/88, como Direitos Sociais, sua especificação de conteúdo aparece em outros dispositivos da Constituição como capítulo da Ordem Social: "onde aparece como aspectos do Direito de Previdência Social (art. 201, III: "proteção à maternidade, especialmente à gestante"), do Direito de Assistência Social (art. 203, I: "proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice"; II: "amparo às crianças e adolescentes carentes") e no capítulo da Família, da Criança, do Adolescente e do Idoso (art. 227, CF/88), sendo de ter cuidado para não confundir direito individual da criança (Direito à Vida, à Dignidade, à Liberdade) com o seu Direito Social que, aliás, salvo o princípio da prioridade, coincide, em boa parte, com o de todas as pessoas (Direito à Saúde, à Alimentação, à Educação, ao Lazer), com o direito civil (condições jurídicas dos filhos em relação aos pais) e com o direito tutelar do menor (art. 227, § 3.º, IV a VII, e § 4.º, CF/88)" [76] Além das normas constitucionais e as constantes nas legislações civis e penais, outro aliado na proteção desses direitos é a Lei n.º 8.069/93, o Estatuto da Criança e do Adolescente.

Embora não esteja presente no artigo 6.º, o Direito dos Idosos são tidos como Direitos Sociais. Uma parte integra o Direito Previdenciário (art. 201, I, CF/88), vide aposentadoria, principalmente, e a outra, o Direito Assistenciário (art. 203, I, CF/88), "como forma protetiva da velhice, incluindo a garantia de pagamento de um salário mínimo mensal, quando ele não possuir meios de prover à própria subsistência, conforme dispuser a Lei." [77] O artigo 230, da CF/88, dispõe também que a família, a sociedade e o Estado têm o dever de "amparar as pessoas idosas, assegurando a sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes direito à vida, bem como a gratuidade dos transportes coletivos urbanos e, tanto quanto possível, a convivência em seu lar." [78] Para dar maior alento a esses preceitos constitucionais, foi elaborada e aprovada a Lei n.º 10.741/2003, o Estatuto do Idoso.

9. Direitos da Nacionalidade

De acordo com o artigo 12, I, da CF/88, são brasileiros natos: a-) os nascidos no Brasil; b-) os nascidos no estrangeiro, filhos de pais ou mãe brasileiros, desde que a serviço da República Federativa do Brasil; c-) nascidos no estrangeiro, filho de pai ou mãe brasileiros, desde que opte por residir no Brasil. Embora, em regra, se tenha adotado o critério "jus solis" para atribuição de nacionalidade (art. 12, I, "a", CF/88), há resquícios de "jus sangüinis" (art. 12, I, "b" e "c"). Alguns autores dizem que se trata de um critério misto, ou um "jus solis" mitigado. Trata-se de "jus solis" quando o critério preponderante para atribuição de nacionalidade é o local onde o sujeito nasce. Com relação ao "jus sangüinis", o critério guia é a descendência do sujeito.

A nacionalidade é o vínculo jurídico que o sujeito tem com o Estado, que confere aos nacionais privilégios com relação aos estrangeiros. A nacionalidade pode ser originária, quer dizer, a pessoa nasce com ela, devido a critérios de sangue, territoriais ou mistos. Ou a nacionalidade pode ser derivada, ou seja, a pessoa a adquire, voluntária e posteriormente ao nascimento. Cidadania decorre da nacionalidade. Os Direitos da Cidadania são os Direitos Políticos. Portanto, o que se diz, vulgarmente, "dupla cidadania", é, na verdade, dupla nacionalidade.

São polipátridas, aqueles que possuem mais de uma nacionalidade, e apátridas [79], os que não têm nacionalidade. Um exemplo de apátrida é o brasileiro naturalizado que perdeu a sua condição nacional em virtude de cancelamento judicial. (art. 5.º, LI, c/c art. 5.º, § 1.º, c/c art. 12, § 4.º, CF/88)

O que determina a diferença entre brasileiros natos e brasileiros naturalizados é o nascimento dentro do território nacional ou a filiação, tal como já citamos o artigo 12, I, e alíneas, da CF/88. Para naturalizar-se o estrangeiro deve iniciar um procedimento administrativo e judicial. [80] Na petição, o estrangeiro deve declarar, de modo expresso, que opta pela nacionalidade brasileira, seguindo o disposto no artigo 12, II, da CF/88, e na Lei n.º 6.815/80, o Estatuto do Estrangeiro. Algumas hipóteses para a naturalização podem ser a obtenção de visto permanente, o casamento com brasileiro (a) ou ter filhos brasileiros.

O artigo 12, § 2.º, da CF/88, dispõe que podem ser naturalizados: 1-) "os que, na forma da lei, adquiram a nacionalidade brasileira, exigidas aos originários de países de língua portuguesa apenas residência por um ano ininterrupto e idoneidade moral" (art. 12, § 2.º, II, "a", CF/88); 2-) "os estrangeiros de qualquer nacionalidade, residentes na República Federativa do Brasil há mais de quinze anos ininterruptos e sem condenação penal, desde que requeiram a nacionalidade brasileira" (art. 12, § 2.º, II, "b", CF/88).

Aos portugueses, o constituinte conferiu tratamento especial, conforme o artigo 12, § 1.º, da CF/88: "Aos portugueses com residência permanente no País, se houver reciprocidade em favor de brasileiros, serão atribuídos os direitos inerentes ao brasileiro, salvo os casos previstos nesta Constituição."

Um brasileiro, em regra, não pode perder a nacionalidade

, salvo em casos de cancelamento da sua naturalização, por sentença judicial, em virtude de atividade nociva ao interesse nacional (art. 12, § 4.º, I, CF/88) ou aquisição de outra nacionalidade (art. 12, § 4.º, II, CF/88). Nesta última, há exceções, que muitas vezes culminam em mais de uma nacionalidade: 1-) "aquisição originária de nacionalidade pela lei estrangeira" (art. 12, § 4.º, II, "a", CF/88); 2-) "imposição de naturalização, pela norma estrangeira, ao brasileiro residente em Estado estrangeiro, como condição para permanência em seu território ou para o exercício de direitos civis" (art. 12, § 4.º, II, "b", CF/88).

Apesar de ser constitucionalmente proibida a distinção entre brasileiros natos e brasileiros naturalizados, há algumas exceções. O artigo 12, § 3.º, da CF/88, apresenta expressamente os cargos privativos para brasileiros natos, nos seguintes incisos: "I - de Presidente e Vice-Presidente da República; II - de Presidente da Câmara dos Deputados; III - de Presidente do Senado Federal; IV - de Ministro do Supremo Tribunal Federal; V - da carreira diplomática; VI - de oficial das Forças Armadas; VII - de Ministro de Estado da Defesa."

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Sobre o autor
Roger Moko Yabiku

Advogado, jornalista e professor universitário. Bacharel em Direito e Jornalismo, graduado pelo Programa Especial de Formação Pedagógica de Professores de Filosofia, MBA em Comércio Exterior, Especialista em Direito Penal e Direito Processual Penal e Mestre em Filosofia (Ética). Professor do CEUNSP e da Faculdade de São Roque - UNIESP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

YABIKU, Roger Moko. Direito Constitucional aplicado à profissão:: direitos fundamentais como base da ordem normativa de condutas profissionais e dos códigos de ética empresarial. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 716, 21 jun. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6913. Acesso em: 16 nov. 2024.

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