1.Introdução
O controle de constitucionalidade tem por objetivo aferir a compatibilidade vertical das normas com a Constituição, verificando a regularidade do processo legislativo (aspecto formal) e o conteúdo propriamente dito (aspecto material).
Raul Machado Horta, dissertando acerca da importância do controle de constitucionalidade ensina que:
"O controle de constitucionalidade das leis é o corolário lógico da supremacia constitucional, seu instrumento necessário, o requisito para que a superioridade constitucional não se transforme em preceito moralmente platônico e a Constituição em simples programa político, moralmente obrigatório, um repositório de bons conselhos, para uso esporádico ou intermitente do legislador, que lhe pode vibrar, impunemente, golpes que a retalham e desfiguram" (01)
Ao longo da evolução do controle de constitucionalidade diversas variações surgiram para a consecução deste desiderato. Em relação ao momento de realização, o controle pode ser preventivo ou repressivo. O primeiro realiza-se antes que a norma ingresse no ordenamento jurídico (v.g. Constituição Portuguesa, art. 278, I; e na Constituição Brasileira, art. 66, §1º). Já o segundo visa expurgar do ordenamento a norma incompatível com a Constituição.
O controle repressivo em relação ao órgão controlador pode ser político, jurídico ou misto. O primeiro é realizado por órgão específico distinto dos demais poderes do Estado (v.g. Modelo Francês). O segundo é realizado pelo Poder Judiciário (v.g. Modelo Brasileiro). O último, por sua vez, submete certas leis ao controle político e outras ao controle jurídico (v.g. Modelo Italiano).
2.Controle de Constitucionalidade à luz do direito comparado
O surgimento do Direito Comparado não é preciso na história do Direito, mas foi a partir da obra de Lambert (1903) - La fonction du droit civil compare - que se iniciou uma série de estudos comparativos de sistemas jurídicos.
Alguns entendem o direito comparado como método comparativo, outros, porém, o concebem como ciência jurídica. Alinho-me a esta última, pois não podemos confundir método e ciência. Tanto o estudo de um ordenamento, quanto a análise de dois sistemas jurídicos, por meio da comparação, são científicos, portanto, integram o ramo da ciência jurídica.
O ilustre professor Paulo Dourado de Gusmão leciona que:
"Direito comparado é a parte da ciência jurídica que tem por objeto a comparação de direitos de diferentes países, sociedades, civilizações ou de épocas diversas com o objetivo de descobrir seus princípios comuns e suas diferenças e, excepcionalmente, quando possível, propor uniformizações jurídicas ou unificações de legislações" (02)
O Direito Constitucional Comparado, segundo Santi-Romano, é "uma ciência essencialmente descritiva" (03) e a exposição a seguir articulada procurará explorar as convergências e divergências dos diversos modelos de controle de constitucionalidade.
O Controle de Constitucionalidade Francês é realizado de maneira preventiva por um órgão especial denominado Conselho Constitucional. Antes da promulgação, as leis são enviadas a esse conselho que declara ou não sua constitucionalidade. Tal decisão vincula as autoridades administrativas e judiciárias.
Sacha Calmon Navarro Coelho relata:
"Surgem as Cortes Constitucionais, ao lado da trindade dos Poderes, com a função de aferir a fidelidade das leis aos textos constitucionais, com maior e menor elastério, dependendo do lugar."i (04)
Note-se que o poder judiciário não detém competência para o controle de constitucionalidade, sendo simplesmente um órgão aplicador da lei pura. Na França, o Conseil Constitutionnel é o guardião da Constituição.
Há uma exceção a esta regra no tocante aos decretos regulamentares. Os decretos, criados pelo Governo, tratam de matérias não afetadas às leis. Portanto, o Conselho Constitucional poderá analisar abstratamente a repartição de competência entre o Governo e o Legislativo. Alexandre de Moraes citando Favoreu ensina que:
"o sistema de repartição de competências entre a lei e o regulamento provocou, por fim, o surgimento na França de um controle de constitucionalidade das leis" (05)
Desde o célebre caso Marbury vs. Madison que o sistema americano de controle de constitucionalidade é o difuso, ou seja, lá o controle é realizado de maneira incidental pelo juiz da causa.
Portanto, no modelo americano todos os juízes possuem competência para avaliar a constitucionalidade de uma lei em face do Texto Maior. Entretanto, o juiz de primeiro grau raramente exerce tal competência, que é realizada pelos tribunais superiores. Alexandre de Moraes citando Cooley ensina:
"se o tribunal perante o qual a questão se apresenta não é de última instância em relação a mesma, deve-se esperar que proceda com cautela e circunspecção, mais do que no comum, e que se abstenha, completamente, de declarar a nulidade de uma lei, a menos que se trate de casos de extraordinária clareza, e especialmente se, sem sério detrimento da justiça, a decisão puder ser retardada, até que o tribunal de categoria superior tenha ocasião de se pronunciar sobre o caso. Outros podem haver em que, por inadvertência ou por caso fortuito, uma lei que haja passado por todos os trâmites exigidos para a sua validez, seja, não obstante isso, evidente e inquestionavelmente nula; mas, exceto esses casos, o fato de um magistrado de categoria inferior, que só exercendo uma jurisdição policial ou outra limitada, se irrogar a competência de proferir decisões acerca da legislação de um Estado ou país, declarando-a inconstitucional (invalid) só pode ser ridículo" (06)
O modelo norte-americano não concebe, entretanto, o controle abstrato das normas. Somente incidenter tantum pode-se verificar a compatibilidade das normas ordinárias com a Constituição. Tal posicionamento foi esposado no caso Muskrat vs. United States (1911):
"O Poder Judiciário tem competência para julgar disputas atuais que se promovam entre litigantes diversos. O direito de declarar inconstitucionalidade das leis surge porque uma delas, invocada por uma das partes como fundamento do seu direito, está em conflito com a lei fundamental. Essa faculdade, que é o dever mais importante e dedicado da Corte, não lhe é atribuída como um poder de revisão da obra legislativa, mas porque os direitos dos litigantes nas controvérsias de natureza judicial requerem que a Corte opte entre a lei fundamental e a outra, elaborada pelo Congresso na suposição de estar em consonância com sua experiência constitucional, mas que, na verdade, exorbita do poder conferido ao ramo legislativo do governo. Essa tentativa para conseguir a declaração judicial de validade da lei elaborada pelo Congresso não se apresenta, na hipótese, em um caso ou controvérsia, a cuja apreciação está limitada a jurisdição desta Corte, segundo a lei suprema dos Estados Unidos" (07)
O sistema americano recebeu críticas da doutrina, principalmente com relação à sua possibilidade de expansão entre países da família romano-germânica. Como, naquele sistema, todos os juízes podem e devem analisar a constitucionalidade das leis, ocorrerá a hipótese paradoxal de uma mesma lei ser considerada constitucional por um juiz e inválida por outro, gerando insegurança jurídica. Cappelletti, um dos maiores doutrinadores do tema, pontua:
"Ulteriores inconvenientes do método ‘difuso’ de controle, porque concretizado em ordenamento jurídicos que não acolhem o princípio do stare decisis, são os que derivam da necessidade de que, mesmo depois de uma primeira não aplicação ou de uma série de não aplicações de uma determinada lei por parte das Cortes, qualquer sujeito interessado na não aplicação da mesma lei proponha, por sua vez, um novo caso em juízo" (08)
Diversamente do modelo americano, o sistema austríaco de controle de constitucionalidade, obra de Hans Kelsen, se dá de forma concentrada, exercida por um Tribunal Constitucional. Esse sistema foi consagrado na Constituição austríaca de 1920 e alterado em 1929.
Nesse modelo os juízes não possuem competência para avaliar questões constitucionais. Porém, o Tribunal Constitucional só poderá analisar questões constitucionais quando provocado por órgãos políticos.
Raul Machado Horta, lembra com brilhantismo a função do Tribunal Constitucional:
"O constituinte austríaco de 1920, sob a inspiração de Hans Kelsen, optando pela organização federal, cuja adoção reclamou um lógico e racional processo técnico-jurídico de adaptação, (Lei de 10 de outubro de 1920) confiou ao Tribunal Constitucional a missão de defender a inviolabilidade do texto constitucional, ao qual se subordinavam tanto a legislação do governo provincial (landesregierung) como a do governo federal, para manter a efetiva supremacia jurídica e política da Constituição Federal" (09)
Entrementes, em 1929, o sistema foi alterado com a inserção da denominada questão constitucional segundo a qual um tribunal inferior poderia deixar de aplicar lei que entendesse inconstitucional, suspendendo o processo e submetendo a questão ao Tribunal Constitucional. Consagrou-se, assim, um controle difuso de forma mitigada.
Ressalte-se que o Tribunal Constitucional só julga a questão constitucional, devolvendo a matéria fática para a instância a quo, conforme explana García de Enterría:
"o sistema de controle de constitucionalidade das leis se configura como uma função constitucional que não seria propriamente judicial, mas sim, nos expressos termos de Kelsen, de legislação negativa. Em concreto, o Tribunal Constitucional não julga nenhum suposto fato singular – que está reservado ao Tribunal a quo que tenha suscitado o incidente de inconstitucionalidade -, mas sim somente o incidente de inconstitucionalidade, somente o problema puramente abstrato de compatibilidade lógica (Vereinbarkeit) entre a previsão abstrata da lei e a norma constitucional" (10)
Vale destacar que o Tribunal Constitucional pode julgar a validade das normas em face da Constituição por meio do recurso constitucional que objetiva proteger liberdades individuais das pessoas lesionadas por atos administrativos inconstitucionais.
O ordenamento jurídico alemão prevê o controle de constitucionalidade abstrato e difuso das normas, que é realizado somente pelo Tribunal Constitucional Federal.
O controle abstrato se dá nos moldes do modelo austríaco. Os legitimados à provocação do tribunal são o Governo Federal, um dos governos estaduais ou um terço dos membros do parlamento federal. Para a instauração de tal ação exige-se a controvérsia sobre a compatibilidade da lei federal ou estadual com a Constituição ou com a legislação federal.
O controle abstrato não será interrompido em caso de desistência do pedido, haja vista a presença do interesse público na causa. Ademais, o Tribunal Constitucional Federal não está adstrito à causa de pedir da ação, podendo analisar todos os aspectos constitucionais da questão sub judice.
Gilmar Ferreira Mendes, grande estudioso do ordenamento alemão, leciona que:
"Desde o início, o controle abstrato de normas desfrutou de posição firme na práxis do Bundesverfassungsgericht, senão por outras razões, graças à relevância política das questões jurídicas submetidas à apreciação do Tribunal. Do prisma estritamente estatístico, o controle abstrato de normas não tem maior significado, tendo sido proferidas apenas 56 decisões de mérito nesse tipo de processo no período 1951-1989. No mesmo período (1951-1989) foram propostas tão-somente 106 ações para o controle abstrato de normas."
E prossegue:
"Já no começo de sua judicatura reconheceu o Bundesverfassungsgericht a dupla função do controle abstrato de normas.
De um lado, revela-se esse processo um instrumento adequado de defesa da Constituição, permitindo eliminar do ordenamento jurídico as leis inconstitucionais (função de defesa). De outro, contribui o controle abstrato de normas para a segurança jurídica quando infirma a existência de inconstitucionalidade, espancando dúvidas sobre a higidez da situação jurídica (segurança jurídica)" (11)
O controle difuso realiza-se por meio da questão de constitucionalidade que é aferida pelo magistrado no decorrer da ação. Assim, quando um juiz considerar uma lei inconstitucional, suspenderá o processo e submeterá a questão para o Tribunal Constitucional Federal.
Em síntese, todos os juízes podem aferir a inconstitucionalidade das leis, mas somente o Tribunal Constitucional Federal poderá declará-la.
O modelo português é constituído pela fiscalização preventiva da constitucionalidade, fiscalização concreta da constitucionalidade, fiscalização abstrata da constitucionalidade e a inconstitucionalidade por omissão.
A fiscalização preventiva de constitucionalidade é prevista pelo art. 278 da Constituição Portuguesa. Nos moldes do sistema francês, o ato normativo é enviado ao Tribunal Constitucional, antes da promulgação, para que avalie sua constitucionalidade. São legitimados para propor o controle preventivo o Presidente da República, Ministros da República, Primeiro-Ministro e 1/5 dos deputados da Assembléia da República.
A norma declarada inconstitucional pelo Tribunal, cuja declaração for afastada pela Assembléia da República (Art. 279, Constituição Portuguesa), poderá ser reapreciada em eventual controle repressivo conforme esclarece Canotilho : "O Tribunal Constitucional pode sempre vir a considerar, em controlo sucessivo, de novo inconstitucionais, as normas já objecto de idêntica decisão em sede de controle prévio" (12)
O controle abstrato das normas é realizado por um Tribunal Constitucional à semelhança do modelo austríaco. Dispõe o art. 281.1 (Fiscalização abstracta da constitucionalidade e da legalidade) da Constituição Portuguesa:
"1. O Tribunal Constitucional aprecia e declara, com força obrigatória geral:
a) A inconstitucionalidade de quaisquer normas;
b) A ilegalidade de quaisquer normas constantes de acto legislativo com fundamento em violação de lei com valor reforçado;
c) A ilegalidade de quaisquer normas constantes de diploma regional, com fundamento em violação do estatuto da região ou de lei geral da República;
d) A ilegalidade de quaisquer normas constantes de diploma emanado dos órgãos de soberania com fundamento em violação dos direitos de uma região consagrados no seu estatuto." (13)
O controle de constitucionalidade concreto ou difuso é previsto pelo art. 204 da Constituição Portuguesa, litteris:
"Nos feitos submetidos a julgamento não podem os tribunais aplicar normas que infrinjam o disposto na Constituição ou os princípios nela consignados." (14)
Deste modo, o poder judiciário português detém competência para apreciar questões constitucionais, embora a declaração definitiva esteja a cargo do Tribunal Constitucional. Ricardo Fiúza sintetiza a questão:
"Em resumo, cabe recurso para o Tribunal Constitucional das decisões de 1º grau e de 2º grau que recusem a aplicação de qualquer norma com fundamento em sua inconstitucionalidade; que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo; ou que apliquem norma anteriormente julgada inconstitucional pelo próprio Tribunal Constitucional" (15)
Destaque-se, ainda, interessante previsão constitucional portuguesa (art. 281.3) que dispõe: "O Tribunal Constitucional aprecia e declara ainda, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade ou a ilegalidade de qualquer norma, desde que tenha sido por ele julgada inconstitucional ou ilegal em três casos concretos" (16)
Por fim, a Constituição Portuguesa prevê a inconstitucionalidade por omissão (art. 283) em relação às medidas legislativas necessárias para tornar exigíveis as normas constitucionais. Declarada a inconstitucionalidade por omissão será dada ciência ao órgão legislativo competente.
Em relação à inconstitucionalidade por omissão Canotilho e Moreira comentam:
"o princípio da constitucionalidade não diz respeito apenas às acções do Estado; abrage também as omissões ou inacções do Estado. A Constituição não é somente um conjunto de normas proibitivas e de normas de organização e competência (limite negativo de actividade do Estado): é também um conjunto de normas positivas, que exigem do Estado e dos seus órgãos uma actividade, uma acção (limite positivo da actividade do Estado). O incumprimento dessas normas, por inércia do Estado, ou seja, por falta total de medidas (legislativas ou outras) ou pela sua insuficiência, deficiência ou inadequação, traduz-se igualmente numa infracção da Constituição – inconstitucionalidade por omissão" (17)
No Brasil, a doutrina do controle de constitucionalidade encontrou chão fértil para o aperfeiçoamento de suas teorias. Pode-se dizer que sistema brasileiro é um dos mais avançados do mundo, conseguindo a junção dos diversos tipos de controle com eficiência singular. Nessa esteira, Ricardo Fiúza conclui:
"O sistema está muito bem estruturado na Constituição. [...] Nós, brasileiros, temos o uso e o vezo de criticar tudo que é nosso, preferindo quase sempre o importado. Entendemos que, em matéria de controle de constitucionalidade, não podemos nos queixar" (18)
O modelo brasileiro consagra o sistema preventivo, o controle concreto, o abstrato, inconstitucionalidade por omissão, inconstitucionalidade interventiva.
O controle preventivo é exercido pelo Legislativo através das Comissões de Constituição e Justiça, que avaliam a compatibilidade do projeto de lei com a Carta Magna. Exerce, também, controle preventivo o Poder Legislativo através do veto jurídico (art. 66, §1º, Constituição Federal).
No controle jurisdicional difuso, todos os juizes detêm competência, incidenter tantum, para analisar a constitucionalidade da lei, à semelhança do que ocorre no sistema norte-americano. Nos tribunais, a inconstitucionalidade só poderá ser declarada pela maioria absoluta dos membros dos tribunais, ou dos integrantes de órgão especial (cláusula de reserva de plenário). No controle difuso o Senado Federal poderá suspender a execução da lei no todo ou em parte, vejamos:
"Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal:
............................
X - suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal;" (19)
Há controvérsia se esse dispositivo consagra a obrigação do Senado Federal em suspender a execução da lei, ou se está enquadrado dentro de sua discricionariedade.
"Alguns autores opinam que o Senado não exerce atividade discricionária, mas vinculada, estando obrigado a editar a resolução suspensiva. Como diz Lúcio Bittencourt, o ato do Senado não é optativo, mas deve ser baixado sempre que se verificar a hipótese prevista na Constituição: decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal. Alfredo Buzaid, por sua vez, embora advertindo que não se trata de operação ou ofício puramente mecânico, o que reduziria o Senado ‘a simples cartório de registro de inconstitucionalidade’, opina que cabe a ele o dever de suspender a lei ou decreto:’Concorrendo os requisitos legais, não pode o Senado recusar a suspensão, ainda sob a alegação de que a lei deve ser mantida por necessária ao bem-estar do povo, ou à defesa do interesse nacional’." (20)
No entanto, o posicionamento do Supremo Tribunal Federal tem sido firme no sentido de ser uma competência discricionária do Senado Federal, verbis:
"Nossa Constituição proveu [...] com prudência porque estabeleceu que o Senado, tendo em vista a decisão do Supremo Tribunal Federal, pode suspender a execução da lei. Mas fica a critério do Senado verificar se determinado pronunciamento do Supremo Tribunal Federal deve ser entendido como um pronunciamento firme, uniforme. Quem suspende a vigência da lei, em nosso sistema, é o Senado Federal, não o Supremo Tribunal Federal" (21)
Os efeitos da declaração de inconstitucionalidade, no controle difuso, se dá inter partes e ex tunc. Após a suspensão da execução do ato normativo pelo Senado Federal tal decisão terá eficácia erga omnes e ex nunc.
O controle concentrado brasileiro é realizado através da ação direta de inconstitucionalidade (art. 102, I, a, CF), ação direta de inconstitucionalidade interventiva (art. 36, III, CF), ação direta de inconstitucionalidade por omissão (art. 103, §2º, CF) e ação declaratória de constitucionalidade (art. 102, I, a, in fine, EC 03/93, CF).
A ação direta de inconstitucionalidade tem por finalidade declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal, estadual ou distrital (quando o Distrito Federal exerce competência equivalente do estado-membro), em vigor, cuja edição tenha se dado posteriormente à promulgação da Constituição. Ao Supremo Tribunal Federal compete processar e julgar a ação direta de inconstitucionalidade. São legitimados para sua proposição: Presidente da República, Mesa do Senado Federal, Mesa da Câmara dos Deputados, Mesa de Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal, Governador de Estado ou do Distrito Federal, o Procurador-Geral da República, Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, partido político com representação no Congresso Nacional, Confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.
A Contituição de 1988 atribuiu ao Supremo Tribunal Federal a guarda da Constituição e ao Superior Tribunal de Justiça a guarda do ordenamento federal. Recentemente, a Emenda Constitucional nº 45 alterou sensivelmente esse quadro inserindo dentre as competências do Supremo a função de proteger a integridade das leis federais, vejamos:
"Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:
....................................................
III - julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida:
....................................................
d) julgar válida lei local contestada em face de lei federal." (22)
O procedimento da ação direta de inconstitucionalidade foi regulamentado pela Lei 9.868/99, aplicando-se subsidiariamente o regimento interno do Supremo Tribunal Federal. Esta lei dispõe sobre os efeitos da declaração de inconstitucionalidade no controle concentrado. Em regra, a decisão do Supremo possui efeitos erga omnes e ex tunc, expurgando incontinenti o ato normativo do ordenamento jurídico, sem a necessidade de manifestação do Senado Federal. Com o advento da lei 9.868/99 o Supremo poderá alterar os limites temporais da declaração de inconstitucionalidade por voto de 2/3 dos seus membros:
"Art. 27. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de 2/3 (dois terços) de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado" (23)
A ação direta de inconstitucionalidade interventiva tem por finalidade assegurar a integridade da federação, pois busca a declaração de inconstitucionalidade da lei estadual e a decretação de intervenção federal no estado-membro, desde que haja infringência dos chamados princípios sensíveis (art. 34, VII, Constituição Federal).
A ação de inconstitucionalidade por omissão visa dar efetividade aos direitos constitucionais carentes de regulamentação legislativa. Prevê o art. 103, §2º da Constituição Federal: "Declarada a inconstitucionalidade por omissão de medida para tornar efetiva norma constitucional, será dada ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias." (24)
A ação declaratória de constitucionalidade, introduzida por ocasião da Emenda Constitucional nº 03/1993, destina-se a afastar a incerteza sobre a validade de determinada lei federal. Após a Emenda Constitucional nº 45, os legitimados para a propositura desta ação são os mesmos da ação direta. O Min. Néri da Silveira ponderando acerca do objeto da ação declaratória de constitucionalidade afirma:
"não se trata de consulta à Suprema Corte, mas de ação com decisão materialmente jurisdicional, impõe-se, à instauração de demanda em exame, que se faça comprovada, desde logo, a existência de controvérsia em torno da validade ou não da lei ou ato normativo federal" (25)
Os efeitos da decisão da ação declaratória são erga omnes e ex tunc, vinculando todos os órgãos do poder executivo e judiciário.
O Direito Constitucional Brasileiro prevê, ainda, a argüição de descumprimento de preceito fundamental, que foi regulamentada pela Lei 9.882/99. Tal instrumento visa "evitar ou reparar lesão a preceito fundamental, resultante de ato do Poder Público" (26) e ainda "quando for relevante o fundamento da controvérsia constitucional sobre lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal, incluídos os anteriores à Constituição" (27). Cabe ressaltar, que esta argüição possui caráter subsidiário, ou seja, só poderá ser manejada quando não houver outro meio de sanar a lesividade.