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Direito e justiça:

uma relação tormentosa, mas necessária

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07/02/2007 às 00:00
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Sumário:Introdução; 1 Os filósofos e as visões da justiça; 2 "Conceitos" de justiça; 3 A Eqüidade e a Justiça; 4 Arbitrariedade e a justiça; 5 Elementos da justiça na sua manifestação existencial; 6 Justiça como um valor; 7 Justiça como um princípio.


Introdução

O direito e a justiça são categorias que, ao longo da história, têm-se colocado ora em lados antagônicos, ora ao mesmo lado. Dá-se o antagonismo quando os ideais de justiça não encontram respaldo na ordem posta. Ocorre a parceria no momento em que a justiça respalda uma ordem positiva ou quando esta ordem a persegue como um fim.

O antagonismo e a parceria revelam uma simbiose entre os dois conceitos. Distingui-los: eis um dos desafios da filosofia, máxime a filosofia do direito.

No que pese o imbróglio, na língua latina, tanto o direito como a justiça possuem uma origem etimológica comum. A expressão é o ius. No grego ocorre o mesmo, com relação ao termo to dikaion (direito) e ao termo dikaio-sunê (virtude de justiça), como atesta Michel Villey. [01] Estas expressões, na tradição ocidental, servem para designar tanto o direito como a justiça. A origem comum, do ponto de vista etimológico, revela pontos de intersecção no surgimento das duas categorias. É o que atesta Tércio Sampaio Ferraz Júnior. [02]

Os romanos, entretanto, perceberam que nem todo direito posto é justo. Tal constatação encontra-se, séculos antes, no povo grego, como retrata Sófocles, na obra Antígona. Nesta peça, a protagonista, Antígona, filha de Édipo, se opõe à ordem imposta por seu tio, rei Creonte, por reputá-la injusta. [03] Entre o povo hebreu também. Na Bíblia, encontram-se inúmeros relatos sobre a oposição dos profetas às ordens impostos pelos mais diversos soberanos. Esta oposição tem acompanhado a humanidade em seu percurso histórico.

Com relação ao direito, há um certo consenso. Tem-se este como o conjunto de regras que regulam a convivência social, positivada pelo Estado. Diz-se positivada para separar o direito dos demais tipos normativos, como a moda, a etiqueta, a religião, a moral, a economia etc. A relação entre o direto positivo e a justiça está no vínculo fim-meio.

Saliente-se, por oportuno, que existem correntes teóricas que vislumbram a existência de um direito não-estatal. No caso, o denominado direito alternativo, que consiste na idéia de que há um direito não criado pelo Estado, mas no meio social, que regula, da mesma forma, coercitivamente, a conduta humana. Não é transcendente, mas imanente, emergente, insurgente, achado na rua. Este direito é considerado, para os seus defensores, vivo, pois, além de atuante, encontra-se em permanente formação. Para esta concepção, a sociedade, em sua marcha histórica, desenvolve formas distintas de soluções de conflitos. Este direito pode ter uma configuração democrática, com também bárbara, como as regras constituídas nas delegacias, prisões, criminalidade organizada etc. [04] Quando vinculado com os anseios legítimos da comunidade, há uma nítida relação com o ideal de justiça.

O direito natural, que é transcendente, nas suas mais diversas manifestações, acaba tendo um vínculo intrínseco com a justiça, melhor dizendo, com uma das acepções da justiça. Ele encampa uma ordem transcendental pautado supostamente na justiça. Por esta razão, este está mais relacionado com o ideal de justiça, mesmo que de forma ideológica.

Com isso se percebe que a justiça se relaciona com as mais diversas formas de manifestação de direito. Neste passo, há hoje inúmeras acepções para a categoria justiça. Eis a dificuldade. Não há falta de definição, mas abundância. Nada obstante, esta dificuldade deve ser ultrapassada para se poder qualificar uma ordem jurídica como justa ou injusta.


1. Os filósofos e as visões da justiça

A justiça tem sido trabalhada por teórico de diversos matizes na história. Eis algumas contribuições.

Em Platão, a justiça é posta como virtude subjetiva. [05] É a saúde da alma, o caminho para o reto viver, para a felicidade do indivíduo e do Estado. Sendo virtude, esta se manifestava em graus distintos nas pessoas. Para ele, preponderava no guerreiro a virtude da coragem, no artífice, a temperança, enquanto que, no sábio, a justiça. Desta forma, competia ao sábio a gestão da cidade. Acerca de Platão, Hans Kelsen vaticina que este teórico derivava a justiça da idéia do bem, com se vê no seguinte excerto: "o bem é, assim, o cerne da justiça, e por isso, aliás, Platão freqüentemente identifica esta com aquele". [06]

Com relação a Aristóteles, há uma correção de rumo. Para ele a justiça consiste no termo médio - aquilo que se encontra entre os vícios do excesso e da escassez. [07] Em Aristóteles, a eqüidade é uma forma de justiça. Nela se verifica o caso concreto, buscando-se a solução mais adequada. [08] Aristóteles a compara à régua de chumbo usada nas construções lésbias, que, por não ser rígida, se adapta às formas irregulares das pedras. Esta régua é também chamada de "Régua de Lesbos". Enquanto que a justiça é a uma medida abstrata, a eqüidade dirige-se à concreção do fato. [09] Miguel Reale acrescenta, com esteio em Aristóteles, [10] que a justiça consiste na expressão ética da igualdade. No mesmo sentido, mas buscando o lastro nos pitagóricos, encontramos Alf Ross. [11]

No referido filósofo grego, percebe-se o caráter axiológico da justiça. Ou seja, uma qualidade atribuída a uma conduta ou a uma norma. Há também a versão da justiça como virtude, de forte influência platônica, pois ela se confunde com a reta disposição da alma. No âmbito social, o estagirista, pautado na natureza política do ser humano, vislumbra, na justiça, ora um caráter comutativo ou sinalagmático [12], ora um caráter distributivo. [13]

Os romanos não se preocuparam em formular um conceito universal de justiça contentando-se na célebre frase de Cícero reproduzida por Ulpiano em que "iustitia est constans et perpetua voluntas ius suum cuique tribuendi" ("justiça é a vontade constante e perpétua de dar a cada um o seu direito"). [14]

Em Santo Tomás De Aquino [15], há a junção das concepções anteriores. Nele há a idéia da justiça como virtude subjetiva, de Platão; a idéia social da justiça, na versão aristotélica; e a visão dos romanos, como acima relatado. Com base nesses dados, postulou que havia três formas de manifestação da justiça. A primeira denominou de comutativa ou sinalagmática, como a devida nas condutas entre os particulares; a segunda como distributiva, devida pela coletividade ao particular e, por último, segundo relato de Enrique R. Aftalion, a justiça social ou geral ou legal, como a devida por todos os indivíduos à comunidade. [16]

Nas escolas jusnaturalistas modernas (Grócio, Hobbes etc.), a justiça decorre da denominada natureza racional do homem.

Com relação a Kant, a justiça vai possuir como lastro demarcador o imperativo categório, cujo enunciado pode ser assim descrito "age como se a máxima da tua ação devesse se tornar, pela tua vontade, lei universal da natureza". [17] A autonomia da vontade é livre e autolegislativa. Tem-se aqui uma visão nitidamente individual do princípio da justiça. Nesta versão resta evidenciado a vontade individual impulsionada pela razão no sentido de determinar qual a regra de justiça. Eis a razão prática.

O neokantiano Hans Kelsen rejeita a idéia de uma justiça absoluta. Pauta-se na máxima romana summum jus, summa injuria. Afirma que a idéia de justiça está na busca que todo homem tem pela felicidade. Acrescenta que esta deve ser vista do ponto de vista coletivo. A felicidade social só será possível, segundo o jusfilósofo de Praga, em uma ordem justa.

No Brasil, Pontes de Miranda, entende que o direito é regra de adaptação social, não sendo o Estado quem cria o direito. Ele é descoberto, revelado, na realidade social. Partindo desta premissa, entende que uma ordem jurídica é injusta pelo fato de a linguagem humana ser imperfeita para reproduzir a realidade. [18] Aqui o problema se dá na produção legislativa, a injustiça se dá no plano político do direito. Entende, também, que haverá injustiça quando o aplicador não aplica corretamente a regra jurídica. Neste caso, o problema ocorre na fase da aplicação.

Na Argentina, Aftalion, Vilanova e Raffo, em clássica obra "Introducción al derecho", entendem que a justiça não pode ser vista como um fim, no sentido de término, chegada, pois, uma vez alcançada, não haveria mais o que perseguir, porém como fim no sentido axiológico, ou seja, algo que é buscado pelo direito. Neste caso, o direito deve buscar ser justo. Eis o valor do fim. Acrescenta que a justiça, enquanto situação objetiva, não é uma virtude. Um homem é justo porque pratica a justiça. Esta justiça é vista no plano individual, subjetivo. Platão tinha esta visão, tendo influenciado Aristóteles e Santo Tomas de Aquino. Justiça é um valor social, pois bilateral. Dar-se frente ao outro, dirigindo-se à conduta em sua interferência intersubjetiva (Carlos Cossio). Acrescenta que a justiça é um valor supremo, central, mas não o único, no universo social. [19]

Outra doutrina de justiça é a veiculada por Jonh Rawls. Este parte da doutrina aristotélica de igualdade, como eqüidade, além da justiça distributiva, bem como da visão de contrato social de Lock, Rousseau e Kant. O contrato social, entretanto, não é visto como fundante do Estado, mas como acordo dos membros da comunidade com base em princípios da justiça. É pressuposto, para tanto, que os pactuantes partam de um lugar comum, qual seja, a igualdade de condições. Sendo necessário para a sua configuração que os acordantes não conheçam a sua posição originária, ou seja, não saber se é rico, pobre, feliz, triste etc. Nesta situação, as pessoas estariam encobertas pelo que denominou de "véu da ignorância". A partir desta posição seria possível um acordo pautado na justiça. Pode-se acrescentar, ainda, que todos os valores devem ser distribuídos igualmente, salvo se a distribuição desigual redundar em benefícios para todos. Para ele a justiça é norteada pelos seguintes princípios:

a- cada pessoa terá direito a gozar das liberdades de forma mais extensa que seja compatível com a liberdade similar a dos demais;

b- as desigualdades sócio-econômicas são justificáveis desde que sejam vantajosas a todos e que sejam vinculadas a posições e funções acessíveis a todos. [20]

Outra versão é a de Pound. Na esteira do pragmatismo americano, considera a justiça a administração da solução que não afete a comunidade toda.

Noutra linha, surge Habermas com outra idéia de justiça. Para ele o direito funda-se entre a facticidade – quando as normas surgem do desígnio de um legislador político e cumprido em face da ameaça de sanção fundada no monopólio da força pelo Estado (o direito positivo) – e a validade – quando a normatividade é pautada em argumento racional ou aceitável. No direito, afirma, tem-se estes dois elementos. Há caráter sacionador e caráter autolegislador, já que o poder emana do povo. A tensão é resolvida, em Habermas, pela razão comunicativa. Esta distingue-se da razão prática de Kant. No idealista alemão, razão prática consiste em uma aptidão individual do sujeito que retira de sua conduta concreta a normatividade abstrata (imperativo categórico). Já a razão comunicativa baseia-se na pluralidade de indivíduos livres e iguais, orientados por procedimentos discursivos chegam à norma. Ou seja, através da linguagem, os agentes sociais interagem e fundamentam racionalmente suas pretensões. Mais. A justiça terá sempre por base um poder comunicativo jurígeno – criador do direito. [21]

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2. "Conceitos" de justiça

[22]

Diversos critérios foram construídos para identificar o que é justiça. Perelman identifica algumas formas de manifestação da justiça. Ei-los: a cada qual a mesma coisa; a cada qual segundo seus méritos; a cada qual segundo suas obras; cada qual segundo suas necessidades; cada qual segundo sua posição; e a cada qual segundo o que a lei lhe atribui. [23]

Analisando o primeiro critério – a cada qual a mesma coisa - é eminentemente formal. Neste, todos são tratados da mesma maneira, não se verificando as particularidades que distinguem os indivíduos. No senso comum, a morte é o sumo da justiça, pois esta atinge a todos, sem distinção.

No segundo critério - a cada qual segundo seus méritos -, não há espaço para a igualdade formal. O sujeito será medido pela sua virtude. Nesta versão, a justiça ficará ao talante do juízo moral do julgador que irá pesar o que reputa mérito ou demérito. Este terá que julgar a intenção do agente. Para os que acreditam no deus semita – Javé ou Alá – esta é a maneira que se separará o joio do trigo. Aqui se tem a justiça distributiva, já preconizada por Aristóteles.

Quanto à terceira corrente – a cada um segundo suas obras – tem-se uma determinação da justiça de forma objetiva. Esta não está baseada na igualdade ou no valor moral – intenção -, mas pautado no resultado da ação. Tem-se um tratamento compatível com o que fora produzido pelo indivíduo. Utiliza-se esta forma de justiça nos concursos, competições, concorrências etc. Vê-se aqui a justiça no socialismo, ou seja, a sociedade em transição para o comunismo.

Na outra formulação – a cada um segundo suas necessidades – há a valorização da existência digna do homem. Neste ponto, há uma aproximação do justo à caridade. A justiça aqui vem compensar a impossibilidade de alguns em garantir a própria existência. Afinal, quem pede esmola, não pede dinheiro, pede que o potencial doador lhe permita continuar existindo. Este contorno do justo fundamenta a denominada legislação social que, de certa forma, para muitos, contrapondo-se à economia liberal, tem buscado garantir melhores condições de vida aos trabalhadores, como se vê nas legislações sobre o salário mínimo, seguro desemprego, auxílio doença etc. Aqui se tem a justiça caridade. A vertente que irá prevalecer no comunismo.

Passando-se ao quinto critério – a cada qual segundo a sua posição – percebe-se, na sua configuração, uma fórmula aristocrata. A demarcação do justo depende da classe que pertença determinado sujeito. Este sistema não deve prevalecer em um Estado republicano, máxime, sob o regime democrático.

Na última configuração – a cada um segundo o que a lei lhe atribui -, tem-se a célebre definição de Cícero, difundida por Ulpiano, anteriormente citada, onde se define justiça como sendo "justiça é a vontade constante e perpétua de dar a cada um o seu direito". Haverá justiça se o responsável aplicar a situações idênticas a mesma lei. Com relação a esta característica, ser justo é aplicar o direito positivo, enquanto que ser injusto consiste em distorcer esse direito. João Mangabeiras, quanto a esta definição lançou o seguinte rechaço:

Porque se a justiça consiste em dar a cada um o que é seu, dê-se ao pobre a pobreza, ao miserável a miséria e ao desgraçado a desgraça, que isso é o que é deles. Nem era senão por isso que ao escravo se dava a escravidão, que era o seu, no sistema de produção em que a fórmula se criou. Mas bem sabeis que essa justiça monstruosa tudo pode ser, menos Justiça. [24]

Estas versões de justiça são consideradas por Perelman como espécies de Justiça Concreta. A partir delas, retirando aquilo que lhe é comum, chega-se ao conceito de Justiça Formal, cujo marco determinativo é a igualdade. Há um nítido retorno a Aristóteles. Na primeira e na sexta noção de justiça, há a marca da igualdade formal; nas demais, de certa forma, uma igualdade material. Eis o conceito de Justiça Formal: "princípio de ação segundo o qual os seres de uma mesma categoria essencial devem ser tratados da mesma forma". [25] A igualdade aqui é uma conseqüência lógica. Haverá justiça toda vez que aplicarmos a mesma regra a uma categoria essencial.

Após esta formulação, entende-se que o direito não se contrapõe à justiça formal, este a realiza. A contraposição, entretanto, pode ocorrer com relação à concepção concreta de justiça eleita.

A aplicação da justiça formal depende, entretanto, da delimitação da denominada "categoria essencial". Para Perelman, esta categoria será determinada pela escala de valores vigentes em uma determinada sociedade. Esta escala é histórica. O cristianismo eliminou a distinção entre bárbaros, nacionais, livres e escravos. Criou uma nova. Crentes e gentios. Esta é a que conta para a justiça divina pois, "quem crer e for batizado será salvo, quem não crer será condenado" (Jesus Cristo, no evangelho de São Marcos, cap. 16, versículo 16). Na revolução francesa, estabelece-se a idéia de cidadão iguais perante a lei. Tal construção se opõe ao do antigo regime que distinguia os seres humanos entre nobres, clérigos e servos. O Estado liberal busca uma liberdade formal. O Estado social visa à justiça como veículo de participação de todos nos bens da nação e assim por diante, segundo conceituação corrente.


3. A eqüidade e a justiça

Afirma Perelman que a eqüidade é a muleta da justiça. Por que a justiça precisa de muleta? Por que, na maioria das vezes, as categorias essenciais são colidentes. A aplicação da justiça formal muitas vezes não é possível. Faz-se necessário, assim, lançar mão de outro instrumento, a eqüidade. Neste caso, necessário se faz a "Régua de Lesbos". Exemplo: se existem dois trabalhadores, cuja produção é idêntica, deve-se remunerá-lo da mesma forma – eis o primado "a cada um segundo as suas obras". Entretanto, se um deles é arrimo de uma grande família, este deverá ser remunerado de forma distinta, se for seguido o postulado "a cada um segundo a sua necessidade". Só haverá aplicação da justiça formal se o dois forem arrimos de uma grande família ou se os dois forem solteiros. Havendo diferença, sempre haverá conduta injusta por conta do patrão.

Esta antinomia só poderá ser superada pela utilização da eqüidade. Neste caso, deverá se escolher dentre as soluções concretas qual a que melhor irá adequar-se à escala de valores vigente. Esta escolha, no caso concreto, deverá tomar em consideração a necessidade, a adequação e a razoabilidade.


4. Arbitrariedade e a justiça

Um regra é arbitrária quando não for suscetível de justificação. Alf Ross indica que a justiça é conduta contrária à arbitrariedade e que haverá justiça toda vez que uma regra for aplicada corretamente. Neste caso, adverte o jusfilósofo dinamarquês, a justiça é intrasistêmica. [26]

Isso significa que justificar consiste em demonstrar que uma regra deriva de outra mais genérica, integrante de uma categoria mais vasta, como difundido por Hans Kelsen. [27] O casuísmo é injustificável. Desta forma um ato arbitrário concreto não pode se coadunar com a justiça formal. Não há derivação entre um e outro.

Todavia, há arbitrariedade na justiça. A verificação de uma conduta ou norma como justa decorre do fato de esta está pautada em uma regra. Esta regra, em última análise, possui o valor justiça como ponto de referência. Aqui se vai da concreção à abstração. Este ponto de parada é arbitrário. Mesmo no valor justiça. É ínsito a esta categoria. Por ser arbitrário, não há justificação.

Por que prevalece, em um dado momento histórico esta categoria essencial e não aquela outra? A esta pergunta responder-se-á: porque, neste momento histórico, o valor que prevalente é este. Esta escolha não é pautada em dado científico e nem em dado lógico, mas, como dito, de forma arbitrária. Por ser arbitrário, é precário. Muda-se ao sabor da escolhas históricas da humanidade. Acrescenta-se, ainda, que, em um mesmo momento histórico, esta prevalência pode não está clara, como no momento atual. Neste caso, o valor justiça eleito pode ser qualquer um dos critérios explicitados no tópico 3.

Desta forma o ideal de justiça é arbitrário. Dele se deriva a justiça das condutas concretas.

Saliente-se. A arbitrariedade é da escolha do critério e não de sua aplicação no caso concreto. Em outros termos, a escolha, por exemplo, entre o critério "a cada um segundo o que a lei lhe atribui" e o critério "a cada um segundo seu mérito" é arbitrária. Após a escolha, sua aplicação é vinculada, sob pena de se incorrer em injustiça.

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Sobre o autor
Beclaute Oliveira Silva

Doutor em Direito (UFPE). Mestre em Direito (UFAL). Professor da FDA/UFAL. Membro do IBDP e da ABDPC.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Beclaute Oliveira. Direito e justiça:: uma relação tormentosa, mas necessária. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1316, 7 fev. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/9466. Acesso em: 29 mar. 2024.

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