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Justiça do Trabalho.

Breve reflexão sobre a sua crise e apontamentos sobre novos rumos para um sistema judiciário do trabalho

Justiça do Trabalho. Breve reflexão sobre a sua crise e apontamentos sobre novos rumos para um sistema judiciário do trabalho

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INTRODUÇÃO

O objetivo do presente texto é estabelecer, em primeiro plano, compreensão e relação entre a crise do modelo clássico de emprego como corolário das mudanças econômicas e tecnológicas que trouxeram novas formas de organização da produção e da divisão internacional do trabalho, e a crise do Poder Judiciário Trabalhista brasileiro; num segundo plano, mas não de forma secundária, apontar os delineamentos que nos permitam, a partir da percepção desta crise, vislumbrar novos horizontes de atuação do judiciário trabalhista.

Temos como premissa básica que, apesar da característica universal do modo de produção capitalista, em que os trabalhadores são possuidores da mão de obra e os capitalistas dos meios de produção, e embora, no mundo existam diferenciais de desenvolvimento econômico, na atualidade, todos os países encontram-se intimamente interligados por meio das teias internacionais do capitalismo, representado exemplarmente pela figura de espectro do FMI, que assombra os Estados Nacionais.

Esta configuração do capitalismo internacional, onde os investimentos financeiros parecem adquirir vida própria independente da produção de bens de consumo, aliada a uma superação do modelo de produção centrado na grande indústria fabril e onde o trabalho com grande capital morto (robótica, microinformática,) torna-se o meio mais adequado às modernas exigências de lucro do capitalismo, traz um impacto profundo sobre a forma e organização do modelo clássico de emprego e que vai ter especial impacto sobre um modelo judiciário que justamente foi forjado sobre estes elementos que hoje encontram-se em crise.


1. PREMISSAS HISTÓRICAS DA CRISE DA JUSTIÇA DO TRABALHO

1.1.Trabalho e emprego - Elementos de transformação

Cumpre observar, antes de qualquer coisa, que o papel dos sujeitos a que se dirige a tutela do judiciário trabalhista não é o mesmo de quando do seu surgimento, o que pode ser observado de forma clara pela performance que, no decorrer da história, vem sendo mostrada pela classe operária, como autêntico fruto do capitalismo e da revolução industrial.

Dada característica universal do meio de produção capitalista, ou, na palavra da moda, o caráter global do capitalismo, podemos ver no mundo o fenômeno de que cada vez mais o trabalho manufatureiro, centrado na grande indústria fabril, perde espaço de relevância, onde, cada vez mais, o trabalho, com grande capital morto, torna-se o meio mais adequado às modernas exigências de lucro do capitalismo moderno, o que leva a profundo impacto sobre a forma e organização do papel da classe operária no mundo moderno.

          Noção de trabalho e crise

Em nossa percepção atual, parece ilusório pensar que, mesmo daqui a mil anos, possa existir uma sociedade onde o trabalho humano seja desnecessário, onde somente as máquinas trabalhem, e o homem seja todo gozo. Aliás, há filosofias que sustentam a possibilidade de uma composição orgânica e techno na formação do homem do futuro (1), que lhe faça transcender todas as suas limitações de existência.

Embora tecnicamente possível em menos de um milênio, entendemos que sempre existirá uma ética do trabalho intrinsicamente ligada às formas de organização da sociedade humana, mas que varia sua apresentação de acordo com o desenvolvimento dos meios de produção.

Basta, para tanto, lembrar que a concepção de trabalho sempre esteve presente onde exista o homem em relação com a natureza, que, mesmo na Bíblia, onde existia apenas Adão e Eva, ainda que permeado da idéia de um mal, o trabalho surge como o meio de viabilização da manutenção do homem com a sua própria atividade de relação com a natureza, com o seu próprio suor, pois Deus deixa de tudo lhe aprouver ao provar do fruto proibido.

Assim, vemos que a relação do homem com a natureza, a partir da noção de trabalho, é uma relação que rompe com o divino, sendo o trabalho a ponte de relação entre o homem e a natureza, onde Deus vai sendo cada vez mais afastado, à medida que o controle do homem sobre a natureza vai se afirmando (2). Assim, se pensarmos que a natureza sempre vai existir, temos que o trabalho humano também, ainda que aquela corra risco de ser destruída por esta atividade do homem.

Logo, o trabalho é criação especificamente humana, pois o divino não trabalha, não transforma a natureza, mas sim a cria ou a elimina, a exemplo de Lúcifer. Somente ao homem é possível a noção de transformação para criar, ainda que isto leve à destruição parcial, a fim de atender as suas necessidades, afinal Deus não tem necessidades.

Embora a noção de trabalho esteja até mesmo lingüisticamente ligada à noção de pena, sofrimento, a grande característica que possui na modernidade é a sua concepção como meio de formação da natureza humana.

Devemos registrar, entretanto, que nem sempre foi assim. Como podemos verificar, na antigüidade grega o trabalho era considerado atividade inferior, a que somente os espíritos inferiores deveriam se dedicar, inclusive daí a noção de que a filosofia é fruto do ócio, o que na verdade prende-se à idéia de trabalho como atividade manual, e, justamente na atualidade, temos a crise do trabalho, como atividade manual.

Cabe-nos, assim, primeiramente, delimitar como se manifesta essa crise, os seus limites e elementos caracterizadores, pois surge nova concepção de trabalho. Estamos num momento de encruzilhada histórica de redefinição do valor trabalho. Assim, temos uma época de incertezas.

Como os campesinos no fim do feudalismo, e os trabalhadores artesãos na época de nascimento da revolução industrial sentiam-se deslocados e sem lugar na sociedade do trabalho, também hoje, vemos a grande massa trabalhadora operária formada sob o sinal da grande indústria, centrada na unidade fabril, perdida sob que rumo tomar dentro da nova conjuntura que se apresenta.

Com o surgimento do capitalismo e a mudança radical que traz ao mundo do trabalho, rompendo os laços de servidão, trazendo à tona o homem plenamente "livre" para contratar com quem desejasse, retirando dos trabalhadores o controle sobre todos os meios de produção, torna-se, assim, possível a fase de explosão do novo sistema, existindo as bases jurídicas para acomodar a chamada Revolução Industrial.

O desenvolvimento do capitalismo tem o seu ápice como modo específico de produção, com a explosão da Revolução Industrial, século XVIII, onde o homem conseguiu estabelecer um controle sobre a natureza nunca antes imaginado.

O rompimento da distinção antes clássica entre trabalho e conhecimento, que ainda se faz presente em alguns setores de nossa sociedade, cada vez mais perde espaço. Estamos hoje numa encruzilhada, ainda por superar este postulado da assim chamada indústria moderna, que forma a nossa sociedade industrial, mas que vem sendo modificado há algumas décadas, e, por isso, temos modificação substancial do papel da principal classe que a compõe, que é a classe operária.

          Características da sociedade industrial .

A sociedade industrial, que hoje está em crise, teve o seu boom nas décadas de 30 a 60, chamada época de ouro, e começou a ter o seu declínio a partir da década de 70, declínio esse que se acelera a cada ano.

A sociedade industrial (3) a que nos referimos, tem as seguintes características fundamentais, possuindo como espaço por excelência do trabalho:

1- A Empresa Industrial Capitalista - cujo paradigma é a fábrica -, que se caracteriza por ser instituição separada da unidade produtiva familiar.

2- Trabalhador (manual) assalariado - que detém somente a sua força de trabalho, e pode vende-la livremente como mercadoria no mercado.

3- Mercado de Trabalho- local onde capitalista e trabalhador se encontram para, respectivamente, comprar e vender a mercadoria força de trabalho.

4- Ética do Trabalho - serve de base justificadora de uma moral, não apenas da necessidade e do dever de trabalhar, mas toda uma teia de relações que mobiliza as instituições da sociedade.

Esta sociedade industrial, que podemos chamar de sociedade do trabalho industrial, surgiu com a revolução industrial, teve seu universalismo fixado a partir principalmente do pós-guerra da 2ª grande guerra. Sociedade para a qual a fábrica se constitui na unidade básica mais importante de produção e, assim, o trabalhador manual é o principal agente no processo de transformação da natureza e o principal sujeito desta sociedade.

Percebe-se que a sociedade industrial caracteriza-se por possuir lugar por excelência da sua manifestação, que é a Fábrica, um microcosmo, onde se realiza a divisão técnica do trabalho. Dentro desse microcosmo, encontram-se os sujeitos principais desta sociedade, os trabalhadores operários, que possuem local de trabalho que não se confunde com o seu ambiente familiar.

Assim, como bem frisou Daniel Bell, a sociedade industrial traz a noção de forma de organização social onde o trabalho ocupa lugar central na vida dos indivíduos, e, por isso, pode ser chamada de sociedade de trabalho (4).

Até pouco tempo, e desde o início do desenvolvimento da Revolução Industrial, a empresa industrial capitalista - para a qual a fábrica é a figura paradigmática - tornou-se o modelo a ser generalizado para o conjunto das relações sociais.

Uma vez que o trabalho fabril se tornou o princípio organizador fundamental das relações sociais, sendo o meio pelo qual os indivíduos adquirem existência e identidade social pelo exercício de uma profissão (5), permitiu a percepção de que havia um conjunto de sujeitos que eram o sustentáculo desta sociedade: a classe operária.

Na esteira deste fato, da importância da classe operária, aquela que desenvolve atividades manufatureiras dentro do núcleo fabril, vislumbrou-se o surgimento de teorias que explicavam esta sociedade, a partir do papel exercido por esta classe, dentro do sistema produtivo, a exemplo a Marx, Weber ou Durkheim (6).

A sociedade industrial baseada em tecnologia mecânica, em que o capital e o trabalho são as principais características estruturais, foi resultado do grande crescimento mundial da economia, como resultado do desenvolvimento do modelo de produção em massa de Henry Ford e de Taylor, que se espalhou para as indústrias do mundo, e de nova expansão do capitalismo internacional. Destaca-se que, na época do pleno emprego, do boom do capitalismo industrial, nos países centrais as taxas de desemprego eram muito baixas, pois alcançavam pouco mais de 1,5% na Europa da década de 60, e 1,3% no Japão. (7)

No entanto, este modelo começou a entrar em declínio, sendo que há algumas décadas passou a se acelerar este processo, pois o aumento das forças produtivas, levou ao desenvolvimento de uma tecnologia, que, superando os processos de trabalho tayloriano e fordiano, cujo ritmo de trabalho dos operários determina o ritmo da produção e o rendimento efetivo obtido (8), pôde produzir em velocidade nunca antes imaginada, como conseqüência da tecnologia da informática, robótica etc.

          A nova sociedade pós-industrial

A nova sociedade, que hoje começa a se delinear, é fruto direto da revolução na base técnica da produção, decorrente da informatização, microprocessamento, biotecnologia e tecnologia informacional, porque a nova capacidade tecnológica libertada é conjugada à nova expansão do capitalismo internacional, onde as fronteiras nacionais pouco significam dentro do mercado mundial, cada vez mais dominado pelas regras do sistema financeiro internacional.

Esta nova sociedade, que vem substituir a sociedade industrial, funda-se sobre a existência de uma economia global que se organiza com altos padrões de produtividade, com crescente agregado de composição orgânica do capital (capital "morto") que torna caríssima a criação de novos postos de trabalho pela mais radical revolução tecnológica já produzida pelo homem (9).

Como o desenvolvimento tecnológico está sendo mais rápido do que a modificação das condições de formação da classe operária, surge o chamado desemprego tecnológico, como conseqüência da necessidade de meios para economizar o uso de mão de obra, superando o ritmo com o qual esta poderia ser ocupada na sociedade industrial (10).

Este é o chamado desemprego estrutural da sociedade pós-industrial, que assim toma as características de verdadeira necessidade e não um acaso ou desvio conjuntural do "capitalismo microeletrônico" da "sociedade informática". (11)

Assim, caracteriza-se esta nova sociedade por ter base de produção de altíssima tecnologia, onde a manufatura, característica da sociedade industrial, já não é relevante, pois o trabalho é desenvolvido em unidades de produção com alta tecnologia, com o uso de pouca mão de obra operária, em que o processo produtivo é todo realizado por robôs e computadores, e o controle da produção é feito por poucos trabalhadores altamente especializados.

Está integração, cada vez mais radical, da ciência com a produção, reforça social e politicamente os proprietários do conhecimento, com a emergência de contigente humano cada vez mais integrado com a inteligência artificial, que gera forte classe trabalhadora especialista (12). Desta forma, a sociedade pós-industrial passa a ser baseada em tecnologia intelectual, informação e conhecimento, com a expansão do setor de serviços, sobretudo pelo incremento de serviços humanos (saúde, educação, serviços sociais) profissionais e técnicos (pesquisa, consultoria, computadores e análise de sistemas), logo, uma espetacular mudança na natureza do trabalho (13) .

          Impacto da sociedade pós-industrial sobre a classe operária

A partir do momento em que se vem afirmando a sociedade pós-industrial, com o conhecimento passando a ser a principal base do desenvolvimento produtivo, e o emprego maciço da informática e microprocessamento no processo produtivo, foi havendo diminuição substancial da f´ábrica, como local aglutinador da classe operária.

Aliás, a classe trabalhadora industrial vem se reduzindo rapidamente há mais de 20 anos, como destaca Tarso Genro. Representa, hoje, menos de 17% da força de trabalho nos EUA, 20% na Grã-Bretanha (contra 30% há dez anos), entre um quarto e um terço nos outros principais países da Europa Ocidental (14)

De fato, a revolução industrial baseada no carvão e na energia elétrica - a produção manufatureira e a maquinofatura -, havia introduzido uma forma de sociabilidade operária que está em declínio no capitalismo avançado. Esta decorria da forma com que a riqueza material era produzida, em que os atos de trabalho são justapostos de forma solidária e aticulada na organicidade da fábrica (15).

O proletariado clássico, cujo exemplo mais forte é o das fábricas de automóveis de Detroit, presentes nas décadas de 50 e 60, como modelo de referência mais completo, reduziu sua importância como ser social para a economia da atualidade, logo, o seu papel também.

Basta lembrar, no caso brasileiro, o exemplo emblemático das greves do ABC paulista que, em plena época de ditadura militar, desencadearam um processo nacional de protestos, mas que hoje em dia, quando se realiza, por assim dizer, o maior declínio nos chamados direitos sociais conquistados, a palavra greve soa como o mais remoto artificio, e a conciliada redução salarial parece ser a saída mais sensata e mesmo heróica. Ainda assim, a greve não ultrapassa nos seus efeitos os portões internos da montadora onde se realiza.

A tradicional classe operária, concentrada em núcleos industriais com centenas de trabalhadores, vai-se tornando rapidamente arcaica perante um futuro em que se consagram a indústria eletrônica e aeroespacial, os serviços de tecnologia sofisticada, a pesquisa científica, a biogenética e a informática como elementos estratégicos da sociedade mundial, integrada cultural e economicamente pelas multi ou transnacionais, e pelo sistema financeiro mundial (16).

A relação solidária para produzir, caracterizada sobretudo pelo espaço da fábrica, criou estilo de vida que começa a desaparecer claramente nos países altamente desenvolvidos, desintegrando materialmente a velha e combativa classe operária (17).

A tendência clara à "terceirização", ao retorno do trabalho domiciliar "tecnologizado" (telecomuter) à separação cada vez mais radical entre a concepção e realização (H. Bravermann), à robotização e à automação, com a conseqüente fragmentação das bases concretas da vida coletiva com suas interferências no afeto, nos valores e nas relações humanas em geral, fazem implodir aceleradamente os fundamentos materiais de todas as teorias sobre o papel da classe operária no capitalismo atual (18).

O aceleramento da produção mundial de bens supérfluos da era eletrônica (ou seja , não imediatamente necessários à simples reprodução da vida), torna mais difícil a vida da classe operária tradicional, como pretendente e capaz de exercer influência estratégica sobre as sociedades desenvolvidas ou em desenvolvimento. O conceito do trabalhador em geral, para a própria política alterou-se radicalmente num mundo submergido em um sistema de valores completamente diferentes daqueles da primeira metade do século (19).

Por outro lado, a nova classe de trabalhadores da sociedade pós-industrial, os trabalhadores de conhecimento, por serem sujeitos que, no dizer de Drucker, possuem seu próprio conhecimento, podendo levá-lo consigo a qualquer parte (20), e, por conta disso, mais capazes objetivamente, são subjetivamente menos interessados em modificar os rumos do "progresso" , tal qual se coloca neste fim de século (21).

A classe operária tradicional perde assim, a condição de ser o fiel da balança na sociedade contemporânea, por já não se situar onde se realiza o progresso e a contínua modernização da sociedade, não ocupando lugar especial que ocupava na produção social, que lhe permitia ser o único desestabilizador radical da ordem capitalista. Não existe a dependência de outrora à sua força de trabalho (22)

Novas classes ou desclassificados da sociedade pós-industrial - A regra da exclusão .

Destaca Peter Drucker que, embora nos Estados Unidos os empregos em manufatura possam ainda ser vistos como um ativo, no Japão eles são vistos cada vez mais como um passivo (23), assim como algo negativo dentro da estrutura das empresas.

De fato, este dado apontado em que o emprego, leia-se "o trabalhador", é um fardo pesado a afetar a eficiência das empresas capitalistas, acentua-se de forma acelerada justamente porque os modernos meios de produção assim o permitem, sendo mesmo opinião comum.

Assim, cria-se situação de desagregação evidente da classe operária. Já não temos uma classe de "vanguarda", mas sim uma série de sujeitos "desclassificados" ou excluídos, que somente servem como elementos pontuais da produção, uma vez que o mercado é voltado aos incluídos que podem pagar, ficando a maioria no limite da exclusão, como alerta o Professor Gilberto Dupas :

"As sociedades deste final de século , embora fascinadas por vários benefícios e promessas oferecidas pela globalização, já elegeram seu grande inimigo : o medo da exclusão social, que atinge todos os níveis. Os inequívocamente incluídos - que sentem as vantagens da tecnologia e da liberdade de mercado, acumulam informações, riqueza e circulam pela aldeia global - têm medo do potencial de violência do excluído, além de um razoável sentimento de culpa cujo tamanho depende do seu grau de solidariedade social. Aqueles ainda incluídos , assustado com a diminuição dos empregos formais e a redução Estado-protetor, temem escorregar para a exclusão. E por último , aqueles que são ou sentem-se excluídos, no seu dia-a-dia de sobreviventes, tem razões de sobra para sentirem medo." (O Novo Paradigma do Emprego.In São Paulo em Perspectiva.Vol 12/ no. 3 . Revista Fundação SEAD.1998. página 69.) (grifo nosso)

A regra da exclusão apresenta-se de modo inequívoco no que diz respeito a locação de trabalho dentro de emprego formal, identificado pelos cidadãos deste século como sua condição de inserção na sociedade (24). De fato, cada vez mais o Emprego Formal, com todas as suas garantias, e nos moldes do artigo 3º da CLT, torna-se cada vez mais sonho quimérico se tomarmos em conta que "cerca de 60% do trabalho gerado no Brasil de hoje (exceto governo) não inclui carteira assinada. A nova maioria são os trabalhadores informais e os autônomos que, submetidos a um novo desafio, dependem quase exclusivamente de si mesmos para gerar renda em trabalhos mais precários, sem as habituais proteções que o emprego formal garantia" (25) .

Podemos claramente estabelecer relação direta entre a regra do sentimento de exclusão da nova sociedade e a perda da centralidade do emprego e da classe operária, que descrevemos nos itens anteriores, justamente porque, havendo uma mudança radical nos meios de produção onde a dependência do capital à força de trabalho era muito maior, perde o sentido para o capital expandir aqueles direitos antes conquistados pelos trabalhadores empregados formalmente.

De fato, a relação jurídica entre capital e trabalho representado pela figura do empregado definida no artigo 3º da CLT, vai-se tornando cada vez mais inadequada para os novos padrões tecnológicos, até mesmo porque, esta forma de relação jurídica é mais onerosa para o capital do que as relações de trabalho em que os custos de manutenção do local de trabalho podem ser assumidos pelos próprios trabalhadores. Acrescenta-se que os custos de previdência e outras possíveis formas de garantia social são, cada vez mais retiradas do âmbito público e transferidos ao setor privado.

Destarte, o emprego formal que há pouco tempo era a regra e o sonho dourado do trabalhador, formando até mesmo a sua identidade social, hoje cada vez mais vai perdendo espaço, tonando-se a exceção. E as garantias de socialização que esta forma de relação estabelecia entre capital e trabalho, com o importante papel do Estado Providência de mediador entre as classes, vai-se tornando algo do passado.

Fazendo, uma síntese do pensamento até aqui exposto, da relação entre o desenvolvimento tecnológico e a fragilidade da relação de emprego da sociedade industrial e a sua relação com o Estado, cite-se o professor Gilberto Dupas :

"..questão que agrava a sensação de exclusão é a deterioração progressiva do Estado no seu tradicional papel de supridor de serviços essenciais" (...)"Parte da sociedade está começando a acreditar que a globalização traz a exclusão. Esse mal-estar é devido a inúmeros fatores , mas sem dúvida o mais importante entre eles é a mudança no paradigma do emprego" (...)" fica claro que hoje há uma crescente e progressiva informalização das relações de trabalho, decorrente tanto da automação e modalidades de trabalho à distância, como pelas tendências de terceirização , porque se respaldam em sólida lógica de mercado: menores preços e maior qualidade do produto final " (O Novo Paradigma do Emprego. In São Paulo em Perspectiva. Vol.12 no.3. Revista Fundação SEAD. 1998. páginas 70 e 75.)


2. NOVAS RELAÇÕES DE TRABALHO E JUSTIÇA DO TRABALHO

Estabelecidas estas premissas históricas, podemos facilmente perceber que a crise da Justiça do Trabalho vai muito além de necessidade de reformulação estrutural ou de aspectos do processo trabalhista, ainda que esta discussão não deixe de ser importante ou secundária. Possui, esta crise, elemento genético muito mais profundo, o que nos leva à necessidade de discutir a crise do judiciário apreciando os aspectos ontológicos sobre os quais se sustenta este ramo especializado do Poder Judiciário.

É de se perguntar se há sentido numa justiça especializada do trabalho, erigida para apreciar os feitos originários de relação jurídica específica, descrita no artigo 3º da CLT, quando já existe o trabalhador multifuncional convivendo com processo de terceirização, o teletrabalho e o trabalho em domicílio.

Destarte, o presente texto não questiona a perversidade ou bondade de um sistema que cada vez mais aumenta a exclusão, mas pensa como ampliar ou fazer ser socialmente útil uma Justiça do Trabalho dentro da atual sociedade que se delineia. Parece-nos inequívoco e necessário repensar um judiciário que se formou sobre bases materiais que já não existem, sob pena de se tornar sem função.

Assim, rediscutir o papel da Justiça do Trabalho é apontar rumos que afirmem a necessidade deste braço do Judiciário brasileiro ou engrossar o caldo dos que lhe apontam como instituição ultrapassada, de época histórica não mais compatível com a nossa "modernidade".

Acreditamos que afirmar simplesmente que ainda existem relações do tipo clássico de emprego que justificam a existência da Justiça do Trabalho, nos moldes que hoje se apresenta, é simplesmente adiar o momento de sua morte.

Se é possível dizer que ainda temos número limitado de relações de trabalho fora dos moldes do artigo 3º da CLT, principalmente em países periféricos como o Brasil e, particularmente, em regiões como a Amazônica (26), são corriqueiras, nos tribunais, as alegações de incompetência absoluta da Justiça do Trabalho. Tal se dá por ausência do modelo clássico de relação de trabalho definido na consolidação. Assim, com a redução expressiva dos sujeitos sob essa forma específica de relação entre capital e trabalho, o corolário será cada vez mais freqüente esse tema nas lides dos tribunais, o que não significa a diminuição dos conflitos, mas sua ampliação para novas fronteiras.

Destarte, pensamos que este tema, que hoje é a exceção, tornar-se-á com a difusão das novas relações de trabalho a regra, excluindo-se cada vez mais da apreciação do judiciário trabalhista especializado, nos moldes com que hoje se organiza, a maioria dos conflitos entre capital e trabalho, que ainda existirão e tendem a se difundir, apresentando-se sobre novas roupagens.

Deduz-se, portanto, que a Justiça do Trabalho já não pode apresentar-se como ramo especializado e responsável por dirimir determinada forma de configuração de relação jurídica de trabalho, sob pena de se tornar uma justiça para uma classe de poucos trabalhadores.

Deve a Justiça do Trabalho ampliar o seu campo de atuação para tornar-se, cada vez mais órgão responsável pela decisão final em temas de ocupação humana, como o instrumento estatal responsável pelas garantias mínimas para que a atividade física e intelectual do homem, expressa como trabalho, não seja aviltada nas mínimas garantias de dignidade da pessoa humana.

Demonstrado, à saciedade, que o trabalho fabril, antes o princípio organizador fundamental das relações sociais, em torno do qual erigiu-se toda uma concepção jurídica sobre o emprego, vai sendo superado de forma acelerada, necessária a superação do modelo de Justiça do Trabalho que se construiu dentro deste modelo.

Na esteira deste fato, da noção de emprego surgido da grande indústria fabril, onde havia perfeita delimitação da atividade a ser desenvolvida pelo trabalhador subordinado às ordens do patrão, formaram-se, também, os fundamentos do direito do trabalho clássico, essencialmente protetor do trabalhador, construído basicamente por regras de direito público que definem o contrato que rege a relação entre empregado e empregador.

Hoje, ao contrário, o que vemos, é a expansão da autonomia da vontade, que exige paralelamente o avanço da autonomia da vontade coletiva, e, neste sentido, uma retração do direito do trabalho "industrial", surgindo um direito do trabalho onde os sujeitos sociais é que se tornam responsáveis pelas regras que devem reger as novas e modernas relações entre o capital e trabalho.

Como demonstrado, a menor dependência do capital ao trabalho, tornou possível a retração de muitas conquistas da classe operária , antes, com maior poder de intervenção, que estão sendo podadas, trazendo novos contornos à relação entre capital e trabalho. Se antes existia campo mais amplo para intervenção do Estado como regulador da relação contratual entre capital e trabalho, hoje retrai-se este campo, porque o capital exige espaço mínimo à intervenção estatal. Mas, se a Justiça do Trabalho não pode desaparecer, precisa urgentemente remodelar o seu espaço de atuação.

          Novos rumos de atuação da Justiça do Trabalho - Variações sobre o tema. 

Por certo, como apontamos, há necessidade de remodelação da forma como o judiciário trabalhista deve atuar na resolução dos campos de conflito entre capital e trabalho, mas não podemos deixar de perceber que os rumos dessa nova forma de atuar pode assumir diferentes caminhos.

Assim, como não podemos abordar todos os possíveis caminhos, traçaremos um limite retor de nossas reflexões, para correr o menor risco de perda de objetividade.

Desta forma, pensamos em eleger um campo que consideramos privilegiado para o início de nossas reflexões sobre o tema, a fim de contribuir com a formação de novo paradigma de atuação judicial, que passamos a traçar a seguir.

          2.1. Sociedade pós-industrial - Inadequação do modelo clássico de emprego - Identificação da crise de paradigmas e necessidade de novos paradigmas para a atuação judicial trabalhista

          *Identificação da Crise

Uma vez que já não há espaço para diversas funções e atividades desenvolvidas dentro da grande unidade fabril, que hoje vão desaparecendo pela aplicação de novas tecnologias, até mesmo a noção de desemprego forjada sob a sociedade industrial torna-se inadequada para qualificar o estado em que se encontram as pessoas que vêem simplesmente sumir os seus postos de trabalho. Porque os postos de trabalho eliminados pelas novas tecnologias não mais ressurgirão, e, como os sujeitos dentro do modelo clássico de emprego definem-se pelo exercício especializado de uma atividade e as novas tecnologias eliminam os postos especializados, é cada vez mais difícil a esperança dessas pessoas em obter uma locação na mesma atividade antes exercida em outra indústria. Portanto, em vez de ser um sem emprego (des + emprego), passam estas pessoas a assumir, na realidade, a posição de um sem função (des + função).

Como o modelo clássico de emprego não é mais adequado em muitas situações para regular as relações entre capital e trabalho, percebemos que temos hoje um quadro típico de crise, como descrito por Thomas Kuhn, pois os profissionais do direito são capazes de perceber que existe inadequação latente dos princípios que regem o modelo clássico de emprego, forjado sob a sociedade industrial, mas não se apresenta, ainda, novo paradigma que com clareza possa substituir o anterior modelo, dentro da chamada sociedade pós-industrial.

Hoje, ao contrário do modelo regulamentador do direito do trabalho clássico das relações entre capital e trabalho, temos um "movimento global de desregulamentação da sociedade, que parte das relações de mercado, chega aos diversos ramos do Direito e tem especial predileção pelo Direito do Trabalho. Tal movimento não é, como pensam alguns uma invenção da teoria neoliberal ou de políticos conservadores. Ele é, na verdade, a resposta espontânea e anárquica - colada diretamente ao movimento e às necessidades do capital - às exigências da terceira revolução científico-tecnológica" (27)

Sendo assim, é preciso repensar a noção da relação entre trabalho e capital, pois a noção de emprego clássica está se tornando inadequada para regular as novas relações sociais surgidas do desenvolvimento tecnológico, e essa velha noção era adequada para um Direito do Trabalho protecionista, que se desenvolveu para abrigar relações com certa estabilidade (princípio da continuidade) e subordinação fiscalizada (28).

Logo, uma vez detectada, do ponto de vista teórico, a crise de paradigmas que o processo produtivo está sofrendo e seus reflexos no mundo do trabalho, especialmente a necessidade de novos paradigmas para a atuação do poder judiciário trabalhista como corolário, temos de delimitar esta crise.

Podemos dizer, seguindo as lições de KUHN, que os cientistas sociais, aí inclusos os teóricos do Direito do Trabalho, desenvolveram uma "ciência normal" (29), onde os sujeitos se definindo pelo lugar que ocupam dentro da produção industrial, a classe operária era o centro de sua forma de análise, onde uma ordem jurídica seria tão mais adequada quanto melhor atribuísse direitos ao trabalhador e o Estado o protegesse dos arroubos do capitalismo.

O encadeamento entre aspectos sociais e grandes desenvolvimentos tecnológicos que permitiram a ascensão do chamado modelo "Japonês ", ou da especialização flexível, e outras mudanças que ainda estão por se operar , trouxeram a necessidade de mudanças na organização da produção e localização do trabalhador, que não mais era definido pela sua atividade na linha de produção, mas pelas funções que desenvolvia dentro da empresa.

Assim, o desenvolvimento tecnológico ocasionou a necessidade de uma revolução científica das ciências sociais, incluso o Direito do Trabalho, alterando os compromissos profissionais dos cientistas sociais, desintegrando a tradição na qual a classe trabalhadora operária era o centro das teorias sociais, tão caras à atividade da ciência normal. (30) Neste ponto é permitido concluir a presença de uma crise de paradigmas na formulação das ciências sociais que trabalham com a categoria do trabalho.

Uma necessidade de novos paradigmas faz-se premente, uma vez que não é mais possível explicar a nova sociedade emergente pelos paradigmas forjados sob a égide do antigo modelo, pois surgem problemas de natureza diferente. O Antigo paradigma já não é bem sucedido para que os membros da profissão resolvam os problemas que emergem dentro do novo modelo.

Surgem constantes anomalias, que são fenômenos para os quais o antigo paradigma não pode solucionar os problemas postos, os quais o cientista social não está preparado para solucionar com os métodos e categorias próprias do antigo paradigma (31) , que no caso da direito do trabalho e sua relação com a atuação judicial, pode ser representado especialmente pela ausência de um paradigma adequado para solucionar os problemas decorrentes dos conflitos metaindividuais entre trabalhadores e o capital, como demonstraremos.

Da conjugação entre o fato de serem constantes o surgimento de anomalias e a percepção pelo cientistas de que os paradigmas que são utilizados não são mais adequados para a resolução dos problemas da nova sociedade "pós - industrial" , podemos afirmar que temos uma crise de paradigmas.

          Crise de paradigmas e emergência de novas teorias

Em sua obra "A Estrutura das Revoluções Científicas", Thomas Kunh observa que "A emergência de novas teorias é geralmente precedida por um período de insegurança profissional pronunciada, pois exige a destruição em larga escala de paradigmas e grandes alterações nos problemas e técnicas da ciência normal. (...). O fracasso das regras existentes é o prelúdio para uma busca de novas regras". (32)

Assim, uma vez que, como demonstramos, há uma crise do modelo de Justiça do Trabalho construído sobre a égide da sociedade industrial, pois diminui significativamente aqueles trabalhadores que estão sob a égide do emprego formal, temos a necessidade do surgimento de novas teorias que possibilitem respostas às novas questões que são postas aos profissionais e teóricos do direito, a fim de serem estabelecidos novos paradigmas, pois outro não é o significado das crises que indicar a chegada da ocasião certa para a renovação dos instrumentos de solução dos problemas (33)

Se olhamos especialmente para o Direito do Trabalho, percebemos que temos hoje um quadro típico de crise, como descrito por Thomas Kuhn, pois os profissionais do direito são capazes de perceber que existe inadequação latente dos princípios que regem o Direito do Trabalho "clássico", mas não se apresenta, ainda, novo paradigma que, com clareza, possa substituir o anterior.

Resta claro, que a percepção da crise está ligada ao fato de ainda não ter emergido um novo paradigma, capaz de superar o antigo. A partir do momento em que este for presente, não haverá mais crise, mas, sim, a ciência normal voltará ao seu curso habitual.

Temos, portanto, que o momento é de busca de novo paradigma, a fim de ser superada a crise da Justiça do Trabalho que hoje se apresenta como corolário da crise da sociedade sob a qual ela se erigiu, sob pena de se tornar inútil, pois não terá respostas às anomalias que nascem e nascerão das novas relações entre o capital e o trabalho.

A emergência de novo paradigma é lento, porque este, antes, precisa superar o antigo, pois não pode existir ciência sem paradigma estabelecido, que deve ser comparativamente melhor que o anterior. Quando este novo paradigma emerge, a crise é estancada, e a ciência volta ao seu curso normal. E é para este objetivo que pretendemos contribuir com estas reflexões, ainda que isto soe por demais ambicioso.

          Sociedade pós-industrial e Justiça do Trabalho

Na nova sociedade que hoje começa a se delinear como fruto direto da revolução na base técnica da produção, decorrente da informatização, microprocessamento, biotecnologia e tecnologia informacional , e conjugada a nova expansão do capitalismo internacional, onde as fronteiras nacionais pouco significam dentro do mercado mundial cada vez mais dominado pelas regras do sistema financeiro internacional, temos que os conflitos se massificam, pois os sujeitos já não são identificados enquanto sujeitos individuais, mas como membros de uma coletividade.

Conseqüentemente, novos interesses surgem como característicos desta nova sociedade. Se antes, na produção da grande indústria fabril, residia o elemento aglutinador da classe operária no espaço da fábrica, hoje, nos novos modelos de organização da produção, vai-se destruindo até mesmo a noção de categoria, tão cara ao direito laboral brasileiro.

Começa a faltar sociabilidade maior dos indivíduos, pois as leis de produção sobrepõem-se às condições particulares dos indivíduos e os problemas passam a ser encarnados na presença de uma coletividade sem rostos determinados. São os chamados interesses coletivos dos trabalhadores (34).

Como dito mais ao norte, a nova sociedade que se apresenta, ao contrário do modelo regulamentador do direito do trabalho clássico das relações entre capital e trabalho, temos um "movimento global de desregulamentação da sociedade, que parte das relações de mercado, chega aos diversos ramos do Direito e tem especial predileção pelo Direito do Trabalho", como " resposta espontânea e anárquica - colada diretamente ao movimento e às necessidades do capital - às exigências da terceira revolução científico-tecnológica" (35)

Assim, acreditamos e vislumbramos que, no futuro próximo, não havendo mais espaço para o modelo regulamentador e de múltiplas garantias sociais (36), que cada vez mais ficará restrito a um grupo privilegiado de trabalhadores, teremos um crescente corpo de trabalhadores submetidos a um regime de poucas normas regulamentares da relação entre capital e trabalho e poucos direitos individuais ligados ao trabalho a serem tutelados, em que o sujeito deixa de ser o centro de imputação de direitos e o grupo social, a comunidade de trabalhadores, é que passa ser o sujeito a que se imputam direitos subjetivos, e estas novas regras, pela característica dos seus titulares, têm a ver ou terão a ver com o respeito ao mínimo de garantias da dignidade humana no fazer da atividade produtiva. Este, pensamos será o espaço que restará para o Estado regular, e, no caso, sendo a maioria, a Justiça do Trabalho precisa repensar radicalmente o seu meio de atuar nesta nova forma regulamentar, onde estará a maioria dos trabalhadores.

Embora sendo poucos os direitos do ponto de vista individual na nova sociedade, porque o sujeito somente passa a ser importante pelo grupo produtivo a que pertence, estas regras dirão respeito às garantias básicas da tessitura da comunidade produtiva, logo a sua tutela abrangerá toda a coletividade, pois a violação destes direitos faz ferir o mínimo ético da organização do trabalho.

Assim, em nossa compreensão, torna-se mais do que válido, ao rediscutir os rumos da Justiça do Trabalho, pensar necessariamente no desenvolvimento e aperfeiçoamento dos meios de tutela coletiva de interesses metaindividuais dos trabalhadores (difusos, coletivos e individuais homogêneos).

Temos de ter atenção que esta forma de análise ou caminho para a superação da crise de paradigmas não elimina o caminho de fortalecimento da autonomia privada coletiva a ser exercida pelos sindicatos e centrais sindicais, inclusive no sentido de atuação internacional, mas se apresenta em nossa visão como o meio mais adequado de tutela eficaz dos mínimos de garantia de dignidade humana em suas atividades laborais.

Adotamos este ponto de vista como forma de análise para a rediscussão do papel da Justiça do Trabalho porque o desenvolvimento e aperfeiçoamento dos instrumentos de tutela dos interesses metaindividuais, necessariamente, requerem reeducação do homem juiz e da magistratura, pois como lembra o professor José Eduardo Faria "Tendo sido educada e organizada para atuar na perspectiva de uma justiça corretiva , a magistratura se revela temerosa quando estimulada a atuar na dimensão de uma justiça distributiva" (37).

Latente se faz a necessidade de nova racionalidade, e não há campo melhor para este novo embate porque somente se podem combater os difusos meios de organização da produção pós-industrial por instrumentos jurídicos que tenham também esta flexibilidade, embora certo que hoje respeitável doutrina ainda enquadre sob o raciocínio formalista estas espécies de interesses, a exemplo de definições de ação civil pública como instrumento que se assemelha ao dissídio coletivo de natureza jurídica (38), o que, a nosso ver, pode levar à limitação do atuar jurisdicional, por vício de formação na tutela destes novos interesses, o que deve ser evitado.

Deve ser reeducado o magistrado, a fim de ser evitada a pergunta na tutela dos interesses metaindividuais na hora de definir o conflito : qual a premissa maior violada ? Pois se esta não existir perfeitamente delimitada em todos os seus requisitos e características de forma e conteúdo, e isto não será difícil de ocorrer dada a própria mutabilidade destas espécies de interesses, e não havendo a "norma", tranqüilamente o magistrado baixará a sua caneta de "prestação" da jurisdição, extinguindo o processo sem julgamento do mérito por falta de interesse processual ou interesse de agir, sob o fundamento de não haver norma violada, ainda que no seu íntimo possa perceber que há um interesse comunitário laboral sendo violado.

Influência nefasta do chamado paradigma normativista, tão bem exposto pelo professor José Eduardo Faria, no qual o juiz que atua consoante este modelo, sem a abertura necessária, costuma ver e julgar conforme um direito positivo, para o qual "importa apenas o estabelecimento de sanções como conseqüência do descumprimento das prescrições normativas. O fato ilícito não é, em si, um fato necessariamente imoral ou eticamente condenável; é apenas e tão somente, uma conduta contrária àquela fixada pela norma" (...) "reduzindo as condutas sociais às estruturas normativas" (39).

Desta forma, mais do que reforma processual formal sobre recursos, supressão de instâncias etc, que trabalharia apenas como caminho para solucionar os mesmos e particulares conflitos decorrentes do emprego formal o que é pouco ante a crise de paradigmas retro apontada, é necessário pensar uma reforma do judiciário trabalhista que seja capaz de enfrentar os novos conflitos coletivos emergentes. Do contrário, teremos, como hoje ocorre no processo civil, que com o tempo os problemas estruturais voltarão à baila dos congressos de profissionais do direito e estudantes sobre as reformas pontuais do processo trabalhista, com preocupações apenas dogmáticas sobre a compreensão do institutos jurídicos, sem que a crise seja efetivamente resolvida.

Basta observar os chamados juizados especiais cíveis ou de pequenas causas, que hoje representam a cópia fiel dos tribunais, numa micro-reprodução do caos de todos nós conhecidos, com acúmulo de processos, pautas infindáveis e conflitantes. Formas de solução de conflito que tendem a repetir as mazelas porque fundadas sobre a mesma racionalidade. Fato que não é novo e, como destacado pelo Professor Renato Lima, é resultado da forma como se encara o problema da crise do judiciário. Assim leciona o professor (40) :

"..mesmo considerando as iniciativas tomadas no sentido de facilitar o acesso à Justiça e as dificuldades concretas enfrentadas pelo Poder Judiciário no cotidiano da vida judicial , o sistema judicial brasileiro está desfocado do seu principal objetivo, que é a mediação eficaz de conflitos através da aplicação da Justiça (de uma concepção de justiça que todos aceitem como a mais legítima). Assim sendo, mais do que acesso à Justiça, a compreensão que a população faz dela pode ser a chave para se pensar saídas possíveis de pacificação social. Em outras palavras , de nada adiantará criar mecanismos de desobstrução do judiciário , visando a facilitação do acesso `a Justiça, se não for questionado o modus operandi dos tribunais, pois, do contrário, em pouco tempo as soluções inovadoras repetirão os vícios e estrangulamentos do sistema." (grifo nosso) (Acesso à Justiça e Reinvenção do Espaço Público - Saídas possíveis de pacificação social . In São Paulo em Perspectiva. Vol 11.no. 3. Revista da Fundação SEAd.1997, página 89)

Destarte, como os litígios de interesses metaindividuais são mutáveis por natureza, e os seus titulares individuais na maioria das vezes são indefinidos, embora definiveis, temos a completa inadequação do atuar jurisdicional sob o antigo paradigma, exigindo novos paradigmas.

Sendo fruto do acirramento das contradições sociais, estes interesses todos não podem ser perfeitamente delimitados em leis e regras, e não podem ser tratados de modo eficaz pelas matizes normativas genéricas de estandardização da vida social, exigindo do Estado repostas diferenciadas e tomadas em ritmos cada vez mais rápidos (41).

Torna-se essencial focalizar uma reforma do judiciário trabalhista que consiga enfrentar à altura os novos processos produtivos e seus impactos nas formas de conflitos entre capital e trabalho, pois, do contrário, este se tornará campo vazio e sem apelo para a sociedade, pois "os conflitos da sociedade brasileira somente tomarão o rumo dos tribunais se estes forem plenamente entendidos como instrumentos mais legítimos e eficazes de resolução de conflitos e se eles não estiverem muito distantes do que a população acredita ser justiça" (42)

Sendo evidente a crise do Estado-Providência " Não basta apenas criar mecanismos de acesso à justiça, é necessário que os tribunais sejam compreendidos como os foros mais eficientes na resolução dos conflitos" (43), e, para isso, é essencial que as formas de tutela de direitos sejam modernizadas e fundem-se sob novos paradigmas, porque cada vez mais fica latente ante os novos instrumentos legais de tutela coletiva, como a ação civil pública. Mas, infelizmente, "A medida que surgem novos tipos de conflitos, a maioria das leis vai envelhecendo e, embora os legisladores venham respondendo ao desafio da modernização das instituições de direito com a criação de novas leis, a cultura técnico-profissional da magistratura parece defasada, incapaz de se repensar à luz da aplicação de leis mais modernas" (44)

Torna-se essencial pensar alternativas que aproximem o judiciário trabalhista da violenta realidade da sociedade, brasileira onde a maioria dos conflitos entre capital trabalho se espraia para a tutela das garantias básicas de dignidade da atividade humana laboral, pressionando-se o sistema judicial existente, tanto no sentido de forçá-lo a se posicionar a garantir direitos, e, como no de pensar quais mecanismos poderiam ser adotados como forma de conter e, efetivamente, resolver os conflitos (45).

Aperfeiçoamento que deve ocorrer seja pela contribuição esclarecedora sobre o papel do magistrado diante dos novos conflitos que se apresentam e que colocam na pauta do dia uma revisão da concepção normativa do direito positivo, e, também, pelo aperfeiçoamento e criação de processos administrativos extrajudiciais que resolvam ou procurem formas de pressão e resolução dos conflitos e, que, paralelamente, selecionem os conflitos que devem chegar aos tribunais. Por exemplo, modificando o Inquérito Civil Público, as regras de fiscalização da DRT e também os meios processuais judiciais próprios, como é o caso da ação civil pública (46). Propiciar o desenvolvimento de novos instrumentos de tutela coletiva como a reclamação trabalhista civil coletiva e outros meios processuais que podem ser engendrados por meio de novo pensar processual, que seja capaz de enfrentar os coletivos conflitos que, vislumbramos, predominam no novo modelo societário.


3. Justiça do Trabalho - Justiça dos conflitos de interesse coletivo - Retomada
do caminho próprio - Construção de um sistema judiciário do trabalho
adequado para demandas coletivas - Necessidade de uma nova racionalidade.

Podemos perceber, portanto, que, em nossa visão sobre a rediscussão do papel da Justiça do Trabalho, temos como essencial que esta se colocará como a guardiã dos interesses básicos da coletividade trabalhadora, no que diz respeito à dignidade do trabalhador, como princípio da organização do trabalho.

Assim, o Poder Judiciário Laboral será o ponto culminante desta nova forma de conceber tutela eficaz e de resolução dos novos conflitos do trabalho da sociedade pós-industrial, mas não será e não deve ser o mais importante, como hoje é. Devemos partir para um aperfeiçoamento dos instrumentos extra-judiciais de tutela do Trabalho, vislumbrando a edificação de um Sistema Judiciário do Trabalho, onde os órgãos administrativos como a DRT, o Ministério Público e Entidades Sindicais tomem e assumam papéis mais relevantes na tutela dos interesses dos trabalhadores previstas nas regras mínimas, que sempre existirão, de tutela da dignidade do trabalho.

Por se tratar de regras mínimas, sempre será fácil violá-las no individual. Premido pelas circunstâncias, o sujeito isolado não terá força para reclamá-las porque muitas vezes não se dirigirá a efeitos patrimoniais imediatos, dirão respeito a regras de meio ambiente, saúde do trabalhador, crimes contra a organização do trabalho , definição de conflitos pelo espaço de exercício da atividade produtiva, no caso de conflitos de camelôs, poder público e empresários do comércio, proteção dos mecanismos de previdência e assistência social mínimos, como elementos de aglutinamento do tecido social.

Os conflitos de massa, donde emergem os interesses metaindividuais, típicos da nova sociedade, tornam-se cada vez mais públicos, porque é exigida a presença do Estado, que servirá de mediador do conflito, e passam a ser incluídos no direito positivo.

Estes interesses coletivos que antes somente possuíam como meio de processamento as reivindicações por meio de atos políticos e usando do código do sistema político, agora poderão e podem ser submetidos ao crivo do judiciário. Mas novo judiciário que extrapole os limites de um pensamento normativo e avance no sentido de uma justiça distributiva.

          Interesses metaindividuais - características - inclusão

Para melhor compreensão dos objetivos que pretendemos alcançar no auxílio de construir esta nova racionalidade a fim de que o Judiciário seja adequado para as novas demandas de uma sociedade pós-industrial, que seja o guardião célere e competente na tutela dos interesses dos trabalhadores no mínimo de dignidade humana, utilizaremos alguns dos conceitos da Teoria da Sociedade de Nikhlas Luhmann, que nos ajudarão na reflexão sobre como melhor atuar na tutela dos interesses metaindividuais dos trabalhadores.

Destaca-se que, sob este prisma, os referidos interesses não são apenas fenômeno jurídico, mas fenômeno que hoje é processado pelo direito, que mediante o seu código próprio e específico torna possível a maior estabilidade na solução dos conflitos que envolvem estes interesses.

Registre-se que a "solução" aqui é posta como a possibilidade de ser submetido o conflito a uma decisão dos tribunais, sem indagar se esta é "justa" num sentido axiológico, mas que os referidos conflitos são passíveis de uma decisão justa, ou seja, de acordo com os ditames do direito positivo (47).

A teoria da Sociedade de Luhman ensina que o sistema jurídico é "autopoético" no sentido de que produz e reproduz as suas características a partir de um código próprio e específico (Direito / Não Direito; Legal /Ilegal; Recht/ Unrecht). Possuindo, desta forma, autonomia em relação ao entorno (ambiente), mas isto não exclui a interdependência deste sistema com outros sistemas, especialmente com o Sistema Político, que opera sob um código próprio e específico (Maioria/Minoria; Governo/Oposição) .

Destaca-se que a autonomia de cada sistema em relação a outro ao mesmo tempo que cresce a sua diferenciação leva a maior interdependência. Por isso, procuramos abordar como se manifestou a inclusão dos interesses metaindividuais no direito positivo a partir das irritações provenientes do sistema político, que ainda permanecem, sem que se rompa a autonomia de ambos os sistemas.

Como demonstrado nos itens antecedentes, não haverá mais espaço para muitos direitos individuais trabalhistas, onde o empregado formal é o centro do direito laboral. Assim, é o momento ideal para a positivação dos interesses metaindividuais, mas positivação que infelizmente não tem sido bem compreendida, pois, como vimos, a positivação dos interesses metaindividuais dos trabalhadores se dá sobre outros paradigmas de raciocínio que já não podem centrar-se na clássica noção do direito subjetivo individual e, por isso, muitas vezes não são compreendidos ou são mal compreendidos pelos atores jurídicos no aplicar de suas normas.

Há grande confusão entre positivação dos interesses metaindividuais, o que ocorreu no direito brasileiro especialmente por meio das Leis 7.347/85 e 8.078/90, e a filosofia do positivismo, muito arraigada em nossa cultura, pois estes interesses, estando no limite da conflitualidade social, são mal compreendidos por atores jurídicos formados para lidar com conflitos especialmente delimitados, onde sujeito, objeto e forma de tutela perfeitamente delineados, ao se deparar com novos conflitos onde os sujeitos são em geral indeterminados, ainda que determináveis, e o seu objeto e a forma de tutela, para que sejam eficazes , possuem uma mutabilidade no tempo e espaço como característica marcante.

Ora, não se pode esquecer que o trabalho é elemento essencial dentro do modo de produção capitalista, mas que dentro da estrutura hoje multifuncional e variante das relações que se estabelecem entre capital e trabalho, necessário se faz que o atuar na solução dos novos conflitos emergentes entre capital e trabalho também assim o seja variante e multifuncional.

É esta realidade cambiante e variável, de mercados interligados, com presença marcante dos meios de comunicação e informática, que leva necessariamente a diversas manifestações de desconformidade e impossibilidade, muitas vezes, da tutela dos interesses de uma coletividade em juízo, o que força o Direito a buscar, cada vez mais, novos paradigmas que reúnam condições para a compreensão da multifacetada realidade de uma sociedade em desenvolvimento, absorvendo e adaptando os seus mecanismos de controle, mediante a flexibilização dos modelos normativos mais bem conectados aos diversos padrões de organização social, e que melhor possam controlar, prever e "desarmar" os conflitos intersubjetivos e intergrupais (48).

Quanto à Teoria da Sociedade, temos a necessidade de inclusão destes novos interesses no sistema jurídico laboral, pois o direito é uma rede de inclusão, ou seja o meio pelo qual se podem solucionar determinados conflitos existentes na sociedade. Assim, embora as leis venham incluindo os conflitos coletivos dentro do direito, existe despreparo dos magistrados na inclusão destes conflitos como passíveis de solução efetiva, indeferindo no nascedouro muitas das ações que, justamente, têm o objetivo de incluir no sistema essas novas modalidades de conflitos da sociedade pós-industrial, dando-lhe uma solução efetiva e não apenas formal.

Deste ponto de vista, temos que a crise da Justiça do Trabalho se dá porque ela não consegue incluir em sua estrutura e, portanto, processar, os novos conflitos coletivos que se apresentam, e, sendo assim, ela se torna obsoleta, incapaz de solucionar os novos conflitos da sociedade emergente, e, como tal, não espanta que vozes da sociedade possam assumir o discurso de sua extinção.

Trata-se, aqui, portanto, de pensar e contribuir para que estes novos conflitos coletivos sejam de fato incluídos no sistema trabalhista, do contrário a estrutura torna-se sem sentido e o direito do trabalho já não será capaz de se legitimar como ramo especializado, porque se não pode sequer processar o conflito, dando-lhe uma decisão de mérito da lide, socorrendo-se os julgados a expedientes de extinção do processo sem julgamento do mérito nos conflitos e demandas coletivas ou outros procedimentos formais de "prestação" da tutela jurisdicional, estes conflitos na realidade estão ficando excluídos do sistema, conflitos estes que, pensamos, dominarão os novos caminhos da Justiça Laboral. Assim, se não pode processá-los, melhor é que esta deixe de existir. (49)

A grita por "Justiça" na tutela de direitos/interesses coletivos, de forma mais célere e expedita, leva a que o político cause irritabilidade ao sistema jurídico para que estes conflitos coletivos passem a ser processados por meio dos códigos próprios do sistema jurídico, daí o surgimento em toda parte de leis que tutelam os chamados interesses metaindividuais. Mas é preciso mais. É necessário construir-se uma nova racionalidade que seja adequada a estes especiais conflitos.

Assim, o direito vem incluir em sua operação os interesses metaindividuais, antes apenas processados pelo sistema político, agora possíveis de serem processados pelo jurídico. Alerta-se que o direito não passa a reconhecer estes novos direitos, mas apenas transforma (50) em direito aqueles eventos que tinham outro significado no ambiente. Para a teoria da sociedade, esta inclusão de novos princípios ou interesses não torna o direito mais justo ou mais adequado à sociedade, como se costuma dizer, mas apenas lhe torna possível o processamento conforme o código específico do direito (51).

Desse modo, os conflitos típicos desta nova sociedade tornam-se cada vez mais públicos porque é exigida a presença do Estado, que servirá de mediador do conflito, onde passaram a ser incluídos no direito positivo e, dentro deste conteúdo e campo de reflexão dos direitos laborais, por dizerem respeito aos mínimos de dignidade do trabalho reforçam um dos princípios basilares do direito do trabalho que é a proteção do hipossuficiente, que passa a ser encarado como a coletividade de trabalhadores em situação de inferioridade ante o capital.

As irritações que o ambiente estabelece com o sistema jurídico, onde cada vez mais se destaca o pouco valor do trabalho como um patrimônio individual, com flagrante redução do campo de direitos subjetivos atribuídos ao indivíduo, e os sujeitos coletivamente considerados é que passam a ter mais espaço de tutela dos poucos de direito que restam ou restarão, levam à clara necessidade de que se estabeleçam novas premissas decisórias, para que estes conflitos de massa sejam passíveis de uma práxis decisória efetiva e não apenas formal.

Nessas condições estruturais, a função do direito é permitir a estabilização da contigência, isto é, da possibilidade de que várias ações sejam oferecidas para que uma seja escolhida como a melhor (52).

Estes interesses, que antes somente possuíam como meio de processamento as reivindicações pelos atos políticos e atuações diretas dos trabalhadores, usando do código deste sistema, agora podem ser submetidos ao crivo do judiciário, mas necessário faz-se que a magistratura seja capaz de realizar efetiva solução destes novos conflitos.

É certo que este caminho é difícil, pois como alerta o Professor José Eduardo Faria :

"Os textos legais editados a partir de concepções mais contemporâneas de direito, aptas a lidar com os conflitos coletivos e com os que envolvem questões distributivas ou de natureza "social" (...) têm esbarrado numa cultura profissional da magistratura que padece de um excessivo individualismo e formalismo em sua visão-de-mundo. Esse individualismo se traduz pela convicção de que a parte precede o todo, ou seja, de que os direitos do indivíduo estão acima dos direitos da comunidade; como o que importa é o mercado, espaço, onde as relações sociais e econômicas são travadas , o individualismo tende a transbordar em atomismo: a magistratura é treinada para lidar com as diferentes formas de ação, mas não consegue ter um entendimento preciso das estruturas socioeconômicas onde elas são travadas. Já o formalismo decorre do apego a um conjunto de ritos e procedimentos burocratizados e impessoais, justificados em nome da certeza jurídica e da "segurança do processo". Não preparada técnica e doutrinariamente para compreender os aspectos substantivos dos pleitos a ela submetidos, ela enfrenta dificuldades para interpretar os novos conceitos dos textos legais típicos da sociedade industrial, principalmente os que estabelecem direitos coletivos, protegem os direitos difusos e dispensam tratamento preferencial aos segmentos economicamente desfavorecidos" (53).

Resulta disto que, uma vez que a nova sociedade é de poucos direitos sociais do trabalhador, este não será o principal sujeito das relações de trabalho, mas sim a comunidade produtiva da qual faz parte, seja nas diversas cooperativas que florescem no país, seja na terceirização da produção e outros modos que serão engendrados a cada dia. Bem como os trabalhadores do mercado informal, que também merecem tutela do Estado, onde cada vez mais o emprego formal torna-se a exceção.

Porquanto é cada vez mais difícil compreender estes direitos sem se estabelecer uma racionalidade que seja capaz de realizar a interdependência do sistema jurídico com o político e o econômico e a inclusão destes direitos coletivos no direito positivo, pela sua codificação. Não basta. Para enfrentar os novos desafios, é preciso mais. Necessário faz-se um atuar judicial que se apresente capaz de estabelecer decisões em novos moldes a fim de legitimar-se à frente destes novos conflitos sociais, mas é mister destacar que a autonomia dos sistemas permanece, e hoje o desafio é processa-los de forma efetiva, realizando-se uma justiça distributiva.

Desta forma, existindo hoje no Brasil, como reflexo da efervescência de novos sujeitos, apesar da histórica presença dos conflitos coletivos desenvolvidos dentro dos limite do poder judiciário trabalhista na forma de greve e dissídios coletivos, é preciso ser destacado que a legislação resultante da interação entre o sistema político e o jurídico, tais como a Lei 7.347/85 (Lei de Ação Civil Pública), consolidando-se com a Constituição de 1988, e posteriormente com a Lei 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor), é resultante de nova realidade e gestada fora do campo do direito do trabalho.

Portanto, vem sendo integrada por meio de construção jurisprudencial e doutrinária a este ramo. É importante que não seja confundida com os tradicionais conflitos coletivos trabalhistas, mas devem ser construídos raciocínios próprios e sob novas bases, a tanto que a lei permite, pois a Lei 8.078/90 conceituou as formas de manifestação destes interesses característicos da sociedade pós-industrial (difusos, coletivos e individuais homogêneos) de forma aberta, ou seja, jurisdificou-lhes de três modos abertos, fazendo possível o seu processamento pelas estruturas do direito, mas não lhes retirando as características políticas e econômicas de mutabilidade no tempo e espaço.

Resta claro que os interesses metaindividuais, como fenômeno da sociedade de massas, não foram reconhecidos pelo direito, mas transformados em direito, que os retirou do " limbo jurídico" (54) onde permaneciam.

Interessante para o nosso trabalho é a conceituação de Mancuso do que seja interesse metaindividual, compreendendo como tal aquele que " quando, além de depassar o círculo de atributividade individual, corresponde à síntese dos valores predominantes num determinado segmento ou categoria social" (55).

Percebe-se, pelo conceito exposto, que há um destaque para elementos que indicam alta fluidez dos interesses metaindividuais e estreita ligação com noções próprias do político e econômico, nem poderia ser de outra forma, pois a jurisdicização dos interesses metaindividuais não lhes retira as características que possuíam e possuem no ambiente jurídico (os elementos que estão fora do sistema jurídico), mas que ao serem processados pelo sistema jurídico, aquela passam a ser compreendidas pelo código que é próprio e específico deste sistema.

Por isso é que se diz que no plano das operações de um sistema não existe nenhum contato com o ambiente/entorno (56) , mas isto não leva ao entendimento do sistema jurídico como hermeticamente fechado, onde predomine da Lei da Entropia (sistema que possui dentro de si todas as leis e se auto sustenta). Logo, percebendo a elevada fluidez destes interesses, preferiu o legislador, ao codificar estes interesses, estabelecer três conceitos abertos para eles.

Permitindo que estes conceitos estabeleçam uma ponte contínua entre o ambiente altamente fluído que é próprio dos interesses metaindidividuais e o sistema jurídico, que se caracteriza justamente por permitir maior estabilidade das relações que se desenvolvem em juízo, assim, tornam-se o meio adequado para que o judiciário laboral possa enfrentar os novos conflitos decorrentes de relações de produção mutáveis dia-a-dia, onde os aparatos técnicos e de gestão estão em constante transformação.

Daí nossa compreensão da Lei 8.078/90 (CDC), que introduziu no sistema jurídico pátrio, por meio do artigo 81, incisos I, II e II, os conceitos de interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos. Estes foram gestados fora do direito do trabalho e, conseqüentemente, permitem novo atuar, mais adequado à Justiça do Trabalho e que seja capaz de encontrar um dos caminhos para a superação da crise.

De fato, estes conceitos legais podem ser compreendidos como instrumentos que permitem o "acoplamento estrutural" entre o ambiente das relações entre capital e trabalho onde se gestam, e os processos judiciais emergentes para solucionar estes conflitos, porque o operar do direito exige certa estabilidade e previsibilidade de acontecimentos para o seu processamento.

A noção de "acoplamento estrutural" é desenvolvida pela teoria da sociedade a fim de explicar como se dá a relação de um sistema com o entorno/meio, sem que este necessite abdicar de suas estruturas próprias e código específico, porque se isto ocorresse, resultaria um seccionamento da sua "autopoiese", impedindo a sua reprodução a partir de suas próprias estruturas .

Exemplificativo desta observação pode ser verificada no seguinte trecho da obra de Niklas Luhmann, Introducion a la teoria de Sistemas:

"El acoplamiento estrutural , entonces excluye el que datos existentes en el entorno puedan especificar , conforme a las proprias estructuras , lo que sucede en el sistema. Maturana diria que el acoplamiento estructural se encuentra de modo ortogonal com respecto a la autodeterminación del sistema. No determina lo que sucede en el sistema , pero debe estar presupuesto , ya que de outra manera la autopoiese de detendría y el sistema dejaría de existir. En este sentido, todos los sistemas están adaptados a su etorno (o no existirian) , pero hacia el interior del radio de acción que así se les confiere, tienen todas lbas possibilidades de comportarse de un modo no adaptado" (In Introducion a la teoria de sistemas. Javier Torres Nafarrate. Gualajara : Universidade Iberoamericana; Iteso; Anthropos. 1996, página 99) (57).

A "autopoiese" pressupõe que um sistema opere determinado por uma estrutura e operações próprias, distinguindo-se de outros sistemas. Mas infelizmente, os operadores do direito têm acentuado o apego ao formalismo, como critério específico do direito, e deixando em segundo plano as variantes dos conflitos coletivos que surgem no entorno (meio ambiente), e se refugiam para "prestar" jurisdição em conflitos coletivos nos aspectos formais, negando a atividade de acoplamento estrutural que é própria no operar destes novos conflitos (58).

Podemos observar, então, que, na maioria dos processos que tivemos oportunidade de ler os Acórdãos, e as lides envolvem interesses metaindividuais. Sempre há discussão sobre aspectos processuais da natureza do interesse tutelado. Se o objeto está dentro da conceituação legal do CDC, discute-se a questão da legitimidade ativa ou passiva, a fim de se descaracterizar que o interesse pode ser tutelável por meio de ação civil pública ou ação coletiva etc., sendo os temas que mais dominam dentro do processamento do conflito em detrimento dos aspectos materiais.

A solução jurisdicional poderia servir de instrumento eficaz e expedito para a solução e acautelamento de direitos básicos da comunidade trabalhadora, realizando, assim, o escopo de uma justiça distributiva, elevando-se o patamar dos conflitos para além do sujeito individual como sujeito principal de imputação de direitos, ou seja, para interesses da coletividade, que é justamente o objeto principal da legislação resultante.

Verificação que se dá pela jurisprudência a respeito do tema, a exemplo do Acórdão TRT 12ª Região RO - V7.922/97 -2. Ac. 3ª T, 3.465/98,3.4.98 (59), onde a discussão versava sobre se determinado interesse seria ou não passível de tutela mediante ACP na justiça do Trabalho.

Podemos destacar ainda, a título de exemplo, como, dependendo da forma de raciocínio da magistratura, mesmo interesse violado pode ser considerado como passível de efetiva solução por meio de tutela coletiva e, noutro momento, não, ainda que envolva o mesmo objeto e partes com igual situação. De turmas diferentes, reproduzimos, em síntese, acórdãos do E. TRT- 8ª. Região.

No processo TRT 4ª T. RO 3200/98 (60), autor Ministério Público do Trabalho e ré TRANSBRASIL S/A. Pretendia o autor que a ré fosse condenada em obrigação de não fazer, para que os trabalhadores que não estivessem recebendo o adicional de periculosidade não fossem postos a trabalhar no pátio de manobras do aeroporto internacional de Belém "Val-de-Cães", A decisão excluiu a legitimidade ativa do MPT, pois não estaria configurada a hipótese de direito coletivo ou difuso a ser tutelado.

Apontando que :

"Na hipótese em exame, o que pretende o Ministério Público do Trabalho é o mesmo que já define a lei , sendo absolutamente fora de propósito individualizá-la para reconhecer os direitos daqueles que trabalham nesse ou naquele lugar a receberem o adicional de periculosidade . Ademais a obrigação pretendida é de não fazer, ou seja, não permitir o exercício de trabalho no pátio de manobras do aeroporto aos que não recebem o adicional, frustrando-lhe o direito de trabalhar e depois discutir"

"Em consequência, ainda que de acordo com o entendimento desta Relatora, a mens legis impulsione no sentido de fortalecer a ação do Parquet , sem dúvida fundamental para os fins sociais das normas de proteção ao trabalho, aqui não se trata de limitar seu campo de atuação, mas de evitar que um comando condenatório genérico venha trazer prejuízos para a sociedade, até porque se de um lado estão trabalhadores exigindo proteção, de outro estão empregadores que também fazem jus ao contraditório, na defesa de seus interesses." (Acórdão TRT 8ª Região -4ª T. RO 3.200/98, Relator Luiz Albano Mendonça de Lima- Juiz Togado. sessão 8 de setembro de 1998.) (grifo nosso).

Por outro viés, nos autos do Processo TRT 8ª Região- 3ª T/RO 3695/98 (61), autor Ministério Público do Trabalho e ré VARIG S/A, pretendia também o autor que a ré fosse condenada em obrigação de não fazer para que os trabalhadores que não estivessem recebendo o adicional de periculosidade não fossem postos a trabalhar no pátio de manobras do aeroporto internacional de Belém "Val-de-Cães". Foi reconhecida a legitimidade ativa do MPT e a possibilidade jurídica do pedido. Em brilhante fundamentação, demonstra a configuração na hipótese de direito laboral essencial aos trabalhadores, onde pressentimos o juízo de que não é o número de sujeitos afetados ou determinados que leva à configuração de um interesse como social, mas sim a sua importância para o tecido social, para ao fim deferir a tutela.

De fato, o acórdão é vazado nos seguintes termos:

"A lei prevê que para os trabalhadores sujeitos a riscos seja pago o adicional de periculosidade (art. 193 consolidado). Trata-se , portanto, de indeclinável obrigação empresarial." (..) "Sabe a Egrégia Corte , que já decidiu inúmeras reclamações trabalhistas sobre o tema, que as empresas que operam nesse Aeroporto - a ré inclusive - de forma reiterada , exigem o trabalho de seus empregados nessa área de risco, mas, também, de forma reiterada, deixam de pagar o adicional de periculosidade devido. São inúmeras as decisões favoráveis aos trabalhadores" (...) " A ação civil pública proposta permite, a meu ver, uma solução única e definitiva, prevenindo evitando as reiteradas reclamações trabalhistas" (..)" Pelo que se vê neste e em outros autos, as inovações resultantes da emergência de novos direitos das coletividades e dos grupos e de seu correspondente direito processual ainda não foram bem assimilados pelos operadores do direito , magistrados principalmente. Só assim se explica a resistência em acolher ações como a destes autos. Em lugar de se entregar a prestação jurisdicional de forma mais ampla e concentrada possível , prefere-se as soluções individuais. Em lugar de uma única ação , prefere-se miríades delas. Em lugar de acolher a benfazeja inovação, se a rejeita" (TRT 8ª Região -3ª T. RO 3695/98, revisor e prolator José Maria Quadros Alencar - Juiz Togado.sessão de 9 de outubro de 1998).

Seguindo no raciocínio ilustra o acórdão :

" não compreendo a alegação de usurpação do poder de comando da empresa. Afinal, o poder de comando da empresa há de ser exercido nos limites da lei, e é isso o que pretende o Ministério Público." (...)" De igual modo não compreendo em que a pretensão do Ministério Público afrontaria a liberdade do trabalho. Afinal o conceito de liberdade de trabalho não inclui , como é evidente, a exigência pelas empresas de traballho em desacordo com a lei, A liberdade de trabalho não é princípio que possa ser invocado para permitir a realização de atividades em contrariedade com a lei" (TRT 8ª Região -3ª T. RO 3695/98, revisor e prolator José Maria Quadros Alencar - Juiz Togado.sessão de 9 de outubro de 1998).

Podemos perceber nos dois exemplos o quanto a perspectiva de realização da justiça distributiva, adaptando-se aos moldes específicos dos direitos laborais, pode levar a caminhos tão opostos e, cumpre nos destacar que, uma vez que os interesses dos trabalhadores, tutelados pelo direito do trabalho, sempre serão interesses sociais, e que, vislumbramos no futuro próximo, serão poucos estes direitos tutelando o mínimo, de forma a não permitir a maior desagregação do tecido social, restando sempre um campo mínimo e necessário de garantias básicas da dignidade do trabalho humano.

Temos de aceitar a premissa que, neste campo, não interessa o número de trabalhadores atingidos, pois ainda que sejam apenas alguns trabalhadores a ser lesados efetivamente em um direito básico, que pode até não ter um efeito patrimonial imediato, temos de considerar a potencialidade do dano social caso a conduta perdure de forma injustificada, pois mesmo nesta sociedade de exclusão, ainda existirá senso mínimo de interesses cuja violação diz respeito a um direito social e coletivo da comunidade trabalhadora, como nos exemplos acima.

Assume, também, a jurisdição caráter pedagógico sobre a empresa que, além de ser condenada a não exigir o ilícito, terá conseqüências patrimoniais no caso de descumprimento, à serem aplicadas em processo de execução das multas fixadas.

Um interesse no campo laboral, para ser definido como metaindividual, não deve estar relacionado ao número de sujeitos lesados concretamente mas à gravidade para o tecido social que representa, hoje quase desagregado pela violência do capital.

Sendo evidente que a menor ou maior definição dos sujeitos ou da indivisibilidade do objeto levará ao enquadramento do interesse como difuso, coletivo ou individual homogêneo, de acordo com a lei, que atua como estrutura de acoplamento e serve o manuseio destes conceitos como meio de inclusão destes interesses no sistema jurídico, não devem e não podem substituir a finalidade do permissivo legal de melhor possibilitar a tutela de tais interesses, que é o que vem ocorrendo em muitos processos, por haver distorção de visão causada pelo paradigma normativista que predomina nos tribunais.

Por outro lado, o avanço na construção de novos paradigmas traz urgente o repensar de uma estrutura judicial centrada apenas sobre o emprego formal, nos moldes do artigo 3º da CLT, e isto hoje é isento de dúvidas. Para tal, é necessário não apenas ampliar a tutela do trabalho de vínculo estável, como é o caso dos servidores públicos, como também que seja tutelado pela Justiça do Trabalho o trabalho não regido pela relação de emprego, na defesa de todos os princípios básicos de sua organização, como os acidentes de trabalho, os crimes contra a organização do trabalho, a ordenação até mesmo dos trabalhadores do comércio informal no caso de conflitos etc.

Essa mudança de paradigma poderá ter efeito de justiça distributiva, por exemplo, no questionamento dos novos conflitos entre capital e trabalho no caso das cooperativas que se espalham pelo país.

De fato, dentro do paradigma vigente, verificamos nestes casos, quando se questiona uma cooperativa, é o fundamento de que, na verdade, o que ocorre é relação de emprego, requerendo-se, portanto, o pagamento das verbas trabalhistas devidas e o desfazimento do engodo legal mediante o reconhecimento do vínculo empregatício, justamente porque, do contrário, a Justiça do Trabalho se tornaria incompetente para solucionar o conflito.

Dentro da nova perspectiva que vislumbramos da atuação judicial, temos que em casos semelhantes não seria de se reconhecerem vínculos empregatícios etc., pois, no mais das vezes, isso leva à demissão de trabalhadores.

Deveria ocorrer uma intervenção de justiça distributiva fazendo com que a cooperativa se torne efetiva, distribuindo-se os lucros entre os cooperados, fazendo-se depositar as parcelas previdenciárias devidas, tendo a Justiça do Trabalho a competência para decretar a intervenção em falsas cooperativas, para que de fato funcionem como cooperativas, tornando indisponíveis bens de falsos administradores e outras medidas judiciais, a fim de que os possíveis prejuízos dos trabalhadores quanto aos direitos e lucros auferidos por aquela revertam de fato a seu favor, até que, por meios democráticos, pudessem designar novos diretores.

Evidente que, dentro da estrutura atual esta forma de intervenção soa de todo impossível, o que evidente pressupõe lógico aumento da competência dos Tribunais e redimensionamento da forma de atuação destes e, especialmente, da sua relação com o Ministério do Trabalho e suas Delegacias Regionais do Trabalho e Ministério Público do Trabalho.

Neste sentido, eficaz intervenção nesta espécie de conflito, requer nova estrutura judiciária e regulamentação legal. Com efeito, devemos pensar a criação no âmbito trabalhista de legislação nos moldes da Lei 8.884/94 - Lei Antitruste - o que requer mudança na estrutura e competência dos TRT´s para apreciar conflitos para além da mera dimensão de reparação do dano.

Dentro deste prisma, impõe-se nova Lei definidora da atribuição de competências ao Ministério do Trabalho e suas Delegacias Regionais, com profunda reforma em sua estrutura neste aspecto, para a instauração de processos administrativos assemelhados aos dos hoje existentes e regulados pela Lei 8.884/94 - Lei Antitruste -, inclusive com regulamentação específica e nos mesmos moldes e atribuições previstas da referida lei, adaptando-se, logicamente, aos parâmetros necessários e indispensáveis à proteção dos interesses da coletividade trabalhadora, que seria a titular dos bens jurídicos protegidos por esta nova legislação (62).

Isto se torna lógico, porque a lei 8.884/94 é hoje eficaz por surgir no contexto da nova sociedade pós-industrial e adaptada aos conflitos desta, sendo para nós evidente que os conflitos entre capital e trabalho, mutatis mutandis, assumem os mesmos perfis. É necessário e urgente uma legislação que permita a solução dos conflitos, nos mesmos moldes, em defesa dos bens jurídicos mínimos de garantia do tecido social do trabalho (63).

Isto evidentemente traz um redimensionamento do inquérito civil público do MPT, que seria mais um instrumento dentro do escopo de pacificação destes novos conflitos, e que vem sendo competentemente usado pelo parquet trabalhista (64), mudando a forma de atuação deste, deixando de ser, como hoje parece evidenciar-se, o meio extrajudicial de processamento de conflitos de dimensão coletiva.

Destarte, também impõe uma reestruturação do Judiciário Trabalhista, onde vislumbramos poderiam ser mantidos os atuais tribunais regionais, mas criando-se uma Turma ou Seção Especializada para julgamento destes conflitos para o exercício do duplo grau de jurisdição de caráter definitivo, ou como instância originária para conflitos de dimensão regional, com recurso ordinário para uma câmara ou seção especializada a ser criada dentro do Superior Tribunal de Justiça para apreciar estes conflitos.

Desta forma seria extinto o Tribunal Superior do Trabalho, somente existindo duas instâncias recursais no processo trabalhista, mantida e respeitada a competência de Recurso Extraordinário, sem efeito suspensivo, para o Supremo Tribunal Federal nos casos de violação direta e literal da Constituição.

Necessário também o desenvolvimento de novos instrumentos de tutela coletiva. Assim, podemos amadurecer a Reclamação Trabalhista Civil Coletiva, considerando o recente dano feito pelo legislador na Lei 7.347/85 - Lei de Ação Civil Pública (65), recompondo a integridade do sistema processual originário do Código de Defesa do Consumidor .

Com efeito, as alterações na lei de ação civil pública não tiveram o efeito de alterar o CDC, por se tratar de lei complementar, o que pensamos permite a construção de ação inominada, que aqui preliminarmente atribuímos o nomen Reclamação Trabalhista Civil Coletiva onde podem ser eficazmente tutelados os interesses metaindividuais do campo trabalhista, com aplicação dos aspectos processuais previstos na Lei 8.078/90, somente se adaptando ao direito material e bens jurídicos dos conflitos coletivos entre capital e trabalho, o que deverá ser mais aprimorado pela doutrina mais abalizada ou outro estudo mais específico.


4. À guisa de conclusão.

Nas limitações destas reflexões, que apenas pretendem contribuir para a construção de novos paradigmas de atuação do judiciário trabalhista, o que por si só pode parecer por demais pretensioso, faz-nos ser cautelosos no sentido de não apresentar conclusões definitivas, embora possamos delinear aspectos preliminares a que estas reflexões nos trazem.

Parece-nos fora de dúvidas que a crise do Judiciário Trabalhista vai muito além de uma crise de estrutura, mas alcança aspectos do seu paradigma formador, o que leva à necessária ampliação de competências para que possa processar todos os conflitos decorrentes da relação entre capital e trabalho, e não apenas as decorrentes do emprego formal.

Avulta dentro da nova sociedade o campo de atuação e presença dos conflitos envolvendo interesses metaindividuais (difusos, coletivos e individuais homogêneos) dentro do campo do direito laboral que, dada a simbologia do seu objeto, o trabalho humano, deve necessariamente ter significado coletivo a proteção das garantias básicas de dignidade humana, mesmo na sociedade de excluídos que hoje se delineia.

Logo, dentro deste estado de coisas, a perspectiva de realização da justiça distributiva é que deve ser incentivada e construída pelos atores do direito, adaptando-se aos moldes específicos dos direitos laborais, superando-se o paradigma normativista que domina nos tribunais.

Neste diapasão, além do lógico aumento de competências dos Tribunais Regionais, temos a necessidade de redimensionamento da forma de atuação destes e especialmente da sua relação com o Ministério do Trabalho e suas Delegacias Regionais do Trabalho e o Ministério Público do Trabalho, o que pode ser feito por meio da criação no âmbito trabalhista de legislação nos moldes da Lei 8.884/94 - Lei Antitruste - o que requer mudança na estrutura e competências dos TRT´s, para apreciar conflitos não só da mera dimensão de reparação do dano, mas de intervenção, de se evitarem e prevenirem danos aos interesses da coletividade trabalhadora.

Sem olvidar de nova competência ao Ministério do Trabalho e suas Delegacias Regionais, com reforma em sua estrutura para a instauração de processos administrativos assemelhados aos hoje existentes e regulados pela Lei 8.884/94 - Lei Antitruste -, inclusive com regulamentação específica e atribuições previstas da referida lei, adaptando-se, logicamente, aos parâmetros necessários e indispensáveis à proteção dos interesses da coletividade trabalhadora, que seria o titular dos bens jurídicos protegidos por esta nova legislação.

Todas as anteriores premissas levam a pensar no redimensionamento do inquérito civil público do MPT, além de reestruturação do Judiciário Trabalhista, onde seriam mantidos os atuais tribunais regionais, criando-se uma Turma ou Seção Especializada para julgamento destes conflitos para o exercício do duplo grau de jurisdição de caráter definitivo, ou, como instância originária para conflitos de dimensão regional, com recurso ordinário para uma câmara ou seção especializada a ser criada dentro do Superior Tribunal de Justiça para apreciar estes conflitos. Extinto o Tribunal Superior do Trabalho, somente existindo duas instâncias recursais no processo trabalhista, mantida e respeitada a competência de um recurso extraordinário, sem efeito suspensivo, para o Supremo Tribunal Federal nos casos de violação direta e literal da constituição.

Assim, interligados é evidente que se trata mais do que construir nova Justiça do Trabalho; é preciso pensar em novo Sistema Judiciário do Trabalho, onde órgãos jurisdicionais e administrativos atuam de forma integrada.

Por fim, pensar no desenvolvimento de novos instrumentos de tutela coletiva como a Reclamação Trabalhista Civil Coletiva, com aplicação dos aspectos processuais previstos na Lei 8.078/90 somente se adaptando ao direito material e bens jurídicos dos conflitos coletivos entre capital e trabalho ou até mesmo criando-se lei específica no âmbito trabalhista.

Como dissemos no princípio deste texto, estas são somente reflexões que podem servir de elemento para rediscussão da Justiça do Trabalho, e se serviu ao menos para suscitar o benefício da dúvida aceitamos com felicidade o resultado.


NOTAS
  1. A propósito o texto de Hermínio Martins. Hegel, Texas : temas de Filosofia e Sociologia. In Amazônia e a crise da modernização .Organizadoras Maria Angela Díncao e Isolda Maciel da Silveira.Belém : Museu Paraense Emílio Goeldi.1994 pag. 5 a 23
  2. Ainda que em momentos de crise pessoal de sofrimento a maioria dos homens corra para a sua fé, mas justamente porque perdeu o seu laço de controle sobre a natureza, por isso não é de estranhar nesse período de crise global o crescimento de fundamentalismos.
  3. SILVA, Josué Pereira da Silva. A Crise da Sociedade do Trabalho em Debate.In : Lua Nova. Revista de Cultura e Política - SP : CEDEC, no. 35, 1995. Página 168.
  4. Apud SILVA, Josué Pereira da Silva. A Crise da Sociedade do Trabalho em Debate.In : Lua Nova. Revista de Cultura e Política - SP : CEDEC, no. 35, 1995. Pagina 170-1
  5. SILVA, Josué Pereira da Silva. A Crise da Sociedade do Trabalho em DebateIn : Lua Nova. Revista de Cultura e Política - SP : CEDEC, no. 35, 1995. Pagina 170-1
  6. SILVA, Josué Pereira da Silva. A Crise da Sociedade do Trabalho em Debate. In: Lua Nova. Revista de Cultura e Política - SP : CEDEC, no. 35, 1995. Pagina 170. Exemplificativo deste papel de destaque dentro da teoria marxista pode ser observado no seguinte trecho do Manifesto Comunista " A burguesia , porém, não forjou somente as armas que lhe darão a morte; produziu também os homens que manejarão essas armas - os operários modernos , os proletários" (grifo nosso (In. MARX, Karl e ENGELS, Friedrich. Obras Escolhidas. Vol.1. São Paulo : Alfa-Omega. Página 26.)

  • HOBSBAW, Eric. A Era dos Extermos - O breve século XX - 1914 - 1991 SP : Companhia das Letras.1995.página 262
  • SILVA, Josué Pereira da Silva. A Crise da Sociedade do Trabalho em Dabate.In : Lua Nova. Revista de Cultura e Política - SP : CEDEC, no. 35, 1995. Pagina 176
  • GENRO, Tarso Fernando Herz. Utopia Possível. 2ª ed. Porto Alegre : Artes e Ofícios.1995.página 64
  • GENRO, Tarso Fernando Herz. Utopia Possível. 2ª ed. Porto Alegre : Artes e Ofícios.1995.página 130
  • GENRO, Tarso Fernando Herz. Utopia Possível. 2ª ed. Porto Alegre : Artes e Ofícios.1995.página 131
  • GENRO, Tarso Fernando Herz. Utopia Possível. 2ª ed. Porto Alegre : Artes e Ofícios.1995.página 131
  • SILVA, Josué Pereira da Silva. In : Lua Nova. Revista de Cultura e Política - SP : CEDEC, no. 35, 1995. Pagina 172
  • GENRO, Tarso Fernando Herz. Utopia Possível. 2ª ed. Porto Alegre : Artes e Ofícios.1995.página 136 Como aponta Peter Drucker o número de empregos em manufatura não cresceu, mas ao contrário, de 1960 a 1990 ele caiu como porcentagem da força de trabalho e também em números absolutos. DRUCKER, Peter Ferdinand. A Sociedade Pós-capitalista. Tradução de Nivaldo Montignelli Jr. São Paulo : Pioneira.1993. Coleção novos umbrais. P´ágina 44.
  • GENRO, Tarso Fernando Herz. Utopia Possível. 2ª ed. Porto Alegre : Artes e Ofícios.1995.página 65
  • GENRO, Tarso Fernando Herz. Utopia Possível. 2ª ed. Porto Alegre : Artes e Ofícios.1995.página 94-5
  • GENRO, Tarso Fernando Herz. Utopia Possível. 2ª ed. Porto Alegre : Artes e Ofícios.1995.página 65
  • GENRO, Tarso Fernando Herz. Utopia Possível. 2ª ed. Porto Alegre : Artes e Ofícios.1995.página 65-6
  • GENRO, Tarso Fernando Herz. Utopia Possível. 2ª ed. Porto Alegre : Artes e Ofícios.1995.página 94
  • DRUCKER, Peter Ferdinand. A Sociedade Pós-capitalista. Tradução de Nivaldo Montignelli Jr. São Paulo : Pioneira.1993. Coleção novos umbrais. pagina 44.
  • GENRO, Tarso Fernando Herz. Utopia Possível. 2ª ed. Porto Alegre : Artes e Ofícios.1995.página 94
  • GENRO, Tarso Fernando Herz. Utopia Possível. 2ª ed. Porto Alegre : Artes e Ofícios.1995.página 126-128
  • A Sociedade Pós-capitalista. Tradução de Nivaldo Montiglinelli Jr. São Paulo : Pioneira.1993. Coleção Novos Umbrais.página 45
  • DUPAS, Gilberto. O Novo Paradigma do Emprego.In São Paulo em Perspectiva.Vol 12/ no. 3 . Revista Fundação SEAD.1998. página 69
  • DUPAS, Gilberto.O Novo Paradigma do Emprego.In São Paulo em Perspectiva.Vol 12/ no. 3 . Revista Fundação SEAD.1998. página 69. Segundo Estatísticas do BID , 56% da força laboral da América Latina está no setor informal, dados diviulgados em reunião da OEA em Washington em 26.04.99, (Diário do Pará, 27 de abril de 1999, Caderno 6. Página 6.
  • O que discordamos, pois, inclusive, há pesquisas que demonstram como o impacto das modernas relações do capital e trabalho afetam e levam a um crescimento do setor informal na região, não se tratando de simples relação direta entre o desemprego formal e a corolária expansão do mercado informal, pois como destaca Ana Laura dos Santos Sena, as concepções dualistas da relação existente entre sistema informal e sistema formal de emprego não conseguem explicar toda a complexidade existente no funcionamento da economia e do desenvolvimento das atividades produtivas (Tese apresentada no Curso Internacional de Mestrado em Planejamento do Desenvolvimento do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos da UFPa, no ano de 1998, intitulada "O Trabalho Informal nas Ruas e Praças de Belém - Estudo sobre o comércio de produtos alimentícios", sob a orientação da Profa. Dra. Edna Maria R. de Castro.)
  • GENRO, Tarso.Crise Terminal do Velho Direito do Trabalho.Revista Anamatra, no. 26, abril/maio/96.
  • GENRO, Tarso.Crise Terminal do Velho Direito do Trabalho. Revista Anamatra, no. 26, abril/maio/96.
  • Para Thomas Kuhn , ciência normal é aquela que possui uma hegemonia no meio de uma comunidade de cientistas, baseada em uma ou mais realizações científicas passadas, e que são reconhecidas durante algum tempo por esta comunidade como proporcionando os fundamentos para sua prática científica. A Estrutura das Revoluções Científicas. 3ª ed. Edição. São Paulo : Editora Perspectiva.1992. Coleção Debates., capítulo 1. A rota para a Ciência Normal, página 29 e seguintes.
  • KUHN, Thomas S. A Estrutura das Revoluções Científicas. 3ª ed. Edição. São Paulo : Editora Perspectivas .1992. Coleção Debates., Introdução, especialmente página 25.
  • KUHN, Thomas S. A Estrutura das Revoluções Científicas. 3ª ed. Edição. São Paulo : Editora Perspectivas .1992. Coleção Debates. página 84
  • KUHN, Thomas S. A Estrutura das Revoluções Científicas. 3ª ed. Edição. São Paulo : Editora Perspectivas .1992. Coleção Debates. página 95
  • KUHN, Thomas S. A Estrutura das Revoluções Científicas. 3ª ed. Edição. São Paulo : Editora Perspectivas .1992. Coleção Debates. .página 105
  • SADER, Emir.ESTADO E POLÍTICA EM MARX :para uma crítica da filosofia política . São Paulo : Cortez.1993.p.27.
  • GENRO, Tarso.Crise Terminal do Velho Direito do Trabalho.Revista Anamatra, no. 26, abril/maio/96.
  • Ainda que diferente fosse o nosso desejo, é flagrante a hegemonia de novo modelo de relações entre capital e trabalho que hoje vai se consolidando.
  • FARIA, José Eduardo. A Crise do Pode Judiciário . IN Justiça e Democracia. Revista Semestral de Informações e Debates. São Paulo : Revista dos Tribunais, no, 01. 1996.pagina 21
  • MARTINS FILHO, Ives Gandra da Silva. Processo Coletivo do Trabalho. 2ª edição.São Paulo : LTr.1996.página199.
  • FARIA, José Eduardo. A Crise do Poder Judiciário . IN Justiça e Democracia. Revista Semestral de Informações e Debates. São Paulo : Revista dos Tribunais, no, 01. 1996.Página 29
  • Não devemos esquecer das especiais lições de Boaventura de Sousa Santos, no clássico artigo "A Sociologia dos Tribunais e a Democratização da Justiça. In Pela Mão de Alice O Social e a Política na Pós-modernidade. 3ª ed. Cortes Editora, páginas 161 a 186, a respeito do tema.
  • FARIA, José Eduardo. A Crise do Poder Judiciário . IN Justiça e Democracia. Revista Semestral de Informações e Debates. São Paulo : Revista dos Tribunais, no, 01. 1996.Página 32
  • LIMA, Renato Sérgio de. Acesso à Justiça e Reinvenção do Espaço Público - Saídas possíveis de pacificação social . In São Paulo em Perspectiva. Vol 11.no. 3. Revista da Fundação SEAd.1997, página 86
  • LIMA, Renato Sérgio de. Acesso à Justiça e Reinvenção do Espaço Público - Saídas possíveis de pacificação social . In São Paulo em Perspectiva. Vol 11.no. 3. Revista da Fundação SEAd.1997, página 88
  • LIMA, Renato Sérgio de. Acesso à Justiça e Reinvenção do Espaço Público - Saídas possíveis de pacificação social . In São Paulo em Perspectiva. Vol 11.no. 3. Revista da Fundação SEAd.1997, página 88
  • LIMA, Renato Sérgio de. Acesso à Justiça e Reinvenção do Espaço Público - Saídas possíveis de pacificação social . In São Paulo em Perspectiva. Vol 11.no. 3. Revista da Fundação SEAd.1997, página 90
  • Importante contribuição neste norte apresentado de redimensionamento do campo de atuação do judiciário trabalhista através da ação civil pública pode ser observado no artigo "Dano Moral Trabalhista - Configuração Própria e Autônoma, Competência da Justiça do Trabalho, Ações Individuais para Tutela de Direitos Morais Laborais Tradicionais, Novas e Ações Civis Públicas Trabalhistas" de autoria de Jorge Pinheiro Castelo. Revista LTr. 63-02.1999, especialmente páginas 201 e 202.
  • Kelsen já havia formulado igual pensamento, como podemos verificar na seguinte passagem "E quando uma decisão judicial se converte em coisa julgada, se não mais poder ser cassada, então a verdade ou falsidade do enunciado, que é o sentido do ato da declaração judicial, de modo algum interessa mais. Quando se diz que alguém foi condenado inocente, visto que ele "em verdade" não cometeu o delito pelo qual foi sentenciado , nada se expressa de juridicamente relevante" KELSEN, Hans. Teoria Geral das Normas. Tradução de José Florentino Duarte. Sérgio Antonio Fabris Editor.Porto Alegre : 1986.pag. 167. Podemos apontar a diferença no fato de que, na teoria de Luhman, isto não implica total isolamento jurídico dos fatos ocorridos no entorno (meio ambiente) e que levaram à possibilidade da decisão.
  • MACHADO, Antônio Alberto & GOULART, Macedo Pedroso. Ministério Público e Direito Alternativo . São Paulo : Acadêmica.1992.P. 28
  • Sobre o direito como rede de inclusão, leia-se GIORGIO, Rafael. Direito , Democracia e Risco - Vínculos com o futuro. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris.1998, especialmente páginas 133 a 163.
  • Devemos alertar que a transfomação a que nos referimos não se dá como pensava Josef Esser, numa transmutação de susbstância de um fato extra-jurídico para um fato jurídico, crítica esta que foi competentemente feita por Hans Kelsen em sua obra Teoria Geral das Normas, mas sim transformação no sentido de que ao ser incluído no universo do sistema jurídico, passa o fenômeno a responder com as características próprias do direito. Vale transcrever a crítica de Kelsen :
    " No fato de que o ato pelo qual se cria uma norma jurídica correspondente à norma moral ou postulado político-social, ao receber a norma jurídica este conteúdo, não existe "transformação" da norma moral ou do postulado político-social .A norma moral ou postulado político - social conserva seu caráter diferente do Direito ; eles não se convertem em Direito; tampouco como a conduta de um indivíduo, a qual corresponde a uma norma moral, é uma transformação da norma moral. Assim como apenas se pode dizer: o estabelecimento de uma norma jurídica, cujo conteúdo corresponde a uma norma moral ou uma norma de política social, é moralmente ou político-socialmente boa "
    "Não se pode falar de uma "transformação" de Moral ou de Política Social em Direito. Moral e Política Social de um lado, e Direito de outro, são diferentes planos de dever ser ou diferentes esferas de norma" KELSEN, Hans. Teoria Geral das Normas. Tradução de José Florentino Duarte. Sérgio Antonio Fabris Editor.Porto Alegre : 1986.pag. 152-153. Destaca-se que a aparente exclusão dos valores éticos e morais do atuar do direito é apenas corolário da necessidade de delimitar campo próprio de atuação, mas que lhe não torna algo isolado e logo sujeito a influências de entorno, dos valores éticos e morais que estão presentes na sociedade (Luhman).
  • GIORGI, Raffaele de. Direito, Democracia e Risco : vínculos com o futuro. Porto Alegre : Sergio Antonio Fabris.1998.pag. 158
  • GIORGI, Raffaele de. Direito, Democracia e Risco : vínculos com o futuro. Porto Alegre : Sergio Antonio Fabris.1998.pag. 158
  • FARIA, José Eduardo. A Crise do Pode Judiciário . IN Justiça e Democracia. Revista Semestral de Informações e Debates. São Paulo : Revista dos Tribunais, no, 01. 1996.Páginas 20 e 21
  • Originariamente a expressão "limbo jurídico" foi cunhada por Anna de Vita . Cfr. MANCUSO, Rodolfo de Camargo . Ação Civil Pública .2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais.1992.P.20.
  • -MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Interesses Difusos: Conceito e legitimação para agir.3 ed,.São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994.P. 37.
  • LUHMANN, Nilklas & GEORGI, Raffaele De. Teoria de la sociedade. Guadalajara : Universidade de Guadalajara. 1993pa.49
  • No mesmo sentido, pode ser verificado In. LUHMANN, Nilklas & GEORGI, Raffaele De. Teoria de la sociedade. Guadalajara : Universidade de Guadalajara. 1993, paginas 51-52
  • É verdade, que Luhmann reserva a função de "acoplamento estrutural" entre o direito e política à Constituição, que seria este canal de irritabilidade que permite a que o sistema jurídico selecione o que pode ser incluído dentro da sua estrutura. Mas pensamos que a noção também pode ser estendida a outros fenômenos onde a linha entre o jurídico e o político seja mais estreita, como é o caso dos interesses coletivos entre capital e trabalho.
  • Revista LTR. 62. -1998.09.páginas 1278/1280. São Paulo.
  • TRT 8ª Região -4ª T. RO 3.200/98, relator Luiz Albano Mendonça de Lima- Juiz Togado. sessão 8 de setembro de 1998.
  • TRT 8ª Região -3ª T. RO 3695/98, revisor e prolator José Maria Quadros Alencar - Juiz Togado.sessão de 9 de outubro de 1998.
  • O Artigo 1º, parágrafo único da Lei 8.884/99, declara que coletividade é a titular dos bens jurídicos que protege.
  • Peço a devida vênia para não deitar as linhas deste novo instrumento legal, mas que pode ser facilmente vislumbrado a partir de uma leitura da Lei 8.884/94 que, em posterior momento poderemos aventurar-nos a construir este "projeto legislativo" com as competentes adaptações aos direitos da coletividade trabalhadora.
  • Neste sentido a contribuição do Procurador do Trabalho José Claudio Monteiro de Brito Filho no artigo "Mediação e Arbitragem como meios de solução de conflitos coletivos de trabalho". Revista LTr. São Paulo. Vol62, n.3.p.345-351.mar.1998.
  • Basta verificar a redação originária da Lei de ação civil pública que trazia apenas a descrição do efeito "erga omnes", o que foi alterado pela lei 9.494/99 e que, por sua vez, alterada pela MP 1.798-2, de 11 de março de 1999, mas que, pensamos, o tema rende ba discussão sobre a sua aplicação ao processo do trabalho por meio da ação civil pública trabalhista como instrumento de construção doutrinária e jurisprudêncial de atuação no direito do trabalho.

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    Informações sobre o texto

    Texto originalmente elaborado como requisito parcial para a obtenção dos créditos da disciplina de Direito do Trabalho, no curso de Mestrado em Direito da UFPA, orientado pela Prof. Dra. Rosita de Nazaré Sidrim Nassar

    Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

    ROCHA, Ibraim José das Mercês. Justiça do Trabalho. Breve reflexão sobre a sua crise e apontamentos sobre novos rumos para um sistema judiciário do trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 41, 1 maio 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1244. Acesso em: 26 abr. 2024.