Nebulosidades modernas e pós-modernas.

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14/01/2024 às 08:07
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[1] Francis Rory Peregrine Anderson (Londres, 11 de setembro de 1938) é um historiador e ensaísta político marxista inglês, professor de História e Sociologia na Universidade da Califórnia em Los Angeles e editor da New Left Review. É irmão do historiador Benedict Anderson. Perry Anderson trouxe para a revista a um profundo conhecimento da obra de Sartre e do marxismo. Inicialmente sua linha editorial sofreu a influência de Gramsci e mais tarde de Lukács e Althusser. Dedicou-se a introduzir, comparar e criticar as principais correntes da tradição marxista ocidental. Em 1962, publicou "Portugal and the End of Ultracolonialism", onde estudou a estrutura do império colonial português e previu o seu fim. A derrota do movimento de 1968 na França conduziu Perry Anderson ao estudo do Estado burguês nos países desenvolvidos. Daí resultaram dois livros: Passagens da Antiguidade ao Feudalismo e Linhagens do Estado Absolutista, ambos de 1974, além de uma obra não concluída sobre as revoluções burguesas.

[2] Richard Rorty (Nova Iorque, 4 de outubro de 1931 - Palo Alto, 8 de junho de 2007) foi um filósofo pragmatista estadunidense. A sua principal obra é Filosofia e o Espelho da Natureza (1979). Foi um filósofo que esteve em pé de guerra com a filosofia durante toda a sua vida. Defendia-se contra a pretensão de absoluto do pensamento analítico e renunciou durante décadas, a modo de protesto contra as correntes tradicionais do seu âmbito, a dirigir uma cátedra de filosofia (apenas aceitou até 1982 um lugar na Universidade de Princeton). Disse numa entrevista: "Creio que as histórias tristes sobre padecimentos concretos muitas vezes são um melhor caminho para modificar o comportamento das pessoas que citar regras universais".

[3] O que se costuma chamar de linguistic turn, ou giro linguístico, foi a percepção de que “todo pensamento é signo; a palavra ou o signo que utiliza o homem é o homem mesmo; o pensamento é de natureza linguística; não se pensa… O “giro linguístico” desloca a centralidade do objeto ou das coisas representadas na mente (ponto de partida da lógica formal) para a linguagem e as palavras. Nesse caso, as palavras (a linguagem e o discurso) tornam-se a referência (o centro ou ponto de partida) das coisas (grifou-se).

[4] Cara Alice Du Bois (1903-1991) foi uma antropóloga cultural americana e uma figura chave nos estudos

da cultura, personalidade e na antropologia psicológica em geral. Em 1954, ela fazia parte do fundo patrimonial Samuel Zemurray Jr. e Doris Zemurray Stone-Radcliffe Professor, na instituição de ensino Radcliffe College.  Após a aposentadoria de Radcliffe, ela foi representante na Universidade Cornell (1971–1976) e, por um período, na Universidade da Califórnia em San Diego (1976). Ela foi eleita membro da Academia Americana de Artes e Ciências em 1955, presidente da Associação Antropológica Americana em 1968–1969 e da Associação de Estudos Asiáticos em 1969–1970, a primeira mulher a receber essa honra. De 1937 a 1939, Du Bois viveu e realizou pesquisas na ilha de Alor, parte das Índias Orientais Neerlandesas, atual Indonésia. Ela coletou estudos de caso detalhados, entrevistas de história de vida e administrou vários testes de personalidade (incluindo testes de Rorschach), que ela interpretou em colaboração com Kardiner e publicou como The People of Alor: A Social-Psychological Study of an East Indian Island, em 1944. Um de seus principais avanços teóricos neste trabalho foi o conceito de "estrutura modal de personalidade". Com essa noção, ela modificou ideias anteriores da escola de antropologia, cultura e personalidade sobre a "estrutura básica da personalidade”, demonstrando que, embora sempre haja variação individual dentro de uma cultura, cada cultura favorece o desenvolvimento de um tipo ou tipos particulares, que serão o mais comum nessa cultura. Seu trabalho influenciou fortemente outros antropólogos psiquiátricos, incluindo Robert I. Levy, com sua etnografia centrada na pessoa, e Melford Spiro. Por seu serviço ao país no OSS, Du Bois recebeu o Prêmio de Serviço Civil Excepcional do Exército dos Estados Unidos em 1946. O governo tailandês a honrou com a Ordem da Coroa da Tailândia em 1949 por seus esforços durante a guerra em nome da Tailândia.

[5] A Gaudium et Spes marcou as orientações pastorais da Igreja em relação às questões relativas à vida da pessoa em sociedade. Outros documentos foram emanados pelos pontificados subsequentes, porém, podemos afirmar que ela é a referência principal para a maioria dos textos sociais posteriores. A Lumen Gentium é uma constituição dogmática que procura compreender a Igreja, seguidora de Cristo, “Luz dos Povos, na perspectiva de seu interior, de sua natureza organização e função.

[6] Em 1989, o cientista político e economista americano Francis Fukuyama publicava seu famoso artigo O fim da história? Na revista The National Interest. Nele, argumentava que a difusão mundial das democracias liberais e do livre capitalismo de mercado possivelmente sinalizavam o fim da evolução sociocultural da humanidade. Três anos mais tarde, ele publicaria o livro O fim da história e o último homem, onde expandia essas ideias. Decorrido um quarto de século, os pontos de vista de Fukuyama continuam sendo debatidos e criticados. Em entrevista à DW [Deutsche Welle], o filósofo de 61 anos afirma que tais ataques a seu texto são decorrentes de uma interpretação equivocada, e defende suas teses à luz de eventos geopolíticos recentes. Em muitos aspectos Fukuyama é menos hegeliano do que desejaria: como cientista político do Departamento de Estado da Casa Branca, sua leitura da filosofia de Hegel focou-se menos no que é efetivamente a sua “instância fundamental” (o desenvolvimento do Espírito) do que em uma de suas dicotomias (a História, que se contrapõe à natureza). Ademais, a hipótese sobre o “fim da História” acabou baseada em uma tradução que, inevitavelmente, traiu e falsificou o que havia registrado o sistema hegeliano: ANDERSON, Perry. O Fim da História: de Hegel a Fukuyama. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1992. “Hegel nunca utilizou os termos Ende [fim] Schluss [encerramento] no léxico de suas conclusões; somente Ziel [meta, alvo], Zweck [objetivo final, finalidade] ou Resultät. A razão disso é simples, num determinado nível. Em alemão, não existe uma palavra que combine os dois sentidos de end em inglês, como término e como propósito, e o interesse essencial de Hegel era mais pelo segundo do que pelo primeiro”. Com efeito, a teoria de Fukuyama acabou ridicularizada por inúmeros autores, entre conservadores, liberais e comunistas. No dia seguinte aos atentados às torres gêmeas, o colunista George Will referiu-se ironicamente a essa teoria: para ele, a História havia “voltado de férias”. WILL, George. The end of our holiday from history. Jewish World Review. 12 set. 2001. Disponível em < http://www.jewishworldreview.com/cols/will091201.asp

[7] Um valor básico de qualquer democracia moderna, como o da soberania popular, hoje é considerado uma verdadeira ameaça para a própria democracia: na Grécia, por exemplo, após a eleição de uma coligação de esquerda radical que colocou para votação em sufrágio universal os rumos da política econômica nacional (em um referendo no qual mais de 60% da população optou pelo “não” ao ajuste fiscal exigido pela Troika) a resposta da União Europeia foi muito contundente: ou o governo grego deveria ignorar a expressão do desejo da maioria do país, ou deveria arcar com as consequências de um “Grexit”. Como afirmou na época o primeiro-ministro Alexis Tsipras, o recado que a União Europeia deu para a Grécia e para os demais países do continente foi o de que a vontade dos povos não exerce qualquer influência nas decisões de poder: ou seja, a democracia não tem espaço, não cabe no atual modelo político-econômico. Com efeito, a constatação de Zizek sobre o sucesso da administração do capitalismo pelo Partido Comunista Chinês parece uma tendência universal: há, de fato, um “sinal agourento de que o casamento entre capitalismo e democracia está próximo do fim”. ZIZEK, Slavoj. O violento silêncio de um novo começo.

[8] Em um artigo de 2007, Eric Hobsbawm afirmou: “Quando caiu o muro de Berlim, um americano incauto anunciou o fim da história. Evito, portanto, usar uma expressão tão claramente desacreditada” HOBSBAWM, Eric. Guerra, paz e hegemonia no início do século XXI. Em: Globalização, democracia e terrorismo. Tradução: José Viegas. São Paulo: Companhia das Letras, 2007. p. 36.

[9] Dostoiévski escreveu em “Os Irmãos Karamazov”: “Se Deus não existisse, tudo seria permitido”. A frase tem sido glosada de muitas formas e feitios. Jean-Paul Sartre escreveu que “tudo é permitido se Deus não existe". Não existindo Deus, "o homem está desamparado", porque não encontra "nenhuma possibilidade de se agarrar, nem em si, bem fora de si”. Esse «desamparamento» é o princípio do existencialismo. Sem Deus, não existe causa nem fim. O homem é liberto e livre. Assim pensa o existencialismo ateu.

[10] “É proibido proibir” é uma frase pintada nos muros de Paris durante as revoltas estudantis de 1968, utilizada como referência por Caetano Veloso para fazer críticas não apenas à censura imposta pela ditadura militar brasileira, mas também à sociedade de consumo, às hierarquias e à burocratização da sociedade. “Il est interdit d’interdire!" ("É proibido proibir", em tradução livre) é um aforismo lançado por Jean Yanne na rádio francesa RTL, em forma de piada, e considerado um poliptoto por linguistas. A data dessa piada de Jean Yanne (1933-2003) não é conhecida.

[11] Finalmente, Karl Popper repõe em seu devido lugar o papel da história. Nesse particular, cumpre ter presente que sua crítica ao que denomina de historicismo tem em vista a suposição de que haveria determinismos históricos. Na tradição anglo-saxônica o emprego do termo não induz a equívocos, o mesmo, entretanto não ocorrendo na tradição latina. Nos países latinos há uma longa tradição historicista que consiste no inventário dos valores que caracterizam a cultura ocidental, justamente o que Miguel Reale denominou de historicismo axiológico. Popper vale-se justamente dessa espécie de historicismo ao reivindicar para a sociedade aberta aqueles princípios que se fundam no valor da pessoa humana, uma das características distintivas de nossa civilização. Embora na tradução não coubesse adotar outro termo, cumpre levar em conta o sentido em que o emprega e de que tradição se louva para fazê-lo. A Sociedade Aberta e Seus Inimigos inicia um ponto de inflexão a partir do qual a doutrina liberal encontrou o caminho que o levaria, nas décadas seguintes, a impor ao comunismo totalitário uma derrota que se espera seja definitiva.

[12] A Sociedade Aberta e seus Inimigos, de Karl Popper (1902-1994), foi publicada (1945) num momento em que o caráter totalitário do regime soviético ficara obscurecido em decorrência da aliança da União Soviética com o Ocidente, contra o nazismo. Logo adiante, na medida em que os russos logram impor o seu odioso sistema a sucessivos países no Leste europeu, a pertinência do alerta de Popper iria tornar-se evidente, assegurando o sucesso da obra e a sua sucessiva reedição. Para muitos segmentos da sociedade, a União Soviética estava associada ao socialismo, criação ocidental francamente caudatária da tradição cristã. Os fundadores do socialismo, no século XIX, associaram-no à ideia cristã da fraternidade universal. Ao mesmo tempo, entretanto, tinha-se consciência de que o bolchevismo inseria uma componente despótica inquestionável, amesquinhadora da pessoa humana, entrando em franca contradição com o cristianismo. Os socialistas alemães, ao longo da década de 20, advertiram quanto à verdadeira característica do regime soviético, movendo uma crítica demolidora, notadamente às ideias de “socialismo científico” e “ditadura do proletariado”. Contudo, nos anos 30, ao formar inicialmente contra o nazismo, os russos e seus seguidores no Ocidente turbaram de alguma forma aquela consciência. Embora a aliança entre os dois totalitarismos haja sido recomposta com a assinatura do Pacto Germano-soviético, em 1937, a invasão da União Soviética pela Alemanha, em 1941, e o ingresso desta na Aliança Ocidental criou a ilusão de que o regime soviético poderia caminhar no sentido da democracia. O seu empenho de domínio da Europa, nos anos subsequentes ao término da guerra, acabaria evidenciando o irrealismo daquela expectativa. Neste particular é que o livro de Popper tornou-se um verdadeiro marco, ao identificar e criticar os fundamentos doutrinários dos inimigos do sistema democrático representativo vigente nos principais países do Ocidente, que batizou com a feliz expressão de sociedade aberta.

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[13] Popper abre sua teoria com as seguintes palavras: “Tolerância ilimitada culminará no desaparecimento da tolerância. Se estendermos a tolerância ilimitada até para aqueles que são intolerantes […], então os tolerantes serão destruídos, e junto com eles a tolerância.”

[14] Esboça ele algumas das dificuldades enfrentadas pela nossa civilização, uma civilização que talvez se possa descrever como objetivando a humanidade e a razoabilidade, a igualdade e a liberdade, uma civilização, por assim dizer, ainda na infância e que continua a crescer a despeito do fato de tantas vezes haver sido traída pelos dirigentes intelectuais do gênero humano. Tenta mostrar que essa civilização ainda não se recuperou de todo do choque de seu nascimento, da transição da sociedade tribal, ou “sociedade fechada”, com sua submissão às forças mágicas, para a sociedade aberta, que põe em liberdade as faculdades críticas do homem. Procura demonstrar que o choque dessa transição é um dos fatores que tornaram possível o surgimento daqueles movimentos reacionários que tentaram, e ainda tentam, derrubar a civilização e retornar ao tribalismo. E sugere que aquilo a que hoje damos o nome de totalitarismo pertence a uma tradição que é tão antiga, ou tão nova, como a nossa própria civilização.

[15] Certo grau de opacidade e, portanto, de Ideologia, é, pois, intrínseco ao conhecimento científico, cujas normas tampouco foram ditadas por alguma divindade imune ao tempo e às injunções da mudança. São normas historicamente condicionadas. Enquanto tais, elas evoluem e se alteram. Isto significa que, em matéria de ciência não há objetividade absoluta “A imagem do mundo que as ciências elaboram de forma alguma pode ser concebida como um instantâneo fotográfico. De uma forma ou de outra, ela é sempre interpretação” (JAPIASSÚ:1981, ps.44-5).

[16] Práxis é um conceito filosófico da atividade teórico-prática do ser humano em todas as áreas da sociedade. Entendida como categoria filosófica, a tensão dialética que se estabelece entre seus pares contraditórios – teoria&prática – permite depreender e compreender a dinâmica do ambiente. Segundo o pensamento marxista, a práxis é atividade humana prático-crítica na medida em que é atividade sensível subjetiva; ou seja, uma atividade plenamente perceptível e consciente para o homem.

[17] É a imputação ofensiva atribuída contra a honorabilidade de alguém com a intenção de desacreditá-lo na sociedade em que vive, e provocar contra ele desprezo ou menosprezo público. Diferença entre difamação e calúnia: na calúnia, o fato imputado é considerado crime pelo nosso ordenamento jurídico (por exemplo, Fulano é corrupto); na difamação, não, mas da mesma forma é uma ofensa à dignidade. Vide artigo 139 do Código Penal brasileiro.

[18] Uma curva de sino é um gráfico que representa uma distribuição normal de variáveis, na qual a maioria dos valores se agrupa em torno de uma média, enquanto valores extremos podem ser encontrados acima e abaixo da média. Por exemplo, a altura humana geralmente segue uma curva em forma de sino, com discrepâncias incomuns e altas e altas e a maioria das pessoas concentrada em torno de uma altura média, como 178 cm para homens americanos.

[19] Altermodernidade: nem uma visão linear da História, como a do modernismo, nem uma imagem desta a avançar em espirais de eternos retornos, como defendido pelo pós-modernismo; agora, uma visão da História como estando constituída por múltiplas temporalidades simultâneas em que a vida e a arte surgem como experiências.

[20] O que aquilo que identifica Ética e Estética é o fundamento polissêmico da linguagem que as constitui, em contraposição à linguagem monossêmica da Ciência. Assim, passando para a segunda pergunta, sem deixar o horizonte da linguagem, encontramos uma interpretação da Modernidade e da Pós-modernidade e os modos da Educação de situar-se aí. Quando, então, tentando superar uma visão monossêmica da Educação, passa-se a pensar nas possibilidades daquilo que se pode chamar de polissemia escolar.

Geralmente designamos por Ética aquele tipo de discurso filosófico que recai diretamente sobre as questões da vida, das mais comezinhas às consideradas mais elevadas, das mais simples às mais complexas. Por isso, desde Aristóteles, a Ética tem que ser pensada junto com a Política: qual a vida que posso realizar junto aos outros? Se há opções, qual será a melhor a seguir? Há liberdade para decidir sobre isso, ou a única coisa que há é a liberdade para decidir sobre isso? Há de fato uma forma de vida melhor que a outra e, portanto, todos devem segui-la, sem distinção?

[21] Há um provérbio chinês que diz assim: “Existem sempre três verdades, a minha, a sua e a verdadeira”. Será então que verdade tem a ver com percepção interna? Ou será que são… O que é verdade? Para se ter certeza de que algo é verdade, o que é preciso saber? Há um provérbio chinês que diz assim: “Existem sempre três verdades, a minha, a sua e a verdadeira”. Será então que verdade tem a ver com percepção interna? Ou será que são os valores de cada um que determinam.

[22] Por um lado, a mente racional é a nossa compreensão, entendimento, consciência sobre as coisas, é no fundo aquilo que nos permite pensar, ponderar e refletir sobre o mundo, sobre as relações … sobretudo. Por outro lado, existe um sistema de conhecimento mais impulsivo e poderoso – a mente emocional. Uma pessoa que toma decisões puramente racionais pode apresentar problemas de empatia. Isso porque ela tende a se preocupar com resultados e efeitos sem vivenciar precisamente os estados emocionais Nessa mesma direção, Immanuel Kant, na obra Fundamentação da metafísica dos costumes (1786), nos advertiu sobre a impossibilidade do encontro entre razão e felicidade, quando afirmou que "quanto mais uma razão cultivada se consagra ao gozo da vida e da felicidade, tanto mais o homem se afasta do verdadeiro contentamento". Afirmou também que se Deus tivesse feito o homem para ser feliz não o teria dotado de razão. Esse filósofo considerava, ainda, as paixões como "enfermidades da alma".  Tais reflexões denotam, também, como Kant estabelecia uma hierarquia entre a razão e as emoções. Longe de terem sido esquecidas, essas premissas da filosofia permanecem vivas até os dias atuais, muitas vezes traduzidas sob metáforas que ouvimos frequentemente na vida cotidiana: "não aja com o coração", "coloque a cabeça para funcionar", "seja mais racional". Nessa perspectiva, parece-nos que para uma pessoa tomar decisões corretas é necessário que ela se livre ou se desvincule dos próprios sentimentos e emoções. Fica a impressão de que, em nome de uma resolução sensata, deve-se desprezar, controlar ou anular a dimensão afetiva. 

[23] O erro de Descartes seria, então, o de imaginar uma razão apartada do corpo, uma mente alheia ao organismo e seus estímulos. Na verdade, ele encontrou três certezas. Por mais que elas sejam um encadeamento de ideias, elas acontecem meio que ao mesmo tempo: Eu existo, Deus existe, a Realidade existe. Porque os nossos sentidos nos enganam às vezes, quis supor que não existia nada que fosse tal como eles nos fazem imaginar. E, por haver homens que se desviam ao raciocinar, mesmo nas mais simples noções de geometria, e cometem paralogismos, rejeitei como falsas todas as razões que tomara antes por demonstrações.

[24] Habermas propõe um modelo ideal de ação comunicativa, em que as pessoas interagem e, através da utilização da linguagem, organizam-se socialmente, buscando o consenso de uma forma livre de toda a coação externa e interna. A Ética do Discurso de Habermas (1989a) é conhecida por sua sugestão de que a racionalidade e a argumentação deveriam guiar os seres humanos no processo de decisão daquilo que faz sentido e daquilo que aceitam como correto para suas vidas.

[25] Para compreendermos o que foi a filosofia iluminista é necessário conhecermos John Locke. Basta, para lembrarmos sua importância, citar as palavras de seu discípulo Pierre Coste. Segundo ele, o Ensaio sobre o entendimento humano é “a obra prima dum dos mais belos gênios que a Inglaterra produziu no último século. Esgotaram-se quatro edições em inglês sob vistas do autor, no espaço de dez ou onze anos; e a tradução francesa que publiquei em 1700, fê-lo conhecer na Holanda, França, Itália, Alemanha, pelo que tem sido e é ainda tão estimado em todos estes países como na Inglaterra, onde nunca deixam de admirar a extensão, a profundidade, a justeza e a nitidez que nele reinam do princípio ao fim. Para cúmulo da glória, adotado de qualquer modo em Oxford e Cambridge, é aí lido e explicado aos jovens como o livro mais próprio para lhes formar o espírito, para regular e estender os seus conhecimentos; de modo que Locke conserva agora o lugar de Aristóteles e dos seus mais célebres comentadores, nestas famosas universidades.”. Esse autor que formou os espíritos dos homens de letras do século XVIII, como empirista que era, foi nominalista. Como nos lembra J. Thonnard, Locke estudou em Oxford e ali, “tomado de desgosto do método formalista do ensino, impregnou-se do espírito do nominalismo de Ockham que ali reinava.”. Realmente, analisando o que Locke defendeu no Ensaio, chegamos a essa conclusão.  Para notarmos as trevas nas quais estava submerso o dito Século das Luzes. Esse século, que foi divulgador e sistematizador dos princípios modernos, preparando o triunfo da mentalidade moderna, teve como fruto de seus princípios a negação do intelecto, a negação da verdade e da própria razão que afirmava defender. O Século das Luzes recusou a luz do intelecto e mergulhou os homens nas trevas do ceticismo. O falso século das luzes trouxe escondido na arrebatadora e otimista bandeira do racionalismo, a deprimente e pessimista negação da razão, levando o Ocidente ao agnosticismo e ao idealismo. Foi com razão, portanto, que Karl Popper considerando o racionalismo afirmou: “Seja, como for, poderemos descrevê-lo como uma irracional fé na razão.”

[26] O Muro de Berlim foi construído em 1961, ao redor da cidade de Berlim Ocidental, a capital da Alemanha Ocidental. Essa construção tinha como proposta isolar essa cidade e fechar suas fronteiras com a Alemanha Oriental. Foi um dos grandes símbolos que evidenciaram a polarização do mundo no período da Guerra Fria. O muro de Berlim foi o símbolo máximo da bipolarização do mundo durante a Guerra Fria e sua queda representou o fim do socialismo como alternativa de modelo econômico naquele contexto.

[27] Globalização é o processo de aproximação entre as diversas sociedades e nações existentes por todo o mundo, seja no âmbito econômico, social, cultural ou político. Os tipos de globalização são três: econômica, cultural e da informação. A globalização é o processo de aproximação entre as diferentes sociedades e países existentes de todo o Planeta, seja na esfera econômica, social, cultural ou política.

[28] Se o Direito pressupõe certa estabilização de valores majoritários ou consensuais para que a norma exerça seu poder de escolha de conteúdos normativos, a pergunta, num momento transitivo, acaba sendo: quais os consensos possíveis num mundo em transformação? Então passam a ser debates correntes: clonar pessoas ou proibir cientistas de realizar experiências genéticas com seres humanos? autorizar casamentos entre homossexuais ou proibir a constituição destas sociedades maritais? diminuir a idade penal e reconhecer a incapacidade da sociedade de atrair novas gerações à consciência social ou deixar relativamente impunes atrocidades cometidas por menores? Diferentemente de como se concebia o Direito como centro de especulações na ideologia burguesa e iluminista dos séculos XVIII e XIX, passa-se a concebê-lo, em meio a tantas transformações socioculturais, como um processo em transformação, permeável às novas demandas e adaptado aos novos atores sociais.

[29] A filosofia moderna renegou o senso comum e a propensão natural do homem. Poderíamos afirma, portanto, que ela virou às costas ao bom senso e negou a evidência. Essa posição absurda e antinatural não poderia senão estabelecer o caos. O pensamento moderno negou a verdade claramente conhecida e deixou o homem moderno à deriva, sendo lançado ao sabor das ondas de um lado para outro, do materialismo ao idealismo e do idealismo ao materialismo, sem nunca encontrar a paz.   De maneira que o problema para a filosofia moderna é assustador, porque agora a filosofia não tem mais remédio senão tirar do ‘eu’ as coisas. (...) Agora é que a filosofia começa a ser difícil: porque agora é que a filosofia, por necessidade histórica e não por capricho, volta as costas ao senso comum, voltou-se de costas à propensão natural e nos convida a realizar um exercício acrobático de extrema dificuldade, que consiste em pensar as coisas como derivadas do eu. Eis aqui ao que chegamos com a nova tese do idealismo.

Sobre a autora
Gisele Leite

Professora universitária há três décadas. Mestre em Direito. Mestre em Filosofia. Doutora em Direito. Pesquisadora - Chefe do Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas. Presidente da Seccional Rio de Janeiro, ABRADE Associação Brasileira de Direito Educacional. Vinte e nove obras jurídicas publicadas. Articulistas dos sites JURID, Lex Magister. Portal Investidura, Letras Jurídicas. Membro do ABDPC Associação Brasileira do Direito Processual Civil. Pedagoga. Conselheira das Revistas de Direito Civil e Processual Civil, Trabalhista e Previdenciária, da Paixão Editores POA -RS.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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