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Emenda 28 e o marco inicial da prescrição dos direitos do trabalhador rural

01/08/2000 às 00:00
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A Emenda Constitucional nº 28, promulgada em 25 de maio de 2.000, publicada no Diário Oficial da União do dia 26 do mesmo mês e ano, deu nova redação ao inciso XXIX do artigo 7º da atual Constituição Federal, fixando prazo prescricional de cinco anos para o trabalhador rural exercer o direito de ação quando verificar lesão dos direitos trabalhistas na vigência do pacto laboral, mantendo a prescrição bienal após a rescisão contratual.

É este o texto da Emenda:

          Art. 1º O inciso XXIX do art., 7º da Constituição Federal passa a vigorar com a seguinte redação:

‘XXIX – ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho,’

‘a) (Revogada)’.

‘b) (Revogada)’

Art. 2º Revoga-se o artigo 233 da Constituição Federal.

Art. 3º Esta Emenda Constitucional entre em vigor na data de sua publicação.

Abrimos um parêntese para esclarecermos que embora o texto constitucional expresse o termo "extinção" do contrato de trabalho, o sentido jurídico da palavra aqui empregada é "rescisão", gênero da espécie "extinção" que é utilizada na doutrina majoritária quando nos referimos ao contrato a termo. Portanto, neste texto, substituiremos a expressão "extinção" utilizada no texto constitucional, pelo gênero "rescisão" para harmonizarmos o sentido jurídico da frase.

Seguindo o comentário, o novo texto veio corrigir a diferença social criada pelo Poder Constituinte de l..988 que não observou a "prescrição imprescritível", axioma encontrado no inciso XXIX do artigo 7º da atual Constituição Federal que acolheu e reconheceu a constitucionalidade do artigo 10 da Lei 5.889/73 que também havia recepcionado o privilégio da imprescrição rural marcada pelo artigo 175 do antigo Estatuto do Trabalhador Rural, Lei 4.214/63, que fixava o prazo prescricional de 02 anos após a rescisão do contrato de trabalho rural para o empregado exercer o direito de ação visando postular verbas decorrentes do contrato laboral, restando expressa a imprescrição dos direitos trabalhista no período de vigência do contrato de trabalho.

Marcou-se, pois, evidente contra-senso o texto constitucional que acolheu a norma ordinária, porquanto aplicou critérios diferenciados ao conceder privilégios de classe quando tratou da extinção de direitos dos trabalhadores urbanos e rurais nas letras "a" e "b" do inciso XXIX do artigo 7º, enquanto assegurava nos demais incisos a igualdade na aquisição de direitos aos trabalhadores de classes distintas, recaindo no adágio latino privilegium odiosum est.

A inexistência do prazo prescricional para a extinção dos direitos trabalhistas na vigência do contrato de trabalho rural trouxe insegurança jurídica nas relações contratuais entre empregador e empregado dessa categoria porque o vínculo laboral dessa classe perdura, na maioria das vezes, por 20 ou 30 anos de prestação de trabalho para o mesmo empregador, acarretando a este último a obrigação de guardar todos os recibos de quitação das obrigações trabalhistas pelo longo período da relação contratual até dois anos contados da rescisão do pacto.

Na intenção de corrigir o privilégio concedido aos trabalhadores rurais, o Legislador Constituinte estabeleceu no artigo 233 e seus parágrafos c/c o § 3º do artigo 10, das Disposições Constitucionais Gerais e Transitórias, a possibilidade de o empregador rural desvencilhar-se das obrigações trabalhistas na fluência do vínculo empregatício com determinado empregado, quando comprovasse, perante a Justiça do Trabalho, o cumprimento dessas obrigações.

Também aqui não se solucionou o problema. Ao contrário, criava-se outro, porquanto a realidade do rural difere muito da urbana, isto porque é conhecido o fato de existir entre empregador e empregado daquela classe um laço estreito de amizade, muitas vezes tornando-se até compadres, reinando entre as partes uma confiança idêntica a do sistema familiar. Neste caso, o empregador viu-se na possibilidade de abalar a harmonia existente no ambiente de trabalho, ao compelir o seu empregado a lhe passar recibo de quitação das obrigações que lhe houvera pagado, isto porque era certo que a simplicidade e ignorância intelectual que é peculiar dos empregados dessa categoria, o impediria a entender que a prática de conceder recibo de quitação ao patrão no ato do recebimento das verbas trabalhistas é fato corriqueiro na relação de emprego, acreditando não ser digno da confiança do patrão que não acreditava em sua "palavra", motivo pelo qual estava a lhe exigir os recibos.

A nova redação emprestada ao texto constitucional atendeu ao inconformismo dos empregadores rurais e da doutrina majoritária, proporcionando a aclamada segurança jurídica e restabelecendo a igualdade social entre trabalhadores urbanos e rurais.


Conclusão.

Sanando a desigualdade social anteriormente criada, o texto do inciso XXIX do artigo 7º, com redação alterada pela Emenda Constitucional nº 28, prestigiou o princípio da isonomia insculpido no caput do artigo 5º Constitucional, obervando ainda, o princípio da Teoria Geral do Direito onde os direitos nascem com prazo de extinção determinado.

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Embora conste do artigo 2º da Emenda a revogação apenas do artigo 233 da Constituição Federal, deve ser observada a regra prevista no § 1º, do artigo 2º da LICC, restando revogado o § 3º do artigo 10 das Disposições Transitórias e aos artigos: 11, letra "b", da C.L.T; 175 do Estatuto do Trabalhador Rural e 10 da Lei 5.889/73, Lex posterior derogat priori.

Em relação ao conflito intertemporal das leis entendemos que uma vez fixado o prazo prescricional pela Emenda Constitucional este terá aplicação a partir da publicação da nova norma, em atendimento ao princípio da imediatidade, sem, contudo, violar o princípio da irretroatividade das leis, artigo 6º da LICC.

Assim, a partir de 26 de maio de 2.000, data da publicação da emenda em comento, aplicar-se-á aos contratos rurais vigentes e rescindidos a partir desta data, a prescrição prevista no texto constitucional já alterado, observando-se que diante da imprevisão da norma anterior nenhum prazo prescricional fluía antes da vigência da nova norma, porquanto a situação anterior à alteração constitucional não pode ser atingida em face da irretroatividade da norma, devendo-se marcar o prazo inicial da prescrição para postular o direito a partir da publicação da citada emenda, que irá refletir efeitos somente sobre facta futura.

Nesse raciocínio temos que: a) Aplicando a nova regra na vigência do contrato de trabalho rural, o empregado terá a partir de 26.05.2000 o prazo de cinco anos para postular os direitos às verbas trabalhistas de todo o pacto laboral,, ou seja, até 26.05.2005 não se consuma qualquer prescrição.

Em relação às ações protocolizadas a partir de 27.05.2005, terá, então, se consumado o prazo prescricional dos direitos anteriores à data da publicação da nova lei, fazendo jus, o reclamante, apenas às verbas do qüinqüênio que antecede a data da interposição da ação.

b) Aos contratos rescindidos antes da publicação da emenda e às ações em andamento aplicar-se-á a lei anterior, isto porque em relação às situações retroativas não havia nenhum prazo prescricional se escoando, com exceção da prescrição bienal fixada para o exercício da ação após a rescisão contratual.

c) Aos contratos rescindidos posteriormente à vigência do novo texto constitucional, o procedimento é idêntico àquele mencionado na letra "a", observando-se, também, a aplicação do prazo bienal previsto na norma anterior e recepcionado pela nova redação.

d) Processos em curso. Pelo princípio de que a lei vale para o futuro, não para o passado, Lex prospicit, non respicit, não se iniciando qualquer prazo prescricional antes da publicação da nova norma por falta de previsão legal, não haverá, por conseqüência, direito adquirido a ser invocado pelo prescribente nas ações em curso, pela inexistência de previsão prescricional à luz da velha norma. O prazo a quo da prescrição é contado da data da publicação da Emenda. Portanto, na prática, a invocação desse direito, pelo prescribente, só poderá ser acolhida e aplicada, decorridos cinco anos da data da publicação da norma atual, data em que se consumará a prescrição dos direitos anteriores à publicação da norma instituidora da prescrição para o trabalhador rural..

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Sobre a autora
Glauce de Oliveira Barros

pós-graduanda em Direito do Trabalho, chefe de gabinete de juiz do TRT-24ª Região, em Campo Grande (MS)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BARROS, Glauce Oliveira. Emenda 28 e o marco inicial da prescrição dos direitos do trabalhador rural. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 44, 1 ago. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1174. Acesso em: 19 abr. 2024.

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Artigo também publicado publicado no JTb Consulex nº 819, edição de 03/07/2000.

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