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"Astreintes" contra Fazenda Pública

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CONCLUSÃO

Ao término desta pesquisa, ficou demonstrado que a inovação da ordem jurídica trouxe um avanço significativo na efetividade da prestação jurisdicional, que antes se via impotente frente ao descumprimento da maioria das obrigações de fazer, tendo de recorrer ao insatisfatório expediente da substituição da obrigação por perdas e danos.  Agora a regra geral é a da tutela específica da obrigação de fazer, ficando a possibilidade de sua conversão em perdas e danos apenas para as hipóteses de: absoluta impossibilidade da substituição; estar a possibilidade de substituição excluída pelo próprio título constitutivo da obrigação; ou de pedido expresso do credor neste sentido.

Com o intuito de induzir o obrigado ao adimplemento das obrigações específicas, autorizadas pelo Código de Processo Civil, as multas periódicas são a versão brasileira das astreintes concebidas pelos tribunais franceses com a mesma finalidade, atuam no sistema mediante o agravamento da situação do obrigado renitente, onerando-o mais e mais a cada hora que passa, ou a cada dia, mês ou ano, ou a cada ato indevido que ele venha a repetir, com o objetivo de criar em seu espírito a consciência de que lhe será mais gravoso descumprir do que cumprir a obrigação emergente do título executivo.

O estudo das astreintes comporta inúmeras vertentes dentro da esfera jurídica pátria, sendo certo que sua melhor preponderância ocorre em relação a trazer efetividade às decisões judiciais.

A legislação instrumental pátria coloca à disposição do juiz ferramentas de coerção psicológica para serem utilizadas contra o devedor, com o intuito de coagi-lo ao cumprimento da obrigação inadimplida. De regra, estes instrumentos acompanham a determinação de conteúdo material, para emprestar ao referido comando a necessária executividade (execução indireta).

A legitimidade do Ministério Público também encontra sólido arrimo à luz de uma interpretação lógico-sistemática dos dispositivos insertos na legislação ordinária, material e processual, em que, de igual sorte, se lhe cometeram diversos poderes e faculdades que se harmonizam plenamente com a iniciativa de propugnar pela efetivação dos comandos judiciais editados contra a Fazenda Pública.

No atual sistema, é legitimado para cobrar a multa diária prevista no art. 461 do CPC o credor da obrigação. Todavia, conforme se demonstrou, melhor seria o Estado. A multa diária imposta na sentença ou na decisão liminar constitui novo título executivo e para a efetivação da sua cobrança faz-se necessário preencher os requisitos da liquidez, certeza e exigibilidade.

A multa diária imposta na sentença é exigida após o trânsito em julgado ou quando impugnada a sentença por meio de recurso desprovido de efeito suspensivo; é fixada em decisão liminar, é exigida desde findo o prazo para o cumprimento da obrigação, portanto, antes do trânsito em julgado.

O sistema brasileiro de pagamento dos débitos públicos, declarados judicialmente, ainda está assimilando o conteúdo das recentes alterações constitucionais. Com efeito, mudar a consciência jurídica a respeito de determinado tema não é tarefa das mais fáceis, ainda mais em se tratando de débitos públicos. No entanto, como tradução inconteste do momento político vivido por nosso país, verifica-se que devem ser retiradas de nosso ordenamento jurídico medidas penalizadoras da sociedade, em todos os sentidos. Especialmente, no que diz respeito aos prejuízos causados pela demora da Justiça.

O objetivo da astreinte é uma das facetas do poder de coerção, ou seja, medida para obtenção compulsória da prática ou abstenção do ato e adequar-se à tendência de maior liberdade no exercício da função judicial.

O objetivo tardio da obrigação não afasta a obrigatoriedade da multa, durante o período em que quebrou descumprida a determinação judicial, valendo dizer que o autor da demanda poderá receber cumulativamente a multa e o cumprimento específico tardio.

É possível fixar astreinte contra a Fazenda Pública. Para que contenham efetividade, permite-se sejam as astreintes impostas ao agente público responsável pelo cumprimento da determinação judicial.


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Sobre o autor
José Guerra de Andrade Lima Neto

técnico em Edificações pelo Centro Federal de Educação Tecnológico de Pernambuco - CEFET-PE, graduação em Bacharelado em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco - UNICAP, Pós-graduação em Direito Público pela Universidade Católica Dom Bosco - UCDB-MS, Pós-graduação em Direito Administrativo pela Universidade Gama Filho - UGF-DF, e na mesma instituição, Pós-graduando em Direito Processual Civil,servidor público federal no Tribunal Regional Eleitoral de Pernambuco

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIMA NETO, José Guerra Andrade. "Astreintes" contra Fazenda Pública. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2369, 26 dez. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14086. Acesso em: 26 abr. 2024.

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